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PRÊMIO CAPES DE TESE
Pesquisa alerta que artigos invalidados continuam sendo citados
Vencedora do Prêmio CAPES de Tese na área de Comunicação, Informação e Museologia, a pesquisadora Karen Isabelle dos Santos d'Amorim (UFPE) apresentou um diagnóstico inédito sobre a saúde da ciência na América Latina com a tese Dinâmica das retratações de artigos científicos na América Latina e implicações na cultura de integridade em pesquisa e governança na Ciência. Ex-bolsista da CAPES, Karen construiu uma trajetória acadêmica singular: graduada em Secretariado Executivo, migrou para a Ciência da Informação e concluiu uma segunda graduação em Biblioteconomia durante o doutorado, que foi realizado em parte na Universidad Carlos III de Madrid, por meio da modalidade sanduíche. A tese revelou que a retratação de artigos — mecanismo para corrigir erros e fraudes — tem falhado na prática: 76% dos trabalhos anulados continuam sendo citados validamente. O estudo oferece subsídios cruciais para que instituições de ensino e de fomento criem barreiras contra a má conduta e o uso de dados invalidados, protegendo a sociedade da desinformação baseada em “falsa ciência”. Os resultados defendem a criação de estratégias de comunicação mais eficazes, que fortaleçam a confiança da sociedade nas instituições de pesquisa.
Sobre o que é a sua pesquisa? Explique o conteúdo da sua tese.
Na minha tese de doutorado, proponho uma abordagem inédita e interdisciplinar para investigar artigos científicos retratados, com foco na América Latina, em uma série histórica de 20 anos. A retratação é a forma mais taxativa de correção da literatura científica, pois invalida formalmente um artigo e busca evitar que informações comprometidas continuem sendo usadas como base para novas pesquisas. A partir da análise de 9,6 mil metadados, minha abordagem permitiu explorar múltiplas dimensões, por meio de 20 indicadores. Identifiquei que 44,8% das retratações decorreram de más condutas, 20,5% de erros editoriais e 16,5% de erros de autoria. Também constatei que os pedidos voluntários de retratação — uma boa prática — ainda são tímidos (17,6%), embora o Brasil se destaque por responder por mais da metade das autorretratações (51,5%). Mostrei ainda que os impactos persistem mesmo após a retratação, o que evidencia a necessidade de estratégias de comunicação mais eficazes para assegurar a confiabilidade do registro científico.
O que vale destacar de mais relevante na sua pesquisa?
O aspecto mais relevante da minha pesquisa é demonstrar que a retratação, embora seja o mecanismo mais taxativo e importante de correção da literatura científica, ainda não cumpre plenamente sua função de invalidação da informação. Defendo a tese de que existe uma desconexão entre a retratação formal de um artigo e a efetiva correção de seus efeitos, já que os resultados evidenciam a persistência de citações e menções a artigos retratados, muitas vezes sem a devida indicação de invalidez. Esses fatores, em conjunto, podem comprometer a confiabilidade da ciência em escala global, uma vez que a comunicação científica é, por natureza, sem fronteiras. Busquei oferecer subsídios para repensar políticas de integridade científica, apoiar o fortalecimento da governança da ciência e estimular a consolidação de uma cultura de responsabilidade e transparência.
De que forma a sua pesquisa pode contribuir para a sociedade?
Quando a retratação envolve áreas de grande impacto social, como a saúde pública ou temas controversos, o efeito sobre a imagem pública da ciência torna-se ainda mais acentuado. Demonstro que, em ambientes on-line, retratações são frequentemente interpretadas como sinal de fragilidade da ciência, sobretudo por grupos negacionistas, quando, na realidade, representam a capacidade da ciência de reconhecer e corrigir seus próprios erros. Ao evidenciar esse descompasso entre o sentido real das retratações e a forma como são percebidas, destaco a urgência de estratégias de comunicação mais eficazes, capazes de transmitir ao público a natureza dinâmica e autocrítica do processo científico. Dessa forma, entendo que minha pesquisa contribui para fortalecer a confiança social no conhecimento científico e para promover uma cultura que valorize a transparência, a responsabilidade e a correção como dimensões centrais da prática científica.
Qual a importância para você de sua tese ter sido escolhida a melhor na área?
Ter minha tese escolhida como a melhor entre tantas defendidas nesse amplo escopo representa um duplo reconhecimento: da relevância do tema para a ciência e para a sociedade e do esforço e da dedicação pessoal investidos na pesquisa. Receber o Prêmio CAPES de Tese é um marco visível na minha trajetória, que lança luz sobre as muitas horas invisíveis de trabalho que fazem da carreira acadêmica uma escolha de vida, muitas vezes difícil, mas profundamente gratificante.
De que forma a bolsa da CAPES contribuiu para sua formação?
Fui bolsista durante o mestrado e o doutorado. O financiamento da CAPES foi essencial para garantir condições materiais de dedicação exclusiva, permitindo que eu me concentrasse integralmente nas atividades de pesquisa. Acredito fortemente que o futuro da pesquisa científica no Brasil depende da capacidade de assegurar maior valorização aos bolsistas, para que não seja necessário escolher entre a sobrevivência econômica e a produção do conhecimento.
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) é um órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
(Brasília – Redação CGCOM/CAPES)
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