A obesidade, assim como a fome, é uma questão social que atinge de forma desigual a população mais vulnerável e demanda abordagens que articulem ações intersetoriais e interseccionais. Para além de uma perspectiva individual, a obesidade está intrinsecamente relacionada a determinantes sociais, que incluem o ambiente alimentar obesogênico, as desigualdades de renda e de escolaridade, a publicidade de alimentos não saudáveis, os estigmas sociais, o racismo estrutural e as políticas urbanas, cujas lacunas contribuem para o aumento de comportamentos sedentários e deficiências de mobilidade nas cidades. Importante ainda citar que desertos e pântanos alimentares têm se revelado determinante crítico da obesidade em nível populacional, uma vez que influencia diretamente o acesso e o consumo de alimentos saudáveis, impactando a segurança alimentar e nutricional da população, principalmente entre grupos populacionais em situação de vulnerabilidade.
Em 2025, o Brasil celebra um marco histórico com a saída do país do Mapa da Fome, ao registrar prevalência de
subalimentação inferior a 2,5% no triênio 2022–2024, em contraste com os 5,7% observados entre 2004–2006 (FAO,
2025) — resultado da retomada e do fortalecimento de políticas públicas intersetoriais de segurança alimentar e
nutricional, como o Plano Brasil Sem Fome, o Programa Bolsa Família, o III Plano Nacional de Segurança Alimentar
e Nutricional (Plansan 2024-2027), a Reinstalação do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, a
Estratégia Alimenta Cidades, o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), o Programa Cozinha Solidária, o
Programas Cisternas, além de outras medidas como valorização do salário mínimo, crédito para a produção de
alimentos pela agricultura familiar (Pronaf), incentivo à qualificação profissional, ao emprego e ao
empreendedorismo. Apesar dos avanços, persistem desafios estruturais, como evidenciado na Pesquisa Nacional por
Amostra de Domicílios Contínua – PNAD de 2024: 3,2% dos domicílios brasileiros ainda vivenciaram insegurança
alimentar grave, tendo cerca de 2,5 milhões de domicílios com privação quantitativa de alimentos, o que atingiu
adultos, crianças e adolescentes. A IA é ainda mais agravante quando se observa a perspectiva racial, pois em
domicílios com responsáveis de cor parda a IA grave foi de 56,9%, mais que o dobro da parcela que representa os
domicílios cujo responsável é de cor branca, 24,4%. Portanto, em um mesmo contexto social de fome e pobreza, a
obesidade se projeta como epidemia importante no país.
Referência: MINISTÉRIO DO DESENVOLVIMENTO E ASSISTÊNCIA SOCIAL,
FAMÍLIA E COMBATE À FOME. Brasil sai do Mapa da Fome da ONU: conquista histórica reflete políticas públicas
eficazes. Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome, 28 jul. 2025.
Disponível em:
https://www.gov.br/mds/pt-br/noticias-e-conteudos/desenvolvimento-social/noticias-desenvolvimento-social/brasil-sai-do-mapa-da-fome-da-onu-conquista-historica-reflete-politicas-publicas-eficazes
FAO; IFAD; UNICEF; WFP; WHO. The State of Food Security and Nutrition in the World 2025 – Addressing high
food price inflation for food security and nutrition. Rome: FAO, IFAD, UNICEF, WFP, WHO, 2025. Disponível
em: https://doi.org/10.4060/cd6008en. Acesso em: 15 out. 2025.
FOOD AND AGRICULTURE ORGANIZATION. Brasil voltou a sair do Mapa da Fome. Food and Agriculture Organization,
13 ago. 2025. Disponível em:
INSTITUTO BRASILEIRO DE GEOGRAFIA E ESTATÍSTICA (IBGE). Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios
Contínua. Segurança Alimentar 2024. Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), , 2025.
Disponível em: https://biblioteca.ibge.gov.br/index.php/biblioteca-catalogo?view=detalhes&id;=2102212
No cenário internacional, observa-se uma mudança significativa no perfil epidemiológico: pela primeira vez, a
obesidade desponta como a principal demanda em saúde pública, superando a prevalência de baixo peso entre
crianças e adolescentes em idade escolar (9,4% contra 9,2%). Em números absolutos, estima-se que 188 milhões de
jovens entre 15 e 19 anos estejam vivendo com obesidade em 2025, em comparação com 184 milhões em situação de
baixo peso. Esse quadro reflete uma transição global, na qual a obesidade já supera o baixo peso em todas as
regiões do mundo, com exceção da África Subsaariana e do Sul da Ásia, reforçando a urgência de políticas
integradas que articulem segurança alimentar, equidade social e promoção da saúde.
Referência: Referência: FAO; IFAD; UNICEF; WFP; WHO. The State of
Food Security and Nutrition in the World 2025 – Addressing high food price inflation for food security and
nutrition. Rome: FAO, IFAD, UNICEF, WFP, WHO, 2025. Disponível em: https://doi.org/10.4060/cd6008en. Acesso
em: 15 out. 2025.
