Ir para o Conteúdo 1 Ir para a Página Inicial 2 Ir para o menu de Navegação 3 Ir para a Busca 4 Ir para o Mapa do site 5
Abrir menu principal de navegação
Ministério das Relações Exteriores
Termos mais buscados
  • imposto de renda
  • inss
  • assinatura
  • cnh social
  • enem
Termos mais buscados
  • imposto de renda
  • inss
  • assinatura
  • Composição
    • Organograma
    • Quem é Quem
    • Gabinete do Ministro das Relações Exteriores
    • Secretaria-Geral das Relações Exteriores
    • Secretaria de América Latina e Caribe
    • Secretaria de Europa e América do Norte
    • Secretaria de África e de Oriente Médio
    • Secretaria de Ásia e Pacífico
    • Secretaria de Assuntos Econômicos e Financeiros
    • Secretaria de Assuntos Multilaterais Políticos
    • Secretaria de Promoção Comercial, Ciência, Tecnologia, Inovação e Cultura
    • Secretaria de Comunidades Brasileiras e Assuntos Consulares e Jurídicos
    • Secretaria de Clima, Energia e Meio Ambiente
    • Secretaria de Gestão Administrativa
    • Escritórios de Representação no Brasil
      • Ererio - Rio de Janeiro
      • Eresul - Rio Grande do Sul
      • Erene - Região Nordeste
      • Eresp - São Paulo
      • Ereminas - Minas Gerais
      • Erebahia – Bahia
      • Erepar - Paraná
      • Erenor - Região Norte
  • Assuntos
    • Alta Representante para Temas de Gênero
      • Alta Representante para Temas de Gênero
      • Relatórios de Atividades
      • Equipe
    • Atos internacionais
    • Cerimonial
      • Cerimonial
      • Embaixadas e Consulados estrangeiros no Brasil
      • Lista do Corpo Diplomático e Datas Nacionais
      • Organismos internacionais
      • Ordem de precedência dos chefes de missão acreditados junto ao Governo brasileiro
      • Privilégios e Imunidades
      • Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul
      • Ordem de Rio Branco
    • Ciência, Tecnologia e Inovação
      • Diplomacia da Inovação
      • Cooperação em Ciência, Tecnologia e Inovação
      • Setores de Ciência, Tecnologia e Inovação (SECTECs)
      • Série de Mapeamentos de Ambientes Promotores de Inovação no Exterior
      • Série de Mapeamentos de Ambientes Promotores de Inovação no Brasil
      • Estudos de Mercado e de Tecnologias
      • Declarações, Atas e Documentos
      • Seleções e Chamadas Públicas
      • Boletim Diplomacia da Inovação
      • Hub da Diáspora Científica e Tecnológica Brasileira
    • Cooperação Internacional
      • Agência Brasileira de Cooperação
      • Cooperação educacional
      • Cooperação esportiva
      • Cooperação humanitária brasileira
      • Cooperação técnica
    • Cultura e Educação
      • Instituto Guimarães Rosa
      • O Brasil na UNESCO
      • Temas educacionais
      • Promoção da cultura brasileira
    • Defesa e Segurança Cibernética
      • Crimes cibernéticos
      • Segurança cibernética
    • Demarcação de Limites
    • Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente
      • Desenvolvimento sustentável
      • Meio ambiente e mudança do clima
      • Mar, Antártida e espaço
    • Direitos Humanos e Temas Sociais
      • Direitos Humanos
      • Temas Humanitários
    • Embaixadas, consulados, missões
      • De outros países no Brasil
    • Energia
    • Instituto Rio Branco
    • Mecanismos Internacionais
      • Mecanismos de Integração Regional
      • Mecanismos Inter-Regionais
    • Palácio Itamaraty
      • Visitação pública ao Palácio Itamaraty
      • Patrimônio Artístico e Histórico
      • Eventos e exposições
      • Arquivo e documentação
      • Biblioteca Azeredo da Silveira
      • Visitação pública ao Instituto Rio Branco
      • Visitação pública ao Memorial das Comunicações do MRE
    • Assessoria de Participação Social e Diversidade
      • Sobre a Assessoria de Participação Social e Diversidade do MRE
      • Sistema de Promoção de Diversidade e Inclusão do MRE
      • Calendário de eventos
      • Plano de Ação do MRE para o Programa Federal de Ações Afirmativas
    • Paz e Segurança Internacionais
      • Desarmamento nuclear e não proliferação
      • Mulheres, Paz e Segurança
      • Organização das Nações Unidas
      • Tribunal Penal Internacional
    • Política Externa Comercial e Econômica
      • Agenda Financeira, Tributária e de Investimentos Internacional
      • Agenda de Negociações Externas
      • Barreiras ao Comércio
      • Comércio Internacional
      • Promoção comercial
      • O Brasil no G-20
      • Organizações Econômicas Internacionais
    • Portal Consular
      • Alertas e Notícias
      • Assistência Consular
      • Cartilhas
      • Documentos Emitidos no Exterior
      • Emergências no Exterior
      • Legalização e Apostilamento de Documentos
      • Links Úteis
      • Nacionalidade Brasileira
      • Perguntas Frequentes
      • Quem Contatar
      • Repartições Consulares do Brasil no exterior
      • Sistema e-consular
      • Vistos
      • Legislação
      • Comunidade Brasileira no Exterior - Estatísticas 2023
      • Alerta consular. Líbano.
      • Relatórios Consulares Anuais - Estimativa de brasileiros ano a ano
      • Guia do Retorno
      • Saída Fiscal Definitiva do Brasil
    • Relações bilaterais
      • África, Europa e Oriente Médio
      • Américas
      • Ásia, Pacífico e Rússia
      • Todos os países
  • Acesso à informação
    • Ações e Programas
    • Agenda de Autoridades
      • e-Agendas
      • Todas as Autoridades
      • Agendas Anteriores
    • Auditorias
      • Auditorias
      • Relatório de Gestão do MRE
    • Consultas Públicas
      • Em andamento
      • Encerradas
    • Convênios e transferências
    • Gestão e governança
      • Gestão no MRE
      • Governança
      • Trabalhe no Itamaraty
      • Comissão de Ética do Ministério das Relações Exteriores
    • Informações classificadas
      • Rol de informações ultrassecretas desclassificadas
