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PRÊMIO CAPES DE TESE
Tese analisa a ‘vida literária’ de autores negros brasileiros

- Vagner Amaro venceu o Prêmio CAPES de Tese 2024 na área de Linguística e Literatura (Foto: Arquivo pessoal)
“O ato de fazer literatura é uma forma de afirmação da vida”. A frase é de Vagner Amaro, doutor em Letras pela Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio). Escritor e editor, ele se debruçou por quase meio século da literatura brasileira para demonstrar o quanto o racismo impôs (e impõe) entraves aos autores negros e como as obras são símbolos de resistência. O trabalho Vidas negras, vidas literárias (1978-2020): escritoras negras e escritores negros na literatura brasileira contemporânea rendeu ao pesquisador o Prêmio CAPES de Tese 2024 na área de Linguística e Literatura.
Fale da sua trajetória acadêmica, da graduação ao doutorado.
A minha primeira graduação foi em Biblioteconomia, pela Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro (Unirio). Depois, cursei Comunicação Social, com habilitação em Jornalismo, pela Estácio. No mesmo período, fiz uma especialização em Gestão da Cultura, também pela Estácio. Dez anos depois, fiz o mestrado em Biblioteconomia, pela Unirio e, em seguida, o doutorado em Letras (Literatura, Cultura e Contemporaneidades) pela PUC-Rio.
Sobre o que é a sua pesquisa? Explique de forma mais detalhada o conteúdo da sua tese.
A minha tese é sobre a aplicação de um modelo de descrição da vida literária utilizado por Brito Broca no livro A vida literária no Brasil 1900 para abordar a vida literária de escritores negros na contemporaneidade, com um recorte temporal de 1978 a 2020. Estabeleço um conceito para vida literária como método de descrição e para a literatura negra brasileira, confluindo as noções de literatura afro-brasileira e literatura negro-brasileira. Ao abordar a vida de escritores negros, faço uma reflexão sobre como essas vidas estão vulneráveis à morte, pela ação do racismo e de uma necropolítica. Por fim, realizo uma análise de um repertório da literatura negra brasileira que apresenta uma recorrência de denúncia da vulnerabilidade à morte da população negra e de reivindicação do direito à vida, apontando que o ato de fazer literatura é uma forma de afirmação da vida.
O que destacaria de mais relevante na sua pesquisa?
Destaco que em diversas obras da história da literatura brasileira os movimentos realizados por grupos de escritores negros que começaram a ocorrer no final dos anos 1970 não foram considerados. Minha pesquisa reivindica essa inscrição/inserção e alerta que os instrumentos teóricos utilizados para a apreensão do literário precisam se flexibilizar para considerar uma literatura que, por exemplo, se baseia no protagonismo negro, na ancestralidade africana (seja na linguagem, na perspectiva e até mesmo na estrutura narrativa) e no combate ao racismo. Acredito que a minha pesquisa e outras de pesquisadoras negras, que cito na tese, já começam a fazer essa inscrição, além de proporem outros referenciais teóricos, como o de Escrevivência, elaborado por Conceição Evaristo. Além disso, a pesquisa situa que o fato do racismo matar (de forma física e simbólica), afeta a produção artística do país e a noção que temos de nós mesmos.
A minha pesquisa informa que a literatura que observo, descrevo e analiso, em relação a Geração Cadernos Negros, não é apenas uma literatura produzida por escritores negros. É uma literatura produzida por escritores negros que pensaram categorias estéticas para o seu fazer literário, que realizavam encontros presenciais para discutir literatura e para dar um corpo coeso ao que vinham apresentando. Faço uso do adinkra sankofa para refletir sobre a literatura produzida por escritores negros antes de 1978 e em como as possibilidades de circulação, recepção e apreciação dessas obras foram afetadas pelo racismo, mas também lanço um olhar para o futuro propondo caminhos para quem desejar se empenhar em abordar a vida literária de escritores negros em suas pesquisas. Eu sou um editor e escritor negro que testemunhou e mobilizou uma mudança significativa no cenário da literatura brasileira em relação à presença negra. A minha história e o meu ponto de vista como editor e escritor, portanto, também são conteúdo relevante da pesquisa, no sentido do enriquecimento da descrição da vida literária de escritores negros.
De que forma a sua pesquisa pode contribuir para a sociedade?
De forma direta, a pesquisa promove uma reparação histórica ao descrever a existência de grupos literários como o Palmares, em Porto Alegre, o Negrícia, no Rio de Janeiro, e o Quilomboje, em São Paulo. Essa pesquisa estimula reflexões sobre como a arte está imbricada com questões sociais como, por exemplo, o racismo, não apenas na sua produção, mas também nas suas possibilidades de circulação, recepção e avaliação. Então, acredito que a tese contribui ao oferecer possibilidades de descrever uma “paisagem da vida literária”, fazendo uso de uma expressão de Brito Broca. Creio, ainda, que a tese contribui para uma apreensão mais profunda, mais crítica, menos desigual e mais democrática da paisagem da vida literária brasileira.
Qual a importância para você de sua tese ter sido escolhida a melhor na área?
O prêmio é mais uma etapa da legitimação e instiga pesquisadores para a leitura da tese e do livro que é fruto da tese, Vidas negras, vidas literárias (1978-2020): escritoras negras e escritores negros na literatura brasileira contemporânea. Comunica positivamente sobre o meu trabalho intelectual, sobre a competência do meu orientador e sobre a qualidade do Programa de Pós-Graduação em Literatura, Cultura e Contemporaneidade da PUC-Rio.
Foi bolsista da CAPES? Se sim, de que forma a bolsa contribui para sua formação?
Sem a bolsa eu não teria condições de ter cursado o doutorado.
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) é um órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
(Brasília – Redação CGCOM/CAPES)
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