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Secretária da Reparação de Salvador é bolsista da CAPES

- Imagem: Isaura Genoveva é secretária da Reparação de Salvador e bolsista CAPES no mestrado em Direito (Bruno Concha/Prefeitura de Salvador)
A secretária municipal da Reparação de Salvador (BA), Isaura Genoveva, é bolsista da CAPES/MEC. A gestora e pesquisadora é graduada em Direito pela Universidade Católica do Salvador (UCSal), especialista em Políticas Públicas em Gênero e Raça pela Universidade Federal da Bahia (UFBA). Agora, é mestranda em Direito pela UCSal, com um período sanduíche na Universidade de Coimbra, em Portugal.
Fale sobre o seu trabalho de mestrado.
Minha dissertação aborda o processo de tombamento do Ilê Axé Iyá Nassô Oká – Terreiro da Casa Branca, considerado o primeiro templo religioso de matriz africana no Brasil e primeiro monumento negro tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). A proposta é analisar os efeitos do racismo, já que bens afro-brasileiros só foram considerados patrimônio nas últimas quatro décadas, enquanto bens de arquitetura europeia eram tombados de forma regular sem questionamento da necessidade de sua tutela pelo poder público.
Fale um pouco de sua trajetória.
O medo da violência policial me fez optar pelo curso de Direito após ver uma abordagem policial violenta repelida por uma vizinha que era advogada. Naquele momento, imaginei, ainda adolescente, que se eu fosse advogada poderia também defender minha família da violência policial que assola as comunidades periféricas do país, mas o fato de ser uma mulher negra não me garantia a mesma atuação que a colega que motivou a escolha do curso, e só descobri isto já na universidade, quando passei a enfrentar o racismo também no sistema judicial.
Quando se é negro, não existe um leque de possibilidades que lhe prive das violências do racismo, porém estudar ainda é a melhor ferramenta para fazer enfrentamento ao preconceito. Fui aluna do Projeto Mentes e Portas Abertas do Instituto Cultural Stive Biko, divisor de águas na minha vida em relação ao conhecimento da verdadeira história dos nossos ancestrais e me instruiu politicamente para atuar no enfrentamento ao racismo de forma inteligente.
O seu cargo é secretária municipal da Reparação de Salvador. Fale sobre a sua atuação à frente da pasta e como é dividir o tempo com a pesquisa de pós-graduação.
De fato, é um desafio enorme ser pesquisadora e estar à frente da única Secretaria de Reparação do país, mas, considerando todos os atravessamentos que uma pessoa negra enfrenta na vida, não existe uma distância muito grande entre pesquisar, viver e pensar o racismo brasileiro. Como gestora, porém, é possível estruturar e propor políticas públicas para a comunidade negra soteropolitana.
Salvador é a cidade mais negra fora da África. Qual é a importância de ter uma Secretaria Municipal de Reparação (Semur)?
Salvador é negra em toda sua essência, mas na mesma proporção ainda é extremamente racista. A instituição de uma Secretária da Reparação, fruto das ações do Movimento Negro Unificado há 23 anos, é uma conquista recente para as pessoas negras que sofrem com o racismo há mais de cinco séculos, mas a Semur é um marco histórico de quem reconhece que precisamos reparar algo e não apenas promover igualdade, e isto é que se propõe quando se institui uma secretaria que tem como missão promover a equidade racial, inclusão e valorização da diversidade.
O Brasil é um dos países mais negros fora da África. Precisamos de mais secretarias de Reparação? Por quê?
O sistema de escravização foi um dos maiores atos de violência contra a humanidade e tem seus efeitos continuados até os dias atuais. Ter secretarias de Reparação em todas as instâncias governamentais é o primeiro ato de reconhecimento de que a escravização foi a base da constituição econômica deste país, que lucrou com o trabalho forçado de milhares de africanos.
Qual é a importância da bolsa da CAPES/MEC para a sua atuação na pós-graduação?
O acesso à educação ainda não é acessível a todas as pessoas principalmente as pessoas negras são as que menos estão nas academias. Somos maioria na população, porém minoria nos espaços de decisão e na pós-graduação. Não existe possibilidade de subversão da lógica racista se não por meio da educação.
A bolsa CAPES/MEC foi a política pública que me garantiu continuar pesquisando, estudando e abriu a possibilidade de assumir a Secretaria de Reparação. Foi o reconhecimento da pesquisadora que, no primeiro semestre do mestrado, implementou o Curso de Extensão Incubadora Obirin Mulheres de Axé, para aproximar a academia da comunidade e demonstrar que este espaço também nos cabe e que podemos trazer mudança a vida de mais pessoas. Sem a bolsa CAPES/MEC, não existiria a pesquisadora que estuda Justiça Territorial a partir da vivência do Terreiro Casa Branca, mas que também foi buscar subsídio na mais antiga Faculdade de Direito do mundo (Universidade de Coimbra).
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) é um órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
(Brasília – Redação CGCOM/CAPES)
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