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Congresso Medtrop
Controle Social do SUS é ferramenta fundamental para garantir justiça climática
Integrantes da Civs/CNS em conjunto a participantes das atividades do MEDTROP 2025
Enquanto as mudanças climáticas impõem inúmeras ameaças à saúde global, no Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) se posiciona de forma estratégica, colocando a participação popular no centro das decisões públicas. Foi sob essa perspectiva que o Conselho Nacional de Saúde (CNS) participou do 60º Congresso da Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (Medtrop 2025), realizado em João Pessoa (PB), de 2 a 5 de novembro.
Na ocasião, pesquisadores, gestores, profissionais da saúde, meio ambiente e epidemiologia, representantes de comunidades tradicionais e estudantes se reuniram para debater os efeitos das mudanças climáticas sobre doenças tropicais, biodiversidade e territórios vulnerabilizados, consolidando diretrizes para fortalecer a vigilância em saúde sob a ótica do conceito de Uma Só Saúde/Saúde Única.

A iniciativa foi organizada de forma intersetorial, com participação ativa do CNS por meio da Comissão Intersetorial de Vigilância em Saúde (Civs), em parceria com a Sociedade Brasileira de Medicina Tropical (SBMT) e a Associação Brasileira de Saúde Única (Abrasuni), em articulação com o Ministério da Saúde.
A relevância do tema é endossada por evidências públicas internacionais. A Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que as mudanças climáticas já causam pelo menos 150 mil mortes por ano, podendo dobrar até 2030. Relatórios recentes também indicam aumento de 23% em óbitos relacionados a ondas de calor desde os anos 1990 — com maior vulnerabilidade para crianças, idosos e populações expostas.
Participação social, educação e vigilância popular
Integrando a programação oficial do congresso, a Civs realizou na última terça (4/11) duas rodas de conversa no stand da Organização Pan-Americana da Saúde (Opas/OMS). As atividades foram conduzidas pelos assessores técnicos da Opas/OMS Fernando Leles e Thania Regina Fernandes Arruda, e reuniu conselheiros de saúde, trabalhadores, gestores, estudantes, pesquisadores e representantes de movimentos sociais, fortalecendo o diálogo entre territórios, ciência e políticas públicas.

A primeira roda de conversa, intitulada “Participação social, educação e vigilância em saúde”, contou com a participação do conselheiro Alex Motta e do integrante da Civs/CNS Luciano Simplicio. O debate ressaltou a importância de processos educativos como estratégia de fortalecimento da autonomia comunitária, da compreensão crítica sobre riscos sanitários e da qualificação do controle social, com ênfase em linguagem acessível, comunicação inclusiva e redes de comunicadores populares.
Em seguida, a roda “Participação social e vigilância popular em saúde” também conduzida pelos integrantes da Civs, e por José Carlos Veloso, representante da SEcretaria de Vigilância em Saúde e Ambiente (SVSA) do Ministério da Saúde, destacou experiências territoriais, práticas de mobilização comunitária, determinantes sociais do adoecimento e o papel da vigilância popular como instrumento de defesa da vida, do meio ambiente e dos direitos humanos.

Durante as atividades, o público contou com sistema de tradução por fones, garantindo acessibilidade auditiva e melhor compreensão dos conteúdos apresentados. O espaço registrou grande participação de pessoas de diferentes regiões do país, evidenciando o interesse crescente pela integração entre vigilância, comunicação social e participação cidadã.
Os debates promovidos pelas duas atividades dialogam com diretrizes da Política Nacional de Vigilância em Saúde (PNVS), reforçando a necessidade de ampliar a capilaridade das Comissões Intersetoriais de Vigilância em Saúde nos municípios, fortalecer conselhos locais e promover critérios nacionais que assegurem transparência e equidade nas decisões em saúde.
Para a Civs, o Medtrop 2025 tem se consolidado como espaço estratégico de aproximação entre academia, serviços e movimentos sociais, ampliando a escuta qualificada e valorizando saberes populares nos processos de vigilância.
O que é Uma Só Saúde?
O conceito de Uma Só Saúde — reconhecido oficialmente pelo Brasil desde 2024, com a instituição do Dia Nacional da Saúde Única — integra saúde humana, animal e ambiental. Estudos mostram que 72% das doenças infecciosas humanas emergentes têm origem em patógenos de vida silvestre. Em cenários de aquecimento global, doenças como malária, dengue e leishmaniose avançam para regiões antes frias, exigindo maior capacidade adaptativa dos sistemas de vigilância.

Nesse contexto, o controle social do SUS emerge como peça fundamental para garantir justiça climática no setor. A participação da Civs/CNS no debate reforçou a necessidade de assegurar que as respostas governamentais sejam transparentes, fiscalizadas e equitativas. Os conselheiros presentes na oficina destacaram que os impactos climáticos afetam de forma mais intensa territórios vulnerabilizados, povos indígenas, comunidades periféricas e trabalhadores expostos.
O objetivo do controle social é, portanto, duplo: fortalecer a Política Nacional de Vigilância em Saúde (PNVS), que ainda carece de plena institucionalização, e garantir que suas diretrizes se vinculem aos planos setoriais de clima, como o Plano Clima 2024–2035 (que inclui a Saúde entre seus 16 setores de adaptação e mitigação). “Essa atuação é crucial para orientar prioridades, monitorar a execução das ações e evitar retrocessos, garantindo que as políticas climáticas sejam territorializadas, intersetoriais e orientadas pelo interesse público e pela justiça climática”, destacou o conselheiro nacional de saúde e coordenador da CIVS, Alex Motta.

Além da roda de conversa, a Civs articulou ainda uma oficina, onde foram elaboradas propostas concretas para o fortalecimento da capacidade adaptativa e da resiliência sanitária do SUS. Entre as principais recomendações para integrar a Vigilância em Saúde e o Plano Clima, destacam-se o aprimoramento de mecanismos de alerta rápido para eventos climáticos extremos e surtos de doenças, a integração entre vigilância de fauna, ambientes e vetores e o uso ampliado de plataformas de análise de risco climático.
Ao final, o evento reforçou que a crise climática é também uma crise sanitária e que a institucionalização da PNVS é fundamental para garantir que o SUS responda de maneira preventiva, estruturante e orientada pela justiça climática.
Natália Ribeiro com informações da Assessoria Técnica
Conselho Nacional de Saúde