      • Rol de informações ultrassecretas classificadas
      • Rol de informações secretas desclassificadas
      • Rol de informações secretas classificadas
      • Rol de informações reservadas desclassificadas
      • Rol de informações reservadas classificadas
    • Institucional
      • Apresentação
      • Organograma
      • Base Jurídica
      • Horário de funcionamento do MRE
    • Licitações e contratos
      • Publicação de Licitações
      • Licitações Finalizadas
      • Plano Anual de Contratações
      • Contratos da Agência Brasileira de Cooperação
      • Contratos do Cerimonial
      • Contratos do Instituto Rio Branco
      • Contratos do Departamento de Comunicações e Documentação
      • Contratos do Departamento do Serviço Exterior
      • Contratos da Divisão de Pagamentos
      • Contratos da Divisão de Logística e Infraestrutura
      • Contratos da Coordenação-Geral de Planejamento e Integração Consular
      • Contratos da Coordenação-Geral de Promoção Comercial
      • Contratos da Divisão de Infraestrutura
      • Contratos do Departamento de Tecnologia e Gestão da Informação
      • Presidência Brasileira do G20
    • Perguntas frequentes
      • O Itamaraty e as carreiras do Serviço Exterior
      • Assistência aos brasileiros no exterior
      • Tratados Internacionais
      • Outros assuntos
    • Plano de dados abertos
    • Plano de integração à plataforma de cidadania digital
    • Plano Diretor de Tecnologia da Informação e Comunicação (PDTIC)
    • Proteção de Dados Pessoais
    • Receitas e despesas
    • Serviço de Informação ao Cidadão
      • SIC - Dúvidas Frequentes
    • Servidores e Empregados Terceirizados
    • Transparência e prestação de contas
      • Demonstrações Contábeis
      • Planejamento Institucional
      • Estrutura Organizacional do MRE e Dados de Contato
      • MRE - Execução Orçamentária e Financeira Detalhada – Despesas Discricionárias
      • Autoridade de Monitoramento e SIC
      • Links para Relatórios de Fiscalização
      • Licitações
      • Ações de Supervisão, Controle e Correição
      • Eleições 2022 - Termo de Execução Descentralizada
      • Termo de Execução Descentralizada MRE-MAPA
      • Programa de Gestão e Desempenho (PGD)
  • Centrais de conteúdo
    • Publicações
      • Discursos, artigos e entrevistas
      • Declarações e outros documentos
      • Resenhas de Política Exterior do Brasil
      • Manual de redação oficial e diplomática do Itamaraty
      • Promoção da cultura brasileira
      • Biblioteca Digital da FUNAG
      • Balanço de Política Externa 2003 | 2010
      • Chamada de Parcerias 2025: Iniciativa Global para a Integridade da Informação sobre a Mudança do Clima
    • Redes sociais
      • Facebook
      • Flickr
      • Instagram
      • X - Português
      • Youtube
      • X - Inglês
      • X - Espanhol
      • LinkedIn
      • Bluesky
    • Redes sociais das representações brasileiras
    • Fotos oficiais, marca do Governo Federal e assinaturas conjuntas
    • Arquivo defeso eleitoral 2022
  • Canais de atendimento
    • Perguntas Frequentes
    • Fale conosco
    • Ouvidoria do Serviço Exterior
    • Imprensa
      • Área de Imprensa
      • Notas à Imprensa
      • Aviso às Redações
      • Credenciamento de profissionais de imprensa
      • Assessoria Especial de Comunicação Social
      • Contatos para imprensa
    • Protocolo
    • Encarregado pelo tratamento de dados pessoais
  • GOV.BR
    • Serviços
      • Buscar serviços por
        • Categorias
        • Órgãos
        • Estados
      • Serviços por público alvo
        • Cidadãos
        • Empresas
        • Órgãos e Entidades Públicas
        • Demais segmentos (ONGs, organizações sociais, etc)
        • Servidor Público
    • Temas em Destaque
      • Orçamento Nacional
      • Redes de Atendimento do Governo Federal
      • Proteção de Dados Pessoais
      • Serviços para Imigrantes
      • Política e Orçamento Educacionais
      • Educação Profissional e Tecnológica
      • Educação Profissional para Jovens e Adultos
      • Trabalho e Emprego
      • Serviços para Pessoas com Deficiência
      • Combate à Discriminação Racial
      • Política de Proteção Social
      • Política para Mulheres
      • Saúde Reprodutiva da Mulher
      • Cuidados na Primeira Infância
      • Habitação Popular
      • Controle de Poluição e Resíduos Sólidos
    • Notícias
      • Serviços para o cidadão
      • Saúde
      • Agricultura e Pecuária
      • Cidadania e Assistência Social
      • Ciência e Tecnologia
      • Comunicação
      • Cultura e Esporte
      • Economia e Gestão Pública
      • Educação e Pesquisa
      • Energia
      • Forças Armadas e Defesa Civil
      • Infraestrutura
      • Justiça e Segurança
      • Meio Ambiente
      • Trabalho e Previdência
      • Turismo
    • Galeria de Aplicativos
    • Acompanhe o Planalto
    • Navegação
      • Acessibilidade
      • Mapa do Site
      • Termo de Uso e Aviso de Privacidade
    • Consultar minhas solicitações
    • Órgãos do Governo
    • Por dentro do Gov.br
      • Dúvidas Frequentes em relação ao Portal gov.br
      • Dúvidas Frequentes da conta gov.br
      • Ajuda para Navegar o Portal
      • Conheça os elementos do Portal
      • Política de e-participação
      • Termos de Uso
      • Governo Digital
      • Guia de Edição de Serviços do Portal Gov.br
    • Canais do Executivo Federal
    • Dados do Governo Federal
      • Dados Abertos
      • Painel Estatístico de Pessoal
      • Painel de Compras do Governo Federal
      • Acesso à Informação
    • Empresas e Negócios
Links Úteis
  • Galeria de Aplicativos
  • Participe
  • Galeria de Aplicativos
  • Participe
Você está aqui: Página Inicial Centrais de conteúdo Publicações Discursos, artigos e entrevistas Ministro das Relações Exteriores Artigos Celso Amorim: 2003-2010 A Lição de Cancún (Revista Política Externa - Vol. 12, nr. 3)
Info

