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Discurso do Ministro Mauro Vieira por ocasião da reunião extraordinária de chanceleres da OTCA - Bogotá, 20 de agosto de 2025
Senhoras e Senhores,
Agradeço ao Governo da Colômbia pela calorosa acolhida em Bogotá e pela organização deste encontro, que precede a V Reunião de Presidentes dos Estados Partes do Tratado de Cooperação Amazônica.
É uma satisfação participar de mais uma Reunião de Ministros de Relações Exteriores de nossa Organização.
O fato de que – em dois anos – nos tenhamos reunido em Belém, Brasília, Cali e Paramaribo demostra nosso empenho com a implementação da robusta agenda amazônica adotada na Cúpula da Amazônia – a Declaração de Belém – de agosto de 2023. A partir daquele encontro histórico, os oito países amazônicos renovaram seu compromisso com a cooperação regional.
Lançamos as bases de um novo ciclo de articulação e de ação convergente frente aos desafios que se impõem à nossa região, especialmente em temas de sustentabilidade, inclusão social, ciência e enfrentamento da urgência climática.
Desde a Cúpula de Belém, temo-nos concentrado na implementação dos mandatos presidenciais. A XIV Reunião de Chanceleres, em novembro de 2023, foi decisiva nesse processo, ao aprovar um conjunto de resoluções que operaram a transição da Declaração para instrumentos e instâncias práticas no âmbito da OTCA. Desde então, nossos governos têm buscado dar continuidade a esse impulso com ações concretas: fortalecimento institucional da Organização, constituição de mecanismos de financiamento, ativação de grupos técnicos e promoção da participação social organizada.
Vejo, com muita satisfação, que já podemos registrar alguns resultados concretos desse trabalho em termos de resoluções adotadas.
Senhoras e senhores,
A crise climática representa o maior desafio global de nosso tempo. O Brasil tem defendido, de forma clara e reiterada, que a justiça climática precisa estar ancorada no princípio das responsabilidades comuns, porém diferenciadas, consagrado na Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (UNFCCC) e em seu Acordo de Paris.
É necessário mobilizar recursos em escala e com celeridade para viabilizar uma transição ecológica justa, que promova ações urgentes de adaptação, mitigação, financiamento, capacitação e transferência de tecnologia – sem deixar ninguém para trás.
O combate à mudança do clima e a inclusão social são objetivos que se fortalecem mutuamente. Proteger a floresta não significa abrir mão do desenvolvimento. Pelo contrário: a conservação e o uso sustentável dos recursos naturais são uma alavanca para o desenvolvimento justo e sustentável, especialmente para as populações que vivem na floresta e da floresta.
Ao mesmo tempo, sabemos que nossos esforços de proteção do meio ambiente não serão sustentáveis no longo prazo se não enfrentarmos os desafios sociais e econômicos das populações em situação de vulnerabilidade que vivem na Amazônia. Estamos comprometidos com um modelo que combine inclusão social, valorização dos saberes tradicionais, inovação científica e uso sustentável da biodiversidade. Essa é a base da nova política brasileira para a bioeconomia da Amazônia.
Lançamos o plano União com os Povos da Floresta, que apoia atividades produtivas sustentáveis com base nos territórios e culturas locais.
Reduzimos o desmatamento na Amazônia brasileira em mais de 30% entre agosto de 2023 e julho de 2024. Isso representa a maior queda percentual em 15 anos.
Estamos fortalecendo a capacidade de atuação de nossos órgãos ambientais e das instâncias de controle e monitoramento.
No plano multilateral, estamos engajados na construção de uma agenda internacional mais coerente e eficaz de financiamento climático e de outros serviços ecossistêmicos, necessários para lidar com outros desafios relacionados à proteção do meio ambiente. É com esse objetivo que o Brasil propôs a criação do Fundo Florestas Tropicais para Sempre (TFFF), que deverá ser formalmente lançado durante a COP30, em Belém do Pará.
O TFFF é um mecanismo inovador de financiamento público e privado de longo prazo, cuja ideia é muito simples: pagar para quem mantém a floresta em pé, tornar rentável a não depreciação dos recursos florestais, monetizar a preservação da natureza, para que seja economicamente mais lucrativo conservar e proteger. O Fundo oferece previsibilidade e estabilidade financeira aos países que as protegem, com base em métricas ambientais robustas, transparência e resultados verificáveis.
