GESTÃO SUSTENTÁVEL DA ÁGUA
Vivemos em um país de superlativos positivos e negativos sobre a água. Ao mesmo tempo que temos uma abundância relativa em termos de chuva média anual (acima de 1.200 mm/ano), convivemos com regiões que passam por escassez crítica ou severa de água e com extratos da população com que historicamente tem um acesso muito precário a esse recurso, o que acaba sendo um perpetuador de pobreza, injustiça social e racismo ambiental.
A governança e a gestão de recursos hídricos é uma das principais ferramentas de adaptação e mitigação aos impactos das mudanças climáticas. Não existem essa adaptação e mitigação sem gestão das águas. Não existe justiça social sem gestão das águas. Não existe combate à fome sem gestão das águas.
A crise climática nos impõe o desafio da segurança hídrica, e nesse sentido é urgente cuidar das áreas de recarga de aquíferos, das florestas que abastecem os rios voadores e produzem chuvas, da vazão média dos rios e das zonas úmidas. É urgente revitalizar as bacias hidrográficas e fortalecer os Comitês de Bacias Hidrográficas. Precisamos investir esforços para tentar reequilibrar o ciclo hidrológico e tornar resiliente as fontes e os reservatórios naturais de água.
Para tornar a resiliência hídrica e a cidadania hídrica uma realidade, o MMA está trabalhando para o reconhecimento e fortalecimento de todas as instâncias da Política Nacional de Recursos Hídricos e do Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos, especialmente os Comitês de Bacias Hidrográficas e o Conselho Nacional de Recursos Hídricos, que são espaços criados por lei e que servem à negociação e às pactuações para o uso da água.
O MMA parte da premissa de que a gestão e a governança hídrica devem adotar uma abordagem transversal, multinível e sistêmica, indissociável da gestão ambiental, com a participação de diversas áreas do conhecimento e da sociedade, pois só assim será capaz de gerar as soluções mais adequadas, sustentáveis e resilientes frente aos desafios que estão postos. Por isso o MMA está envolvido com a gestão e a governança das águas, defendendo a gestão ambientalmente e socialmente adequada da água em fóruns de discussão e tomada de decisão em âmbito nacional e internacional.
O MMA tem utilizado a água como vinculador de políticas públicas e marcos internacionais e se pautado na melhor técnica e ciência disponível para qualificar e promover debates e ações relevantes para a conservação das águas e das bacias hidrográficas.
GESTÃO DE RECURSOS HÍDRICOS TRANSFRONTEIRIÇOS
Dados atualizados mostram que no mundo 153 países compartilham corpos de água, em 310 Bacias Hidrográficas Transfronteiriças (BHT) e 592 aquíferos, correspondendo a 42% da superfície global e incluindo mais de 2,8 bilhões de pessoas (GWP, 2021). Estes números demostram a grande importância das BHTs e a necessidade de ações de governança que ensejem aumento da cooperação e minimização de conflitos.
A governança e a gestão das águas transfronteiriças possuem relevância ímpar para o desenvolvimento socioeconômico e ambiental do Brasil. Essa relevância fica ainda maior diante das incertezas das mudanças climáticas devido à possibilidade de aumento das situações de conflito pelo uso da água, nacionais e internacionais.
Destaca-se que no Brasil a gestão dos recursos hídricos deve ser integrada, descentralizada e participativa, considerando os fundamentos, diretrizes e objetivos da Política Nacional de Recursos Hídricos (Lei 9433/1997). Logo, deve haver intercâmbio de informações entre os planejamentos de recursos hídricos nas diversas escalas espaciais e esferas institucionais para:
- atendimento à legislação vigente, respeitando a soberania dos países limítrofes;
- identificação de potenciais sinergias para a cooperação frente aos desafios da gestão das águas;
- organização de estratégias conjuntas para otimização de recursos financeiros e resultados robustos e sustentáveis.
As ações que ocorrem à montante da bacia hidrográfica podem afetar significativamente o que está à jusante, tanto em relação à qualidade quanto à quantidade da água; os sedimentos erodidos no alto da bacia, assoreiam rios, hidrovias e reservatórios na parte baixa da bacia (podendo afetar outras cidades, estados ou países); as ações que impactam as águas superficiais, impactam também (em maior ou menor escala) as águas subterrâneas e vice-versa. Assim, respeitando a soberania dos países, a relação dos sistemas hídricos, o funcionamento do ciclo hidrológico e o papel dos ecossistemas devem fazer parte da busca de soluções pela sustentabilidade hídrica e conservação das águas.
