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MEMÓRIA
Na esteira de “Ainda Estou Aqui”, Assessoria Especial em Defesa da Democracia indica filmes voltados para o tema do combate à repressão
ADMV destaca poder do cinema de dar voz àqueles que foram silenciados e fazer com que a sociedade encare seu passado e reflita sobre o presente (Foto: Ainda Estou Aqui/Divulgação)
O cinema, como toda forma de arte, é um poderoso instrumento para resgatar histórias silenciadas e refletir sobre a memória, a verdade e a justiça. Neste domingo (2), a premiação do Oscar coloca o Brasil em destaque com o filme “Ainda Estou Aqui” (2024), de Walter Salles, como um dos concorrentes à estatueta de Melhor Filme, além de disputar em outras duas indicações: Melhor Filme Internacional e Melhor Atriz, com Fernanda Torres.
Aclamado pela crítica e já vencedor do Globo de Ouro, o longa metragem, que retrata a história de uma família afetada pela ditadura militar, dando ênfase em Eunice Paiva, figura importante na luta pela verdade e memória dos desaparecidos políticos do período, tem levantado debates importantes sobre a ditadura militar, memória, verdade e justiça, temas concernentes à atuação deste ministério.
Diante desse cenário, a Assessoria Especial em Defesa da Democracia, Memória e Verdade (ADMV) do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania reuniu indicações de filmes que tratam da repressão política e seus impactos na sociedade. São obras que abordam diferentes aspectos da resistência, das perseguições e da busca por justiça, ajudando a reconstruir a história e dar voz àqueles que foram silenciados.
Símbolos de resistência
Carlos Marighella, um dos nomes mais marcantes da luta contra a ditadura militar no Brasil, tem sua história contada em duas produções fundamentais: “Marighella” (2012), documentário dirigido por Isa Grinspum Ferraz, e “Marighella” (2019), cinebiografia de Wagner Moura. "Por meio de linguagens diferentes, ambos os filmes ajudam a entender não apenas a militância e a ação política, mas também a dimensão humana de Marighella", destaca o coordenador de Apoio a Políticas de Memória e Verdade, Elson Silva. De acordo com ele, a trilha sonora é um dos pontos altos das obras. "A música Mil Faces de um Homem Leal, dos Racionais MC’s, carrega um peso simbólico muito forte e reforça a atualidade do tema”, ressaltou.
O coordenador lembrou, ainda, que "Marighella" de 2019 se inspira no premiado livro "Marighella, o guerrilheiro que incendiou o mundo", do jornalista Mario Magalhães, além de ter recuperado o documentário intitulado "Marighella - Retrato Falado do Guerrilheiro" (2001), dirigido por Silvio Tendler.
A coordenadora-geral de Memória e Verdade da Escravidão e do Tráfico Transatlântico de Pessoas Escravizadas, Moema Carvalho, destaca que ainda são poucas as produções audiovisuais que retratam a resistência e a organização da população negra durante a ditadura, mas os documentários "Black Rio! Black Power!" (2023), de Emílio Domingos, e "O Negro da Senzala ao Soul" (1977), de Gabriel Prioli, mostram como a cultura negra era vista como ameaça pelos militares em contraponto ao mito da "democracia racial" tão propagado pela ditadura e a violência que seguiu duramente contra a população negra, tão pouco noticiada. De acordo com ela, as forças de repressão da ditadura militar temiam o surgimento de um movimento “Panteras Negras”, como ocorrido nos Estados Unidos, em solo brasileiro.
“A população negra brasileira sempre se auto-organizou e resistiu através e pela nossa cultura. Desde a capoeira aos bailes black, das senzalas aos dias de hoje, a população negra resiste apesar das violências da sociedade e das forças de segurança combinada com as intersecções de opressões.” "São filmes essenciais sobre a resistência negra que retratam não apenas a ditadura e que valem a pena serem vistos", enfatizou Moema.
Apesar de a resistência à ditadura ser frequentemente associada a figuras masculinas, filmes como “Que Bom te Ver Viva” (1989), de Lúcia Murat, e “Torre das Donzelas” (2018), de Susanna Lira, resgatam o papel fundamental das mulheres nesse contexto. "As histórias de mulheres perseguidas pela ditadura foram historicamente silenciadas", aponta a coordenadora-geral de Políticas de Memória e Verdade, Paula Franco. "Ambos os filmes nacionais, feitos por mulheres, são um convite para pensar a ditadura para além da figura masculina que ainda protagoniza a maior parte das produções sobre a temática”, completou.
Outro documentário essencial é “Barra 68 – Sem Perder a Ternura” (2001), de Vladimir Carvalho, que resgata a invasão da Universidade de Brasília pela ditadura. "Assistir a esse documentário é quase um rito de passagem para quem estuda na UnB", comenta Flávia Neri Fontinelle de Aguiar. "A história da universidade se confunde com a história da luta pela democracia no Brasil”.
