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Inventora brasileira ganha prêmio da União Europeia com tecnologia protegida para plantas
A pesquisadora Alessandra Alves de Souza, geneticista e inventora do uso na agricultura da molécula N-acetilcisteína (NAC) e seus análogos, foi anunciada como a ganhadora brasileira do prêmio Ingenias LATAM 2025 por sua invenção protegida em nível nacional para o tratamento e a prevenção de doenças bacterianas em plantas de citros, que produzem frutas como laranjas, tangerinas e limões. O prêmio é uma iniciativa do Instituto da
Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO, na sigla em inglês), no âmbito do projeto AL-INVEST Verde DPI, financiado pela União Europeia. Seu objetivo é dar visibilidade e impulsionar o talento feminino no campo da propriedade intelectual (PI) e da inovação na América Latina.
A cerimônia de premiação foi realizada no dia 4 de setembro na sede do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INAPI) do Chile, em Santiago, coorganizador e anfitrião desta primeira edição do prêmio, voltado para mulheres inventoras com invenções protegidas por PI. Além do INAPI, esta edição contou com o apoio dos escritórios de PI dos seguintes países: o INPI do Brasil, a Dirección Nacional de Propiedad Intelectual (DINAPI) do Paraguai e a Dirección Nacional de Propiedad Industrial (DNPI) do Uruguai.
Durante a cerimônia, o diretor executivo do EUIPO, João Negrão, destacou por meio de uma mensagem em vídeo:
"Hoje prestamos homenagem a quatro mulheres excepcionais. Mulheres cuja engenhosidade, perseverança e impacto nos lembram que a inovação prospera quando todos têm a oportunidade de contribuir. Suas histórias são um poderoso testemunho do potencial que liberamos quando abrimos as portas da inovação para todos. No EUIPO, temos o compromisso de criar um sistema de PI que funcione para todos, independentemente de gênero, formação ou experiência. Mas não podemos fazer isso sozinhos. Por meio de parcerias estratégicas com escritórios nacionais de PI em toda a América Latina como o INPI, nosso objetivo é fortalecer a cooperação global e ampliar o acesso aos sistemas de PI para grupos sub-representados, inclusive mulheres".
Por sua vez, Júlio César Castelo Branco Reis Moreira, Presidente do INPI Brasil, ressaltou que:
“O prêmio Ingenias LATAM simboliza o compromisso conjunto da América Latina e da União Europeia com o fortalecimento de um ecossistema de inovação mais inclusivo, sustentável e orientado para o bem comum. Para o INPI, é motivo de orgulho apoiar essa iniciativa de cooperação internacional, que reconhece o protagonismo das mulheres e o potencial transformador da ciência e da propriedade intelectual na América Latina. Premiar uma pesquisadora brasileira que alia excelência técnica e impacto social em um setor estratégico como a citricultura evidencia como a inovação latino-americana tem contribuído de forma concreta para o desenvolvimento econômico, ambiental e tecnológico do planeta”.
Molécula conhecida, uso inovador
A ideia que levou à invenção da pesquisadora brasileira surgiu após o sequenciamento genético da bactéria Xylella fastidiosa e o entendimento de como essa bactéria causava doença nos citros. Bióloga e pesquisadora no Instituto Agronômico IAC, no estado de São Paulo, com doutorado em biologia molecular com foco na interação planta-patógeno, Alessandra se dedica há anos a estudar as bactérias que afetam severamente a citricultura brasileira. Ao notar a falta de soluções eficazes e ambientalmente seguras para combater doenças bacterianas, decidiu investigar o potencial de uma molécula conhecida da medicina humana — a N-acetilcisteína (NAC) — como ferramenta agrícola.
“A NAC é uma molécula já conhecida, mas ninguém tinha pensado em usá-la para tratar plantas. Nosso diferencial foi ter coragem de pensar fora da caixa e enxergar o que outros não viam”, acrescentou Alessandra.
Foi assim que nasceu a invenção premiada: uma composição agrícola à base de NAC, capaz de inibir biofilmes bacterianos em plantas, restaurar o fluxo de seiva e reduzir os danos causados por doenças como a clorose variegada dos citros e o cancro cítrico. Com ação antimicrobiana e antioxidante, o composto também ajuda a mitigar estresses ambientais como a seca ou a presença de metais pesados.
Inspiração para mulheres
A inovação, que já foi protegida com PI no Brasil, e está em fase de proteção em outros países, é versátil, acessível e segura para o meio ambiente e os consumidores. Para a pesquisadora brasileira, inspirar outras mulheres na ciência é parte essencial de sua trajetória.
