Confiança Regulatória (Reliance)
O que é reliance?
Reliance, ou confiança regulatória, é uma prática adotada por autoridades reguladoras de saúde para otimizar e acelerar seus processos decisórios. Trata-se da possibilidade de uma autoridade reguladora nacional considerar e utilizar, total ou parcialmente, as avaliações, inspeções e decisões de outras autoridades reguladoras confiáveis ou de instâncias internacionais, respeitando sempre sua soberania e independência.
O uso do reliance não significa delegar responsabilidades, mas sim reconhecer o valor do trabalho já realizado por outras autoridades, contribuindo para o uso mais eficiente de recursos, redução de retrabalho e promoção do acesso oportuno a produtos seguros, eficazes e de qualidade.
Definição oficial segundo a OMS
“Reliance (confiança regulatória): ato pelo qual uma autoridade reguladora, em uma jurisdição, considera e atribui importância significativa às avaliações realizadas por outra autoridade reguladora ou instituição confiável, ou a qualquer outra informação oficial, para tomar sua própria decisão. A autoridade que confia permanece independente, responsável e presta contas das decisões tomadas, mesmo quando se baseia em decisões, avaliações e informações de terceiros.”
“Reliance: the act whereby a regulatory authority in one jurisdiction takes into account, and gives significant weight to, assessments performed by another regulatory authority or trusted institution, or to any other authoritative information, in reaching its own decision. The relying authority remains independent, responsible and accountable for the decisions taken, even when it relies on the decisions, assessments and information of others.”
(WHO Good Regulatory Practices: guidelines for national regulatory authorities for medical products, 2021)
- Diferença entre reliance, recognition e work-sharing
- Reliance: Uma autoridade utiliza, de forma total ou parcial, o trabalho técnico de outra autoridade confiável como parte de seu próprio processo decisório. A decisão final permanece com a autoridade que utiliza o reliance.
- Recognition (Reconhecimento): A autoridade reconhece oficialmente as decisões de outra autoridade reguladora sem necessidade de reavaliar os dados. Nesse caso, a decisão é aceita integralmente e pode não haver nova análise.
- Work-sharing (Compartilhamento de trabalho): Autoridades reguladoras trabalham de forma colaborativa e simultânea em avaliações, inspeções ou outros processos, com divisão de tarefas, buscando harmonização e ganhos de eficiência.
- Vantagens do reliance
- Para autoridades reguladoras:
- Melhoria na eficiência dos processos regulatórios.
- Otimização de recursos humanos e financeiros.
- Redução de duplicação de esforços.
- Fortalecimento das capacidades institucionais e técnicas.
- Promoção de alinhamento internacional e harmonização regulatória.
Na prática: A Anvisa participa ativamente de iniciativas como o Foro Internacional de Reguladores de Dispositivos Médicos (IMDRF), do Programa de Auditoria Única de Dispositivos Médicos (MDSAP) e do PIC/S (Esquema de Cooperação em Inspeção Farmacêutica), reforçando o seu alinhamento com as boas práticas globais.
- Para o setor produtivo:
- Redução de prazos para análise e aprovação de produtos.
- Maior previsibilidade e transparência nos processos regulatórios.
- Facilitação do acesso simultâneo a mercados distintos.
- Estímulo à inovação e competitividade.
Na prática: A adoção de mecanismos de reliance em medicamentos e dispositivos médicos permite que empresas tragam inovações ao mercado brasileiro com maior rapidez, sem comprometer a avaliação técnica.
- Para a sociedade:
- Acesso mais rápido a medicamentos, vacinas e dispositivos médicos seguros, eficazes e de qualidade.
- Fortalecimento da confiança nos processos de regulação sanitária.
- Melhoria na resposta a emergências de saúde pública.
- Contribuição para sistemas de saúde mais eficientes e equitativos.
Na prática: O uso de reliance foi essencial para a resposta da Anvisa à emergência sanitária da COVID-19, viabilizando o acesso rápido a produtos essenciais em um contexto de alta demanda global.
Fundamentos legais e normativos no Brasil
A adoção de práticas de reliance pela Anvisa está alinhada com diretrizes internacionais e é sustentada por fundamentos legais e normativos no âmbito nacional.
Guias da OMS sobre reliance
A Organização Mundial da Saúde (OMS) é uma das principais referências internacionais na promoção do reliance como boa prática regulatória. A OMS incentiva o uso dessa estratégia especialmente por autoridades reguladoras que buscam fortalecer suas capacidades e otimizar recursos.
Marcos legais e regulatórios que permitem a adoção de reliance pela Anvisa
No Brasil, a adoção de mecanismos de reliance é respaldada por diversos instrumentos legais e normativos, que conferem à Anvisa a competência para utilizar informações provenientes de outras autoridades reguladoras e organismos internacionais em seus processos decisórios.