Arte e luta
“Tatuagem” (2013), de Hilton Lacerda, retrata um grupo teatral marginalizado durante a ditadura. "A história se passa na periferia de Recife e foca na contestação da ordem social vigente através da arte e nas relações afetivas entre as personagens. Entre música, poesia e transgressão, o filme traz o contexto político da época, lembrando que o pessoal é, também, político e que as pessoas periféricas também foram afetadas", afirma Elaine Muniz Pires, coordenadora de Apoio à Comissão Especial de Mortos e Desaparecidos Políticos.
Enquanto “Dzi Croquettes” (2009), dirigido por Raphael Alvarez e Tatiana Issa, também aborda o papel da arte em contextos ditatoriais. É um documentário sobre o grupo teatral homônimo, que traz um olhar inusitado sobre a resistência à repressão. "Muitos pensam que só os grupos armados lutaram contra a ditadura, mas a resistência veio de várias formas, inclusive pela arte e pelo humor", destaca Kátia Azambuja, analista na ADMV.
O impacto da repressão no campo
O documentário “Cabra Marcado para Morrer” (1984), de Eduardo Coutinho, é um marco na história do cinema político brasileiro. Iniciado antes do golpe de 1964, o projeto foi interrompido pela ditadura e retomado 17 anos depois. "Esse filme é um registro valioso da luta dos trabalhadores rurais e da repressão no campo", explica o chefe da ADMV, MDHC, Nilmário Miranda. Recentemente, ele participou do Festival Cultural da Memória Camponesa, evento que celebrou o centenário de Elizabeth Teixeira, protagonista do documentário.
Marcas no presente
Uma das produções mais recentes sobre o tema é “O Pastor e o Guerrilheiro” (2023), dirigido por Eduardo Belmonte. O filme acompanha a relação entre um ex-militante da Guerrilha do Araguaia e um pastor evangélico que foi preso por engano. "A obra consegue costurar diferentes tempos históricos e mostrar como as feridas da ditadura ainda estão abertas", comenta o ex-preso político e assessor especial do MDHC, Hamilton Pereira.
As ditaduras na América Latina
Além das produções nacionais, filmes estrangeiros também ajudam a compreender a repressão na América Latina. Entre os indicados pela equipe da ADMV estão “Argentina, 1985” (2022), “Infância Clandestina” (2011) e “Crônica de uma Fuga” (2006), todos da Argentina, além de “Machuca” (2004), do Chile. Outro documentário de grande relevância recente é “La Memoria de los Cuerpos” (2021), que aborda as violências sexuais cometidas contra mulheres durante a ditadura argentina.
O papel do cinema
Com essa seleção de filmes, a Assessoria Especial em Defesa da Democracia, Memória e Verdade reforça a importância de manter viva a história das vítimas da repressão e de ampliar o debate sobre democracia e direitos humanos. "O cinema tem esse poder de dar voz a quem foi silenciado, de fazer com que a sociedade encare seu passado e reflita sobre o presente", conclui a coordenadora-geral, Paula Franco.
Filmes brasileiros:
- Black Rio! Black Power! (2023), de Emílio Domingos
- O Pastor e o Guerrilheiro (2023), de Eduardo Belmonte
- Marighella (2019), de Wagner Moura
- Torre das Donzelas (2018), de Susanna Lira
- Em busca de Iara (2013), de Flavio Frederico
- Tatuagem (2013), de Hilton Lacerda
- Marighella (2012), de Isa Grinspum Ferraz
- Dzi Croquettes (2009), de Raphael Alvarez e Tatiana Issa
- O Ano em que Meus Pais Saíram de Férias (2006) de Cao Hamburger
- Barra 68 – Sem Perder a Ternura (2001), de Vladimir Carvalho
- Marighella - Retrato Falado do Guerrilheiro (2001), de Silvio Tendler
- Ação entre Amigos (1998), de Beto Brant
- Que Bom te Ver Viva (1989), de Lúcia Murat
- Cabra Marcado para Morrer (1984), de Eduardo Coutinho
- O Negro da Senzala ao Soul (1977), de Gabriel Prioli
- Os Inconfidentes (1972), de Joaquim Pedro de Andrade
Filmes estrangeiros:
- Argentina, 1985 (2022), de Santiago Mitre
- La Memoria de los Cuerpos (2021), de María Marta Garcia Scarano
- Uma Noite de 12 Anos (2018), Álvaro Brechner
- O pacto de Adriana (2017), de Lisette Orozco
- Infância Clandestina (2011), de Benjamín Ávila
- Nostalgia da Luz (2010), Patricio Guzmán
- Crônica de uma Fuga (2006), de Adrián Caetano
- Machuca (2004), de Andrés Wood
- Kamtchaka (2003), de Marcelo Piñeyro
- A História Oficial (1985), de Luis Puenzo
- Cria Cuervos (1976), de Carlos Saura
- A Batalha do Chile (1975-1979), Patricio Guzmán
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Texto: E.G. e R.M
Edição: L.M.
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