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Presidente do CNPq entrega título de Pesquisador Emérito a Fernando de Mendonça, pioneiro da física espacial brasileira
O professor Ricardo Galvão entregando o título de Pesquisador Emérito ao físico Fernando de Mendonça - Foto: Divulgação
O presidente do CNPq, Ricardo Galvão, entregou o título de Pesquisador Emérito ao professor Fernando de Mendonça, em evento realizado no dia 28 de junho, na residência do agraciado, em São José dos Campos, São Paulo. Primeiro diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE) e ex-Diretor Científico da Comissão Nacional de Atividades Espaciais (CNAE), Mendonça é figura essencial na história da ciência e tecnologia no Brasil. Ao longo de sua vida profissional, também desempenhou papel central na capacitação de pesquisadores em física espacial, consolidando a posição do Brasil no cenário científico internacional.
“Ele foi, de fato, um homem à frente de seu tempo”, afirma o presidente do CNPq. Galvão lembra que, em 1962, ao assumir como associado de pesquisa no laboratório de rádiociências, na universidade norte-americana de Stanford, e participando do programa científico da NASA em sua especialidade, Mendonça publicou aquela que que viria a ser uma de suas produções mais relevantes, revelando um novo método para calcular o conteúdo eletrônico da ionosfera por comparação dos desvios Doppler de sinais eletromagnéticos, transmitidos em duas frequências relacionadas, a partir de um satélite.
A cerimônia oficial de outorga do título Pesquisador Emérito do CNPq aconteceu no último dia 8 de maio, na Escola Naval, no Rio de Janeiro. Como Mendonça não pôde comparecer, a Diretoria Executiva do CNPq decidiu entregar o diploma em mãos, em São José dos Campos. Participaram do evento na casa de Mendonça o diretor interino do INPE, Antônio Miguel Vieira Monteiro, e pesquisadores da dita “velha guarda” da instituição.Emocionado, Mendonça, que completou 100 anos em 2 de dezembro de 2024, agradeceu a homenagem e relembrou como o CNPq e a CAPES (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior) tiveram papel seminal na criação e consolidação do INPE como uma das mais destacadas instituições brasileiras de ciência e tecnologia. Ele recordou que, no final da década de 1960, não havia no país profissionais especializados em ciência e tecnologia espacial - por isso, no período inicial do INPE, concentrou-se na formação desse quadro. Com a parceira do CNPq, da CAPES e da NASA, Mendonça enviou 84 estudantes brasileiros para fazer doutoramento em ciências espaciais no exterior. Apenas um desses alunos não retornou ao país, e todos os que voltaram, mesmo os que não permaneceram no INPE, acabaram contribuindo de forma significativa para o desenvolvimento do Brasil.
Ao ser perguntado sobre a maior dificuldade enfrentada para criar e consolidar o INPE, Mendonça respondeu que encontrou obstáculos no ciúme de outras instituições e no desejo do Ministério da Aeronáutica de absorver a instituição. Segundo o pesquisador, o governo militar, de fato, incentivou a criação de infraestrutura e a aquisição de tecnologia, impulsionando o desenvolvimento do INPE; contudo, havia a intenção da Aeronáutica de absorver o instituto. Temeroso de que a censura e o controle sob uma gestão militar pudessem impactar de forma negativa a pesquisa e a divulgação de resultados científicos, Mendonça procurou o apoio da comunidade científica e do então Ministro da Educação, Jarbas Passarinho, evitando assim a transferência do INPE para a Aeronáutica e garantindo sua permanência sob a égide do Ministério da Educação e Cultura (MEC).