- Lei nº 9.782/1999 – Estabelece o Sistema Nacional de Vigilância Sanitária e define as competências da Anvisa, incluindo a possibilidade de cooperação técnica com entidades nacionais e internacionais.
- Lei nº 13.411/2016 – Dispõe sobre a priorização de análises e pode ser aplicada em situações em que o reliance contribui para a celeridade processual.
- Lei nº 14.313/2022 – Regula a atuação da Anvisa na análise de produtos em saúde e prevê explicitamente a possibilidade de aproveitamento de pareceres técnicos emitidos por outras autoridades.
- Regulamentos específicos da Anvisa (RDCs) – Contêm dispositivos que formalizam o uso de reliance em determinados contextos regulatórios.
O reliance está previsto formalmente em normas da Anvisa
- Registro de medicamentos, vacinas e produtos biológicos, e cadastro de IFAs - RDC 741/2022 e IN 289/2024
- Ensaios clínicos de medicamentos, vacinas e produtos biológicos - RDC 945/2024 e IN 338/2024
- Inspeção e certificação de BPF de medicamentos, vacinas, produtos biológicos e IFAs - RDC 741/2022 e IN 292/2024
- Registro de dispositivos médicos (classes de risco III e IV) - RDC 741/2022 e IN 290/2024
- Inspeção e certificação de BPF de dispositivos médicos - RDC 741/2022, RDC 497/2021 e RDC 687/2022
- Avaliação na área de alimentos - RDC 741/2022 e IN 344/2025
Autoridades e organismos parceiros
A Anvisa mantém uma rede estratégica de cooperação com autoridades reguladoras e organismos internacionais que compartilham altos padrões de qualidade, transparência e rigor técnico. Essas parcerias são fundamentais para a adoção e o fortalecimento de práticas de reliance, contribuindo para decisões mais ágeis, seguras e alinhadas com as melhores práticas internacionais.
O reconhecimento mútuo, a troca de informações técnicas e a participação em iniciativas multilaterais reforçam a confiança nos processos regulatórios e ampliam a capacidade da Agência de proteger a saúde da população brasileira.
A Agência utiliza informações técnicas e relatórios dessas autoridades em processos de avaliação, registro, inspeção e pós-mercado.
A Anvisa também firma acordos bilaterais de cooperação técnica com autoridades reguladoras estrangeiras, que estabelecem bases formais para a troca de informações confidenciais, o uso de dados técnicos, a realização de reuniões regulares e a implementação de ações conjuntas.
Esses instrumentos viabilizam a aplicação concreta do reliance e demonstram o compromisso da Anvisa com a cooperação internacional e a convergência regulatória.
Autoridades Reguladoras Estrangeiras Equivalentes (AREEs) reconhecidas (por processos regulatórios)
- Registro de medicamentos, vacinas e produtos biológicos
- Mecanismo de reliance - Análise otimizada com base em documentos de aprovação
- Regulamentos aplicáveis - RDC 741/2022 e IN 289/2024
- AREEs
- European Medicines Agency (EMA - UE);
- Food and Drug Administration (FDA - EUA);
- Health Canada;
- Medicines and Healthcare products Regulatory Agency (MHRA - Reino Unido);
- Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA - Japão)*;
- Swissmedic (Suíça); Therapeutic Goods Administration (TGA - Austrália);
- World Health Organization - Prequalifcation of Medical Products (WHO PQT)
* A Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA) é AREE no que compete exclusivamente às informações de qualidade do produto.
- Cadastro de insumos farmacêutico ativos (IFAs)
- Mecanismo de reliance - Análise otimizada com base em documentos de aprovação
- Regulamentos aplicáveis - RDC 741/2022 e IN 289/2024
- AREEs
- European Medicines Agency (EMA - UE);
- European Directorate for the Quality of Medicines & Healthcare (EDQM - UE);
- Health Canada;
- Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA - Japão)*;
- World Health Organization - Prequalifcation of Medical Products (WHO PQT)
* A Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA) é AREE no que compete exclusivamente às informações de qualidade do produto.
