Resultado final do Concurso Sílvio Romero 2025
O Centro Nacional de Folclore e Cultura Popular (CNFCP), unidade especial do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN), divulgou o resultado final do Concurso Sílvio Romero de Monografias sobre Folclore e Cultura Popular – edição 2025, uma das mais tradicionais iniciativas de estímulo à pesquisa na área da cultura popular brasileira.
Nesta edição, o concurso recebeu 121 monografias inscritas, provenientes de diversas regiões do país, reafirmando a relevância da premiação no fortalecimento da produção acadêmica e da valorização dos saberes e manifestações culturais populares.
Os prêmios concedidos foram de R$ 25.000,00 para o 1º lugar, R$ 20.000,00 para o 2º lugar e R$ 15.000,00 para o 3º lugar, além da outorga de até três menções honrosas, conforme previsto no edital.
O resultado preliminar foi divulgado no dia 28 de novembro, e o prazo para recurso foi até o dia 3 de dezembro.
Veja, a seguir, os premiados:
1º prêmio:
“Encontros entre fé, arte e patrimônio no 'museu de sítio' de Congonhas (MG)”, de Isabella Mendes Freitas, baseado na tese de doutorado “A cidade colecionada: a fabricação do patrimônio no “museu de sítio” de Congonhas (MG)”, defendida na Universidade Federal de Juiz de Fora - Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais, orientada pelo Prof.º Luzimar Paulo Pereira, em 2024.
Resumo: O trabalho parte da análise da expografia do “Museu de Congonhas”, localizado na cidade de Congonhas (MG), para discutir processos de simbolização relacionados à biografia do Santuário de Bom Jesus de Matosinhos, principal “acervo operacional” do museu. Construo uma etnografia guiada por uma visita ao museu e, a partir de cada sala, eixo e objetos expográficos, analiso processos de “colecionamento”, “artificação”, “hibridação” e “tradução que envolvem os encontros entre a religião, a arte e a política de patrimônio. Tomando o “Museu de Congonhas” como uma forma de colecionar a cidade patrimonializada, e tomando, por sua vez, a própria cidade patrimonializada como uma coleção, realizo, durante o texto, esse movimento duplo, de olhar a cidade por meio do Museu, e compreender a narrativa contada pela instituição como um reflexo dos debates, conflitos, tensões e dilemas da cidade.
2º prêmio: “Venha receber seu Samba, meu irmão - uma etnografia do samba de cumbuca do Sertão do Piauí: desafios, convívio e conquistas estruturais”, de Eduardo Pontin Ferreira de Araújo, baseado na monografia apresentada no IV Encontro de Cultura Regional do Centro-Sul do Piauí.
Resumo: O Samba de Cumbuca ou Batuque é um tipo de Samba rural praticado na região Sudeste do Piauí, no sertão do estado, neste trabalho retratado nos munícipios de Floresta do Piauí, Campinas do Piauí, Santa Cruz do Piauí, Paquetá e São João do Piauí.
Música e dança que existem ao menos desde o século XIX, o Batuque ainda hoje permanece sendo cultivado em comunidades negras rurais e comunidades quilombolas distantes dos grandes e pequenos centros, razão pela qual prossegue pouco conhecido no próprio Piauí.
Esta monografia se propõe a traçar a trajetória do Batuque de Floresta, do Samba de Cumbuca do Quilombo Volta do Campo Grande e do Batuque de Negros e Negras do Brás da Malhada.
Enquanto etnografia descreve o convívio em campo com os sambistas ao longo de um ano e sete meses, o que possibilitou não apenas uma vivência enriquecedora, como também compartilhamento mútuo, resultando em conquistas estruturais para o Batuque piauiense.
3º prêmio: “Tirando a viola do saco: marginalização, resistência e ressignificação da viola e do violeiro no contexto do projeto de europeização e apagamento de saberes no Rio de Janeiro oitocentista”, de Bruno de Carvalho Reis, baseado em tese de doutorado em andamento, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) – Programa de Pós-Graduação em Música, orientada pela Prof.ª Marcia Emerlindo Taborda.
