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Palavras do Ministro Mauro Vieira na Cerimônia de inauguração da nova sede do CEBRI - Rio de Janeiro, 12 de dezembro de 2025
É com grande satisfação que participo hoje desta cerimônia de inauguração da nova sede do Centro Brasileiro de Relações Internacionais, o CEBRI.
Gostaria, em primeiro lugar, de agradecer a Presidente Júlia Dias Leite pelo convite e cumprimentar, por seu intermédio, a todos os conselheiros do CEBRI. É uma alegria poder ver e rever aqui, hoje, algumas das maiores referências intelectuais sobre a política externa brasileira.
Cumprimento também o Reitor da PUC-Rio, Padre Anderson Antonio Pedroso, por essa parceria que tanto contribui para a vitalidade e dinamismo do ambiente intelectual do Rio de Janeiro e do Brasil.
Não poderia haver lugar mais apropriado para abrigar este Centro do que uma antiga residência de padres jesuítas, ordem tão associada ao rigor da reflexão e do estudo.
A sociedade brasileira amadureceu muito desde que o CEBRI foi criado, 27 anos atrás, em 1998.
De uma realidade em que o Itamaraty exercia virtual monopólio sobre o desenho da política externa brasileira, evoluímos para um cenário de maior diálogo, permeabilidade e representatividade.
De um passado talvez um pouco ensimesmado, próprio das nações com vasto território e abundância de recursos naturais, construímos massa crítica sobre o mundo ao nosso redor e enriquecemos, de forma notável, o debate público sobre política externa.
Não posso deixar, aqui, de fazer referência ao ex-Chanceler Luiz Felipe Lampreia, Conselheiro Fundador do CEBRI. Ainda no final de sua gestão à frente do Itamaraty, e partindo do pressuposto de que faltava ao Brasil um ‘think tank’ na área de relações internacionais, Lampreia fez bom uso da posição que ocupava para liderar a criação dessa instituição tão importante hoje para o Brasil.
Nem ele, nem aqueles que o acompanharam nessa construção, como seu então jovem assessor e posteriormente Secretário-Geral do Itamaraty, Embaixador Marcos Galvão, podiam imaginar as dimensões e o papel que o CEBRI assumiria nos dias de hoje - o que se deve também ao empenho e à contribuição de muitas pessoas de lá para cá, como Júlia Dias Leite e José Pio Borges.
Por sua capacidade de articulação entre governo, academia, empresariado e sociedade civil, o CEBRI é, ao mesmo tempo, causa e consequência dessa profunda e bem-vinda transformação na relação da sociedade brasileira com a formulação da política externa.
Que este dia marque o início de um novo e auspicioso capítulo, sob a testemunha do Jequitibá centenário, que assistiu a todas essas transformações, sob a guarda dos jesuítas - e que assistirá ainda a tantas outras, agora nesta sede do CEBRI.
Caros amigos e amigas,
Celebramos hoje também a obra e a memória de uma das figuras mais marcantes da diplomacia brasileira das últimas décadas.
Marcos de Azambuja foi, além de um amigo, meu chefe como Embaixador em Paris entre 1997 e 1999. E, como ele mesmo disse certa vez: para o diplomata, “chefe mesmo é o chefe que se tem fora do Brasil”.
Me recordo de um chefe cheio de vida, inteligentíssimo e dotado de um fino humor e de extraordinário poder de síntese. Em seu telegrama de despedida do Itamaraty, de meras 21 linhas, dizia voltar “para casa com o coração em festa, enriquecido por tantas memórias, cheio de esperanças para o futuro e comovido ao compreender que, se as forças minguam com o inexorável passar do tempo, não se perde nem a fé nem o entusiasmo.”
Azambuja conhecia o Itamaraty como poucos. Transitava com naturalidade por seus vários mundos: o de ontem, aqui no Rio de Janeiro – que tão bem apelidou de “casa bem assombrada”; e o de hoje, em Brasília, menos intimista, mais diverso.
Ele compreendia perfeitamente que a sociedade se move no tempo, e com ela se devem mover suas instituições.
No Itamaraty, alcançou tudo o que poderia ter almejado. Ingressou no Instituto Rio Branco em 1956. Foi Secretário-Geral, Representante Permanente em Genebra e Embaixador na Argentina e na França.
Em um curto espaço de tempo, veremos o lançamento de dois livros de Marcos de Azambuja.
Além das “Memórias de Marcos Azambuja”, livro editado pelo CEBRI e lançado aqui hoje, será publicada em breve pela FUNAG e pelo CEBRI uma importante coletânea de seus escritos.
Em um dos textos dessa coleção – intitulado “Uma casa nova para o CEBRI” – Azambuja refletiu sobre este exato momento em que estamos hoje.
Com o carinho que dedicava a esta instituição, identificou na inauguração desta nova sede mais uma etapa da longa reinvenção do Rio de Janeiro após a mudança da capital federal para Brasília.
De sede natural de grandes encontros internacionais, o Rio passaria a se ver também como espaço privilegiado de reflexão e de debate sobre a política externa brasileira.
Azambuja não viveu para ver este momento. Tenho certeza de que, se aqui estivesse, teria trazido a alegria, o humor e a sagacidade que atravessaram a sua existência.
Senhoras e senhores,
Vivemos hoje o momento mais desafiador em décadas de política internacional.
Podemos afirmar que a ordem mundial como a conhecemos – ou, melhor, como a conhecíamos – está sendo desmontada, e justamente por aqueles que mais diretamente contribuíram para a sua construção.
O Brasil nunca se furtou a apontar os limites do sistema multilateral construído após a Segunda Guerra Mundial, que não foi capaz de dar vazão plena aos anseios da maioria por paz, desenvolvimento e justiça.
Mas não será pelo desmonte desse sistema que resolveremos nossos problemas.
Em meio à proliferação de conflitos em nível sem precedentes e ao recurso à lei do mais forte no comércio internacional, o Brasil tem defendido uma verdadeira refundação dos pilares desse sistema, por meio de uma reforma abrangente das Nações Unidas e da Organização Mundial do Comércio.
Precisamos de organizações internacionais que reflitam a realidade do século XXI. Na ONU como no G20, não é mais possível contornar o BRICS e a voz do mundo em desenvolvimento, do Sul Global, na construção de soluções. Na OMC, onde o consenso corre o risco de tornar-se o poder de veto da intransigência, precisamos de soluções criativas para restabelecer um sistema previsível e próspero.
Estamos em um desses momentos únicos na história, em que ideias novas são urgentemente necessárias.
E é neste momento em que o diálogo com a sociedade é ainda mais indispensável.
Parabenizo uma vez mais o CEBRI pela inauguração desta nova sede e transmito a plena disposição do Itamaraty de prosseguir nesse diálogo construtivo, em prol da formulação de uma política externa representativa, com valores profundamente democráticos, e atenta aos anseios e preocupações da sociedade brasileira.
Muito obrigado.