O excesso de peso e a obesidade continuam em trajetória ascendente. Segundo a pesquisa Vigilância de Fatores de
Risco e Proteção para Doenças Crônicas por Inquérito Telefônico (Vigitel) publicada em 2023, 61,4% das pessoas
com 18 anos ou mais, residentes nas capitais brasileiras e no Distrito Federal, apresentavam excesso de peso, e
24,3% tinham obesidade. Ressalta-se que o agravamento da obesidade é mais evidente entre indivíduos com menor
nível de escolaridade. A prevalência da condição é de 26,9% entre adultos com até 8 anos de estudo, enquanto
entre aqueles com 12 anos ou mais de escolaridade, o índice é de 22,7%.
Referência: BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância
em
Saúde e Ambiente. Departamento de Análise
Epidemiológica e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis. Vigitel Brasil 2023: vigilância de fatores de
risco e
proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico. Brasília, DF: Ministério da Saúde, 2023.
Estudo a partir das informações da Pesquisa Nacional de Saúde e da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF),
revelou que as mulheres que se autodeclararam negras apresentaram maiores prevalências de excesso de peso
(58,8%) e obesidade (24,5%), em comparação a mulheres brancas. As mulheres negras com mais de 1 salário-mínimo
apresentaram maior prevalência de excesso de peso (59,2%), se comparadas às mulheres brancas com mesma renda.
Ainda, cabe destacar que o contexto de insegurança alimentar e nutricional e obesidade em mulheres negras de
baixa renda se agrava diante das privações de proteção social e de segurança econômica. Além disso, o excesso de
peso nessas populações expressa as desigualdades nutricionais e também o impacto cumulativo da discriminação
racial, do estresse crônico e das adversidades socioeconômicas sobre a saúde metabólica.
Referências: CALDEIRA, T. C. M. et al. Documento técnico contendo sistematização e análise de estudos sobre
Avaliação da Escala Brasileira de Insegurança Alimentar – EBIA, consumo alimentar (segundo a classificação
NOVA) e excesso de peso e obesidade e a interseccionalidade de raça/cor, gênero e renda no Brasil a partir
de dados secundários. Carta Acordo celebrada entre a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a
Agricultura - FAO e a Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnologia - FINATEC (7421 - FAO/FINATEC),
2023.
BRITO, R. C. S. et al. Association between Food Insecurity and Overweight: a Systematic Review based on
Intersectionality of Gender and Race/Color. Nutrition Reviews, p. nuaf152, 25 ago. 2025.
Em crianças, dados do Estudo Nacional de Alimentação e Nutrição Infantil (ENANI), realizado em 2019, revelaram
que, entre as 14.558 avaliadas, a prevalência de excesso de peso em menores de cinco anos no Brasil foi de
10,1%.
A faixa etária de 12 a 23 meses apresentou a maior prevalência, com 13,7%. Já a obesidade atingiu 3,0% das
crianças menores de cinco anos.
Referência: UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO. Estado
Nutricional Antropométrico da Criança e da Mãe: Prevalência de indicadores antropométricos de crianças
brasileiras menores de 5 anos de idade e suas mães biológicas. 7. ENANI 2019. Rio de Janeiro: UFRJ,
2022.
Entre crianças e adolescentes brasileiros, a prevalência de obesidade tem crescido de forma expressiva nas
últimas décadas. De acordo com estimativas internacionais, a taxa de obesidade entre meninas de 5 a 19 anos
aumentou de 3,1% em 1990 para 14,3% em 2022, enquanto entre meninos passou de 3,1% para 17,1% no mesmo período.
Referência: NCD RISK FACTOR COLLABORATION (NCD-RisC). Global,
regional, and national prevalence of child and adolescent overweight and obesity, 1990–2022, with forecasts
to
2050: a systematic analysis for the Global Burden of Disease Study 2022. The Lancet, v. 403, n. 10431, p.
1030–1048, 2024.
O Brasil ocupava, em 2022, a 54ª posição no ranking global de obesidade infantil. Projeções indicam que, mantidas
as tendências atuais, mais da metade das crianças e adolescentes brasileiros poderá apresentar excesso de peso
até
2035. Estima-se que uma em cada três crianças no País já esteja com sobrepeso, com um crescimento anual
projetado
de 1,8% entre 2020 e 2035.
Referência: WORLD OBESITY FEDERATION. Atlas Mundial da Obesidade
2024. Tradução e adaptação: Painel Brasileiro da Obesidade (PBO)/Instituto Cordial. Fórum DCNTs, 2024.
A relação entre sistema alimentar, crise climática e obesidade configura-se um fenômeno sindêmico, no qual
diferentes crises globais — obesidade, fome, crise climática — interagem e compartilham determinantes
estruturais comuns. A organização atual dos sistemas alimentares, centrada na produção intensiva de commodities
agrícolas e na ampla oferta de alimentos ultraprocessados, contribui significativamente para as emissões de
gases de efeito estufa, desmatamento e degradação ambiental — fatores que intensificam a crise climática. Somado
a esse contexto, os efeitos das mudanças no clima comprometem a produção agrícola, impactando no preço dos
alimentos e criando barreiras no sistema alimentar que podem reduzir o acesso à alimentação adequada e saudável,
influenciando significativamente em padrão de consumo que contribui para o aumento da obesidade no país.
