Notícias
RECONHECIMENTO
Iphan aprova tombamento definitivo do Sítio Histórico e Arqueológico de São José do Queimado
Acervo Iphan
Em Serra (ES), as ruínas da Igreja de São José do Queimado guardam uma história marcada por fé, luta e traição. Em 1849, cerca de 300 homens e mulheres escravizados trabalharam incansavelmente, de sol a sol, movidos por uma promessa de alforria que nunca se cumpriu. Quando perceberam que a liberdade não seria concedida, insurgiram-se em uma revolta: um ato de coragem que ecoa até hoje. Hoje, as ruínas que guardam a memória desse acontecimento recebem o reconhecimento como Patrimônio Cultural brasileiro.
A decisão foi tomada durante o 111º Conselho Consultivo do Patrimônio Cultural, realizado nesta quarta-feira (26), no auditório do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan), em Brasília. Com a aprovação, o Sítio Histórico e Arqueológico de São José do Queimado será inscrito nos Livros do Tombo Histórico e Arqueológico, Etnográfico e Paisagístico.
O presidente do Iphan, Leandro Grass, ressaltou o compromisso da gestão com o reconhecimento do patrimônio de matriz africana no país. “Já são diversos bens reconhecidos, e hoje Espírito Santo reforça seu papel e seu lugar na história do Brasil”, disse ele.
Após a votação, a deputada federal Jack Rocha, do Espírito Santo, frisou que o Conselho realizou “uma reparação histórica incalculável para a população capixaba”. E completou: “Hoje não estamos apenas mantendo as ruínas de pé, mas preservando nossa ancestralidade, nossa fé e tudo o que este patrimônio representa.”
Na leitura do parecer técnico, a relatora do processo, a historiadora Alessandra Ribeiro, destacou que o reconhecimento “permitirá ampliar a visibilidade dessa memória pública e da revolta. Assim, tende a promover um exercício de reparação simbólica no sentido de reconhecer e valorizar a trajetória da cultura negra na atuação da história brasileira”.
A justificativa do tombamento baseou-se em três pilares: relevância histórica e arqueológica do sítio; a importância de visibilidade nacional da Revolta do Queimado como episódio fundamental da resistência negra no país; e a necessidade de articulação entre políticas públicas, especialmente aquelas voltadas à promoção da igualdade racial.
A área tombada abrange as ruínas da igreja, o cemitério local a paisagem composta por árvores de médio e grande porte no entorno. “A presença significativa de vestígios arqueológicos são fatores que contribuem para uma distinção do local frente a outras áreas adjacentes. Os resquícios existentes no referido sítio tornam um lugar que evoca uma sacralidade e rememora a resistência negra à escravidão”, frisou a relatora.
O processo de tombamento envolveu 25 rodas de conversa da equipe da pesquisa junto com a comunidade realizadas ao longo de 2020. Nesses momentos, trataram sobre religiosidade, o papel do poder público, os empreendedores do campo do comércio e turismo, educação, pesquisa e documentação. Os resultados desses diálogos integraram um dossiê de documentação sobre as ruínas da Igreja de São José do Queimado, que contribuiu com o parecer técnico a favor do tombamento.
O sítio já era protegido em nível estadual desde 1992, e o município o incluiu como bem de interesse de preservação em 1990. Desde então, ações vêm sendo desenvolvidas para garantir seu acautelamento, ou seja, medidas de preservação anteriores ao agora consolidado tombamento federal.
A insurreição de 1849
Durante a missa inaugural da Igreja de São José do Queimado, cujo nome é uma referência às frequentes queimadas de cana-de-açúcar da região, em 19 de março de 1849, um grupo de escravizados exigiu a carta de alforria. Liderada por Elisiário, Chico Prego, João da Viúva e outros, a revolta teria sido motivada pela promessa não cumprida feita pelo pároco Gregório José Maria de Bene, que garantiria liberdade àqueles que ajudassem na construção do templo dedicado a São José.
Os escravizados organizaram um levante que reuniu pessoas de diferentes regiões da província capixaba. A repressão foi violenta, seus principais líderes foram condenados à morte, enquanto outros fugiram e formaram quilombos em áreas como Roda d’Água e Retiro, nos atuais municípios de Cariacica e Santa Leopoldina, respectivamente.
Devido à força da insurreição, foram necessários reforços militares do Rio de Janeiro, além das capixabas para contê-la. Os rebelados foram presos e julgados, sendo cinco deles condenados à morte. Elisiário, escapou da cadeia e refugiou-se nas matas do Morro do Mestre Álvaro e nunca mais foi recapturado. Chico Prego foi capturado e enforcado, em 11 de janeiro de 1850.
O local é aberto a visitas guiadas. Para isso, os interessados devem fazer o agendamento no site https://serra.colab.re/, da prefeitura de Serra (ES). O serviço é oferecido para grupos escolares, instituições e público geral, com até 40 pessoas por grupo.
Mais informações
Assessoria de Comunicação Iphan - comunicacao@iphan.gov.br
Mariana Alvarenga - mariana.alvarenga@iphan.gov.br
www.iphan.gov.br
www.instagram.com/iphangovbr
www.facebook.com/IphanGov
www.twitter.com/IphanGovBr
www.youtube.com/IphanGovBr
