Notícias
ESTATAIS
Gestão reúne governo, estatais e academia em oficina sobre desafios e estratégias para o desenvolvimento sustentável e soberano
Workshop ocorreu na manhã desta quinta-feira (23/10) na sede da Enap. Na imagem, a pesquisadora Léa Vidigal, o secretário-adjunto da Sest/MGI, Pedro Cavalcante e o secretário da Sete/MGI, Francisco Gaetani. Foto: André Corrêa
Com participação de lideranças do setor público, academia e convidados, o Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos (MGI) realizou, nesta quinta-feira (23/10), o 1º Workshop Estatais Brasileiras na sede da Escola Nacional de Administração Pública (Enap), em Brasília.
Com o tema “Instrumentos Estratégicos para o Desenvolvimento Sustentável”, o evento se insere em projeto da Secretaria de Coordenação e Governança de Empresas Estatais (Sest/MGI) que inclui ainda workshops em São Paulo e no Rio de Janeiro, compartilhamento de experiências e, ao final, elaboração de documento que deverá orientar decisões estratégicas futuras.
Durante a abertura, os participantes enfatizaram a necessidade de maior integração e planejamento entre as empresas públicas para ampliar efetividade e impactos de suas ações na economia e na sociedade.
Pedro Cavalcante, secretário-adjunto da Sest, abriu o encontro salientando o esforço iniciado em 2023 para reverter a lógica de liquidação do patrimônio público. “A meta do MGI é apoiar o aperfeiçoamento das empresas para que cada uma desempenhe melhor sua missão pública. Sustentabilidade e inovação são premissas que nos guiam para que as estatais atuem em prol de um desenvolvimento inclusivo e perene”.
O secretário extraordinário para Transformação do Estado da pasta da Gestão, Francisco Gaetani, destacou o longo processo de construção da burocracia profissional brasileira, no qual as estatais sempre estiveram à frente com seus quadros qualificados, e a crise de legitimidade do Estado.
“O Estado hoje enfrenta riscos existenciais e precisa renovar continuamente o mandato das estatais junto à sociedade. Esse é um momento decisivo para a gestão das estatais dar um salto e desinterditar o debate sobre a função dessas empresas”.

A pesquisadora e especialista em Direito Econômico Léa Vidigal citou o Relatório Agregado das Empresas Estatais Federais – ano base 2024, segundo o qual o conjunto das estatais federais apresentou ativos de R$ 6,7 trilhões e compôs 5,3% do PIB nacional. “O projeto que se inicia hoje busca criar um olhar qualificado sobre a missão de cada empresa, com base no planejamento de mercados, na soberania econômica e na transformação ecológica integrada à tecnologia”, esclareceu. Ela contextualizou que “na China, há mais de 100 mil estatais; nos Estados Unidos, apenas o estado de Nova York conta com mais de 600 ‘public authorities’ em todos os setores da economia. No Brasil, são 123, contando subsidiárias”.
Nesse contexto, defendeu que a atividade empresarial do Estado promove setores importantes e que, ao olhar para esses países, “não podemos tomar o discurso como método, mas a prática como exemplo e atender às necessidades do país”, complementou Léa.
Oficina 1 – Inovação e Mercados Estratégicos
Após a abertura, foi dado início à Oficina 1, intitulada “Estatais, Inovação e Mercados Estratégicos”. A sessão foi moderada pelo economista Paulo Gala, professor na Fundação Getúlio Vargas, em São Paulo. O pesquisador ressaltou que as empresas estatais são parte inseparável da história econômica do país.

