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Protagonista na história da mineração, população negra ainda enfrenta desafios por maior participação e equilíbrio na distribuição de recursos
A atividade minerária ganhou força no Brasil a partir do século XVI, principalmente em Minas Gerais, Goiás, Mato Grosso e São Paulo, com a exploração de ouro. Trabalhadores escravizados foram trazidos ao país por dominarem técnicas utilizadas na extração e no beneficiamento dos minérios, conhecimento que foi decisivo para o desenvolvimento econômico da colônia. Hoje, o setor mineral representa entre 4% e 5% do PIB brasileiro.
Apesar da luta e do protagonismo histórico, esse conhecimento técnico não se converteu em benefícios proporcionais para a população negra. Pretos e pardos são mais de 56% da sociedade brasileira, mas, entre 2012 e 2023, a renda do trabalho principal dessas pessoas correspondeu, em média, a apenas 58,3% da renda da população branca, segundo levantamento do Centro de Estudos e Dados sobre Desigualdades Raciais (Cedra).
A desigualdade também aparece nos espaços de decisão. De acordo com a Pnad/IBGE, pessoas negras, embora sejam maioria da população (56,5%), ocupavam apenas 33,7% dos cargos gerenciais em 2023. O cenário se repete na mineração, onde a representatividade de pretos e pardos em posições de liderança permanece baixa.

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Na Agência Nacional de Mineração (ANM), o desafio é reconhecido. A instituição hoje conta com mais de 40% de profissionais negros. Entre eles está o desenhista Alencar Moreira Barreto, que ingressou no órgão em 1984 e acompanhou parte das transformações da autarquia. Ele destaca que, apesar de avanços recentes, a presença de pessoas negras em cargos de poder no setor público ainda é pequena.
“Isso acontece devido às desigualdades no mercado de trabalho e às dificuldades de acesso às boas instituições de ensino”, afirma. Para ele, a valorização da cultura afro-brasileira e o enfrentamento ao racismo estrutural são desafios permanentes.
A busca por diversidade também marcou o último concurso da ANM, realizado em 2025. Voltado principalmente para áreas técnicas, o processo resultou na nomeação de cerca de 20% de candidatos pretos e pardos.

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Entre os novos servidores está a geóloga Gleice dos Santos Reis, cuja relação com a mineração começou aos 12 anos. “Sempre fui curiosa e apaixonada por compreender minerais, vulcões e rochas. A ciência sempre me chamou”, conta. Ela relata que, ao longo da formação acadêmica, muitas vezes era a única mulher negra nos ambientes de estudo, realidade que se intensificou ao ingressar no mercado de trabalho.
“Ser negra e mulher em uma área predominantemente masculina e branca exigiu de mim força e resiliência. Precisei provar constantemente que poderia ser tão boa quanto qualquer outro profissional”, afirma. Para ela, apesar dos avanços, ainda há grande espaço a ser conquistado. “É importante lembrar que o Brasil colônia só conseguiu enviar grandes riquezas minerais à Europa graças ao conhecimento dos nossos antepassados africanos”, ressalta.
Além das ações internas, a ANM participa de mesas de diálogo e grupos de trabalho interministeriais voltados à agenda da diversidade. “O Brasil é plural, e essa multiplicidade deve ser refletida no serviço público e na mineração como um todo”, afirma o diretor-geral da agência, Mauro Sousa.
Para o coletivo Quantos — instituição dedicada a impulsionar profissionais negros da mineração a cargos de liderança — é fundamental que as empresas adotem medidas concretas para enfrentar a desigualdade no setor.
“As empresas precisam sair do discurso e investir em ações estruturantes, como políticas claras de avanço de carreira”, afirma a presidente do Quantos, Camila Silva Chaves.

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Iris Vasconcellos Guimarães — ASCOM da Agência Nacional de Mineração