Resumo: Esta monografia investiga a marginalização simbólica, social e cultural da viola e do violeiro no Rio de Janeiro oitocentista, articulando-a a um projeto de europeização dos costumes e apagamento de saberes afro-indígenas. A partir de uma abordagem interdisciplinar — que conjuga Musicologia Histórica, Etnomusicologia e História Social — analisa-se como a figura do capadócio se consolidou como matriz simbólica do violeiro carioca, expressão de uma oralidade plebeia combatida pelos discursos da modernidade tropical. O trabalho examina os mecanismos de criminalização e folclorização da viola, bem como sua resiliência como micromúsica e signo de resistência. Por fim, propõe-se uma revisão crítica da diversidade organológica das violas no Brasil, desconstruindo o mito da percussividade essencial da música africana.
1º Menção Honrosa: “Reinado, folclore e cultura popular em Itaúna: o adro do Rosário como território sagrado da memória afrodescendente”, de Charles Galvão de Aquino, monografia original.
Resumo: Esta monografia analisa o Reinado, o folclore e a cultura popular em Itaúna, tomando o adro da Capela do Rosário como território sagrado da memória afrodescendente. O Reinado de Nossa Senhora do Rosário é interpretado como prática religiosa e política, na qual fé, ancestralidade e resistência se entrelaçam de forma coletiva. Embora o antigo cemitério tenha sido suprimido em sua estrutura física, abriga os restos mortais de centenas de afrodescendentes, configurando-se como espaço de pertencimento, dignidade histórica. A pesquisa demonstra como a cultura popular afro-brasileira transforma o esquecimento em presença simbólica viva. Diante da desatenção histórica e do apagamento dessa dimensão funerária, o trabalho defende o reconhecimento do antigo cemitério do adro como patrimônio imaterial, imprescindível à história negra e à construção da identidade cultural itaunense.
2ª Menção Honrosa: “A literatura de cordel por uma perspectiva interseccional”, de Bruna Gabriella Santiago Silva, baseado na dissertação de mestrado “Erguer a voz: as representações das mulheres negras na literatura de cordel de Jarid Arraes”, defendida na Universidade Federal de Sergipe – Programa de Pós-Graduação em História, orientada pelo Prof.º Petrônio Domingues, em 2021.
Resumo: A presente pesquisa tem como objetivo refletir como a escrita de Jarid Arraes estabelece o enfrentamento e desconstrução dos estereótipos em torno da mulher negra na literatura de cordel contemporânea. Para tal iremos analisar a construção dos estereótipos e como a população negra é representada nos mais diversos campos de saberes e as principais consequências dessas imagens pejorativas. No que tange a literatura de cordel traçaremos um panorama da representação das mulheres negras nos principais autores do século XX, a cunho comparativo com os cordéis produzidos no século XXI, a partir, da emergência de novos (as) sujeitos (as) sociais no campo na criação dos folhetos. Por meio da contribuição da história do tempo presente buscamos analisar como Jarid Arraes se destaca nessa cena trazendo a recepção, o impacto e a publicação dos folhetos da cordelistas, bem como, os recentes temas abordados pela mesma como o feminismo negro, empoderamento e fortalecimento étnico encontrados nessa produção.
Link: https://ri.ufs.br/bitstream/riufs/15452/2/BRUNA_GABRIELLA_SANTIAGO_SILVA.pdf
3ª Menção Honrosa: “O fio e a meada: uma história cultural da literatura de cordel”, de Marcus Haurélio Fernandes Farias, baseado na dissertação de mestrado “O fio e a meada: classificação tipológica e uma história cultural da literatura de cordel”, defendida na Universidade Estadual de Campinas – Programa de Pós-Graduação em Teoria e História Literária no Instituto de Estudos da Linguagem, orientada pelo Prof.º Alexandre Soares Carneiro, em 2024.
