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Discurso em jantar oferecido pelo Presidente da Guiana - Georgetown, Guiana - 3 de março de 1989
ALgradeç , o sensibilizado, as palavras calorosas que acaba de dirigir-me Vossa Excelência. Considero-as um tributo à amizade que irmana nossos dois povos. Muito me orgulha ser o primeiro Presidente brasileiro a visitar a República Cooperativista da Guiana. Vossa Excelência é um estadista de renome, que conduz os destinos de seu país com firmeza e descortino. A carinhosa acolhida que vem sendo dispensada a minha mulher, a mim e aos membros de minha comitiva, pela qual somos extremamente reconhecidos, constitui demonstração a mais da tradicional hospitalidade do povo guianense. As histórias do Brasil e da Guiana seguiram cursos diversos. Fomos colonizados por potências européias diferentes. Conquistamos nossa independência em épocas distintas. Não são as mesmas as origens de nossos idiomas.
Mas as semelhanças entre nossos dois países, as forças que os aproximam são muito mais intensas que as diferenças que marcaram nosso passado. Guiana e Brasil têm a uni-los a geografia, diversos componentes étnicos comuns, o apego aos valores democráticos, o patrimônio amazônico, a luta por um futuro de prosperidade. Queremos, ambos os países, participar plena e ativamente da construção de uma ordem internacional mais justa e equitativa, em que todos os povos possam usufruir dos benefícios do progresso e onde o bem-estar não seja privilégio de uns poucos. Estamos irmanados na luta pela superação das dificuldades prevalecentes no cenário internacional. Infelizmente, os avanços que se têm verificado no cenário político, com a retomada do diálogo entre as superpotências, com o encaminhamento de soluções para alguns conflitos regionais e a tendência para a revalorização das instâncias multilaterais, ainda não encontraram correspondência no aprimoramento das relações econômicas internacionais.
Continuamos defrontados com uma conjuntura desfavorável. O protecionismo comercial inibe nossas exportações, os monopólios das tecnologias de ponta tolhem a competitividade de nossas indústrias, o peso insuportável da dívida externa limita nossa capacidade de investimento, frustra as legítimas expectativas de crescimento econômico e de progresso social de nossos povos. Os países latino-americanos enfrentam uma crise sem precedentes. O produto interno per capita da América Latina está, há dez anos, estagnado nos mesmos níveis. Numa inversão injusta e ilógica, vemo-nos hoje transformados em exportadores líquidos de capitais. As transferências de recursos dos países da região, nos últimos sete anos, somaram 180 bilhões de dólares. Os créditos e investimentos na América Latina, em 1988, não ultrapassaram 4 bilhões de dólares. No mesmo período, a região transferia 29 bilhões de dólares para o exterior. São números preocupantes. Os países mais pobres não podem seguir financiando os mais ricos. Esta é uma situação que não pode perdurar. Temos adotado, por nosso lado, políticas austeras de ajustamento, com alto custo social. Com ânimo cons.trutivo, tem o Brasil oferecido alternativas para a solução do problema da dívida externa.
Esperamos que nossos interlocutores se dêem conta da amplitude do problema e se disponham a considerá-lo não apenas em suas dimensões econômico-financeiras, mas sobretudo em seus aspectos políticos, cuja gravidade não pode ser minimizada. Não tenho dúvida de que o caminho para construção do progresso, da estabilidade e da consolidação da democracia na América Latina passa, necessariamente, pela solução do problema da dívida externa. É uma questão que tem de ser resolvida levando em consideração as legítimas aspirações de desenvolvimento econômico e social dos devedores. É preciso que nossos países voltem a ter condições de crescer.
Aprendemos, países em desenvolvimento, nesses últimos anos, que devemos contar essencialmente com nosso próprio esforço. Temos que, juntos, construir nosso futuro. Num mundo que caminha célere para a economia dos conjuntos, os países da região têm que estar solidários. Meu País sempre atribuiu importância fundamental à dimensão latino-americana de sua política externa, às relações com todos os nossos vizinhos. Elevamos a integração regional à categoria de imperativo constitucional. O Brasil participa ativamente de um amplo espectro de iniciativas em prol do entendimento entre os países da região. Somos membros fundadores do Grupo dos Oito mecanismo de concertação de características inéditas na diplomacia latino-americana. Como membros do Grupo de Apoio a Contadora, estamos prontos a dar nossa contribuição à solução negociada da crise centro-americana. Temos participado ativamente dos esforços de integração desenvolvidos pela Associação Latino-Americana de Integração.
Emprestamos, junto com a Guiana, respaldo ao Sistema Econômico Latino-americano. No plano sub-regional, somos ambos países signatários do tratado de Cooperação Amazônica. Contribuímos para a elaboração e execução de políticas conjuntas, em benefício da utilização racional do patrimônio amazônico, por cuja preservação somos responsáveis. A Guiana acumulou, não obstante seu relativamente curto período de vida independente, invejável tradição de pluralismo, entendimento e de cooperação, tendo tido participação particularmente atuante no Movimento NãoAlinhado. Buscamos ambos, corn os países vizinhos, estabelecer modalidades objetivas e profícuas de colaboração. Sabemos que a integração regional constitui uma via essencial para enfrentarmos os desafios ao desenvolvimento. Sabemos também que a integração passa pela cooperação bilateral.
Senhor Presidente, Em setembro último, nossos Ministros das Relações Exteriores assinavam, nesta acolhedora Capital, o Programa de Trabalho de Georgetown. Trata-se de um instrumento extremamente útil, de amplo alcance, que baliza a cooperação bilateral, nos seus mais variados aspectos. Cabe-nos agora imprimir impulso renovado à consecução dos propósitos do Programa de Georgetown e estabelecer condições ainda mais propícias à execução de Projetos/conjuntos. As ações que nossos países já vêm empreendendo em benefício mútuo, nas áreas de saúde, agricultura, energia, educação, comércio, finanças, transportes, constituem um patrimônio valioso que devemos preservar e aprimorar. Novos campos estão sendo explorados. Técnicos brasileiros e guianenses examinam fórmulas que permitam ao Brasil contribuir para a solução de problemas que a Guiana enfrenta no setor de energia elétrica. Contatos e programas estão sendo estabelecidos entre instituições de nossos dois países para, em conjunto, atuarmos na área da produção agrícola. Tem sido mutuamente proveitosa a colaboração prestada por empresas brasileiras no campo da extração mineral.
Continuamos, no Brasil, a buscar fórmulas que estimulem o desenvolvimento do comércio bilateral. Dentro de nossas disponibilidades de recursos, examinamos as necessidades guianenses de financiamentos que permitam a importação de produtos brasileiros. Muito significativo é o reinicio da operação de linha aérea direta entre cidades brasileiras e Georgetown, numa iniciativa que, certamente, contribuirá para estreitar ainda mais os vínculos entre os povos guianense e brasileiro. É promissor o universo da cooperação bilateral. Muito ainda há a fazer. Os alicerces, porém, estão assentados. Estou certo de que nossas conversações, durante esta visita, darão novo alento ao trabalho que vem sendo desenvolvido. Espero poder, em breve, retribuir a generosa acolhida que aqui recebi. A visita de Vossa Excelência ao Brasil muito honrará a mim e a meu País. É nesse espírito que convido todos a comigo erguerem suas taças pela saúde de Vossa Excelência e da Senhora Hoyte, pelo progresso e bem-estar do povo guianense e pelo fraterno entendimento que preside as relações entre brasileiros e guianenses.
(Texto reproduzido em conformidade com o acordo ortográfico vigente à época de sua publicação original)