“Por essas razões, Fernando de Mendonça é reconhecido pelo CNPq como uma das grandes personalidades militares, juntamente com o Brigadeiro Casimiro Montenegro, Almirante Álvaro Alberto e General Argus Moreira, que contribuíram de forma seminal para a criação e consolidação do Sistema Nacional de Ciência e Tecnologia”, diz o presidente do CNPq. Segundo Galvão, além da formação de pessoal, o CNPq também desempenhou papel seminal no desenvolvimento científico e tecnológico do INPE, apoiando projetos de pesquisa, desenvolvimento de satélites e sistemas para sensoriamento remoto e observação da Terra, além de outras iniciativas, como a instalação Rádio Observatório Pierre Kaufmann, de Atibaia.
Além de Mendonça, receberam o título de Pesquisador Emérito do CNPq em 2025 os acadêmicos Ennio Candotti (in memoriam), Fernando de Mendonça, Leda Bisol, Marilena Chauí, Newton Carneiro Affonso da Costa (in memoriam) e Roberto José da Silva Badaró.
Uma vida dedicada às ciências espaciais
Natural de Guaramiranga, Ceará, Fernando de Mendonça foi aviador da FAB (Força Aérea Brasileira) e se graduou Engenheiro Eletrônico, com suma cum laude, no ITA (Instituto Tecnológico da Aeronáutica), em 1958. Ele recebeu o título de PhD em Radio Ciências pela Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, em 1961. Ao mesmo tempo, representou a CNAE (Comissão Nacional de Atividades Espaciais) nos Estados Unidos, formou equipes e iniciou o laboratório de física espacial da CNAE.Em 1963, auxiliou o Estado Maior da Força Aérea na criação de um grupo de estudos e projetos especiais, tendo como resultado a construção da Base de Lançamento de Foguetes da Força Aérea no Rio Grande do Norte. Foi Diretor Científico da CNAE, Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais, embrião do INPE, tendo participado de todas as etapas de sua criação, desde obras físicas à busca de pesquisadores interessados em trabalhar no emergente programa espacial brasileiro. Exerceu a Diretoria Geral do INPE, de 1963 a 1976.
No início dos anos 1970, quando os Estados Unidos se preparavam para lançar o primeiro satélite de sensoriamento remoto ERTS-1, no âmbito do Programa Espacial Americano, Mendonça preparou o INPE para ter a primeira estação da América do Sul de recepção e de gravação de imagens para rastrear o satélite. Instalada em Cuiabá, Mato Grosso, a estação foi a terceira no mundo, depois das dos Estados Unidos e do Canadá. Assim, quando o ERTS-1 foi lançado ao espaço, em julho de 1972, o INPE já adquiria os equipamentos necessários para o Laboratório de Processamento de Imagens, a ser instalado em Cachoeira Paulista. Em menos de um ano, em abril de 1973, a Estação de Cuiabá já estava recebendo e gravando os primeiros dados do satélite ERTS-1, que proporcionou ao mundo a capacidade de pesquisar e monitorar os recursos naturais e, como um todo, o meio ambiente da Terra. O INPE, então, começou a dar os primeiros passos nas pesquisas e domínio no processamento de imagens de satélite.
Em 1974, graças a uma iniciativa conjunta com o Ministério da Educação, MEC, e o CNPq, Mendonça cria o Projeto SACI, de educação primária via satélite, para atender as quatro primeiras séries do antigo primeiro grau. SACI era a sigla para Satélite Avançado de Comunicações Interdisciplinares. Na opinião de Mendonça, a adoção de educação por satélite seria uma solução para reduzir o número de analfabetos no Brasil, à época considerado um entrave à modernização do país, principalmente nas regiões Norte e Nordeste. Em 1976, o projeto registrava um total de 1.241 programas de rádio e TV, realizados com recepção em 510 escolas de 71 municípios. Contudo, o projeto não teve continuidade e foi interrompido em 1978, sob o argumento dos altos custos de manutenção de satélites.
De 1977 a 1982, Mendonça foi Diretor Executivo da Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN). Dirigiu, assim, a formação de centenas de doutores na Alemanha para o Programa Nuclear Brasileiro. A partir de 1983, atuou no setor privado, na área de telecomunicações via satélite e representações no setor espacial.

