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PRÊMIO CAPES DE TESE
Pesquisa analisa memórias tradicionais em comunidade do Piauí
O trabalho de Sarah Fontenelle Santos, intitulado Comunicação popular e insurgente da Boa Esperança: entre território, memória e histórias de vida em "Lagoas do norte para quem?", venceu o Prêmio CAPES de Tese 2024 na área de Comunicação e Informação. Doutora pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), a pesquisadora investiga como as histórias de vida e memórias tradicionais, como a da comunidade de Boa Esperança, em Teresina-PI, podem ser usadas como ferramenta de luta territorial e comunicação transformadora.
Fale da sua trajetória acadêmica, da graduação ao doutorado.
Minha trajetória acadêmica se desenvolveu no Piauí, meu estado de nascimento. Sou formada em Jornalismo e Relações Públicas pela Universidade Estadual do Piauí (UESPI) e tive a honrosa oportunidade de cursar a especialização Educação do semiárido na perspectiva da educação do campo, também na mesma instituição. Na pós-graduação da Universidade Federal do Piauí (UFPI), realizei a pesquisa intitulada Indústrias culturais, regionalização e mercado: um olhar a partir da TV Meio Norte.
Sobre o que é a sua pesquisa?
A pesquisa se elabora em comunicação e em pesquisa-ação, onde os sujeitos comunitários da comunidade Boa Esperança, Ribeirinhos e Quilombolas, em Teresina-PI, traçam rotas para pensar teorias e metodologias capazes de produzir significados e soluções para o seu tempo. Assim, pensamos, conjuntamente, rotas para uma comunicação e um jornalismo contra-colonial. Chamamos de contra-colonial porque essa proposta vai na contra a colonialidade, que subalterniza os modos de vida, os modos de ser e os modos de produzir conhecimento dos povos da terra. Buscamos, portanto, colocar no lugar uma comunicação em circularidade com a natureza, com os encantados do lugar e com todas as gentes que lutam em defesa do seu direito ao território, contra remoção de suas moradias e pelo direito à uma cidade coletiva, inclusiva e de bem viver.
Na comunidade Boa Esperança, comunidade ribeirinha às margens dos rios Parnaíba e Poty, em suas táticas contra o projeto de cidade desterritorializador chamado Programa Lagoas do Norte, aprendemos que a comunicação e o jornalismo ganham muito quando partem das histórias de vida e das memórias. São essas histórias que guardam as lembranças ancestrais para re-editar a vida, reelaborar a palavra silenciada por séculos de opressão e construir narrativas onde o povo é protagonista.
O que você destacaria de mais relevante na sua pesquisa?
Talvez o que haja de mais relevante nesta pesquisa seja a possibilidade de narrar o presente junto ao povo, tendo-o como protagonista, a partir de suas epistemologias, ontologias, seus modos de ser e de fazer. Ou seja, é relevante Senti-pensar a comunicação desde outros lugares, dando novos rumos e interpretações a ela. Senti-pensar comunicação em espaços-tempos comunitários é reposicionar o locus de enunciação, marcando geopoliticamente quem é a comunidade Boa Esperança dentro do contexto de luta pela cidade, por moradia e por território. É necessário demarcar os espaços-tempos comunitários como lugares de produção epistêmica e comunicacional, e a comuidade Boa Esperança nos revela esse saber/fazer por meio de suas memórias e histórias de vida. Essas histórias se apresentam como táticas em defesa do território, sendo a matéria-prima para elaborar a palavra coletiva e romper o silenciamento.
Qual a importância para você de sua tese ter sido escolhida a melhor na área?
Este prêmio vem carregado com muitos afetos, além de uma grande honra. É o reconhecimento de uma caminhada coletiva, repletade carinho. Sou profundamente grata pelas confluências com a comunidade Boa Esperança, que permitiram à academia acessar um saber ancestral, fundamental para elaborararmos uma comunicação de cura, enraizada na terra. Sou grata também ao encontro com a minha orientadora, sempre atenta e aberta às propostas do trabalho, e ao Programa de Pós-graduação em Estudos da Mídia da Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Este prêmio carrega um peso significativo para a área acadêmica, dando um contorno especial à luta no território e à comunicação que vem das margens.
De que forma a sua pesquisa pode contribuir para a sociedade?
Contribui com a sociedade na medida em que a comunidade Boa Esperança nos apresenta soluções comunitárias para questões do presente nos territórios, tendo suas tecnologias ancestrais como guia para enfrentar os desafios impostos pela colonialidade e pelo sistema-mundo capitalista. A pesquisa contribui para pensarmos em uma comunicação integral, ativa, de bem-viver e em cosmoconvivência, pois se desenha como condição para elaboração da palavra coletiva, que reivindica o direito à moradia e ao território. Essa tese fortalece a comunidade, a pesquisa em comunicação e a academia, pois permite tecer teoricamente na ciência do comum, proposta por Sodré: comunicar, sentir, ouvir e estar sempre atento a todos os ruídos nos movimentos da vida que pulsa na enunciação coletiva e dos ecos de suas vozes.
Foi bolsista da CAPES? Se sim, de que forma a bolsa contribui para sua formação?
Fui bolsista da CAPES desde o mestrado até o doutorado. Sem dúvida, essa é uma porta necessária para que os filhos e filhas da classe trabalhadora possam acessar este lugar de produção de conhecimento e pesquisa, sem o qual eu não teria conseguido desenvolver trabalhos com tanta dedicação, sobretudo no doutorado, cujo processo me exigiu estudar fora do meu estado. Permitir que a classe trabalhadora tenha acesso a suportes como bolsas é permitir que possamos trazer outros fluxos para a academia e outros saberes e modos de fazer para a ciência. É reconhecer que há muito mais a ser dito e reverberado além do que foi encastelado e disciplinado enquanto ciência.
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) é um órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
(Brasília – Redação CGCOM/CAPES)
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