- Ensaios clínicos de medicamentos, vacinas e produtos biológicos
- Mecanismo de reliance - Análise otimizada com base em documentos de aprovação
- Regulamentos aplicáveis - RDC 945/2024 e IN 338/2024
- AREEs
- European Medicines Agency (EMA - EudraGMDP - UE);
- Food and Drug Administration (FDA - EUA);
- Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA - Japão)
- Inspeção e certificação de BPF de medicamentos, vacinas, produtos biológicos e IFAs
- Mecanismo de reliance - Aceite de inspeções ou relatórios de auditorias para certificação
- Regulamentos aplicáveis - RDC 741/2022 e IN 292/2024
- AREEs - Autoridades ou entidades que são membros do Pharmaceutical Inspection Co-operation Scheme (PIC/S) e do International Council for Harmonisation of Technical Requirements for Pharmaceuticals for Human Use (ICH), incluindo EMA**
Alemanha - Federal Ministry of Health (BMG) e Central Authority of the Laender for Health Protection regarding Medicinal Products and Medical Devices (ZLG);
Arábia Saudita - Saudi Food and Drug Authority (SFDA);
Austria - Austrian Federal Office for Safety in Healthcare;
Bélgica - Federal Agency for Medicines and Health Products;
Bulgária - Bulgarian Drug Agency (BDA);
Canadá - Heath Canada (HC);
Cingapura - Health Sciences Authority (HSA);
Chipre - Pharmaceutical Services (CyPHS);
Coreia do Sul - Ministry of Food and Drug Safety (MFDS);
Croácia - Agency for Medicinal Products and Medical Devices of Croatia (Halmed);
Dinamarca - Danish Medicines Agency (DKMA);
Eslováquia - State Institute of Drug Control (SIDC);
Eslovênia - Agency for Medicinal Products and Medical Devices (JAZMP);
Espanha - Spanish Agency of Medicines and Medical Devices (AEMPS);
Estado Unidos da América - U.S Food and Drug Administration (US FDA);
Estônia - State Agency of Medicines (SAM);
Finlândia - Finnish Medicines Agency (FIMEA);
França - French National Agency for Medicines and Health Products Safety (ANSM) e Agency of Food, Environmental & Occupational Health Safety (ANSES);
Grécia - Greek National Organisation for Medicines (EOF);
Holanda - Health and Youth Care Inspectorate (IGJ);
Hungria - National Center for Public Health and Pharmacy (NCPHP);
Irlanda - Health Products Regulatory Authority (HPRA);
Islândia - Iceland Medicines Agency (IMA);
Itália - Italian Medicines Agency (AIFA);
Japão - Ministry of Health, Labour and Welfare (MHLW) e Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA);
Letônia - State Agency of Medicines (ZVA);
Liechtenstein - Office of Healthcare (AG);
Lituânia - State Medicines Control Agency (SMCA);
Malta - Malta Medicines Authority (MMA);
México - Federal Commission for the Protection Against Sanitary Risks (COFEPRIS);
Noruega - Norwegian Medical Products Agency (NOMA);
Polonia - Chief Pharmaceutical Inspectorate (CPI);
Portugal - National Authority of Medicines and Health Products, IP (Infarmed, IP);
Reino Unido - Medicines & Healthcare Products Regulatory Agency (MHRA);
República Checa - State Institute for Drug Control (SÚKL) e Institute for State Control of Veterinary, Biologicals and Medicines (ISCVBM);
Romênia - National Agency for Medicines and Medical Devices of Romania (NAMMDR);
Suécia - Swedish Medical Products Agency (MPA);
Suíça - Swiss Agency for Therapeutic Products (Swissmedic);
Turquia - Turkish Medicines and Medical Devices Agency (TMMDA ou TITCK);
Taiwan - Taiwan Food and Drug Administration (TFDA);
Ucrânia - State Service of Ukraine on Medicines and Drugs Control (SMDC);
União Européia - European Medicines Agency (EMA).
** A European Medicines Agency (EMA), na posição de Organização Associada Parceira do PIC/S, com Guias reconhecidamente equivalentes, é classificada como membro do PIC/S no contexto da IN 292/2024.
- Registro de dispositivos médicos (classes de risco III e IV)
- Mecanismo de reliance - Análise otimizada com base em documentos de aprovação
- Regulamentos aplicáveis - RDC 741/2022 e IN 290/2024
- AREEs
- Health Canada;
- Food and Drug Administration (FDA - EUA);
- Ministry of Health, Labour and Welfare (MHLW - Japão) e Pharmaceuticals and Medical Devices Agency (PMDA - Japão);
- Therapeutic Goods Administration (TGA - Austrália)
- Inspeção e certificação de BPF de dispositivos médicos
- Mecanismo de reliance - Aceite de inspeções ou relatórios de auditorias para certificação
- Regulamentos aplicáveis - RDC 741/2022, RDC 497/2021 e RDC 687/2022
- AREEs
- Organismos Auditores reconhecidos pelo Medical Device Single Audit Program (MDSAP);
- Autoridades reguladoras dos Estados-parte do Mercosul
- Avaliação na área de alimentos
- Mecanismo de reliance - Análise otimizada com base em documentos de aprovação
- Regulamentos aplicáveis - RDC 741/2022 e IN 344/2025
- AREEs
- Codex Alimentarius;
- Bundesinstitut fur Risikobewertung (BfR - Alemanha);
- European Food Safety Authority (EFSA - UE);
- Food and Drug Administration (FDA - EUA);
- Food Standards Australia New Zealand (FSANZ)