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Palavras do Presidente Fernando Henrique Cardoso no início da entrevista coletiva concedida pelos Chefes de Estado e de Governo da CPLP
Vou pedir permissão, dado que estamos com bastante atraso, para que, enquanto os Senhores Presidentes vão assinando o documento - e eu mesmo o farei —, num brevíssimo relatório, dizer algo sobre o conteúdo das nossas discussões. E os Senhores Jornalistas que desejarem façam, depois, perguntas aos Presidentes. Na verdade, o fato mais significativo do nosso encontro aqui, hoje, em Brasília, talvez tenha sido a adesão da República do Timor Leste à CPLP. Creio que isso, por si, já é marcante: a ampliação da CPLP e o fato de que temos, na Ásia, um país de expressão portuguesa. Devo dizer também que, nos nossos encontros, aqui, celebramos muito a paz de Angola, que foi um processo longo. Os nossos países, em conjunto, acompanharam - o Brasil sempre deu atenção às lutas desenvolvidas pelo povo angolano - e, depois de muitos anos, é possível dizer que reina, realmente, a paz em Angola. Há uma declaração específica sobre essa matéria, que mostra, realmente, a importância que atribuímos tanto ao fato de o Timor participar do nosso encontro quanto ao fato de que nós, hoje, constituímos, aqui, uma zona de paz, incluindo, principalmente, Angola.
O tema central da conferência foi a questão, exatamente, da paz e a necessidade imperiosa do desenvolvimento para a consolidação da paz. Claro que nós, também, reconhecemos a importância da luta contra o terrorismo. Mas essa luta, por sua vez, deve pautar-se, como mostramos em mais de uma declaração e nos documentos, pelo respeito aos direitos humanos e pela tolerância. Tolerância essa que foi ressaltada como uma das características da cultura comum dos países de expressão portuguesa. E respeito aos direitos humanos, obviamente, porque todos nós, hoje, fazemos parte de países democráticos, muitos dos quais lutaram, arduamente, contra regimes autoritários e, portanto, valorizam, na devida dimensão, a questão relativa aos direitos humanos.
Também nos referimos à importância da próxima conferência, em Johannesburgo, sobre desenvolvimento sustentável, que é uma implementação dos resultados da Conferência do Rio de 1992. E a ênfase dada a Johannesburgo vem no contexto da nossa compreensão do que seja desenvolvimento. O desenvolvimento não pode ser um processo excludente, tem que ser um processo abrangente. Um processo que não pode significar apenas o progresso tecnológico, que é inevitável. Nós vivemos, hoje, o momento da chamada globalização, que é consequência da revolução dos meios de transporte, dos meios de comunicação, dos processos produtivos. É um processo normal, inevitável, mas o que não é inevitável é a exclusão.
Daí porque houve tanta ênfase na questão relativa à possibilidade de os membros da CPLP participarem mais ativamente no concerto internacional de nações, na construção de instituições de governança mundial, que evitem a concentração da riqueza e que permitam, efetivamente, que desse processo de desenvolvimento tecnológico resulte em maior bem-estar para a humanidade. Foi com essa perspectiva que se mencionou a importância da Conferência de Johannesburgo, porque lá vamos discutir, de novo, o desenvolvimento sustentável. E a perspectiva adotada pelos membros da CPLP é a perspectiva de que quanto mais houver esforços multilaterais melhor será. Por mais que haja - e, às vezes, é necessário - um esforço bilateral, por mais que haja, às vezes, até a pretensão de um certo unilateralismo, isso ficaria curto diante das necessidades dos povos e dos anseios desses povos. Portanto, favorecemos um tipo de desenvolvimento que seja sustentável e que implique uma ampliação da participação de todos no progresso.
