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Cerimônia
Antonio José Roque da Silva recebe prêmio Álvaro Alberto, maior honraria científica brasileira; leia o discurso do presidente do CNPq
O físico Antonio José Roque da Silva recebe prêmio das mãos do Almirante Marcos Olsen; do presidente do CNPq, Ricardo Galvão; e do secretário executivo do MCTI, Luis Fernandes - Foto: Ana Gouveia / CBPF
Com palavras emocionadas em defesa da capacidade de realização da ciência brasileira, o diretor do Centro Nacional de Pesquisas em Energia e Materiais (CNPEM), Antonio José Roque da Silva, recebeu a medalha e o diploma do Prêmio Almirante Álvaro Alberto, a maior honraria científica brasileira, concedida anualmente pelo CNPq, em parceria com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação (MCTI) e a Marinha, a um(a) cientista de destacada trajetória. A cerimônia foi realizada na Escola Naval, no Rio de Janeiro, na noite da quinta-feira (08/05).
"Sinto-me representando a ciência brasileira e sua capacidade de realizar algo como o Sirius e, em breve, espero, o Orion", firmou Roque, aludindo, respectivamente, ao acelerador de partículas com fonte de luz sincrotron e ao complexo laboratorial de máxima contenção biológica utilizando esse mesmo tipo de luz – dois projetos que envolvem projeto, tecnologia e componentes 100% nacionais.
"Isso começou há mais 40 anos, com uma ideia surgida no Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), com uma ideia que diversos físicos começaram a pensar. Por isso, é importante manter nossas unidades de pesquisa fortes, porque delas saem muitas e desafios, que depois, eventualmente, a gente consegue consolidar", observou Roque, que reconheceu também a importância do CNPq em sua trajetória. "É uma honra estar recebendo esse prêmio, e eu só estou aqui hoje porque recebi bolsa do CNPq para fazer meu doutorado, assim como vários aqui presentes. Por isso, é central que a gente continue apoiando e defendendo do CNPq", afirmou.
"Estamos aqui no dia de festa da ciência, que combina a concessão do Prêmio Nobel Álvaro Alberto, que evoca um grande brasileiro, um grande cientista, um grande patriota, e a homenagea àqueles que têm servido a ciência como instrumento para o desenvolvimento do Brasil", afirmou o secretário executivo do MCTI, Luis Fernandes, referindo-se à posse dos novos membros da Academia Brasileira de Ciências (ABC), solenidade que integrou o evento. Fernandes substituiu a ministra Luciana Santos, impossibilitada de comparecer por encontrar-se em missão no exterior.
Parceira do CNPq na realização do prêmio, a Marinha abrigou a cerimônia, concedendo ao premiado seu “Farol da Ciência”. "A Marinha do Brasil sente-se honrada em abrigar já por alguns anos a entrega do Almirante Álvaro Alberto, o prêmio o maior na área de ciência e tecnologia, e que projeta a Marinha dentro da sua atribuição de promover o desenvolvimento nacional", afirmou o almirante de esquadra Marcos Sampaio Olsen, comandante da força.
Por fim, o presidente do CNPq, Ricardo Galvão, revisitou as principais realizações do Conselho ao longo do último ano, convocando a comunidade científica a seguir alerta na defesa do órgão. “Há 74 anos, o CNPq acompanha vidas, da graduação ao pós-doutorado, da iniciação científica à produtividade em pesquisa. O CNPq está presente na trajetória de quase todas e todos os compatriotas que constroem e defendem a ciência brasileira. Em tempos de avanço continuado de discursos negacionistas, fortalecidos pelas redes sociais, convido a comunidade científica a reagir com o que de melhor dispomos para desenvolvermo-nos com justiça social e sustentabilidade, ou seja, civilidade republicana, conhecimento, racionalidade e responsabilidade com o presente e o futuro.
Também foram entregues o título de Pesquisador Emérito e a Menção Especial de Agradecimento, ambos concedidos pelo CNPq a personalidades científicas de destaque e instituições com relevantes contribuições à ciência brasileira.
Neste ano, os contemplados com o título de Pesquisador Emérito foram o físico e ex-presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Ennio Candotti (in memoriam); o fundador e primeiro diretor do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), engenheiro Fernando de Mendonça; a professora aposentada de Linguística da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Leda Bisol; a filósofa Marilena Chauí, da Universidade de São Paulo (USP); o matemático, engenheiro civil e professor da USP, Newton Carneiro Affonso da Costa (in memoriam); e o médico infectologista e professor da Universidade Federal da Bahia (UFBA), Roberto José da Silva Badaró.