Notícias

A Lição de Cancún (Revista Política Externa - Vol. 12, nr. 3)

Compartilhe por Facebook Compartilhe por Twitter Compartilhe por LinkedIn Compartilhe por WhatsApp link para Copiar para área de transferência
Publicado em 01/01/2014 00h00 Atualizado em 27/12/2024 18h33

The Ministerial Declaration that launched the Doha Round within the World Trade Organization (WTO) opened up promising perspectives for the developing courítries, particularly in relation to agriculture. The preparations for the Cancun Conference demonstrated a disturbing attempt at undermining the levels of ambition agreed upon in Doha. The fact: that the V Ministerial Conference of the W70, held in Cancun, failed to obtain results was interpreted by some as a lost opportunity. Although we, too, were frustrated by the Cancun impasse, our own interpretation is different. Cancun represents a moment of affirmation for the new actors arising in the scenario of trade diplomacy, who are committed to overcome the historical distortions of the international trade system, that are harmful to the developing countries. The Ministerial Conference was a point of inflection, that opens doors to the strengthening of trade multilateralism and for the full realization of the founding goals of the WTO.

1. A V Conferência Ministerial da Organização Mundial do Comércio encerrou-se em 14 de setembro de 2003 em Cancún, no México, sem produzir os resultados a que se propunha. Ao longo de todo o seu desenrolar, foi objeto de atento acompanhamento pela opinião pública mundial. Os embates que marcaram seus trabalhos, e que culminaram no impasse que levou Luis Emesto Derbez, Secretário de Relações Exteriores do México e Presidente da Conferência, a declarar de maneira abrupta (e, para muitos, prematura) o seu encerramento às 16h do último dia, foram vividos em tempo real e com perplexidade pelos observadores da comunidade internacional. Até mesmo a proposta de declaração revisada pelo próprio Presidente Derbez, sobre o tema central da agricultura, deixou de ser considerada. Aos olhos de muitos, Cancún entrava para a história como uma oportunidade perdida. Ao invés de uma Declaração Ministerial que desse rumo à continuação da Rodada multilateral de negociações comerciais iniciada dois anos antes em Doha, o encontro havia produzido um magro comunicado final de seis parágrafos, cuja parte operativa se resumia a instruir os delegados a continuar trabalhando na sede da Organização em Genebra e a solicitar a realização de uma reunião do Conselho Geral da OMC, até o dia 15 de dezembro, com vistas a tomar as decisões necessárias para a conclusão exitosa da Rodada no prazo inicialmente previsto de 31 de dezembro de 2004. Em seu documento final, Cancún se limitava a procurar manter vivo o processo negociador.

2. Os resultados inconclusivos da Conferência trazem, é certo, frustrações. Do ponto de vista do Brasil, não interessa o adiamento de um processo de liberalização comercial, como o de Doha, com sua ênfase na correção de um legado de distorções que penalizam países em desenvolvimento e exportadores competitivos de produtos agrícolas. No entanto, para os países em desenvolvimento que necessitam de um sistema multilateral forte e eqüitativo para ampliar suas oportunidades de geração de riqueza e de empregos, Cancún pode ser vista também sob um prisma positivo, como procurarei esclarecer.

3. Na realidade, se inserirmos a Ministerial de Cancún na seqüência dos inúmeros desapontamentos e promessas quebradas sempre que se tratou de incorporar o tema agrícola às disciplinas que regem o comércio internacional, a reunião não deixa de representar um certo tipo de avanço, ao menos de um ponto de vista político. Vale recapitular que o sistema GATT (Acordo Geral sobre Tarifas e Comércio, em sua sigla em inglês) não se aplicava na prática à agricultura, desde os célebres waivers obtidos pelos EUA ao longo da década de 1950. Somente a partir de 1994, com a criação da Organização Mundial do Comércio (OMC), foram estabelecidas algumas regras - ainda sujeitas a exceções - com a adoção do Acordo sobre Agricultura na Conferência de Marraquexe. 0 alcance limitado do Acordo era implicitamente reconhecido em seu Artigo 20, que preconizava a realização de um esforço liberalizador adicional. As negociações "mandatadas" nunca chegaram a prosperar, em face da postura adotada por alguns países desenvolvidos - liderados pela União Européia - que alegavam precisar de um marco negociador mais amplo, incluindo bens industriais, serviços e novas regras, para poder efetuar concessões na área agrícola. Surgiu, assim, promovida inicialmente pela própria União Européia, a idéia de uma nova rodada de negociações multilaterais, à qual os Estados membros da OMC foram aos poucos aderindo. Após a debacle da Conferência de Seattle, esse projeto encontraria momento propício na IV Conferência Ministerial da OMC, em 2001.

4. As negociações Iançadas em Doha, capital do Catar, receberam o título de Agenda para o Desenvolvimento. Essa denominação, de autoria do então Diretor-Geral Mike Moore, refletia o desejo do Secretariado de responder à percepção de que a OMC é um clube de ricos, insensível às reivindicações do mundo em desenvolvimento por um sistema multilateral de comércio mais justo. De fato, o preâmbulo da Declaração Ministerial de Doha incluía um compromisso com a inclusão das preocupações dos países em desenvolvimento no "coração" das atividades da OMC. 0 mandato negociador de Doha parecia abrir perspectivas alentadoras para os países em desenvolvimento, uma vez que formulava diretrizes ambiciosas para a liberalização do comércio agrícola. Além disso, incluía um chamado ao aperfeiçoamento das cláusulas de tratamento especial e diferenciado e contemplava a possibilidade de negociações sobre um conjunto de itens identificados desde a Ministerial de Seattle sob a rubrica de "Implementação" (uma espécie de compêndio de questões, cujo equacionamento pela Rodada Uruguai havia sido considerado insatisfatório pelos países menos desenvolvidos). A adoção de uma Declaração à parte, que explicitava a compatibilidade entre o Acordo sobre Aspectos dos Direitos de Propriedade Intelectual relacionados ao Comércio (Trips, em sua sigla em inglês) e o acesso a medicamentos em condições razoáveis, também representou um ganho para os países em desenvolvimento. No tocante à agricultura, criava-se uma oportunidade para o desmantelamento de barreiras protecionistas e a eliminação dos subsídios bilionários de que se beneficia esse setor nos países mais ricos do mundo. 0 mandato de Doha estabeleceu os objetivos para os chamados "três pilares" da negociação agrícola da seguinte forma: (a) melhora substancial em acesso a mercados, (b) redução dos subsídios à exportação com vistas à sua eliminação, e (c) redução significativa das medidas de apoio interno distorcivas do comércio internacional.

5. Vale aqui a observação de que os interesses de Brasil não se limitam à agricultura. No contexto dos itens relacionados à "implementação" dos Acordos da Rodada Uruguai, tal como a revisão do Acordo de Medidas sobre Investimento relacionadas a Comércio (Trims, em inglês) e a compatibilização do Acordo Trips com a Convenção sobre Diversidade Biológica, apresentamos propostas específicas. Também no capítulo de "regras" (antidumping, créditos à exportação, subsídios e medidas compensatórias), temos uma agenda ofensiva. Nossos interesses são multifacetados. Participamos ativamente em todas as frentes negociadoras. Mas nenhum outro tópico tem o potencial de produzir para o País e o Mercosul um impacto comparável ao de uma reforma da agricultura em escala global. A plena integração do setor agrícola no sistema multilateral ampliará nossa participação no comércio internacional e elevará preços internacionais artificialmente deprimidos, aumentando a renda e contribuindo para combater o ciclo vicioso da pobreza. Em futuro previsível, nenhum outro setor produtivo tem, do nosso ponto de vista, a capacidade de tornar os ganhos potenciais do comércio internacional para a criação de riqueza e sua melhor distribuição uma realidade concreta.

6. Já era perceptível durante a fase preparatória da Conferência de Cancún a falta de disposição negociadora das principais potências comerciais nas áreas de maior interesse para os países em desenvolvimento. Essa atitude se manifestava no descaso em relação a prazos do cronograma estabelecido na Declaração de Doha para lidar com temas como "implementação" e tratamento especial e diferenciado para países em desenvolvimento. Entrementes, o atraso da União Européia para definir os termos da reforma de sua Política Agrícola Comum acarretou postergações sucessivas nos debates para a definição de modalidades negociadoras em matéria agrícola. Ao mesmo tempo, permaneciam paralisadas as tratativas relacionadas ao parágrafo 6 da Declaração de Doha sobre Trips e Saúde Pública (referentes à possibilidade de os países com pouca ou nenhuma capacidade de produção no setor farmacêutico virem a beneficiar-se das flexibilidades contidas no acordo Trips). Embora não fizessem parte da Rodada propriamente dita, a paralisia dessas discussões afetava negativamente o ambiente negociador.