Considerando os fundamentos da Política Nacional de Recursos Hídricos, o MMA tem atuado em diversos fóruns internacionais relacionados com a gestão das águas transfronteiriças, em especial na Bacia do Rio da Prata e no Sistema Aquífero Guarani, contribuindo tecnicamente para o desenvolvimento de projetos financiados com recursos GEF e de outras instituições promotoras do desenvolvimento sustentável.
Neste sentido, destacamos o papel de articulação do MMA com outros ministérios e instituições nacionais relacionadas com a gestão das águas, como o Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional, a Agência Nacional de águas e Saneamento Básico e o Serviço Geológico do Brasil, que juntos contribuem tecnicamente para a gestão das águas transfronteiriças no Brasil.
Quadro 1 - Panorama de governança em Bacias Hidrográficas Transfronteiriças (BHT) no Brasil:
Quadro 2 – Aquíferos Transfronteiriços do Brasil.
Dentre as BHT, três possuem tratado de cooperação com organismos de cooperação e sistema de governança em atividade. Desta maneira, o país apresenta o índice do ODS 6.5.2 de 90% de suas BHT cobertas por acordos operacionais. Porém somente o aquífero Guarani possui um acordo internacional, o que demonstra que a gestão dos aquíferos transfronteiriços precisa de maior atenção e articulação internacional.
Tanto a Bacia do Prata, quanto a Amazônica e o Sistema Aquífero Guarani possuem Plano de Ações Estratégicas (PAE) e Análise Diagnóstica Transfronteiriço (ADT) elaborados e em processo de implementação; já a Lagoa Mirim e a Região do Pantanal estão em processo de elaboração.
Os PAEs são instrumentos de diretrizes para a governança e gerenciamento cooperativo de corpos hídricos transfronteiriços; e os ADTs ferramentas de diagnóstico para a proposição de ações transfronteiriças.
- O Sistema Aquífero Guarani (SAG)
O Sistema Aquífero Guarani (SAG) é um corpo hídrico transfronteiriço presente no subsolo da Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai, que contém uma das maiores reservas de água doce do mundo, cuja área se estende por mais de um milhão de quilômetros quadrados. 62% da área do aquífero encontra-se em território brasileiro (MS, MT, RS, SP, PR, GO, SC e MG,) o equivalente a 9% do território nacional, enquanto 21% encontram-se na Argentina, 8% no Paraguai e 3% no Uruguai.
O aquífero constitui uma fonte de água doce para milhões de pessoas, atendendo às necessidades domésticas, agrícolas, industriais e turísticas. Em 02/08/2010 foi assinado o Acordo de Cooperação Internacional sobre o Aquífero Guarani, entre Brasil, Argentina, Uruguai e Paraguai, mas a promulgação desse acordo ocorreu apenas este ano, em 23/01/2024, pelo Decreto 11.893/2024.
Em 2022, os quatro países promoveram o Projeto de Médio Porte (PPM): "Implementação do Programa de Ação Estratégica para o Sistema Aquífero Guarani: Possibilitando Ações Regionais", que no Brasil é coordenado pelo MMA, com participação do Sistema Geológico Brasileiro (SGB-CPRM) e Agência Nacional de Águas (ANA) e Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional (MIDR), cujos objetivos são:
- implementar um sistema de monitoramento quali-quantitativo das águas do aquífero,
- atualizar o Programa Estratégico de Ações (PEA) com aprofundamento das temáticas indígenas e de gênero, e
- implantar os Comitês de Monitoramento e Modelagem (CMM) e de Capacitação e Difusão (CCD), que são ações do Programa de Ações Estratégicas, além de atividades de capacitação, inovação e participação.
O valor do Projeto é de US$ 2.000.000,00, proveniente do Fundo Global para o Meio Ambiente–GEF (SEI 02000.003048/2023-08). O andamento e os resultados do projeto foram bastante positivos. A previsão de finalização é março de 2025.
- A Bacia do Prata/Plata
A Bacia Hidrográfica Transfronteiriça do Prata abrange uma área de cerca de 3.100.000 km², que inclui Argentina, Bolívia, Brasil, Paraguai e Uruguai, sendo formada pelos rios Paraguai, Paraná e Uruguai, drenando aproximadamente um quinto do continente sul-americano. Divide-se em 7 sub-bacias: Alto Paraguai, Baixo Paraguai, Alto Uruguai, Baixo Uruguai, Alto Paraná, Baixo Paraná e a própria sub-bacia do Rio da Prata. Sua população ultrapassa os 110 milhões de pessoas e sua atividade econômica corresponde a mais de 70% do PIB dos cinco países, abarcando as cinco capitais e regiões com intensa atividade econômica, social e agrícola.
A Bacia do Rio da Prata é estratégica para os usos múltiplos da água, para o equilíbrio ecossistêmico e para a segurança hídrica nacional e dos demais países que compartilham do seu território.
