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Discurso na Sessão de Abertura da Reunião de Cúpula do Grupo do Rio - Rio de Janeiro, 9 de setembro de 1994
É com imenso prazer que lhes dou as boas-vindas ao VIII Encontro Presidencial, nesta cidade do Rio de Janeiro, que emprestou seu nome ao Mecanismo Permanente de Consulta e Concertação Política. Em nome do povo brasileiro, formulo a todos votos de feliz estada.
Quero dirigir uma saudação especial aos Presidentes Samper, da Colômbia; León Carpio, da Guatemala; Perez Balladares, do Panamá; Caldera, da Venezuela, e ao Primeiro-Ministro Manning, de Trinidad e Tobago, que pela primeira vez participam de nosso Grupo. Esta renovação é sinal concreto da vigência da democracia em nossa região. À gentileza da presença de tão ilustres visitantes, o Rio de Janeiro retribui com o que tem de melhor: a beleza de sua natureza e a hospitalidade de sua gente. Tenham todos certeza de que aqui estarão entre amigos.
Em dezembro de 1986, criava-se o Mecanismo do Grupo do Rio, que se mantém como a instância mais elevada de consulta entre os países da América Latina e do Caribe, na esteira da bem-sucedida experiência em favor da paz na América Central.
Passados oito anos, o acervo político do Grupo é importante. A democracia é nosso maior patrimônio. A confiança entre nossos países tornou-se cada vez mais sólida. Damos expressão unívoca ao pensamento político da nossa região e promovemos a ação conjunta em defesa de interesses comuns. Países individuais e grupos de países demonstram interesse em dialogar conosco. Representamos mercados emergentes, cujos atrativos são cada vez mais reconhecidos.
O Presidente Aylwin, anfitrião do nosso Encontro precedente, foi feliz ao expressar que vivemos um momento de esperança. É também a hora de afirmar a capacidade de realização dos povos latino-americanos e caribenhos, e, sobretudo, a confiança no futuro.
A realização material de nossas potencialidades só terá sentido se forem respeitados os princípios básicos do Direito Internacional. A bipolaridade política e ideológica impedia a plena realização do ideal de democracia mundial.
Impõe-se lograr uma ordem internacional que garanta e proteja os direitos de todas as Nações, desenvolvidas e em desenvolvimento, pequenas e grandes contra atos ilícitos e abusos de poder. O Grupo do Rio há de se colocar na vanguarda dessa grande tarefa.
A maturidade de nossa atuação externa projeta-se nas Nações Unidas, em cujos debates inclui-se a questão da ampliação do Conselho de Segurança. A atuação solidária da América Latina e do Caribe é fundamental para garantir que a região se faça representar naquele foro em condições de igualdade com outras no contexto de uma nova ordem internacional em formação.
Senhores Chefes de Estado e de Governo,
Acompanhamos com preocupação o recrudescimento das tensões acumuladas no relacionamento de Cuba com os Estados Unidos da América. É nossa esperança que essas dificuldades possam ser resolvidas por meio do diálogo.
O Grupo do Rio saberá contribuir, com amizade e sentido construtivo, para a gradual reinserção de Cuba no convívio regional. O progresso das reformas econômicas e o avanço das aberturas políticas são responsabilidade do povo cubano. Tal processo deve ser apoiado por uma política de mão estendida. Nada se ganhará com o continuado isolamento político e econômico daquele País.
Devemos procurar favorecer, em seu quadro adequado, a solução da crise do Haiti. Condenamos a atitude dilatória das autoridades «de facto» naquele País, cuja intransigência ameaça prolongar a situação de impasse e agravar o sofrimento da população haitiana. Há que conduzir-se esforço político e diplomático que leve aquelas autoridade a responderem sem demora ao chamado da comunidade internacional, abrindo caminho para a restauração do Governo legítimo do Haiti.