7. Este quadro pouco animador deteriorou-se em decorrência do acerto tático entre Estados Unidos e União Européia. Havia entre a maioria dos participantes a noção de que alguma forma de entendimento entre os dois grandes subsidiadores seria necessária para que as negociações pudessem efetivamente progredir, uma vez que o impasse entre ambos levaria inevitavelmente à paralisia. Só que o arranjo a que chegaram EUA e UE, circulado em Genebra em 13 de agosto - a quatro semanas de Cancún -, ao invés de impulsionar a agenda reformadora de Doha, tentou freiá-la, mediante a uma acomodação bilateral em bases conservadoras, nas três vertentes da negociação. Em outras palavras, o arranjo entre Bruxelas e Washington constituía um retrocesso, cuja eventual aceitação pelos demais teria resultado em um injustificável sacrifício dos propósitos da Rodada, inclusive em seu tema basilar. A nova e mais ampla definição da "caixa azul", por exemplo, destinava-se meramente a consolidar práticas norte-americanas que distorcern o comércio internacional, aumentando os limites de concessão de apoio doméstico autorizados pelo Acordo de Agricultura (e equiparando, em termos práticos, às condições de competição entre EUA e União Européia em matéria de apoio interno); abria-se a possibilidade de que os subsídios à exportação não fossem eliminados para certos produtos; a fórmula para acesso a mercados não atendia os interesses exportadores do Mercosul e de outros países em desenvolvimento.

8. 0 descaminho que havia tomado a Rodada completar-se-ia com a decisão do Presidente do Conselho Geral da OMC de enviar para o plenário da V Conferência projeto de declaração ministerial inaceitável para um bom número de participantes. Esse texto reproduzia quase textualmente a criticada proposta EUA/UE em matéria agrícola. Além disso, incluía proposta apresentada à última hora por Japão, Coréia do Sul e União Européia de negociação em investimentos, concorrência transparência em compras governamentais e facilitação de comércio - os "temas de Singapura" (assim chamados por terem sido suscitados pela primeira vez na Conferência Ministerial realizada naquele país em 1996). A insistência em negociações sobre os temas de Singapura ignorava a oposição aberta de um número significativo de países em desenvolvimento (sobretudo asiáticos e africanos). Em suma, as deficiências do processo preparatório em Genebra e o evidente desequilíbrio da proposta apresentada pelo Presidente do Conselho transferiram aos Ministros, em Cancún, a tarefa de recolocar a Rodada nos trilhos consensualmente estipulados pela Declaração de Doha. Em paralelo, um grupo de países em desenvolvimento grandes e pequenos, da América Latina, África e Ásia, começou a organizar-se, sob a coordenação do Brasil, em torno de uma plataforma alternativa para o tratamento da questão agrícola. Esse grupo não pararia de crescer até o último dia da Conferência e ficaria conhecido como G-20+.

9. Aberta a Conferência e após alguns embates táticos, o Ministro Derbez (México) evitou caracterizar qualquer documento como base para as negociações, a despeito da forte insistência (sobretudo dos EUA) de que o projeto de declaração ministerial de responsabilidade do Presidente do Conselho Geral servisse de referência, especialmente em agricultura. Sucederam-se reuniões informais de consulta conduzidas por diversos "Facilitadores" (um para cada um dos principais temas). No caso da agricultura, o G-20+, que tive a honra de coordenar como chefe da Delegação brasileira, destacou-se por uma atuação coesa e objetiva, tecnicamente bem fundamentada, em reuniões de nível ministerial: primeiramente com a União Européia, depois com os EUA e finalmente com ambos. Entabulou-se assim uma verdadeira negociação. Na tarde do dia 13 de setembro, uma nova versão do projeto de declaração foi circulada pelo Presidente da Conferência. Sua redação, no entanto, veio a ser criticada pela maioria das delegações. Os países mais interessados na reforma agrícola consideravam que os parágrafos sobre o tema, apesar de incorporarem alguns aspectos pleiteados pelo G-20+, permaneciam amplamente insatisfatórios. Entretanto, não chegaram a rejeitar o projeto. Assinalaram suas insuficiências e, na realidade, aprestavam-se, com novo aprofundamento técnico, para uma negociação que se anunciava difícil e prolongada. Mas foi em relação aos temas de Singapura que se produziram as reclamações mais veementes - sobretudo de países africanos e asiáticos. A flexibilização tardia por parte da União Européia em relação à sua proposta original, que consistiu em admitir o abandono das questões de investimentos e concorrência, não foi considerada suficiente. Mais de 70 países em desenvolvimento haviam assinado uma declaração afirmando não estarem em condição de aprovar negociações nesses temas. Os africanos, em particular, assumiram postura incisiva contrária à abertura de negociação em qualquer um dos quatro temas, enquanto a Coréia do Sul insistia na inclusão de todos eles. Na tarde do dia 14, quando estavam prontos os arranjos logísticos para a prorrogação dos trabalhos noite adentro, o Ministro Derbez afirmou não vislumbrar bases para um acordo e declarou encerrada a Conferência.

10. 0 que distingue Cancún de Conferências anteriores da OMC, ou mesmo de outras da época do GATT, é a demonstração da capacidade do mundo em desenvolvimento de resistir a pressões com uma atuação articulada e pró-ativa, em defesa do mandato negociador da Rodada. Isso se tornou possível somente graças à reformulação do mapa da correlação de forças, para a qual concorreram com destaque três elementos, vistos a seguir.

11. Em primeiro lugar, as ONGS, que já haviam demonstrado sua capacidade de influir nos debates travados na OMC quando da negociação da Declaração sobre Trips e Saúde Pública, consolidaram e ampliaram sua influência nos trabalhos da Rodada por meio de uma crescente articulação com delegações governamentais, em particular de países de menor desenvolvimento relativo, mas também daquelas mais interessadas na reforma agrícola.

12. Em segundo lugar, a muitos terá surpreendido a capacidade de mobilização e coordenação dos países africanos e, em sentido amplo, dos de menor desenvolvimento relativo. Em contraste com sua participação discreta e fragmentada em Conferências anteriores, revelaram-se unidos e articulados ao longo da Conferência em torno do objetivo de incorporar efetivamente questões de seu interesse aos trabalhos da OMC. Alguns desses países, como Burkina Faso, Chade, Benin e Mali, foram alçados a uma inusitada posição de protagonismo, quando lograram que fosse incluído formalmente, como item separado da agenda, o tema dos subsídios ao algodão. 0 pleito dos quatro era a eliminação dos subsídios dos produtores desenvolvidos e a prestação de compensação aos agricultores africanos pela redução artificial que aqueles subsídios impõem aos preços internacionais. A questão chegou a ser considerada por muitos como um teste para medir o grau de disposição efetiva dos países desenvolvidos em dar cumprimento às promessas e ao espírito de Doha, tendo em vista a disparidade entre a pequena participação do setor algodoeiro no comércio internacional e a grande importância de que ele se reveste para a economia dos quatro países. A resposta do mundo desenvolvido foi de absoluto desdém, como ficou patente na falta de referência à questão dos subsídios no contexto dos debates sobre a revisão futura de todo o setor têxtil pela OMC. Essa indiferença foi devastadora para as esperanças da sub-região (e de africanos em geral) de que Cancún propiciaria avanços concretos em temas de seu interesse vital. Ao depararem-se, posteriormente, com demandas de abertura de negociação nos temas de Singapura, apresentadas por países pouco receptivos na questão do algodão, e sem que se estabelecesse qualquer vínculo nítido com o atendimento de pleitos na área agrícola, os países africanos se negariam a fazer concessões. Esses desdobramentos são cruciais para esclarecer as circunstâncias em que se cristalizou o endurecimento de posições apontado como responsável pelo encerramento da Conferência. Explicam também porque os Ministros do Quênia e da Tanzânia se retirariam da reunião antes do seu final, em sinal de protesto.