A Bacia do Prata possui um Tratado específico (Tratado da Bacia do Prata) dotado de organismo de cooperação próprio, o Comitê Intergovernamental Coordenador dos Países da Bacia do Prata (CIC Plata), que vem coordenando atividades e projetos, além de troca de informações na bacia.
- Comitê Intergovernamental Coordenador dos Países da Bacia do Plata (CIC-Plata)
A organização e arranjo do CIC-Plata precedeu o Tratado da Bacia. Estabelecido ainda em 1968, este foi o órgão responsável pela compilação e organização da redação do texto do próprio tratado.
Como um órgão de coordenação e acompanhamento das ações multinacionais, tem como objetivo o desenvolvimento integrado da Bacia e a assistência técnica e financeira, que promove por meio de contribuições/depósitos realizados pelos 5 países.
Além disso, apoia e coordena a realização de projetos de cooperação, tais como, o Programa Marco e PPM-Prata, com o apoio dos organismos internacionais, por meio da cooperação internacional para o desenvolvimento. A representação brasileira, em nível técnico, no CIC-Plata atualmente é realizada pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança do Clima - MMA e pelo Ministério da Integração e do Desenvolvimento Regional – MIDR, com apoio da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico – ANA e do Serviço Geológico do Brasil – SGB/CPRM.
PROMOÇÃO DE FONTES ALTERNATIVAS DE ÁGUA (ÁGUA DE CHUVA E REÚSO NÃO POTÁVEL DE ÁGUA)
O MMA está apoiando iniciativas que promovam o uso de fontes alternativas de água, como o aproveitamento de água de chuva e o reuso de água.
Uma forma de mitigar os efeitos das chuvas torrenciais e dar maior resiliência hídrica em períodos prolongados de desabastecimento das populações em situação de vulnerabilidade é o emprego de sistemas descentralizados de captação, tratamento, reservação e abastecimento humano com o aproveitamento adequado da água de chuva para quem mais precisa.
O aproveitamento da água de chuva promove o desenvolvimento urbano sustentável, subsidiando políticas públicas para universalização do abastecimento de água e melhoria dos sistemas de drenagem e mobilidade, principalmente em localidades que convivem com a escassez hídrica, além das precárias condições sanitárias.
Desta forma, o MMA firmou parceria com a Universidade Federal de Pernambuco, por meio do TED 002/2024 para a instalação de 14 sistemas de aproveitamento de água da chuva pela tecnologia PluGoW, que foi implantada na comunidade do Córrego da Telha, no bairro da Guabiraba da cidade de Recife/PE e a Startup Pluvi, incubada no polo tecnológica da UFPE. Trata-se de uma parceria que pode ser replicada para outras localidades de difícil acesso e que necessitam de maior segurança hídrica frente à emergência climática que se agrava.
Por fim, compreendendo que a regulamentação para a promoção do uso de fontes alternativas de água, especialmente a água de chuva para consumo humano e o reúso não potável de efluentes sanitários, é essencial para a ampliação da matriz hídrica nacional, o MMA tem atuado no âmbito de colegiados deliberativos, como o Comitê Interministerial de Saneamento Básico – CISB e do Conselho Nacional de Recursos Hídricos – CNRH, com propostas de regulamentação visando dar maior segurança jurídica para investimentos no setor, além de promover a economia circular da água como um vetor de sustentabilidade e resiliência hídrica.
Mais informações:
QUARTAS HÍDRICAS
A Quarta Hídrica são encontros de diálogo com especialistas que visa incorporar a inovação e a ciência à Gestão de Recursos Hídricos. São convidados representantes de instituições públicas e privadas ligadas à gestão da água, de bacias hidrográficas e outros temas relacionados ao uso racional e eficiente deste recurso natural tão ameaçado pela emergência climática que enfrentamos.
Frente aos cenários preocupantes de redução da disponibilidade hídrica futura, é essencial que os servidores do MMA responsáveis por esta pauta sejam constantemente capacitados e atualizados quanto aos planos, programas e projetos relacionados à água, para incorporarmos as tecnologias e a governança que estão na vanguarda da gestão da água. Outra possibilidade decorrente das Quartas Hídricas são as parcerias entre o MMA e as instituições participantes, como foi o caso do aproveitamento de água de chuva para comunidades em situação de vulnerabilidade em Recife/PE, por meio do TED com a Universidade Federal de Pernambuco.
O encontro entre os especialistas convidados e os servidores é realizado ao menos 1 (uma) vês por mês, sempre nas quartas-feiras, e possibilita uma troca constante de experiências e boas práticas que irão refletir na atuação de cada servidor no dia a dia de trabalho.