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Cerrado é o bioma com a maior concentração de cavernas do Brasil
Foto: APA Nascentes do Rio Vermelho (GO) - Cristiano Ferreira
O último Anuário Estatístico do Patrimônio Espeleológico Brasileiro, divulgado pelo Centro Nacional de Pesquisa e Conservação de Cavernas (ICMBio/Cecav) mostra que o Cerrado é o bioma com a maior concentração de cavidades naturais subterrâneas. No país, 12.008 cavernas conhecidas, o equivalente a 46,10% está nessa região. Os dados correspondem aos anos de 2023 e 2024 e podem servir de bússola para indicar locais para a realização de novas pesquisas e iniciativas de conservação.
Responsáveis por uma série de processos naturais, as cavernas desempenham papel fundamental no armazenamento da água, protegem e conservam minerais raros e servem de morada para diversas espécies, muitas delas endêmicas. Além disso, os ambientes naturais subterrâneos servem como laboratório para entendimento do clima no passado (paleogeografia). Eventualmente, essas informações permitem que se proponham estratégias para frear impactos e definir modelos para o presente ou futuro.
Devido à importância desses ambientes naturais, cada vez mais evidente, o número de pesquisas científicas relacionadas a cavernas tem se intensificado. No ano passado, o ICMBio/Cecav identificou um aumento de 280% de novos estudos ao longo dos últimos 16 anos.
O que a ciência tem descoberto nas cavernas do Cerrado
Um artigo de autoria do analista ambiental do ICMBio/Cecav, Cristiano Ferreira, traz importantes informações sobre dolinas encontradas na Área de Proteção Ambiental (APA) Nascentes do Rio Vermelho, localizada no Cerrado goiano. Por meio de um método pouco utilizado no Brasil, os resultados do trabalho intitulado “UAV-based doline mapping in Brazilian karst: A cave heritage protection reconnaissance” poderão orientar ações de manejo da bacia da região, especialmente da área de recarga da Gruna da Tarimba, uma das maiores cavidades naturais subterrâneas do Brasil, localizada em Buritinópolis e Mambaí (GO). Outra possível contribuição que esse trabalho poderá trazer é o mapa de potencial ocorrência de cavernas, baseado na presença de dolinas ainda não checadas em campo.
“As dolinas são formas de relevo negativas, que muitas vezes se assemelham a funis, tigelas ou baldes. Elas concentram a água das chuvas para meio subterrâneo, colaborando decisivamente para a recarga dos aquíferos. Dependendo do contexto ambiental, podem ser fundamentais para o equilíbrio e aporte hídrico para sistemas de cavernas alagadas”, afirmou Cristiano Ferreira.
Assim como em Goiás, outras regiões do Cerrado também têm revelado informações valiosas por meio das pesquisas em cavernas. No Vale do Peruaçu, onde estão localizados o Parque Nacional e a Área de Proteção Ambiental Cavernas do Peruaçu, pesquisadores já identificaram que a região enfrenta um período de seca que já dura mais de 40 anos. O local é o que mais aquece em todo o planeta, apresentando temperatura de 2.5º C, que está acima da média global, de 1.5º C. Para chegarem a conclusões como essa, os espeleotemas, depósitos minerais formados dentro das cavernas, desempenham papel fundamental. As formações rochosas revelam as mudanças do clima ao longo do tempo.
Segundo o professor do Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo (IGC/USP), Francisco William da Cruz (Chico Bill), há uma relação muito forte entre a química do espeleotema e a diminuição da infiltração da água no solo. Foi por meio dessas formações rochosas, que os pesquisadores identificaram que as últimas quatro décadas foram as mais secas dos últimos 700 anos. “Com os espeleotemas, você tem a possibilidade de olhar mais para o passado e ver o quão grave é essa situação de seca. O que os espeleotemas estão ajudando a entender é que não tem precedentes o que está acontecendo”, diz o professor da USP.
A identificação de novas cavidades naturais subterrâneas no Cerrado, aliada ao avanço das pesquisas, amplia o conhecimento sobre seu potencial espeleológico. Esses estudos também oferecem subsídios para orientar ações de enfrentamento às mudanças climáticas e de mitigação de outros impactos ambientais, que colocam o bioma como o segundo mais ameaçado no país.
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