O TFFF funcionará em paralelo aos marcos ambientais multilaterais existentes, como a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas e os tratados referentes a biodiversidade e desertificação. Sua estrutura permite o engajamento tanto de países desenvolvidos quanto de países em desenvolvimento.
O Brasil espera contar com o apoio dos países amazônicos para mobilizar potenciais países investidores a anunciarem aportes e contribuições ambiciosas, de modo a garantir a capitalização e a operacionalização do TFFF nos próximos meses.
A realização da COP30 em Belém será, por si só, um gesto de enorme simbolismo. Mas ela precisa também se afirmar como um ponto de inflexão. Precisamos chegar à Conferência com uma posição amazônica articulada e única, capaz de influenciar os grandes debates sobre adaptação, perdas e danos, mercados de carbono e transição justa, entre outros.
Proteger a Amazônia também significa cuidar das espécies que nela habitam e que circulam entre nossos países, simbolizando a unidade amazônica.
O Brasil sediará em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, em março de 2026, a décimo-quinta conferência das partes (COP15) da Convenção sobre Espécies Migratórias.
Convidamos todos os países amazônicos a participar desse importante evento, estimulando ainda aqueles que não o fizeram a ratificar essa Convenção.
Senhoras e senhores,
A OTCA nasce de uma visão compartilhada de futuro.
Nosso Tratado, firmado em 1978, já previa que o desenvolvimento da Amazônia deveria ocorrer de maneira harmoniosa, com base no aproveitamento racional dos recursos naturais e com respeito aos povos da região. Essa visão permanece atual e deve ser continuamente atualizada, à luz dos desafios contemporâneos.
O Governo brasileiro está em dia com o pagamento de sua quota ao orçamento regular da OTCA. Reconhecemos que decisões ambiciosas exigem meios financeiros ambiciosos. A previsibilidade orçamentária é condição indispensável para que a Secretaria Permanente entregue resultados à altura das expectativas depositadas pelos nossos governos e sociedades.
Quero também sublinhar a valiosa contribuição que órgãos brasileiros dão à OTCA. A Agência Brasileira de Cooperação (ABC) e a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) vêm apoiando de maneira consistente iniciativas de cooperação técnica Sul-Sul em benefício direto dos países amazônicos.
Destaco, em particular, o Projeto Amazonas, voltado ao fortalecimento da gestão integrada de recursos hídricos na região. Igualmente relevante é o projeto de apoio à implementação da Agenda Estratégica da OTCA. Ele tem posto em consonância prioridades nacionais e regionais, fortalecido equipes técnicas, desenvolvido metodologias comuns e oferecido suporte operativo ao Secretariado Permanente.
Esses instrumentos demonstram, na prática, a disposição do Brasil de compartilhar conhecimentos, formar quadros e investir na capacidade regional da nossa Organização.
Saúdo o início dos trabalhos da Comissão Especial sobre Segurança Pública da OTCA, que permitirá avançar na cooperação entre os países da região contra o crime organizado.
O combate ao narcotráfico é um tema fundamental para o desenvolvimento e a segurança de nossos países. É importante que, juntos, os países da região amazônica encontremos um caminho para enfrentar esse desafio.
O combate aos crimes ambientais – que já são a terceira maior fonte de recursos para o crime no mundo – igualmente uma responsabilidade compartilhada de todos os países, não apenas na Bacia Amazônica. Para tanto, o Brasil defende a adoção de um marco legal vinculante dedicado ao combate a crimes ambientais no âmbito da Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado.
Senhoras e Senhores Ministros,
A implementação integral da Declaração de Belém, o fortalecimento institucional da OTCA e a preparação coordenada para a COP30 devem caminhar de forma articulada e complementar.
O Brasil reafirma seu compromisso com esse processo e sua disposição para atuar de forma construtiva com todos os países membros.
Desejo pleno êxito aos trabalhos desta Reunião.
Renovo nossos votos de que a V Reunião de Presidentes, que ocorrerá amanhã, redobre a vontade política que nos une em defesa da Amazônia.
Muito obrigado.