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NOTA PÚBLICA: Condraf expressa preocupação diante de ações violentas contra indígenas Guarani e Kaiowá no Mato Grosso do Sul
Foto: Agência Brasil/EBC
O Comitê Construção da Paz no Campo, nas Águas e nas Florestas (CPPAZ), vinculado ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (Condraf), instituído pela Resolução Nº 18, de 6 de agosto de 2024, vem a público expressar profunda preocupação diante das ações violentas e desproporcionais praticadas por forças de segurança pública do Estado de Mato Grosso do Sul contra comunidades indígenas Guarani e Kaiowá e da escalda da violência na região, conforme relatado no Ofício SEI Nº 6023/2025/MPI, do Ministério dos Povos Indígenas.
As ações de retomada territorial realizadas pelas comunidades Guarani e Kaiowá, representam legítimas expressões de resistência e reivindicação de direitos historicamente negados. No entanto, essas iniciativas têm sido recebidas com repressão policial, uso excessivo da força, intimidações e ameaças, inclusive contra mulheres, crianças e servidores públicos.
Desde o dia 21 de setembro de 2025, foram registrados episódios particularmente graves, nas Terras Indígenas Guyraroka e Passo Piraju, com a realização de operações policiais para despejo das comunidades, sem decisão judicial para tal e com o uso de violência, incluindo atropelamento e disparos de balas de borracha contra indígenas, cercos policiais com tropas de choque, drones e viaturas em áreas retomadas e lançamento de bombas de efeito moral. Destaca-se nesses contextos as denúncias sobre a atuação dos fazendeiros da região na pulverização de agrotóxicos sobre casas, escolas e locais sagrados. Nas duas localidades citadas, foi denunciada igualmente a atuação conjunta dos efetivos das forças policiais estaduais com os fazendeiros da região, seja na utilização de tratores para a destruição de habitações dos indígenas, seja na escolta policial dos maquinários utilizados para o plantio. Foram registrados, nesses casos, pessoas feridas, inclusive mulheres, crianças e idosos.
Destaca-se também o relato da morte de um jovem pela Polícia Militar (PM), na TI Panambizinho, no município de Dourados(MS), além da intimidação de servidores públicos durante ações de fiscalização ambiental nos territórios indígenas.
Essas práticas violam frontalmente os princípios constitucionais e os compromissos assumidos pelo Estado brasileiro no âmbito internacional. A Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, adotada em 2007, reconhece o direito à autodeterminação, à integridade cultural, à posse de terras e territórios tradicionais, e à proteção contra qualquer forma de violência ou discriminação.
A Convenção nº 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT), ratificada pelo Brasil, assegura o direito à consulta prévia, livre e informada, bem como à preservação dos modos de vida e das instituições sociais dos povos indígenas.
Ademais, o Sistema Interamericano de Direitos Humanos, por meio da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), concedeu medida cautelar em favor da comunidade Guyraroká, exigindo do Estado brasileiro ações urgentes e culturalmente adequadas para proteger os direitos à vida e à integridade pessoal dos indígenas, diante de ameaças, perseguições e uso de pesticidas em áreas próximas à aldeia.
Adicionalmente, é necessário destacar que a demarcação da Terra Indígena Guyraroká foi anulada pela Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) em 2014, com base na tese do marco temporal e sem a participação da comunidade indígena no processo. Em 2018, os Guarani e Kaiowá ingressaram com uma ação rescisória (AR 2686) para reverter essa decisão, apontando graves violações processuais e constitucionais. Embora o STF tenha decidido por unanimidade admitir o recurso e analisar o mérito da ação, o julgamento segue pendente, mantendo a comunidade em situação de extrema vulnerabilidade jurídica e territorial.
Diante da gravidade dos fatos, o CPPAZ reafirma que a construção da paz no campo, nas águas e nas florestas exige o respeito incondicional aos direitos dos povos indígenas, o fortalecimento do diálogo interinstitucional e a implementação de ações coordenadas que promovam justiça social, dignidade e proteção à vida.
Assim, solicitamos aos órgãos competentes que apurem com rigor os episódios relatados e adotem medidas urgentes para garantir a segurança das comunidades indígenas e dos servidores públicos envolvidos nas ações de mediação e fiscalização.
Brasília, 22 de outubro de 2025
Comitê Construção da Paz no Campo, nas Águas e nas Florestas (CPPAZ)
Conselho Nacional de Desenvolvimento Rural Sustentável (Condraf)