Cabe fazer, nessa mesma direção, uma referência específica aos avanços havidos na Conferência de Doha, da OMC, para que haja, efetivamente, uma liberalização do comércio e para que se eliminem as barreiras de acesso dos países em desenvolvimento ao mercado mundial. Isso faz parte, naturalmente, dessa mesma visão compartilhada por todos nós de que é preciso assegurar que essa globalização seja mais solidária, menos assimétrica, mais justa e que não haverá possibilidade de que, na concreção desse caminho, nós não sejamos capazes, também, de negociar acordos de acesso a mercados que sejam efetivamente favoráveis a esses ideais.
Além disso, houve também vários acordos que assinamos, entre os quais um acordo no domínio da Aids ou da Sida, como se diz em alguns outros países, tendo em vista as vitórias já alcançadas por alguns dos países, entre os quais o Brasil, no que diz respeito a um tratamento mais adequado dos infectados pelo HIV, e tendo em vista a possibilidade de transferência tecnológica de que hoje dispomos. Houve vários acordos nessa direção e uma definida vontade política de fazer com que a luta, o combate contra essa moléstia seja algo central no concerto das nações civilizadas e, certamente, algo central no que diz respeito aos nossos interesses diretos como países de língua portuguesa.
Também assinamos acordos que vão facilitar a circulação de pessoas no espaço da comunidade, no espaço da CPLP. Houve também uma declaração importante de apoio à candidatura da Pastoral da Criança ao Prémio Nobel da Paz. Também saudamos o fato de ter havido o primeiro fórum empresarial da CPLP, que foi realizado em Lisboa. Haverá um segundo fórum, aqui, no Brasil, no ano de 2003. Houve acordos também nas áreas de cooperação e uma missão identificadora de áreas de possível cooperação em tecnologias da informação e da comunicação. São acordos que fizemos especificamente com Moçambique. Também no que diz respeito a Moçambique, há algo sobre tecnologias de informação. Estabelecemos um grupo de trabalho entre Moçambique e Brasil para avançar nessa direção das tecnologias de comunicação.
Quero dizer que, também com relação a Angola, especificamente, fizemos um convénio com o Programa Escola para Todos, em que o Brasil se comprometeu, através do orçamento da República, a manter mais 50 professores no Timor. Mais 50 professores, durante cinco anos. Isso é um projeto no valor global de i milhão de dólares, demonstrando, de forma prática, a disposição de o Brasil ajudar na luta pela difusão da língua portuguesa no Timor. Por fim, quero insistir em que nós, realmente, consideramos a questão da língua como uma questão muito importante, vital. Não resumimos o nosso debate nem a CPLP se resume à discussão da língua, mas acreditamos que o Instituto Internacional da Língua Portuguesa e, agora, a concessão do Prémio Camões durante as reuniões da CPLP são estímulos importantes à valorização da língua portuguesa. Língua falada, hoje, por cerca de 200 milhões de pessoas, com a particularidade de que essas pessoas se distribuem na Ásia, nas Américas, na Europa e na África. Portanto, uma língua de difusão universal.
Certamente, não há de ser só pelo fato de falarmos a mesma língua que vamos nos entender, mas porque temos também valores culturais comuns, alguns dos quais já, aqui, mencionados. E também sabemos - isso foi enfatizado - que, no mundo contemporâneo, é preciso dar um sentido prático às nossas ações. Um sentido prático significa um apelo constante à sociedade civil, para que ela participe, também, mais efetivamente nos vários programas de aproximação entre os nossos povos e para que o espírito empresarial que existe latentemente em todos e já mais consolidado em alguns seja também chamado a cooperar de forma ativa na consecução dos objetivos da nossa Comunidade dos Povos de Língua Portuguesa.
Termino dizendo que a próxima reunião da CPLP vai realizar-se em São Tomé e Príncipe, no ano de 2004. Eram essas as informações que eu queria prestar.
Agora, os Senhores Presidentes, de acordo com a programação, uma regra que deve ser estabelecida, responderão, se for o caso, a perguntas que venham a ser feitas. Muito obrigado