Para ele, sem uma missão pública clara “uma estatal não tem nem razão para existir, pois elas devem atuar onde o mercado não pode ou não consegue.” Ele definiu o relatório agregado das estatais como “o balanço mais poderoso da economia brasileira”.
Em seguida, falou Uallace Lima, secretário de Desenvolvimento Industrial, Inovação, Comércio e Serviços do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços (MDIC). Ele enfatizou a reconstrução do poder de atuação do BNDES, banco de desenvolvimento vinculado ao MDIC, e o lançamento da Nova Indústria Brasil (NIB) em janeiro de 2024.
“Quando foi lançada, a NIB foi muito questionada por conter medidas de política de conteúdo industrial nacional”, recordou. E ponderou que, na verdade, essas políticas estão sendo fortalecidas no mundo todo: “na ocasião, o Fundo Monetário Internacional publicou estudo mostrando que Estados Unidos, Europa e China concentravam 73% das políticas de indústria nacional”.
Alessandro Octaviani, professor da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, colocou as estatais como componentes fundamentais nas economias capitalistas atuais e futuras. Ele destacou que o Brasil dispõe de um potencial pouco explorado no que tange ao papel constitucional das estatais.
“O tamanho da potência normativa conferido às estatais deriva da Constituição” citando os artigos 219 e 174, que definem o mercado interno como patrimônio nacional e instrumento para autonomia tecnológica e o planejamento econômico estatal como mandatório ao setor público e indicativo ao privado.
Concluiu com a ideia de que o Brasil deve “jogar o jogo que se joga hoje no mundo”, pois, nos últimos 10 anos, a produção normativa sobre o tema nas 20 principais economias tem focado no que definiu como “segurança econômica nacional”. Seu projeto de pesquisa com alunos de pós-graduação identificou que os países vêm protegendo e estimulando, cada vez mais, setores como energia, alimentação e infraestrutura, típicos da ação estatal.

- Representante do BNDES fala durante a oficina realizada durante a manhã de quinta-feira, na sede da Enap. Foto: André Corrêa
A assessora da presidência do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Marília Marcato, por sua vez, citou inovações financeiras desenvolvidas pelo banco como a Letra de Crédito de Desenvolvimento (LCD), que auxilia na captação de recursos. E alertou para “a armadilha tecnológica que países de renda média global, como o Brasil, enfrentam ao se verem presos a um modelo de produção com baixo conteúdo tecnológico” do qual só conseguem sair com fortes investimentos de longo prazo.
Por fim, falou Igor Ferreira Bueno, diretor do Departamento do Complexo Industrial e Inovação em Saúda, do Ministério da Saúde. Para ele, o complexo industrial de saúde é o caminho para construir a soberania produtiva e garantir o acesso universal à saúde.
“É preciso superar a dependência externa em serviços de saúde, a Covid-19 deixou isso bem escancarado”, defendeu. Mencionou a estatal Hemobrás, que confere ao país autonomia de produção de medicamentos hemoderivados, e a crise de produção de insulina no mundo: “O Brasil domina a tecnologia e tem certa proteção. Não teríamos isso sem a ação estatal”.

A primeira oficina foi concluída com uma sessão dedicada a contribuições e ao debate entre o público presente. O 1º Workshop Estatais Brasileiras continuou pela parte da tarde com a Oficina 2 – Transformação Ecológica e o papel das Estatais na Agenda Climática, dando seguimento aos resultados do Encontro Global sobre Empresas Estatais e Ação Climática, evento pré-COP realizado pelo MGI em 15/10, no Rio.
Sobre o evento

Promovido pela Secretaria de Coordenação e Governança da Empresas Estatais (Sest/MGI), o 1º Workshop Empresas Estatais Brasileiras: Instrumentos Estratégicos para o Desenvolvimento Sustentável conta com o apoio da Enap, da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (Flacso) e da Open Society Foundations (OSF).
O evento marcou o início de um ciclo de encontros que buscará, nos próximos meses, ampliar e aprofundar o diálogo entre órgãos de governo, empresas públicas, academia e sociedade sobre o papel das estatais na execução das políticas de desenvolvimento nacional.
A iniciativa do Ministério da Gestão e da Inovação em Serviços Públicos representa um esforço coordenado para discutir fundamentos constitucionais, econômicos e institucionais que justificam a presença das estatais em setores estratégicos. A expectativa é que, a partir das contribuições obtidas, sejam elaboradas diretrizes e insumos normativos capazes de fortalecer as empresas públicas como instrumentos eficientes para enfrentar os desafios atuais do desenvolvimento brasileiro.