Notícias
BOLSISTA EM DESTAQUE
Estudo analisa medidas de proteção social a pescadores artesanais
Ângela Assis é graduada em Ciências Sociais pela Universidade Federal do Ceará (UFC). Ela iniciou os estudos sobre proteção social ainda na graduação, quando investigou aspectos socioeconômicos de pessoas idosas que contribuem para o processo de institucionalização de longa permanência. No mestrado na mesma área na Universidade Estadual do Ceará (UECE), continuou a pesquisa e analisou como essa população tem acesso às políticas de proteção social. Atualmente, no doutorado em Políticas Públicas, também na UECE, analisa medidas de proteção social destinadas aos pescadores artesanais, homens e mulheres, com foco na previdência e assistência social. Ângela foi bolsista da CAPES/MEC pelo Programa de Doutorado Sanduíche no Exterior (PDSE), em 2024, na Universidade de Málaga, na Espanha.
Sobre o que é a sua pesquisa? Explique de forma mais detalhada o conteúdo do trabalho.
Com abordagem qualitativa, desenvolvo uma pesquisa empírica que combina diferentes estratégias metodológicas, articulando a análise de fontes bibliográficas e documentais com a observação direta, realizada por meio de visitas ao território para acompanhar o cotidiano da pesca. A pesquisa de campo inclui a aplicação de entrevistas com os pescadores artesanais, o que possibilita o acesso aos relatos de vida, às experiências e percepções sobre as condições de acesso às políticas públicas de proteção social. O local de estudo é a região do Grande Mucuripe, em Fortaleza, território emblemático para a pesca artesanal no Brasil, marcado por tensões entre tradição, modernização e vulnerabilidades socioeconômicas. A investigação também se estende à província de Málaga, na Espanha, permitindo a inclusão de elementos do contexto internacional para a análise da realidade brasileira.
Qual a diferença entre o modelo do Brasil e da Espanha, onde esteve no doutorado-sanduíche?
A Espanha, de um modo geral, desenvolveu um modelo de proteção social mais abrangente, que articula aspectos como assistência social, educação, emprego, habitação, saúde e previdência, para garantia do bem-estar social. Trata-se de um sistema que busca responder de forma integrada às necessidades da população, oferecendo tanto serviços quanto benefícios econômicos. No caso dos pescadores artesanais, a especificidade de sua atividade na Espanha levou à criação de um regime diferenciado dentro da seguridade social, gerido pelo Instituto Social de la Marina (ISM), um órgão quase secular. O ISM é responsável por coordenar políticas voltadas ao setor marítimo-pesqueiro, englobando desde a previdência e aposentadoria, com coeficientes redutores, até a assistência médica especializada em saúde marítima, além de ações de formação e qualificação profissional. Esse modelo reconhece as condições particulares do trabalho no mar e, por isso, incorpora mecanismos de proteção condizentes à realidade desse segmento. No Brasil, a integração entre as políticas públicas é marcada por descontinuidades institucionais e o acesso aos direitos previdenciários para pescadores, por exemplo, é uma conquista relativamente recente, datada de 1972, o que demonstra o histórico de invisibilidade e a ausência de garantias estatais voltadas ao setor.
O que vale destacar de mais relevante na sua pesquisa?
A pesquisa expõe uma lacuna entre o que é idealizado na formulação de uma política pública e o que é, de fato, entregue à população. Apesar das garantias estatais em termos previdenciários e da inclusão desse segmento como público prioritário da Política Nacional de Assistência Social, os pescadores artesanais continuam enfrentando barreiras para ter acesso a essas políticas. Como exemplo, cito a fragmentação das políticas sociais (com critérios de elegibilidade complexos e restritivos), as condicionalidades que reproduzem desigualdades de gênero (já que mulheres pescadoras não têm os mesmos direitos que os pescadores), a falta de conhecimento sobre os direitos sociais, a informalidade da atividade pesqueira e a ausência de documentação que comprove o exercício laboral.
De que forma a sua pesquisa pode contribuir para a sociedade?
A relevância social da pesquisa reside na possibilidade de dar visibilidade à luta por direitos sociais de um segmento historicamente marginalizado, cuja contribuição econômica e sociocultural para a sociedade brasileira é inegável. Ao evidenciar o gap de implementação entre o arcabouço legal e o acesso real dos pescadores artesanais às políticas públicas, o estudo amplia a compreensão sobre as contradições estruturais que marcam o sistema de proteção social no Brasil. Posteriormente, pode subsidiar a construção de políticas sociais mais integradas e condizentes com as especificidades da pesca artesanal. Também espero contribuir com as instâncias associativas e demais movimentos sociais em suas lutas por maior inclusão e reconhecimento desses trabalhadores, fortalecendo o protagonismo político dos pescadores artesanais na formulação e implementação de políticas públicas.
De que forma a bolsa da CAPES/MEC contribui para sua formação?
A bolsa da CAPES/MEC possibilitou a dedicação exclusiva à pesquisa, viabilizando que parte do trabalho de campo fosse realizado na Espanha, o que foi essencial para ampliar os horizontes de pesquisa. Pude conhecer de perto outro modelo de proteção social, em uma realidade contrastante com o Brasil, além de construir uma interlocução mais próxima com pesquisadores de diferentes países que estão desenvolvendo estudos sobre o mesmo tema. Ou seja, mais do que um apoio financeiro que garantiu as condições materiais para o desenvolvimento da pesquisa, foi um investimento fundamental na produção de conhecimento crítico, o que fortalece o diálogo acadêmico internacional e enriquece as reflexões sobre os desafios da proteção social no Brasil.
A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) é um órgão vinculado ao Ministério da Educação (MEC).
(Brasília – Redação CGCOM/CAPES)
A reprodução das notícias é autorizada desde que contenha a assinatura CGCOM/CAPES

