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Por meio do sequenciamento genético, projeto gerará informações que direcionarão ações de conservação de espécies cavernícolas ameaçadas de extinção
Sequenciamento em laboratório - Foto: Miguel Aun
Iniciado em 2023, o projeto Genômica da Biodiversidade Brasileira (GBB), uma parceria entre Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e o Instituto Tecnológico Vale Desenvolvimento Sustentável (ITV DS), foi responsável pelo sequenciamento genético de 400 espécies da fauna brasileira. A iniciativa, que contou com a participação do Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas (ICMBio/Cecav), busca monitorar animais em risco de extinção e planejar ações de preservação da biodiversidade brasileira. O projeto engloba algumas das espécies contempladas no Plano de Ação Nacional para Conservação do Patrimônio Espeleológico Brasileiro (PAN Cavernas do Brasil), entre elas os troglóbios Xangoniscus aganju (isópode que ocorre na região da Serra do Ramalho, na Bahia) - categorizada como EN (Em Perigo) e Potiicoara brasiliensis (crustáceo que ocorre em Mato Grosso do Sul e Mato Grosso) - categorizada como NT (Quase Ameaçada). Os troglóbios são espécies exclusivamente subterrâneas.
Segundo o analista ambiental do ICMBio/Cecav, Diego Bento, O GBB é dividido em eixos, o primeiro eixo objetiva a geração de genomas de referência, em que os pesquisadores montarão o genoma completo de algumas espécies. Esse genoma completo servirá de base para diversos outros estudos. “A ideia é que esse genoma de referência sirva de base para estudos posteriores de genômica populacional, que formam o segundo eixo do GBB, como o que vai abranger o gênero Xangoniscus inteiro (que inclui Xangoniscus aganju e outras nove espécies troglóbias). A ideia desse projeto de genômica populacional é verificar as relações filogenéticas, ou seja, quem é mais aparentado com quem. E no caso das espécies que ocorrem em mais de uma caverna, verificar se todas elas compõem uma mesma população ou se são populações diferentes. Se for uma mesma população em várias cavernas, a espécie tende a ter uma abundância maior, ela é menos suscetível a impactos ambientais do que se forem populações diferentes e isoladas geneticamente”, comentou Diego. Um estudo de genômica populacional será feito também com Potiicoara brasiliensis, cujo principal objetivo será avaliar se realmente se trata de uma única espécie em toda a sua distribuição geográfica (que é muito ampla para uma espécie troglóbia) ou várias espécies morfologicamente muito parecidas, mas geneticamente distintas. Neste caso, ao invés de Quase Ameaçada (NT), é provável que essas espécies possam ser incluídas em categorias que indiquem um maior risco de extinção.
Também há a previsão de geração de genomas de referência e realização de estudos genômicos populacionais de espécies de anfíbios e de morcegos que habitam cavernas brasileiras.
O analista ambiental do ICMBio/Cecav também destaca o eixo de geração de “barcodes”, cujo objetivo é gerar genomas organelares que, no caso de animais, são os genomas mitocondriais (ou mitogenomas). “Essas informações também poderão ser usadas para estudos futuros, por exemplo, de detecção via DNA ambiental. O próprio mitogenoma também serve para a gente avaliar, por exemplo, relações filogenéticas, para verificar se determinadas espécies constituem complexos. E aí o GBB tem por objetivo gerar mitogenomas de todas as espécies ameaçadas de animais, entre elas todas as espécies ameaçadas de invertebrados troglóbios e de morcegos cavernícolas. Já temos uma primeira leva, que está entre 50 e 60 espécies, com amostras já coletadas. Nossa ideia é ir ampliando essa amostragem para cerca de 150, 200 espécies de invertebrados troglóbios, que atualmente já se encontram em alguma categoria de ameaça”, disse.
Interface com o PAN Cavernas do Brasil
A participação do ICMBio/Cecav no GBB, segundo Diego, primeiramente buscou atender algumas ações do PAN Cavernas do Brasil que estão voltadas à conservação de espécies ameaçadas. “A espécie Potiicoara brasiliensis, por exemplo, é atualmente categorizada como NT (quase ameaçada). Não é uma categoria que indica que ela está ameaçada de extinção, mas próxima de se enquadrar em alguma categoria de ameaça. Então, imagine uma espécie que está em várias cavernas, e provavelmente também no lençol freático, em uma região que vai desde o sul do Mato Grosso do Sul até o sul de Mato Grosso, é uma espécie com uma distribuição muito ampla. Mesmo que ela esteja sofrendo algum tipo de impacto antrópico localmente, dificilmente isso vai impactar a espécie toda. Espécies assim tendem a não ter um risco alto de extinção no futuro próximo. Mas, se em vez de ser uma espécie só amplamente distribuída, eu tenho, na verdade, várias espécies com a distribuição muito mais restrita, um impacto localizado pode causar uma extinção”, explicou Diego Bento.
O analista ambiental do ICMBio/Cecav e Coordenador do PAN Cavernas do Brasil, Maurício de Andrade, conta que o GBB tem o papel fundamental de esclarecer incertezas taxonômicas e avaliar a condição populacional de algumas espécies ameaçadas. “As análises genéticas realizadas pelo GBB contribuem com informações para avaliação de risco das espécies e para execução de ações do PAN”, explicou Maurício.