13. 0 terceiro e talvez mais significativo elemento na correlação de forças que emergiu em Cancún terá sido o surgimento do G-20+. Sua marca distintiva, desde a origem, foi a do firme compromisso com o sentido reformista do mandato de Doha para agricultura. Como visto acima, os Estados Unidos e a União Européia haviam, de fato, sucumbido à tentação protecionista de resguardar seus regimes nacionais (respectivamente, o Farm Bill e a PAC revisada) e promover reformas mínimas no sistema internacional vigente. Prenunciava-se a reedição de um Acordo de Blair House (como ficou conhecido o episódio em que EUA e União Européia acertaram os ponteiros entre si, em 1992, ditando os limites que poderia assumir o Acordo sobre Agricultura da Rodada Uruguai). 0 Grupo de Cairns - que reunia os principais países exportadores demandantes em agricultura e que envolve países tanto em desenvolvimento, como desenvolvidos - revelava hesitação em antepor-se ao novo acordo dos dois grandes. A ocasião prestava-se a um rompimento com a tradicional dinâmica da "bipolaridade" no sistema GATT/OMC, segundo a qual os acordos pré-negociados entre europeus e norte-americanos se transformavam no consenso inevitável.

14. Essa nova investida diplomática caracterizou-se, desde o início, por seu sentido pragmático, destituído de qualquer componente confrontacionista ou ideológico. Os integrantes do Grupo aproximaram-se em função de afinidades espontâneas ditadas pelo interesse compartilhado no fortalecimento do sistema multilateral de comércio. De um pequeno núcleo formado por Brasil, Argentina e índia, surgiu uma proposta que refletia de perto a estrutura (mas não o conteúdo, obviamente) do documento conjunto EUA-UE. A questão central nas negociações para a sua elaboração foi a busca de consenso para o tratamento especial e diferenciado, no âmbito de acesso a mercados, em que as posições defensivas de países em desenvolvimento asiáticos, como China e Índia, exigiam acomodação. Mas um importante elemento congregador, desde o início, foi o repúdio aos efeitos danosos causados pelos subsídios distorcivos ao comércio. 0 texto final não chegava a ser inovador: 70 a 80% das propostas nele contidas haviam sido defendidas pela própria Delegação dos EUA no Comitê de Agricultura da OMC, até um pouco antes da reconversão norte-americana ao protecionismo agrícola.

15. A unidade do G-20+, calcada numa plataforma comum sólida, revelou-se funcional ao longo da Conferência: o Grupo mostrou capacidade para engajar-se nas negociações de maneira propositiva e flexível a respeito de qualquer tema pontual e, mesmo defrontado com uma segunda versão de projeto de declaração ministerial que não incorporava a maior parte de seus anseios, manteve-se à mesa para negociar, com propostas conjuntas de emendas ao projeto. Infelizmente, a oportunidade de discuti-Ias não chegou a materializar-se. 0 G-20+ foi considerado um acontecimento histórico e inovador por inumeros observadores e comentaristas. Sua atuação equilibrada e construtiva foi explicitamente reconhecida pelo Diretor-Geral Supachai Panitchpakdi. Como comentei em palestra proferida na Firjan, em 13 de outubro, o G-20+ encontrou eco junto à opinião pública não por criticar a OMC, mas em função da defesa do mandato da Declaração de Doha e de uma agenda liberalizante e reformista (1). 0 caráter inovador e a capacidade de liderança do grupo foram salientados em artigo publicado recentemente no jornal Valor Econômico (2). Lamentavelmente, outras análises da Conferência levaram alguns participantes - por razões táticas e de forma pouco construtiva - a responsabilizar o Grupo por impasses cuja origem remonta ao processo preparatório em Genebra e que foram agravados pela forma arrogante com que as preocupações de países em desenvolvimento - inclusive as menores e mais frugais - foram tratadas, como vimos nas questões do algodão e dos temas de Singapura.


16. Antes da apresentação formal de sua proposta inicial, o Grupo evoluíra de 3 para 17 membros. Ao longo do processo preparatório da Conferência em Genebra, outros 3 somaram-se. 0 Grupo chegou a Cancún com 20 membros do mundo em desenvolvimento e, da abertura ao encerramento da Conferência, sob a coordenação do Brasil, atuou em uníssono. A intensa pressão exercida por países desenvolvidos sobre seus membros individualmente, a qual envolveu inclusive gestões em capitais, resultou numa defecção (EI Salvador), mas não impediu a adesão de três novos membros: Egito, Nigéria e Indonésia. Encerrada a Conferência, novas pressões sobre seus integrantes levaram a defecções. É prematuro julgar se serão ou não permanentes. Obviamente, tais pressões não ajudam a reverter o ceticismo dos países menores e menos desenvolvidos quanto às perspectivas de democratização dos métodos de trabalho da OMC. De qualquer forma, e independentemente de sua adesão formal ou não ao Grupo, os seus integrantes originais mantêm os mesmos pleitos e o mais provável é que permaneçam em contato nas etapas futuras das negociações.

17. Integram o Grupo três dos maiores países africanos (com representação tanto maghrebina como sub-sahariana), vários dos grandes asiáticos, boa parte da América do Sul e mesmo um membro do Nafta. De maneira ainda mais relevante, a legitimidade do Grupo como um ator central em qualquer negociação multilateral agrícola assenta-se no fato de seus membros representarem mais de 20% do PIB agrícola mundial (acima dos 15,9% da soma de Japão, Estados Unidos e União Européia) e mais de 65% da população agrícola do planeta (sem comparação possível com o 1 % que representam os agricultores somados de EUA, UE e Japão) (3).

18. A constituição do G-20+ fez-se de maneira não-excludente. Cabe assinalar, por exemplo, que 12 dos 17 membros do Grupo de Cairns - aliados tradicionais do Brasil em matéria de agricultura - decidiram juntar-se ao C-20+. Ao longo da Conferência, o Grupo manteve, de maneira permanente, contato estreito com os cinco membros de Cairns que não se associaram a suas propostas (Canadá, Austrália, Nova Zelândia, Malásia e Uruguai). Esse contato traduziu-se, em diversos momentos, em cooperação e atuação convergente de uns e outros em questões tópicas. Não devemos esquecer, entretanto, que os 17 membros de Cairns nunca chegaram a influir decisivamente no condomínio "bipolar" das negociações agrícolas a que me referi acima, com seus 7,5% do PIB agrícola mundial e 4,9% da população agrícola (4).