Os agraciados com a Menção Especial de Agradecimento, por sua vez, foram uma pessoa física, a professora e pesquisadora da área de Direito Internacional da UFRGS, Cláudia Lima Marques; e três pessoas jurídicas: o British Council (BC), o Instituto Rio Branco (IRBr/MRE), e o Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe (CAF).
Veja fotos do evento (crédito: Ana Gouveia/CBPF)
Assista à entrevista com o professor Antonio José Roque da Silva.
Leia na íntegra o discurso do professor Ricardo Galvão:
Em outubro de 2019, mais de uma centena de pessoas, entre pesquisadores e servidores do CNPq, deram-se as mãos para abraçar o prédio sede de nosso Conselho, em Brasília, em um gesto que marcaria a história da ciência brasileira.
Eles não estavam sozinhos. Naquele gesto, representavam dezenas de milhares de pesquisadores que formam a comunidade científica de nosso país, indo de estudantes de iniciação científica a pesquisadores consagrados. Representavam, certamente, todos os cidadãos e cidadãs que reconhecem na ciência não somente um método de produção e validação do conhecimento, mas também uma coluna basal do moderno desenvolvimento democrático, sustentável e socialmente justo, essencial para a sobrevivência de nossa sociedade. Foram esses cidadãos que posteriormente dariam, nas urnas, resposta às ações predatórias contra a ciência, proporcionando um novo alvorecer em nosso país, cuja luz penetrou com civilidade, mas pujantemente, a escuridão negacionista do governo anterior. Isso tornou possível o momento de reconstrução da ciência e da sociedade brasileira que hoje vivemos.
Aquele abraço foi uma resposta ao boato, infelizmente bem fundamentado, de que haveria um projeto em curso visando o fechamento do CNPq e sua fusão com a CAPES – nossa parceira, mas que desempenha uma função distinta e complementar à nossa. Felizmente, viramos aquela página infeliz; mas nada está garantido. Temos que nos manter paladinos influentes em defesa do sistema nacional de ciência tecnologia e inovação, pois ataques à ciência e apologia a discursos negacionistas ainda persistem em setores numerosos de nossa sociedade, estimulados até mesmo por exemplos da estultice predatória vinda de governos de extrema direita de outros países.
Portanto, o CNPq ainda necessita ser protegido. Protegido por seus gestores e servidores e, sobretudo, pela comunidade científica, que tem a real capacidade de mostrar à sociedade a importância desse órgão extraordinário. Nesse sentido, estando bem familiarizado com as estruturas de apoio à ciência em diversos países, posso afirmar que são poucos as congêneres do CNPq que tenham a nossa abrangência e a nossa capacidade de fomentar ciência, em seus vários níveis, com recursos não-reembolsáveis.
E como proteger o CNPq? A resposta é simples: usando-o. Valorizando-o. Aproveitando todas as oportunidades que oferece para quem quer entrar, permanecer, defender e ampliar o sistema científico brasileiro. Não por outra razão, escolhemos trabalhar neste ano com um slogan singelo, que vocês verão nos próximos dias na página e nas redes sociais do CNPq: USE A CABEÇA.
Essa frase tão simples tem significado amplo e diverso. Primeiro, remete à própria forma de nossa tão conhecida marca: uma cabeça, a cabeça pensante dos pesquisadores e pesquisadoras do Brasil. Segundo, convida a cada membro dessa enorme comunidade a acompanhar nosso dia a dia, conhecer nossas ações e aproveitar as múltiplas possibilidades de fazer ciência, inovação e desenvolvimento tecnológico através delas.
O CNPq é para todos. Todos os que dedicam suas vidas ao avanço científico e tecnológico do país.
Inicialmente, é para quem está descobrindo, dando os primeiros passos no universo da ciência. Mais da metade dos 91 mil bolsistas do CNPq são de iniciação científica e tecnológica. Jovens que estão na graduação, alguns ainda no ensino médio, mas que já revelam um pendor pela ciência. Muitos descobriram essa paixão através de um projeto coordenado por um professor ou professora; ou participando de uma das mais de 50 olimpíadas do conhecimento apoiadas pelo CNPq; ou de alguma feira, mostra científica ou ação de popularização da ciência que o CNPq apoia em todo o país. E, para aqueles que se destacam, o CNPq concede premiações, como o Prêmio Jovem Cientista, retomado após seis anos de interrupção, o Destaque na Iniciação Científica e o de Fotografia - Ciência e Arte.
