Notícias
Palavras do Senhor Ministro de Estado por ocasião das Exéquias do Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães Neto
Minha alocução será brevíssima, entre outros motivos, porque esta é uma solenidade que não esperava que me tocasse presidir – e, honestamente, preferia poder adiá-la sine die.
Minhas primeiras palavras são de agradecimento ao Senhor Presidente da República por deslocar-se ao Palácio de Itamaraty para render suas homenagens ao Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães Neto, que nos deixou antes de ontem, aos 84 anos.
Quero também estender meus mais comovidos sentimentos à Maria, sua viúva, a seus filhos, Anne, Samuel, Heloísa e Armada, a seus demais familiares, tantos amigos, amigas e admiradores – entre os quais me incluo – que somou ao longo de sua vida, nas cinco décadas de carreira diplomática e tantas mais de militância política e intelectual.
Velamos o corpo do Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães e honramos sua memória nesta cerimônia de exéquias não somente por razões de emoção e afeto – e todas elas são cabíveis hoje –, mas também porque esse velho amigo tem lugar reservado na história da diplomacia brasileira.
Foi ele o mais longevo Secretário-Geral das Relações Exteriores dos tempos modernos. Não será despropositado recordar que somente o Visconde de Cabo Frio, na virada do século XX, ocupou por mais tempo o cargo – que à época se chamava Diretor-Geral de Política Externa –.
Além de duradoura, a gestão do Samuel à frente da Secretaria-Geral deixou uma marca indelével na história da instituição e na memória coletiva dos nossos diplomatas.
Sob as orientações do Ministro Celso Amorim – de quem foi amigo e parceiro de toda a vida –, Samuel Pinheiro Guimarães trabalhou incomensuravelmente durante os dois primeiros mandatos do Presidente Lula para modernizar, atualizar e fortalecer o Itamaraty em seus meios, nos seus métodos de trabalho, na composição e diversidade de seus quadros e nos incentivos para as carreiras do serviço exterior brasileiro.
Suas realizações aperfeiçoaram a Casa de Rio Branco e a dotaram do maquinário necessário para assegurar que o Brasil tivesse uma política externa compatível com sua projeção, suas dimensões e com seu potencial nas relações internacionais.
Samuel sempre acreditou em um Brasil autônomo, resoluto e desassombrado, que pudesse navegar uma ordem internacional intrinsecamente injusta e hierarquizada, sem receio de lutar pela sua transformação. Ousaria dizer que o Brasil que ele projetou se viabilizou também pela força de seu empenho, seu talento e sua atuação.
O Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães deixou memórias por onde passou, fosse nas elevadas funções em que se desempenhou no Itamaraty, como Secretário-Geral, Chefe do Departamento Econômico, Diretor do Instituto de Pesquisa em Relações Internacionais, entre tantos outras experiências; fosse na Embrafilme – novamente ao lado do Celso –; fosse como Ministro-Chefe da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, no segundo mandato do Presidente Luiz Inácio Lula da Silva; fosse como Alto Representante do MERCOSUL – bloco de integração econômica sul-americana para o qual, aliás, ele contribuiu, lá atrás, para sua concepção, estruturação e fundação.
O poderoso legado do Embaixador Samuel Pinheiro Guimarães como intelectual distinguido que pensou o Brasil no mundo e como importante formulador de política externa brasileira não será esquecido pelos jovens e futuros colegas, muitos dos quais terão se beneficiado – conscientemente ou não – de sua atuação visionária e de sua fé inabalável no futuro que se reservava ao Brasil no concerto das nações.
No plano pessoal, para além da menção ao prazer da companhia de que privaram seus amigos, é preciso lembrar que Samuel foi um homem de incomensurável integridade e coerência irredutível com seus princípios, suas posições políticas e intelectuais e suas crenças.
Dono de fina sensibilidade social, tinha perfeita consciência da monta dos desafios diante do Brasil para superar suas agruras e desigualdades econômicas e sociais, inclusive do imperativo de fortalecer a sociedade civil para garantir que os menos privilegiados e setores historicamente marginalizados pudessem ampliar a sua voz e assegurar maior representação política. Aqui, o cidadão privado e o homem público se encontravam.
Hoje nos despedimos das diversas facetas do Samuel – o marido, o pai, o avô, o diplomata, o intelectual, o ativista social e o grande amigo – ao mesmo tempo em escolhemos homenagear sua memória e seu legado diante de tantos de seus seguidores e admiradores.
Muito obrigado.