19. Os países africanos e o G-20+ sinalizaram para o mundo o fortalecimento da posição dos países em desenvolvimento na diplomacia comercial. Essa afirmação política é indissociável do processo de universalização da OMC. A Organização já conta com 148 Estados membros - ainda longe, é certo, dos 191 das Nações Unidas. Mas a tendência histórica no sentido da ampliação de sua composição é consistente; 33 países e territórios aduaneiros independentes aderiram à OMC a partir de 1996, um ano após sua constituição, dos quais 10 do Leste Europeu e 23 do mundo em desenvolvimento - 10 da Ásia, 8 da África e 5 da América Latina e do Caribe. Negociam sua acessão 25 outros Estados, entre os quais a Argélia, a Arábia Saudita e, com destaque, a Federação Russa. Mantida a tendência dos últimos anos, sobretudo após o ingresso da China e uma vez consumada a acessão da Rússia, terão se incorporado ao sistema multilateral de comércio países que respondem pela quase totalidade não somente do comércio internacional, mas também da população e do território do planeta.

20. A universalização do sistema multilateral de comércio implica, por certo, conseqüências sistêmicas para a Organização - muito bem-vindas, aliás. Decisões tomadas em um sistema genuinamente mundial têm maior solidez e legitimidade. Mais do que isso, no entanto, não há engenharia política capaz de evitar que uma organização verdadeiramente mundial do comércio deixe de democratizar-se. Democracia, neste caso, se traduz em transparência e em ampla e efetiva participação de todos os membros ao longo do processo de tomada de decisão. Significa também o fim das soluções impostas, dos acertos destituídos de representatividade, do cerceamento da associação em torno de interesses concretos mediante pressões e ameaças. Kevin Watkins, do jornal inglês The Guardian, tinha razão ao dizer em 22 de setembro que "Cancún foi o momento em que a glasnost chegou à OMC" (5). A velha prática das decisões a portas fechadas entre major players e da apresentação de fatos consumados para o endosso em grande medida passivo da maioria mostrou ser falível em momentos cruciais. Abre-se, a partir de Cancún, uma oportunidade histórica para o reforço do próprio conceito de multilateralisino no campo comercial.

21. 0 funcionamento democrático de uma instituição multilateral impede que ela seja controlada por qualquer membro ou grupo de membros de maneira individual. A opção da bilateralização ou regionalização pode parecer tentadora para certos países desenvolvidos porque a disparidade do peso relativo dos grandes junto aos fracos não enfrenta nela contrapontos em qualquer aliança de monta. Trata-se de um dilema de sérias implicações para o futuro do ordenamento econômico-comercial do mundo. 0 risco de fracionamento do sistema multilateral é real; a disjuntiva diante da qual nos encontramos é saber se os Estados membros aproveitarão o momento engendrado em Cancún para fortalecer o sistema multilateral ou para esvaziá-lo, transportando na prática para foros bilaterais ou regionais as negociações comerciais. É certo que, não por coincidência, o último dos seis parágrafos do comunicado final da Conferência reafirma o compromisso dos Estados membros de implementar a Declaração de Doha. Mas a expressão da vontade política atestada pelos documentos finais tem sido abalada por declarações de representantes de grandes potências comerciais, em que suscitam publicamente a questão de seguir ou não com o formato multilateral para as negociações comerciais. 0 editorial do Financial Times do último dia 29 de setembro (6) comenta essas afirmações e aponta para os riscos de confiar em recompensas comerciais decorrentes de uma lealdade incondicional aos interesses de um pólo determinado. 0 artigo lucidamente conclui que a OMC, com seus defeitos, ainda representa a melhor alternativa para genuína liberalização comercial.

22. Não é possível antever com razoável grau de certeza os desdobramentos da atual situação pós-Cancún. 0 número de variáveis e de atores interessados é grande o suficiente para que a definição do futuro do sistema multilateral de comércio independa da vontade de qualquer Governo individualmente. Mas há razões para um otimismo cauteloso. Primeiro, não há como compartimentalizar de maneira estrita as questões multilaterais e as bilaterais ou regionais. Os interesses e as sensibilidades são os mesmos e tendem a manifestar-se de forma até mais aguda. No caso das discussões para a conformação da Área de Livre Comércio das Américas (Alca), por exemplo, a Delegação dos EUA recusa-se a negociar "temas sensíveis" como regras anti-dumpíng e subsídios agrícolas, alegando não ter como oferecer concessões sem um rearranjo global das respectivas disciplinas. Símetricamente, o Brasil e seus sócios do Mercosul têm sustentado - no espírito de construção de uma "Alca possível" e equilibrada - que a parte normativa de propriedade intelectual, serviços, investimentos e compras governamentais requererá tratamento multilateral, ainda quando reconheçam o direito dos países que assim o desejarem de concluir acordos bi- ou plurilaterais no contexto da Alca. Não escapa às análises sobre a Alca e a Rodada de Doha que ambos os exercícios não constituem vias alternativas, mas sim processos interdependentes. Assim, desengajar-se da Rodada de Doha implica dificultar o equacionamento das agendas de liberalização do comércio pela via bilateral ou regional. A menos que, como afirma o mesmo editorial do Financial Tínies, estejamos lidando com parceiros "excessivamente desesperados e que não estão em condições de rejeitar qualquer oferta" - por pior que seja. (7)

23. Mesmo para os países desenvolvidos, há na Rodada de Doha - e mais amplamente na OMC - um conjunto de temas e/ou disputas que só podem ser resolvidos pela via multilateral. Um exemplo é o término da chamada "cláusula de paz" em agricultura. No Acordo de Agricultura celebrado ao final da Rodada Uruguai em 1994, os Estados membros comprometeram-se a não apresentar queixas formais sobre subsídios agrícolas até 31 de dezembro de 2003. Sua prorrogação chegou a ser solicitada por países desenvolvidos que aplicam subsídios, no âmbito das negociações agrícolas da Rodada de Doha. A prorrogação da cláusula da paz vai contra os interesses dos países demandantes em matéria agrícola. Se os países subsidiadores estiverem interessados em evitar uma enxurrada de queixas submetidas pelo procedimento de solução de controvérsias após sua expiração, terão de dispor-se a sentar-se à mesa para enfim negociar o capítulo agrícola segundo os parâmetros estabelecidos em Doha. De resto, a existência do foro multilateral permite evitar ou pelo menos mitigar o desgaste político inerente aos enfrentamentos comerciais não só entre países ricos e pobres, mas também entre países de nossa categoria. A alternativa para a OMC é o estado de guerra comercial permanente, que não interessa a ninguém.