O CNPq é para quem quer se tornar um cientista profissional. Quem vislumbra abraçar a ciência como carreira geralmente segue na vida acadêmica. Quando termina a graduação, emenda um mestrado, um doutorado. Aproximadamente 10 mil das 91 mil bolsas do CNPq são para mestrandos e doutorandos. Atualmente são distribuídas para 188 instituições de pesquisa e educação superior em todas as regiões do país. O investimento na última chamada para mestrado e doutorado foi incrementado em R$ 98 milhões, atingindo o total de R$ 530 milhões. Além das bolsas, os jovens cientistas em formação também podem se beneficiar dos incontáveis espaços laboratoriais e grupos de pesquisas financiados pelo CNPq, espalhados por todo o Brasil.
O CNPq é para quem faz ciência na interface entre o setor acadêmico e o setor empresarial. O Brasil forma, por ano, mais de 20 mil doutores e doutoras, mas parte significativa deles não chega a ser absorvida pelo setor acadêmico. Neste atual cenário da economia do conhecimento, o CNPq está seguro de que também deve haver lugar para cientistas em empresas e corporações públicas e privadas que possuam setores de pesquisa aplicada, dedicados ao desenvolvimento de tecnologias inovadoras, acionadas pela ciência. Programas consolidados do CNPq, como Recursos Humanos em Empresas - RHAE, Mestrado e Doutorado Acadêmico para Inovação -MAI/DAI, e outros, atuam nessa interface, aproximando pesquisadores de startups e pequenas, médias e grandes empresas. São uma forma de gerar oportunidades para pós-graduados e alavancar novos investimentos públicos e privados em pesquisa e desenvolvimento. A esses pesquisadores oferecemos mais de 900 bolsas de produtividade em Desenvolvimento Tecnológico e Extensão Inovadora. Com as chamadas RHAE e MAI/DAI, promovemos atualmente a realização de mais de 300 pesquisas científicas em interação direta com empresas públicas e privadas.
O CNPq é para cientistas em busca de novos desafios. A vida profissional do cientista começa para valer depois de concluir a graduação, o mestrado e o doutorado. E o CNPq não larga a mão de ninguém: nem de quem ainda está em busca de uma colocação profissional – que pode concorrer às bolsas de pós-doutorado, nem de quem já conseguiu uma vaga como pesquisador em uma universidade, empresa ou instituto de pesquisa. Chamadas regulares, como a Universal, que tem investimento previsto da ordem de R$ 450 milhões e a de Cooperação Internacional, com mais de R$ 200 milhões, e ações especiais, por exemplo nas áreas ambiental e de saúde.
Uma dessas ações especiais, muito comentada no ano passado, positiva ou negativamente, foi o Programa Conhecimento Brasil, de Atração de Talentos brasileiros atuando fora do país ou Formação de Redes Internacionais com pesquisadores brasileiros atuando no exterior. Estima-se que, desde 2015, cerca de 30.000 brasileiros receberam bolsas de diversas agências para fazer mestrado, doutorado ou pós-doutorado no exterior. Embora todos tivessem obrigação contratual de retornar ao país após o estágio no exterior, e aqui permanecer pelo mesmo tempo em que usufruíram da bolsa, poucos retornaram, boa parte simplesmente porque não havia posições disponíveis em nossas instituições científicas para absorvê-los. E os que não retornavam eram processados para restituir ao Tesouro Nacional os recursos investidos em suas bolsas! Quase um cenário kafkiano.
Com recursos do FNDCT, o Programa Conhecimento Brasil foi lançado não somente como uma saída para esse impasse, mas também para permitir que o sistema nacional de ciência, tecnologia e inovação se beneficiasse do conhecimento e da capacidade técnica de nossos compatriotas com experiência internacional adquirida com nossos recursos públicos.
O programa foi lançado em duas linhas distintas. A primeira para pesquisadores brasileiros com posição já definitiva no exterior, mas interessados em estabelecer projetos de pesquisa em rede com pesquisadores residentes no Brasil. Nesta linha foram apresentadas cerca de 1.000 propostas, sendo aprovadas 640, com recursos investidos de 200 milhões de reais, por dois anos.