Resumo: A literatura de cordel, reconhecida como patrimônio cultural e imaterial do Brasil, expressão que desafia fronteiras geográficas e culturais, tributária da oralidade, mas associada, quase sempre, ao folheto, é o mote deste trabalho. Estudada e classificada como um todo homogêneo, o cordel é, para alguns, um gênero ou subgênero poético e, para outros, uma manifestação legítima da cultura popular brasileira. Seria, ainda, nessa perspectiva, o gênero literário brasileiro por excelência, nascido no Nordeste, em especial na área ocupada por Pernambuco e Paraíba, a partir, principalmente, da iniciativa pioneira de Leandro Gomes de Barros (1865-1918), levado aos outros estados pelas sucessivas ondas migratórias e pela natureza diaspórica do nordestino. Mereceu, ao longo de décadas, muitas classificações, baseadas em critérios que refletiam o espírito de cada época, não encontrando, portanto, o necessário consenso. Classificações que, por vezes, quando muito, serviam de base a reelaborações futuras, como ocorre com Ariano Suassuna, ao retomar as ideias de Gustavo Barroso, que abarcavam o oral e o escrito e confundiam o cordel com o repente. Algumas propostas romperam, ao menos em parte, com esses esquemas, metodologicamente falhos, casos de Candace Slater, Eduardo Diatahy de Menezes e Maria José Londres, os dois últimos tendo por base a Morfologia do conto maravilhoso, do russo Vladimir Propp. Houve, porém, um esforço revolucionário, apenas esboçado, mas que plantou as bases para um novo entendimento sobre a necessidade de uma delimitação mais consistente dos muitos gêneros abrigados sob esse caleidoscópico guardachuva chamado literatura de cordel. Um campo em especial, o dos romances e textos que se relacionam à memória coletiva (razão de sua permanência e maior penetração entre o público tradicional), se sobressaía na preferência dos leitores. Ruth Lemos Terra propõe, a começar por esse campo, para estudo, classificação, catalogação, o método histórico-geográfico de Aarne-Thompson (AaTh), da Escola Finlandesa de Folclore, hoje Aarne-Thompson-Uther, que, além de versões de contos de tradição oral, tem sido empregado em obras literárias, como o Livro das mil e uma noites, o Conto dos contos, entre outros. O nosso trabalho, apoiado nas poucas pistas deixadas por Terra, não propõe uma ruptura com as abordagens tradicionais; sugere, antes, outro olhar sobre um importante eixo da literatura de cordel: a partir do gênero romanesco, dos poemas narrativos, inspirados especialmente nos contos de tradição oral, nas lendas hagiográficas, cujas origens são quase sempre impossíveis de precisar, elaboramos uma classificação que abrange a matéria literária propriamente dita, apresentando, de maneira incipiente, alguns estudos sobre os chamados temas perenes. E, tendo por base o método comparativo, acompanhamos o percurso de algumas das mais relevantes obras do cordel, suas interfaces e seus diálogos com obras literárias de diferentes tradições.
Link: https://repositorio.unicamp.br/acervo/detalhe/1414136
Sobre a Comissão de Seleção
A avaliação dos trabalhos ocorreu no dia 27 de novembro de 2025, às 10h, em reunião online da Comissão Especial de Seleção, designada pela Portaria nº 40, de 17 de setembro de 2025. A Comissão foi composta pelas pesquisadoras:
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Eurides de Souza Santos — mestre e doutora em Música pela Universidade Federal da Bahia (UFBA); Professora Titular do Departamento de Música da Universidade Federal da Paraíba (UFPB);
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Léa Freitas Perez — mestre em Antropologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); doutora pela Ecole des Hautes Etudes en Sciences Sociales; Professora Titular Aposentada da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG);
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Patrícia Silva Osório — mestre em Antropologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS); doutora pela Universidade de Brasília (UnB); Professora da Universidade Federal do Mato Grosso (UFMT);
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Wlamyra Ribeiro de Albuquerque — mestre em História pela Universidade Federal da Bahia (UFBA); doutora pela Universidade Estadual de Campinas (Unicamp); professora da Universidade Federal da Bahia (UFBA);
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Ana Lima Kallás — mestre pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ); doutora pela Universidade Federal Fluminense (UFF); pesquisadora do CNFCP (membro institucional).
Participaram ainda Ana Carolina Carvalho de Almeida Nascimento, Coordenadora da Coordenação Técnica de Pesquisa e Projetos Especiais do CNFCP, e Túlio Lourenço do Amaral, pesquisador do CNFCP e Coordenador do Concurso Sílvio Romero 2025.
Após apresentação de seus integrantes, a Comissão iniciou a análise das 121 monografias inscritas. Algumas submissões foram desclassificadas por apresentarem identificação de autoria, de orientadores ou de instituições — o que contraria os itens 6.3 e 6.4 do edital — ou por não atenderem ao formato exigido.