24. Em resumo, mantidas as atuais circunstâncias, o caminho mais racional - e, esperamos, por isso mesmo o mais provável - a ser adotado pelos países desenvolvidos na busca de seus próprios interesses é o de manter suas fichas negociadoras no tabuleiro da OMC. 0 mundo em desenvolvimento dele nunca se afastou. Dadas as promessas de ganhos universais despertadas pelo lançamento da Rodada de Doha, é legítimo esperar que se processem as reacomodações necessárias, em torno de pontos de interesse comum, mediante concessões recíprocas e soluções de compromisso. A racionalidade e a sabedoria política militam, assim, a favor do reforço do multilateralismo.

25. 0 Brasil sempre esteve disposto a negociar. 0 Governo do Presidente Lula tem plena consciência das possibilidades que podem ser abertas para o Brasil e seus vizinhos por um comércio internacional mais livre. Tampouco lhe escapa o sentido de urgência de uma expansão da atividade econômica para a consecução da agenda social. Por essa razão, lamentamos que, no México, não tenhamos podido negociar. Mas negociar para a Delegação brasileira pressupunha buscar apoio em uma base a mais ampla possível. A aliança que ajudamos a construir no G-20+ é, até certo ponto, o reflexo de um momento. A dinâmica dos jogos de interesse poderá ou não modificá-la, com possíveis reconfigurações, à medida que evolua o próprio cenário negociador. Outras alianças poderão surgir, em temas distintos e com perfis diferentes. Isso não é o fundamental. A lição a ser extraída de Cancún é a de que é, sim, possível os países em desenvolvimento unirem-se de maneira construtiva em torno de plataformas comuns que no fundo coincidem com os próprios objetivos da Organização Mundial do Comércio. A Agenda para o Desenvolvimento de Doha jamais será cumprida em detrimento daqueles que deveriam ser seus principais beneficiários.

26. A V Conferência Ministerial nunca havia sido pensada como fim ou início de um processo negociador - e sim como um momento de avaliação dos progressos alcançados e de orientação do trabalho futuro. Constatada a impossibilidade de acordo e a necessidade de novos esforços em Genebra, Cancún permanece como um ponto de inflexão, em que um coro de vozes comprometidas com o sistema soube evitar que a Rodada fosse seqüestrada em detrimento da grande maioria. É vital que os Estados membros retomem o quanto antes os contatos em âmbito técnico em Genebra, com o objetivo de encerrar a Rodada no prazo acordado de 10 de janeiro de 2005. Como tive a oportunidade de observar em conversa recente com o Diretor-Geral Supachai Panitchpakdi, considero importante que duas circunstâncias estejam presentes para uma retomada produtiva das negociações em Genebra: (1) os proponentes dos temas de Singapura não devem voltar a insistir na abertura de negociações em áreas que visivelmente não estão maduras para tanto, e (2) os principais envolvidos nas negociações agrícolas deveriam tomar como ponto de partida, em Genebra, o último papel do Presidente da Conferência de Cancún. Verificadas essas condições, estimo tecnicamente possível concluir a Rodada no tempo previsto. Sabemos, porém, - e este certamente não é o nosso desejo - que os tempos negociais podem revelar-se mais longos do que o planejado e não dependem apenas de entendimentos no nível técnico. Do nosso ponto de vista, seria preferível submeter-nos a um pequeno atraso a relegar a um futuro incerto a oportunidade para corrigir distorções da Rodada anterior.

Notas

1. Palestra proferida em 13/10/2003 no seminário "Negociações Internacionais: a Experiência Internacional", promovido pela Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro, na cidade do Rio de Janeiro,

2. MARCONINI, Mário, "OMC: acefalia e negligência" ln: Valor Econômico, 14/10/2003.

3. Fonte: Instituto de Estudos do Comércio e Negociaçôes Internacionais (Icone), citando dados da FAO e do Banco Mundial.

4. Fonte: Instituto de Estudos do Comércio e Negociações; Internacionais (Icone), citando dados da FAO e do Banco Mundial.

5. WATKINS, Kevin. "Cancun was where the WTO found glasnost - and a chance for renewal" In: The Guardian, Reino Unido, 23/09/2003.

6. Editorial. "A big trader trawls for tiddlers: us bilateral deals are unlikeiy to net much of a catch" in: Financial Times, Reino Unido, 29/09/2003.

