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FINANCIAMENTO
CNS defende transparência rigorosa sobre R$ 24,8 bilhões em emendas e declara apoio ao STF para blindar o SUS
Foto: Ascom CNS
Em uma ofensiva para retomar a racionalidade no financiamento da saúde pública, o Pleno do Conselho Nacional de Saúde (CNS), a partir de articulação da Comissão Intersetorial de Orçamento e Financiamento (Cofin), aprovou um pacote de três medidas estratégicas para subsidiar a fiscalização do uso de recursos indicados pelo Legislativo. A decisão foi tomada durante a 373ª Reunião Ordinária do colegiado, realizada nos dias 10 e 11 de dezembro.
A aprovação das medidas, uma Moção de Apoio, uma Recomendação e uma Resolução, ocorre após a constatação de que, no último ano, R$24,8 bilhões do Fundo Nacional de Saúde (FNS) foram executados via emendas parlamentares. O volume de recursos exige monitoramento urgente, segundo o coordenador da Cofin, Getúlio Vargas Júnior.
O dado alarmante sobre o valor das emendas foi apontado em estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), publicado na nota técnica "Emendas parlamentares ao orçamento federal do SUS: 2014-2024". O levantamento evidencia um aumento significativo das despesas em Ações e Serviços Públicos de Saúde (ASPS) da União via emendas: o valor saltou de R$5,1 bilhões, em 2014, para R$24,8 bilhões em 2024. No mesmo período, a participação dessas emendas nas despesas discricionárias (aquelas que o governo tem liberdade para gerir) do Ministério da Saúde subiu de 18,6% para 45,4%.
Medidas aprovadas
O primeiro documento avalizado pelo Pleno é a Moção de Aplauso n.º 4 ao ministro Flávio Dino e ao Supremo Tribunal Federal (STF). O texto respalda a atuação recente da Corte para disciplinar o "orçamento secreto" e as "emendas Pix", exigindo que a liberação desses recursos respeite os princípios constitucionais da transparência e da impessoalidade.
Para combater o uso político da verba, conselheiras e conselheiros de saúde também aprovaram a Recomendação n.º 18 direcionada ao Ministério da Saúde, ao Tribunal de Contas da União (TCU) e ao Congresso Nacional. O documento exige que o destino das emendas dialogue obrigatoriamente com o que foi aprovado nos Planos de Saúde e pactuado nos Conselhos de Saúde locais. O objetivo é garantir que o dinheiro atenda a necessidades coletivas reais da população, bloqueando repasses motivados apenas por interesses pessoais ou eleitorais de parlamentares.
A terceira medida é a Resolução n.º 798, que endurece as regras de prestação de contas. O CNS determina que o Ministério da Saúde e o Fundo Nacional de Saúde (FNS) apresentem (mensalmente ou quadrimestralmente, inclusive no Relatório Anual de Gestão - RAG), um quadro detalhado da distribuição das emendas. O relatório deverá responder: quem enviou o recurso (deputado, senador, comissão ou bancada), qual o valor exato e como a verba foi utilizada na ponta.
Toda a documentação aprovada será disponibilizada em breve após publicação em Diário Oficial.
A "parlamentarização" do orçamento
A partir das discussões e encaminhamentos do Seminário "Financiamento e impacto das emendas parlamentares no SUS", realizado pela Cofin no início de dezembro, o pleno do 373ª RO deliberou para a publicação dos documentos, que dialogam diretamente com os alertas apontados na atividade.
Especialistas apontam que a explosão de emendas, muitas vezes desconectadas das pactuações da Comissão Intergestores Tripartite (CIT), desafia o planejamento sanitário e a equidade do SUS. Ao transferir o poder decisório de critérios técnicos (Executivo) para interesses políticos locais (Legislativo), o sistema enfrenta desorganização na rede de assistência e risco à sustentabilidade fiscal futura dos municípios. A nova postura do CNS visa garantir que o financiamento do SUS sirva à saúde do cidadão, e não como moeda de troca política.
Além disso, a lógica da austeridade fiscal, consolidada pela Emenda Constitucional 95 (Teto de Gastos), retirou cerca de R$ 70 bilhões do SUS entre 2018 e 2022 , transformando o piso constitucional da saúde em um teto de despesas e forçando uma competição predatória por recursos dentro do orçamento público.
Para a presidente do CNS, Fernanda Magano, a narrativa de que o SUS é ineficiente serve aos interesses de mercantilização da saúde, abrindo portas para a privatização e para a atuação predatória do mercado. “O desafio para os próximos anos é mobilizar a sociedade para a 18ª Conferência Nacional de Saúde e pautar um financiamento justo, que não seja corroído pelos juros da dívida pública ou pelas restrições do novo arcabouço fiscal”, declarou.
Natália Ribeiro
Conselho Nacional de Saúde