“Ainda enfrentamos desafios, mas mostrar que é possível chegar até aqui, sendo mulher, cientista e líder, abre caminhos para outras”, afirmou Alessandra.
A invenção levou à criação de uma startup focada em sua aplicação no campo, e possui impacto direto na citricultura brasileira, especialmente no estado de São Paulo, onde a pesquisadora reside e que é responsável por cerca de 80% da produção nacional de laranjas. Atualmente, o Brasil lidera o mercado global de suco de laranja, com aproximadamente 70% da produção mundial.
Nesse contexto, as doenças bacterianas representam uma ameaça constante à produtividade e à sustentabilidade dos pomares.
“O que me move é pensar numa agricultura mais limpa, que preserve o meio ambiente, a saúde das pessoas e a produtividade agrícola. A ciência pode — e deve — contribuir para isso”, concluiu a pesquisadora, cuja solução oferece uma alternativa científica promissora para proteger essa cadeia essencial à economia e à segurança alimentar global.
Vencedoras dos outros países
As vencedoras dos demais países participantes do Ingenias LATAM 2025 foram: Silvana Herrera Leiva (Chile), designer de produtos e inventora de uma faixa sensorial para a detecção de obstáculos no campo de visão de pessoas com deficiência visual; a bióloga Gladys Antonieta Rojas de Arias (Paraguai), inventora de compostos derivados do 2,5-dihidroxibenzil para o tratamento da doença de Chagas e da leishmaniose; e María Inés Costa Saravia (Uruguai), técnica em design gráfico e inventora de uma ferramenta de tricô de crochê manual que se retrai mecanicamente após cada ponto e mantém a tensão constante do fio.
Um júri internacional, composto por representantes dos escritórios de PI dos países participantes e por especialistas do setor privado na área de inovação, selecionou as vencedoras com base em critérios como a vigência do direito de propriedade intelectual que protege a invenção e suas contribuições para a inovação, a sociedade e a sustentabilidade. O prêmio inclui um minidocumentário em vídeo apresentado durante a cerimônia de entrega. Vale destacar que, a partir de 1º de dezembro de 2025, o EUIPO — principal impulsionador do Ingenias LATAM — será responsável pela gestão dos primeiros registros de indicações geográficas artesanais e industriais no âmbito europeu.
Por um sistema mais acessível e inclusivo
Iniciativas como o Ingenias LATAM fazem parte do compromisso estratégico do EUIPO dentro de seu Plano Estratégico 2030, voltado à construção de um sistema de propriedade intelectual mais acessível e inclusivo. Promover a participação de grupos historicamente subrepresentados — como as mulheres, que representaram apenas 18% dos pedidos de patentes internacionais em 2024 (OMPI) e 24% dos desenhos industriais registrados junto ao
EUIPO em 2022 — é essencial para reduzir a desigualdade de gênero nos ecossistemas de PI. Por meio de alianças temáticas com organizações parceiras — como os escritórios de PI da região —, o EUIPO atua ativamente para aproveitar o potencial criativo e inovador de toda a sociedade, tanto em nível regional quanto global.
Sobre o AL-INVEST Verde
O AL-INVEST Verde é um programa da União Europeia (UE) cujo principal objetivo é promover o crescimento sustentável e a geração de empregos na América Latina, apoiando a transição para uma economia de baixo carbono, eficiente no uso de recursos e mais circular. Por meio do Componente 3: AL-INVEST Verde DPI, liderado pelo Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO), o programa busca alcançar um maior uso e eficácia dos direitos de propriedade intelectual na América Latina, particularmente nos países do MERCOSUL e Chile, para fomentar oportunidades de cooperação em pesquisa e estimular a competitividade e a inovação sustentável.
Sobre o EUIPO
O Instituto da Propriedade Intelectual da União Europeia (EUIPO, na sigla em inglês) é uma das maiores agências descentralizadas da União Europeia, com sede em Alicante (Espanha). O EUIPO administra o registro de marcas da União Europeia desde 1994 e de desenhos industriais desde 2003, ambos direitos de propriedade intelectual que abrangem os 27 Estados-membros da União Europeia. Em 2023, a agência adicionou ao seu portfólio outro direito de propriedade intelectual: as indicações geográficas artesanais e industriais. O EUIPO também realiza atividades de cooperação em nível europeu e internacional e abriga o Observatório Europeu das Infrações aos Direitos de Propriedade Intelectual. Em 2024, o EUIPO foi nomeado pela quinta vez como o escritório de propriedade intelectual mais inovador do mundo.
Confira o vídeo da pesquisadora brasileira.
Com o EUIPO