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Discurso na Assembléia Nacional - Paramaribo, Suriname - 2 de março de 1989
Sinto-me feliz e honrado por esta oportunidade de me dirigir aos ilustres representantes do povo do Suriname. Em 1956, assumia eu, pela primeira vez, uma cadeira no Congresso Nacional. Desde então, só em duas ocasiões afastei-me do exercício da atividade parlamentar — quando eleito para governar meu Estado natal e, nestes últimos quatro anos, como Chefe do Executivo brasileiro. Sou parlamentar por vocação. Ao Legislativo dediquei grande parte de minha vida pública. Foi minha melhor escola. É onde estão minhas raízes.
Minha presença nesta Casa constitui oportunidade propícia para partilhar, com Vossas Excelências, a rica experiência democrática que vive o Suriname. A consolidação da democracia pressupõe a aceitação do pluralismo e a busca do consenso. Exige paciência, humildade, tolerância, mas também determinação, na procura incessante de equilíbrios que são tênues, na composição de interesses quase sempre conflitantes, na superação diária de divergências. Os resultados têm sido compensadores. Há pouco menos de dois anos, em 30 de setembro de 1987, irmanada em torno de um projeto comum, a nação surinamesa referendava a Constituição da República. Estavam assentados os pilares do Estado democrático. O regime pluralista e representativo forneceu o embasamento político para que o país voltasse seus esforços para a conquista do desenvolvimento econômico e do bem-estar social. O processo de transição, que a História mostra ser freqüentemente traumático, transcorreu em paz no Suriname, o que só engrandece e dignifica o povo deste país. Senhor Presidente, Senhores Membros da Assembléia Nacional. Trago-lhes a mensagem fraterna de apoio e de admiração do povo brasileiro, pela valiosa lição de luta da gente e do Governo deste país, em prol da liberdade, dos valores democráticos, da plena inserção do Suriname na comunidade internacional, como país sul-americano, como parte da família de nações latino-americanas. A Constituição brasileira, promulgada em outubro último, reflete a firme determinação dos brasileiros de realizar, pela prática da democracia, a grande aspiração nacional de construção de uma sociedade igualitária, cada vez mais justa, livre, pluralista e fraterna, em íntima comunhão com seus vizinhos. Nossa Constituição consagra, como um dos objetivos fundamentais da política externa do Brasil, a integração latino-americana.
Acreditamos que o desenvolvimento econômico e social só poderá ser plenamente atingido pelos países da região, se unirmos nossas vontades, se somarmos nossos esforços. O caminho da prosperidade tem de ser trilhado em conjunto. Na integração regional está a alternativa para superação das imensas dificuldades que nos são impostas pela conjuntura econômica internacional. Ao fortalecermos nossa cooperação bilateral, estaremos dando um grande passo na direção da integração latino-americana. Minha visita ao Suriname tem justamente esse objetivo: o de impulsionar o nosso relacionamento, buscando elevá-lo a patamares cada vez mais condizentes com as suas potencialidades. Múltiplos são os elementos comuns a nossos dois países, que fornecem alicerces sólidos para o estabelecimento de uma cooperação profícua e duradoura. Prezamos as instituições democráticas que conquistamos; queremos crescer em paz e com estabilidade; defenpemos a solidariedade continental e latino-americana, assim como os princípios da boa vizinhança; partilhamos visões convergentes sobre grandes temas da atualidade internacional; temos, na integração, um de nossos objetivos prioritários. Temos sabido identificar, num trabalho persistente, formas eficazes de nos auxiliarmos mutuamente. De progredirmos juntos. Com imaginação e realismo, seguiremos aperfeiçoando novas modalidades de cooperação. Encontraremos os meios de superar as limitações que nos impõem o protecionismo dos parceiros comerciais mais fortes, o tratamento iníquo da questão da dívida externa, as tentativas de monopólio do conhecimento científico e tecnológico. Espero com minha visita contribuir para dar dimensão nova, mais abrangente e profunda, ao processo de entendimento entre nossos países. Vamos intensificar nosso diálogo político e ampliar o conhecimento de nossas realidade.
São notáveis as semelhanças étnicas de nossa gente. Nossas raízes africanas, ameríndias, européias, entrelaçamse com as imigrações do Oriente. Fazem, da pluralidade de raças, mais um ponto de identificação. Enfrentamos, em conjunto, o desafio dos grandes espaços amazônicos, o qual exige a intensificação da cooperação mútua e regional. Esforçamo-nos por ampliar o acervo de tecnologias próprias, mediante o intercâmbio e a cooperação. Nossa realidade geográfica estimula o livre fluxo de informações sobre tecnologias que dificilmente estarão disponíveis em outros climas, em outros quadrantes. Pouco a pouco, estabelecemos vínculos culturais que farão florescer iniciativas comuns, certamente enriquecedoras em meio à nossa diversidade lingüística, de costumes, de formação. Noto com satisfação que o ensino da língua portuguesa já desperta grande interesse em Paramaribo e que programas da televisão brasileira têm tido boa aceitação. Fiel aos princípios da não-ingerência em assuntos internos de outros países, da autodeterminação dos povos, da solução pacífica das controvérsias, o Brasil tem, no relacionamento com os países do Continente, uma das mais altas prioridades de sua política externa. Ê nossa permanente preocupação formular linhas de atuação que sejam positivas para o Brasil e para cada um de nossos vizinhos. Somos, portanto, sensíveis às dificuldades políticas e econômicas por que tem passado o Suriname, e estamos firmemente imbuídos da vontade de examinar, em conjunto, as melhores formas de cooperação. Vamos projetar um futuro comum, com a estabilidade que todos desejamos e a que têm direito nossos povos. A clareza e a nitidez desse processo de cooperação são fruto do diálogo aberto, franco, que passa pelo Executivo, e tem suas bases bem assentadas nos Poderes Legislativos de cada um de nossos países. A força e a legitimidade da cooperação bilateral, do estreitamento de nossos vínculos, decorrem justamente deste debate público, dos contatos entre nossos Governos, nossos legisladores, nossa gente. Na visita que ora faço a esta Casa, cumpro o alto e honroso dever de homenagear o povo surinamense, aqui representado por Vossas Excelências, selando, dessa forma, as raízes duradouras de nossa amizade. Ao renovar-lhes, pois, a homenagem do povo e do Governo do Brasil, trago-lhes também os nossos votos pela crescente paz e prosperidade do Suriname.
(Texto reproduzido em conformidade com o acordo ortográfico vigente à época de sua publicação original)