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Discurso da Ministra de Estado da Igualdade Racial, Anielle Franco, por ocasião do IV Fórum Permanente dos Afrodescendentes da ONU
Discurso da Ministra de Estado da Igualdade Racial, Anielle Franco, por ocasião do IV Fórum Permanente dos Afrodescendentes da ONU
Nova Iorque, 14 de abril de 2025
Excelentíssima Senhora June Soomer, Presidente do Foro Permanente sobre Afrodescendentes;
Excelentíssimo Senhor Philémon Yang, Presidente da 79ª Assembleia Geral;
Excelentíssimo Senhor Earle Courtenay Rattray, Chefe de Gabinete do Secretário-Geral;
Excelentíssima Senhora Natalia Kanem, Diretora Executiva do Fundo de Populações da ONU;
Excelentíssimo Senhor Jürg Lauber, Presidente do Conselho de Direitos Humanos;
Excelentíssimo Senhor Volker Türk, Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos;
Excelentíssima Senhora Francia Marquez, Vice-Presidente da República da Colômbia e querida amiga,
Caras Embaixadoras, Embaixadores e demais autoridades presentes,
Senhoras e senhores,
É com profunda honra e firme senso de responsabilidade histórica que tomo a palavra, em nome do Governo Brasileiro, para abrir pela terceira vez os trabalhos deste Fórum Permanente sobre Afrodescendentes das Nações Unidas.
Estamos reunidos em um momento simbólico e estratégico para o futuro da nossa luta global por justiça, equidade e dignidade. Um momento para fortalecer a cooperação e o multilateralismo como valores fundamentais ao desenvolvimento coletivo.
Começa este ano a Segunda Década Internacional dos Afrodescendentes, aprovada por esta Assembleia-Geral para intensificar o combate ao racismo, à discriminação e às desigualdades sistêmicas, confirmando que esta não é uma pauta lateral, mas central ao projeto de um mundo mais justo.
Nos últimos anos, nosso país tem dado passos firmes para transformar a reparação histórica em políticas públicas estruturantes.
Avançamos em ritmo recorde e com investimento histórico na titulação de territórios quilombolas, assegurando, a partir da terra, a preservação ambiental, da cultura e da ancestralidade desses povos.
Em dois anos, atingimos o maior patamar de presença de profissionais negros na administração pública federal.
Reafirmamos a política de cotas e ações afirmativas no setor público e privado, ampliando o acesso da população negra às universidades, aos concursos públicos e à economia digital.
Retomamos e fortalecemos o Sistema Nacional de Promoção da Igualdade Racial (SINAPIR), ampliando sua capacidade de levar as políticas aos estados e municípios, bem como os mecanismos de escuta e participação social.
Garantimos a transversalidade como princípio permanente de nossas políticas públicas. A igualdade racial atravessa todos os campos da vida: saúde, educação, segurança pública, esportes, moradia, ciências e cultura.
Desenvolvemos o Programa Juventude Negra Viva, uma iniciativa interministerial voltada à redução das vulnerabilidades dos jovens negros.
Criamos ações específicas para mulheres negras, quilombolas e de comunidades tradicionais e de terreiros.
Senhoras e Senhores,
Promover igualdade racial também é fomentar riqueza, autonomia e geração de oportunidades para quem historicamente foi empurrado para as margens da economia.
O crescimento do PIB é importante, mas não fomenta sozinho a criação e manutenção de oportunidades equitativas ou a democratização do acesso à vida digna.
Precisamos de investimentos estratégicos e direcionados, que fomentem a inovação e o empreendedorismo negro, garantindo que a economia digital, as novas tecnologias e a transição para um mundo mais sustentável contemplem e beneficiem igualmente as populações afrodescendentes.
A crescente presença da tecnologia e da inteligência artificial em nossas sociedades exige atenção, para que avancem como ferramentas de inclusão e não de reprodução das desigualdades sócio-raciais.
A reparação é tema desta edição do Fórum e agenda inegociável. Não é um favor. É um passo civilizatório. O tráfico transatlântico de africanos escravizados foi um crime contra a humanidade e precisa ser encarado com coragem.
Estamos investindo em políticas de memória, verdade e reparação. Em iniciativas de preservação de sítios históricos da escravidão e da resistência negra, em museus da diáspora africana e na valorização dos saberes ancestrais nos currículos escolares, na cultura e na ciência.
Do mesmo modo, a luta antirracista precisa ser compreendida no contexto das grandes agendas globais, como as três que destaco:
Justiça climática – No Brasil, são comunidades negras, quilombolas e periféricas que mais sofrem com os efeitos da degradação ambiental. Na COP 30, que será realizada em Belém do Pará em 2025, apresentaremos ao mundo experiências de resistência, de transição ecológica justa e de protagonismo negro, quilombola e indígena na preservação dos biomas e das águas.
Ao assumirmos o compromisso de execução do ODS 18 – da Igualdade Étnico-Racial – colocamos o combate ao racismo como pilar do desenvolvimento. É um avanço histórico e o reconhecimento de que a desigualdade racial corrói as bases da democracia, da economia e da dignidade humana.
Aliança Global contra a Fome e a Pobreza – Sob a liderança do presidente Lula, lançamos esta aliança fundamental contra a mazela da fome que atinge mais perversamente a população afrodescendente em todo o mundo. Já contamos com a adesão de 81 países, 26 organizações internacionais, 9 instituições financeiras e 31 fundações e ONGs.
Esporte Sem Racismo – Convocamos as lideranças globais a impulsionar a resolução de 2023 do Conselho de Direitos Humanos por um mundo do esporte livre do racismo. Nesta missão coletiva, devemos criar e aperfeiçoar mecanismos legais, formativos e de amplo debate para tornar ambientes esportivos espaços de respeito e transformação social.
Lançamos um chamado à comunidade internacional: que possamos agir de forma coordenada, valendo-nos de espaços de cooperação privilegiados — como os organismos multilaterais e regionais – para garantir que o esporte, em todas as suas expressões, seja campo de liberdade e dignidade para todos os corpos.
O esporte nos iguala enquanto humanos. Devemos lutar incansavelmente para que seja espaço de acolhimento, desenvolvimento, democracia e superação. Nosso governo considera esta uma luta inadiável e tem articulado interlocutores nacionais e internacionais, instituindo políticas e acordos para intensificar o combate ao racismo nos esportes, por meio de processos formativos, plataforma de dados e diálogos com federações e mídias.
Temos ainda muito a fazer. Mas hoje, mais do que antes, sabemos para onde estamos indo: rumo a uma sociedade de plenitude de direitos, de liberdade para sonhar, viver e prosperar.
Finalizo lembrando as palavras da professora, poeta e ativista Beatriz Nascimento:
"Nosso passado não nos condena. Ele nos funda."
Que este Fórum nos inspire a seguir fundando, juntos, um futuro mais justo e igualitário para todas as pessoas afrodescendentes do planeta.
Muito obrigada.
Axé.
Boa jornada de trabalho a todas e todos.