Constituímos a área menos armada do mundo, de fato a única área povoada completamente livre de armas nucleares. Saudamos o anúncio da adesão de Cuba ao Tratado de Proscrição de América Latina e no Caribe. Conquistamos o direito de estar na vanguarda do movimento internacional em prol da completa eliminação das armas de destruição em massa, em todos os Continentes.
Como contrapartida, exigimos que nossos parceiros desenvolvidos assegurem-nos a possibilidade de aquisição da tecnologia necessária ao bem-estar de nossos povos. Só antiquados ressaibos de dominação podem explicar as dificuldades que ainda enfrentamos para adquirir os meios tecnológicos de que carecem nossas economias.
Senhores,
A nossa região embarcou em vigoroso programa de reformas econômicas, implementando com coragem e determinação. O êxito dos programas de ajuste macroeconômico na região muito depende de condições externas que concorram para a estabilidade e a continuidade do processo. Esta mensagem precisa ser transmitida, com muita clareza, aos países desenvolvidos.
Nesse contexto, é oportuna a iniciativa do Presidente Clinton de convocar uma Cúpula das Américas. Sem dúvida, é hora de imprimir sentido positivo às relações hemisféricas e de lhes dar nova direção, depurada das injunções da Guerra Fria.
A Cúpula das Américas poderá marcar a partida para uma nova fase da vida hemisférica, em que se associem realismo e solidariedade. A cooperação é o melhor atalho para a ampliação da riqueza regional.
Nossa região quer parceria na construção do futuro do hemisfério. Seremos parceiros na luta contra a corrupção e o crime organizado, e na administração da justiça; no combate ao narcotráfico e na criação de condições de bem-estar para os nossos filhos, e para os filhos de nossos filhos; na tecnologia e no comércio, e contra a discriminação. Parceiros, enfim, no resgate da cidadania, em todo o hemisfério.
O desenvolvimento solidário das Nações , neste mundo interdependente, é a forma lógica de reduzir os desequilíbrios que se evidenciam, por exemplo, nos fluxos crescentes de migrantes e refugiados.
A América Latina e o Caribe desejam a cooperação e não o assistencialismo. O regionalismo aberto contribui para reforçar o ideal do livre comércio. Adquirimos autoridade para reclamar a eliminação de práticas arbitrárias unilaterais.
O Grupo do Rio deve atuar como construtor de consensos. Esse papel há de ser nossa contribuição à consolidação de uma verdadeira ordem regional e mundial alicerçada na liberdade econômica, na justiça social e na democracia.
Há dois anos, nesta mesma cidade, firmou-se a consciência de que o encaminhamento dos temas ambientais deve englobar soluções para o problema da pobreza. Urge acelerar a implementação dos compromissos por todos assumidos na Conferência do Rio.
Senhores,
O êxito do processo de integração sub-regional abrirá caminho para a crescente ampliação dos espaços econômicos. A prioridade que o Brasil atribui ao Mercosul não é excludente. Consideramos que os arranjos regionais de comércio devem contribuir para a expansão global dos fluxos comerciais, de investimentos e de tecnologia.
Esta visão levou-me a propor, em nossa última Cúpula Presidencial em Santiago do Chile, a criação da Área de Livre Comércio Sul-Americana, a ser implementada, de forma flexível, mediante um conjunto de acordos de livre comércio articulados entre si e amparados pelo Tratado de Montevidéu. Estão avançadas as negociações com países vizinhos. Chile e Bolívia já discutem sua associação ao Mercosul. A ALCSA também facilitará o estabelecimento de bases sólidas para a convergência futura das diferentes iniciativas de integração econômica.
Nenhuma sociedade sobrevive sem a visão do futuro. O tesouro mais bem cuidado de nossa região é a tradição de respeito mútuo, de diálogo, de soluções consensuais. O Grupo do Rio apresenta-se como instrumento privilegiado para fortalecer esse acervo e enriquecê-lo como contribuição para nossos povos e para a paz mundial.
Muito obrigado.