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Discurso do Ministro Mauro Vieira na Reunião ministerial informal da OMC - Paris, 3 de junho de 2025
Prezados colegas,
Há uma crescente percepção entre os Membros da OMC de que a Organização, em sua forma atual, pode não estar mais preparada para responder à evolução do cenário comercial global.
Medidas importantes estão sendo adotadas, como o Acordo de Subsídios à Pesca e a iniciativa de Facilitação de Investimentos para o Desenvolvimento. No entanto, é cada vez mais evidente que resultados setoriais isolados, por mais significativos que sejam, não serão suficientes para restaurar a relevância da Organização.
Ao longo das últimas três décadas, as disciplinas da Rodada Uruguai moldaram e forneceram um sólido arcabouço legal para o comércio, o investimento e a proteção da propriedade intelectual.
Entretanto, a economia global, assim como os instrumentos políticos e as medidas comerciais aplicadas pelos Estados, se transformou desde então. O mundo que vemos hoje tem pouca semelhança com o da Rodada Uruguai.
Uma reforma estrutural e abrangente da OMC é, portanto, imperativa. Devemos ir além de reformas graduais.
A restauração da funcionalidade do sistema de solução de controvérsias por meio de soluções criativas que tratem das lacunas percebidas pelos Membros é um ponto crucial.
O Brasil está disposto a discutir o tema de forma aberta e franca e a buscar alternativas. Nosso objetivo final é implementar um processo de dois níveis, capaz de emitir decisões finais e alcançar previsibilidade jurídica.
A credibilidade do sistema depende de sua capacidade de liberalizar ainda mais o comércio de produtos agrícolas para grandes e pequenos produtores.
Isso requer a garantia de condições iguais por meio da redução do apoio doméstico, que distorce o comércio, maiores compromissos de acesso ao mercado e soluções justas para programas de estoques públicos de alimentos, mecanismos de salvaguardas especiais e algodão.
Em trinta anos de existência da OMC, a agricultura foi deixada para trás. É o setor comercial mais protegido de todos, em detrimento de produtores eficientes não subsidiados, de países em desenvolvimento, de países menos desenvolvidos e de seus legítimos objetivos de segurança alimentar.
A reforma deve lidar, de forma eficaz, com questões e preocupações emergentes, como os subsídios relacionados à transição verde e à reindustrialização. Esses subsídios precisam urgentemente ser submetidos a um escrutínio multilateral e estar em conformidade com as disciplinas acordadas.
Além disso, violações ou modificações do princípio da não discriminação devem estar no centro de nossas preocupações com a reforma.
Arranjos de comércio preferenciais, com tarifas e cotas específicas para cada país, ou medidas comerciais unilaterais e arbitrárias para proteger o meio ambiente desafiam os princípios fundamentais da OMC.
Esses fatos levantam questões fundamentais sobre o tratamento de nação mais favorecida e correm o risco de minar a coerência jurídica e a previsibilidade do sistema multilateral de comércio.
O Brasil também está profundamente preocupado com a proliferação de medidas comerciais unilaterais apresentadas como políticas ambientais, que são de natureza protecionista, discriminatórias e injustas — especialmente em relação aos países em desenvolvimento.
O Brasil acredita que chegou a hora de a OMC ser reavaliada e possivelmente reconfigurada à luz das atuais realidades internacionais. Estamos abertos para nos engajar em um processo de reforma profunda do sistema que considere os interesses e as sensibilidades de todos os Membros.
Obrigado.