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Sociedade civil se reúne para discutir regularização fundiária do Quilombo Tapera, em Petrópolis/RJ
- Foto: Acervo
Em audiência pública realizada no dia 5 de agosto, na Câmara Municipal de Petrópolis, representantes da comunidade quilombola Tapera, organizações da sociedade civil, autoridades públicas, e integrantes do Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) discutiram os obstáculos enfrentados no processo de regularização fundiária do território tradicional, já certificado pela Fundação Cultural Palmares.
O debate contou com a presença da diretora da Divisão Quilombola do Incra, que esclareceu à população que o processo de titulação está travado por uma pendência burocrática: a publicação do Relatório Técnico de Identificação e Delimitação (RTID) no Diário Oficial do Estado do Rio de Janeiro. Apesar de já ter sido publicado no Diário Oficial da União, o RTID precisa ser veiculado duas vezes no órgão estadual para que seja iniciada a fase de notificação oficial de todos os ocupantes e confinantes da área, via Correios, conforme estabelece a Instrução Normativa nº 57/2009.
Somente após essa etapa começa a correr o prazo legal para contestações. Em seguida, ocorre a análise dessas contestações pelo Incra. Só então será possível alcançar a Portaria de Reconhecimento assinada pela presidência do órgão. Ainda assim, restarão outras etapas burocráticas, como o Decreto Presidencial e a emissão do título final de propriedade coletiva, conforme quadro explicativo anexo.
A comunidade Tapera, com histórico de resistência e preservação de sua identidade cultural, reivindica há anos o direito ao seu território ancestral. A morosidade do processo preocupa os moradores, que temem retrocessos e pressões fundiárias enquanto aguardam o cumprimento das formalidades legais.
Durante a audiência, a liderança quilombola Denise ressaltou que, desde 1847, a comunidade existe e resiste ao apagamento histórico. Sua tataravó Sebastiana já habitava o território quando Petrópolis tinha apenas quatro anos. Em tom firme e emocionado, ela afirmou:
“Enquanto nossos territórios não forem titulados, nossas lideranças estão sendo ameaçadas e assassinadas. A titulação é urgente. Nosso território está sob risco de especulação imobiliária, cercado por um condomínio/associação. A especulação está dentro do nosso território”.
Outra liderança, Dona Angélica, da comunidade do Contorno (próxima ao Quilombo Tapera), trouxe uma leitura histórica da luta pela terra no Brasil, destacando o impacto duradouro da Lei de Terras de 1850, criada para impedir que a população negra, uma vez liberta, tivesse acesso à terra, “Apesar disso, temos esperança. Esperança em destravar as instituições públicas, como o Incra e o governo estadual. Esperança na reparação histórica, que só será possível com a titulação do território da Tapera”, afirmou.
Os representantes do ICMBio, mencionaram a sobreposição do território com a Área de Proteção Ambiental (APA) de Petrópolis e com o Parque Nacional da Serra dos Órgãos. Destacaram que há esforços em curso para garantir a compatibilização entre a gestão ambiental e os direitos da comunidade, em diálogo com o Plano de Manejo da APA, atualmente em revisão. Ressaltaram também a existência de relatório institucional sobre territórios quilombolas em Unidades de Conservação federais no Sudeste, publicado em 2024, e a orientação do Ministério do Meio Ambiente para o levantamento de povos e comunidades tradicionais no Mosaico Central Fluminense, vigente desde 2023.
Está em construção um termo de compromisso entre o ICMBio e a comunidade, com o objetivo de alinhar estratégias de conservação ambiental com a permanência digna das famílias quilombolas em seu território.
A regularização fundiária de territórios quilombolas é um direito garantido pela Constituição Federal e regulamentado pelo Decreto nº 4.887/2003. O caso do Quilombo Tapera exemplifica os desafios enfrentados por comunidades negras tradicionais no Brasil, cuja luta por seus territórios segue marcada por entraves burocráticos, omissões institucionais e ameaças constantes.
A Audiência Pública foi passo importante ao cobrar maior celeridade dos órgãos competentes e envolver o poder público municipal no acompanhamento e apoio ao processo de titulação.
O vídeo da audiência está disponível no YouTube.
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