Referências: SWINBURN, B. A. et al. The Global Syndemic of Obesity, Undernutrition, and Climate Change: The
Lancet Commission report. The Lancet, v. 393, n. 10173, p. 791–846, fev. 2019
FAO; IFAD; UNICEF; WFP; WHO. The State of Food Security and Nutrition in the World 2025 – Addressing high
food price inflation for food security and nutrition. Rome: FAO, IFAD, UNICEF, WFP, WHO, 2025. Disponível
em: https://doi.org/10.4060/cd6008en. Acesso em: 15 out. 2025.
GARRIDO, G. et al. The Role of Food Consumption in the Global Syndemic: A Scoping Review and Conceptual
Model. International Journal of Environmental Research and Public Health, v. 22, n. 6, p. 897, 5 jun. 2025.
As mudanças no padrão alimentar com aumento crescente do consumo de
ultraprocessados, têm contribuído para o risco da obesidade. Observa-se aumento progressivo na participação dos
alimentos ultraprocessados na alimentação dos brasileiros, ao passo que a ingestão de alimentos in natura e
minimamente processados tem diminuído. Ao avaliar dados da Pesquisa de Orçamentos Familiares e comparar os
períodos de 2008-2009 e 2017-2018, foi registrado um incremento de 1,02 ponto percentual (p.p.) no consumo de
alimentos ultraprocessados, apresentando variações significativas entre grupos específicos: aumento entre a
população negra foi de +2,04 p.p., entre os povos indígenas foi de +5,96 p.p. e entre indivíduos do menor
quintil de renda, foi uma variação de +3,54 p.p., enquanto no maior quintil de renda, observou-se uma redução no
consumo desses alimentos (-1,65 p.p.).
Referências: LANE, M. M. et al. Ultra-processed food exposure and adverse health outcomes: umbrella review
of epidemiological
meta-analyses. BMJ, p. e077310, 28 fev. 2024
LOUZADA, M. L. D. C. et al. Consumo de alimentos ultraprocessados no Brasil: distribuição e evolução
temporal
2008–2018. Revista de Saúde Pública, v. 57, n. 1, p. 12, 15 mar. 2023.
O complexo cenário de desigualdades, os desafios do sistema alimentar e a influência dos determinantes sociais,
ambientais, econômicos e culturais exigem um olhar interseccional e ações intersetoriais integradas,
direcionadas para a promoção da segurança alimentar e nutricional, para a prevenção da obesidade e para o
enfrentamento dos determinantes estruturais, abrangendo, portanto, ações que não se concentram apenas na
abordagem do indivíduo.
Referências: BRITO, R. C. S. et al. Association between Food Insecurity and Overweight: a Systematic Review
based on Intersectionality of Gender and Race/Color. Nutrition Reviews, p. nuaf152, 25 ago. 2025.
FERREIRA, S. R. G. et al. Determinants of obesity in Latin America. Nature Metabolism, v. 6, n. 3, p.
409–432, 4 mar. 2024.
DISSEN, A.; UCHMANOWICZ, I.; CZAPLA, M. Obesity: A call to action. Advances in Clinical and Experimental
Medicine, v. 34, n. 4, p. 473–477, 8 abr. 2025.
FAO; IFAD; UNICEF; WFP; WHO. The State of Food Security and Nutrition in the World 2025 – Addressing high
food price inflation for food security and nutrition. Rome: FAO, IFAD, UNICEF, WFP, WHO, 2025. Disponível
em: https://doi.org/10.4060/cd6008en. Acesso em: 15 out. 2025.
A Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional (Caisan), atualizou e coordenou a instituição da nova Estratégia Intersetorial de Prevenção da Obesidade..
A nova Estratégia foi pactuada intersetorialmente no Pleno Ministerial da Caisan - que conta com 24 Ministérios - e também recebeu colaborações de representantes de vários setores do Governo Federal, de organizações da sociedade civil, de organismos internacionais, de pesquisadores e de especialistas.
A Estratégia propõe promover ambientes alimentares saudáveis e sustentáveis, envolvendo ações articuladas com outras iniciativas, vinculadas à produção, acesso, abastecimento e consumo de alimentos adequados e saudáveis, incluindo propostas voltadas aos espaços urbanos promotores de alimentação adequada e saudável e à mobilidade urbana. Também aborda os preconceitos e estigmas relacionados a essa condição, destacando que a obesidade é um problema coletivo e não individual e prioriza o cuidado com crianças e adolescentes, a fim de assegurar um futuro mais saudável para as futuras gerações.
Objetivos
Os objetivos estão propostos em três eixos:
Cada um desses eixos possui diretrizes que orientam ações e metas pactuadas em nível federal e que compõem um Plano Operativo, a fim de orientar o monitoramento e avaliação dos resultados.
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