7. Idem, ibid.

Comunicação Governamental
Compartilhe por Facebook Compartilhe por Twitter Compartilhe por LinkedIn Compartilhe por WhatsApp link para Copiar para área de transferência
  • Composição
    • Organograma
    • Quem é Quem
    • Gabinete do Ministro das Relações Exteriores
    • Secretaria-Geral das Relações Exteriores
    • Secretaria de América Latina e Caribe
    • Secretaria de Europa e América do Norte
    • Secretaria de África e de Oriente Médio
    • Secretaria de Ásia e Pacífico
    • Secretaria de Assuntos Econômicos e Financeiros
    • Secretaria de Assuntos Multilaterais Políticos
    • Secretaria de Promoção Comercial, Ciência, Tecnologia, Inovação e Cultura
    • Secretaria de Comunidades Brasileiras e Assuntos Consulares e Jurídicos
    • Secretaria de Clima, Energia e Meio Ambiente
    • Secretaria de Gestão Administrativa
    • Escritórios de Representação no Brasil
      • Ererio - Rio de Janeiro
      • Eresul - Rio Grande do Sul
      • Erene - Região Nordeste
      • Eresp - São Paulo
      • Ereminas - Minas Gerais
      • Erebahia – Bahia
      • Erepar - Paraná
      • Erenor - Região Norte
  • Assuntos
    • Alta Representante para Temas de Gênero
      • Alta Representante para Temas de Gênero
      • Relatórios de Atividades
      • Equipe
    • Atos internacionais
    • Cerimonial
      • Cerimonial
      • Embaixadas e Consulados estrangeiros no Brasil
      • Lista do Corpo Diplomático e Datas Nacionais
      • Organismos internacionais
      • Ordem de precedência dos chefes de missão acreditados junto ao Governo brasileiro
      • Privilégios e Imunidades
      • Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul
      • Ordem de Rio Branco
    • Ciência, Tecnologia e Inovação
      • Diplomacia da Inovação
      • Cooperação em Ciência, Tecnologia e Inovação
      • Setores de Ciência, Tecnologia e Inovação (SECTECs)
      • Série de Mapeamentos de Ambientes Promotores de Inovação no Exterior
      • Série de Mapeamentos de Ambientes Promotores de Inovação no Brasil
      • Estudos de Mercado e de Tecnologias
      • Declarações, Atas e Documentos
      • Seleções e Chamadas Públicas
      • Boletim Diplomacia da Inovação
      • Hub da Diáspora Científica e Tecnológica Brasileira
    • Cooperação Internacional
      • Agência Brasileira de Cooperação
      • Cooperação educacional
      • Cooperação esportiva
      • Cooperação humanitária brasileira
      • Cooperação técnica
    • Cultura e Educação
      • Instituto Guimarães Rosa
      • O Brasil na UNESCO
      • Temas educacionais
      • Promoção da cultura brasileira
    • Defesa e Segurança Cibernética
      • Crimes cibernéticos
      • Segurança cibernética
    • Demarcação de Limites
    • Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente
      • Desenvolvimento sustentável
      • Meio ambiente e mudança do clima
      • Mar, Antártida e espaço
    • Direitos Humanos e Temas Sociais
      • Direitos Humanos
      • Temas Humanitários
    • Embaixadas, consulados, missões
      • De outros países no Brasil
    • Energia
    • Instituto Rio Branco
    • Mecanismos Internacionais
      • Mecanismos de Integração Regional
      • Mecanismos Inter-Regionais
    • Palácio Itamaraty
      • Visitação pública ao Palácio Itamaraty
      • Patrimônio Artístico e Histórico
      • Eventos e exposições
      • Arquivo e documentação
      • Biblioteca Azeredo da Silveira
      • Visitação pública ao Instituto Rio Branco
      • Visitação pública ao Memorial das Comunicações do MRE
    • Assessoria de Participação Social e Diversidade
      • Sobre a Assessoria de Participação Social e Diversidade do MRE
      • Sistema de Promoção de Diversidade e Inclusão do MRE
      • Calendário de eventos
      • Plano de Ação do MRE para o Programa Federal de Ações Afirmativas
    • Paz e Segurança Internacionais
      • Desarmamento nuclear e não proliferação
      • Mulheres, Paz e Segurança
      • Organização das Nações Unidas
      • Tribunal Penal Internacional
    • Política Externa Comercial e Econômica
      • Agenda Financeira, Tributária e de Investimentos Internacional
      • Agenda de Negociações Externas
      • Barreiras ao Comércio
      • Comércio Internacional
      • Promoção comercial
      • O Brasil no G-20
      • Organizações Econômicas Internacionais
    • Portal Consular
      • Alertas e Notícias
      • Assistência Consular
      • Cartilhas
      • Documentos Emitidos no Exterior
      • Emergências no Exterior
      • Legalização e Apostilamento de Documentos
      • Links Úteis
      • Nacionalidade Brasileira
      • Perguntas Frequentes
      • Quem Contatar
      • Repartições Consulares do Brasil no exterior
      • Sistema e-consular
      • Vistos
      • Legislação
      • Comunidade Brasileira no Exterior - Estatísticas 2023
      • Alerta consular. Líbano.
      • Relatórios Consulares Anuais - Estimativa de brasileiros ano a ano
      • Guia do Retorno
      • Saída Fiscal Definitiva do Brasil
    • Relações bilaterais
      • África, Europa e Oriente Médio
      • Américas
      • Ásia, Pacífico e Rússia
      • Todos os países
  • Acesso à informação
    • Ações e Programas
    • Agenda de Autoridades
      • e-Agendas
      • Todas as Autoridades
      • Agendas Anteriores
    • Auditorias
      • Auditorias
      • Relatório de Gestão do MRE
    • Consultas Públicas
      • Em andamento
      • Encerradas
    • Convênios e transferências
    • Gestão e governança
      • Gestão no MRE
      • Governança
      • Trabalhe no Itamaraty
      • Comissão de Ética do Ministério das Relações Exteriores
    • Informações classificadas
      • Rol de informações ultrassecretas desclassificadas
      • Rol de informações ultrassecretas classificadas
      • Rol de informações secretas desclassificadas
      • Rol de informações secretas classificadas
      • Rol de informações reservadas desclassificadas
      • Rol de informações reservadas classificadas
    • Institucional
      • Apresentação
      • Organograma
      • Base Jurídica
      • Horário de funcionamento do MRE
    • Licitações e contratos
      • Publicação de Licitações
      • Licitações Finalizadas
      • Plano Anual de Contratações
      • Contratos da Agência Brasileira de Cooperação
      • Contratos do Cerimonial
      • Contratos do Instituto Rio Branco
      • Contratos do Departamento de Comunicações e Documentação
      • Contratos do Departamento do Serviço Exterior
      • Contratos da Divisão de Pagamentos
      • Contratos da Divisão de Logística e Infraestrutura
      • Contratos da Coordenação-Geral de Planejamento e Integração Consular
      • Contratos da Coordenação-Geral de Promoção Comercial
      • Contratos da Divisão de Infraestrutura
      • Contratos do Departamento de Tecnologia e Gestão da Informação
      • Presidência Brasileira do G20
    • Perguntas frequentes
      • O Itamaraty e as carreiras do Serviço Exterior
      • Assistência aos brasileiros no exterior
      • Tratados Internacionais
      • Outros assuntos
    • Plano de dados abertos
    • Plano de integração à plataforma de cidadania digital
    • Plano Diretor de Tecnologia da Informação e Comunicação (PDTIC)
    • Proteção de Dados Pessoais
    • Receitas e despesas
    • Serviço de Informação ao Cidadão
      • SIC - Dúvidas Frequentes
    • Servidores e Empregados Terceirizados
    • Transparência e prestação de contas
      • Demonstrações Contábeis
      • Planejamento Institucional
      • Estrutura Organizacional do MRE e Dados de Contato
      • MRE - Execução Orçamentária e Financeira Detalhada – Despesas Discricionárias
      • Autoridade de Monitoramento e SIC
      • Links para Relatórios de Fiscalização
      • Licitações
      • Ações de Supervisão, Controle e Correição
      • Eleições 2022 - Termo de Execução Descentralizada
      • Termo de Execução Descentralizada MRE-MAPA
      • Programa de Gestão e Desempenho (PGD)
  • Centrais de conteúdo
    • Publicações
      • Discursos, artigos e entrevistas
      • Declarações e outros documentos
      • Resenhas de Política Exterior do Brasil
      • Manual de redação oficial e diplomática do Itamaraty
      • Promoção da cultura brasileira
      • Biblioteca Digital da FUNAG
      • Balanço de Política Externa 2003 | 2010
      • Chamada de Parcerias 2025: Iniciativa Global para a Integridade da Informação sobre a Mudança do Clima
    • Redes sociais
      • Facebook
      • Flickr
      • Instagram
      • X - Português
      • Youtube
      • X - Inglês
      • X - Espanhol
      • LinkedIn
      • Bluesky
    • Redes sociais das representações brasileiras
    • Fotos oficiais, marca do Governo Federal e assinaturas conjuntas
    • Arquivo defeso eleitoral 2022
  • Canais de atendimento
    • Perguntas Frequentes
    • Fale conosco
    • Ouvidoria do Serviço Exterior
    • Imprensa
      • Área de Imprensa
      • Notas à Imprensa
      • Aviso às Redações
      • Credenciamento de profissionais de imprensa
      • Assessoria Especial de Comunicação Social
      • Contatos para imprensa
    • Protocolo
    • Encarregado pelo tratamento de dados pessoais
Redefinir Cookies
Acesso àInformação
Todo o conteúdo deste site está publicado sob a licença Creative Commons Atribuição-SemDerivações 3.0 Não Adaptada.
Voltar ao topo da página
Fale Agora Refazer a busca