A segunda linha foi para atração e fixação de pesquisadores interessados em retornar e desenvolver sua carreira profissional no país. Nesta linha foram apresentadas cerca de 1.500 propostas, sendo 139 apresentadas por empresas interessadas em atrair doutores. Foram aprovadas, preliminarmente, 574 propostas, com recursos investidos de 800 milhões de reais, por cinco anos. Somando as duas linhas, as propostas vieram de 56 países, demonstrando uma diáspora com ampla distribuição internacional.
O CNPq é para quem combate desigualdades regionais, de gênero, de raça, de religião e de opção sexual e de gênero. Infelizmente, desigualdades e preconceitos ainda sobrevivem em nosso meio acadêmico, colocando barreiras no desenvolvimento profissional de jovens brilhantes que muito têm a contribuir para o desenvolvimento científico e tecnológico do país. O CNPq combate essas desigualdades com várias ações afirmativas, como o aumento da representação feminina em nossos comitês assessores, programa de bolsa especial de doutoramento e pós-doutoramento no exterior para mulheres negras, indígenas, quilombolas e ciganas, bolsas de iniciação científica para universidades com programas de ações afirmativas e vários outros. Entre todas essas ações merece especial destaque o Prêmio Mulheres e Ciência, lançado no ano passado pelo CNPq em colaboração com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, com o Ministério das Mulheres, com o British Council e com o Banco de Desenvolvimento da América Latina e Caribe – CAF. Em sua primeira versão, foram premiadas seis pesquisadoras entre cerca de mil candidatas, em áreas que vão desde ciências da vida à inteligência artificial, passando por ciências sociais aplicadas.
Finalmente, o CNPq é para quem tem toda uma vida dedicada à pesquisa. Quem já tem uma carreira consolidada precisa de apoio e incentivo para traduzir experiência em conhecimento de ponta; transformar contatos em redes robustas de pesquisa; converter o saber acumulado em legado para as novas gerações. Pesquisadores de longa e reconhecida trajetória contam com as bolsas de produtividade em pesquisa, que correspondem a cerca de 17 mil das 91 mil bolsas do CNPq, e têm acesso aos mais robustos editais de mobilidade, como os de pesquisador visitante e de cooperações internacionais, e de financiamento à pesquisa. Como, por exemplo, cito o de Institutos Nacionais de Ciência e Tecnologia, que, em parceria com o FNDCT, o Ministério da Saúde, a CAPES e quatro fundações estaduais de pesquisa, está fazendo o maior investimento de sua história, na casa de R$ 1 bilhão e meio.
O Professor Antônio José Roque da Silva, querido amigo e colega do Instituto de Física da USP, merecidamente outorgado com o Prêmio Almirante Álvaro Alberto neste ano, é um exemplo paradigmático de uma pessoa com a vida inteiramente dedicada à ciência que interagiu exitosamente com o CNPq. Pesquisador de Produtividade em Pesquisa no mais alto nível, teve vários projetos submetidos e aprovados pelo CNPq.
Para onde se olhe na ciência brasileira, nota-se a presença do CNPq. Criado em 1951 para pensar e executar a política científica nacional – participando na origem do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, em 1984, que daí em diante assume esse papel, o CNPq completa 74 anos conservando-se como uma das mais destacadas agências de fomento à investigação científica, em recursos não-reembolsáveis que viabilizam incontáveis laboratórios, projetos de pesquisa e bolsas, em cooperação com universidades, institutos de pesquisa e empresas de todo o Brasil. Os números que comprovam toda essa fortuna científica estão disponíveis para quem quiser ver: basta acessar nossos painéis de dados, na página do CNPq. Além de disponíveis, nossos dados estão agora também muito mais bem protegidos, graças ao backup das plataformas do CNPq que implementamos recentemente, aqui no Rio de Janeiro, em parceria com o Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas. Isso nos deixa a salvo de um novo apagão, como o que acometeu temporariamente a plataforma Lattes em 2021.
Em suma, há 74 anos, o CNPq acompanha vidas, da graduação ao pós-doutorado, da iniciação científica à produtividade em pesquisa. O CNPq está presente na trajetória de quase todas e todos os compatriotas que constroem e defendem a ciência brasileira. Em tempos de avanço continuado de discursos negacionistas, fortalecidos pelas redes sociais, convido a comunidade científica a reagir com o que de melhor dispomos para desenvolvermo-nos com justiça social e sustentabilidade, ou seja, civilidade republicana, conhecimento, racionalidade e responsabilidade com o presente e o futuro.
Um chamado à razão.
Muito obrigado!



