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SALVAGUARDA
Com presença da ministra da Cultura, Salvador celebra 40 anos como Patrimônio Mundial da Unesco e avança em políticas de preservação
Foto: Filipe Araújo / MinC
Salvador celebrou, na manhã desta segunda-feira (15), os 40 anos do reconhecimento como Patrimônio Mundial pela Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). O evento ca capital baiana foi promovido pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) e reuniu autoridades, representantes da comunidade local, pesquisadores e gestores públicos para marcar avanços estratégicos na política de preservação do patrimônio cultural brasileiro.
Durante o evento, a ministra destacou o patrimônio cultural como elemento central da memória coletiva e da identidade nacional. “Patrimônio também fala sobre memória”, afirmou Margareth Menezes, ao defender a retomada e o fortalecimento das políticas públicas voltadas à preservação. Segundo ela, a reconstrução institucional do setor cultural reafirma a importância de o Brasil manter um Ministério da Cultura, diante da dimensão e da diversidade cultural do país.
A ministra também ressaltou a necessidade de inclusão e diversidade nos espaços de decisão, especialmente em Salvador, cidade cuja população e majoritariamente negra. “Lugar de poder não é lugar de cor de pele, lugar de poder é lugar de competências”, declarou, ao reforçar o compromisso com o enfrentamento do racismo e a ampliação da representatividade feminina e negra nas instâncias de poder. Para a titular da Cultura, preservar o patrimônio também é combater apagamentos históricos: “A gente não pode permitir esses apagamentos mais”.
No campo das ações concretas, a titular da Cultura anunciou a retomada de iniciativas estruturantes para a requalificação do Centro Histórico de Salvador, entre elas o restauro da Igreja da Boa Viagem, já com obras iniciadas após período de interdição; a elaboração de uma cartilha orientadora para moradores e usuários do centro tombado; e a regulamentação específica da área — uma lacuna histórica de quatro décadas. “Requalificar o centro histórico da Bahia quer dizer integrar todas as colaborações para mostrar como é especial o patrimônio que nós temos”, declarou.
Um dos principais marcos da cerimônia foi o lançamento da Portaria Nº 297/2025, publicada nesta segunda no Diário Oficial da União. A norma estabelece diretrizes de preservação e critérios de intervenção para o Centro Histórico e a Cidade Baixa de Salvador, duas das áreas urbanas mais emblemáticas do país, protegidas por tombamento federal. Elaborada com intensa participação social, a portaria é a mais detalhada já produzida pelo Iphan, com seis capítulos e 59 anexos, mapeando mais de 3 mil imóveis.
A nova regulamentação busca conciliar a preservação do patrimônio com as demandas contemporâneas da cidade, considerando mobilidade urbana, acessibilidade, adaptação às mudanças climáticas, uso de novas tecnologias, reuso de edificações e ampliação da oferta habitacional, especialmente nas Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS). A portaria entra em vigor 45 dias após a publicação e não tem efeito retroativo.
Durante a cerimônia, também foi apresentada a Portaria Nº 289/2025, de abrangência nacional, que regulamenta a autorização para intervenções em bens edificados tombados, valorados e em seus entornos, além do lançamento do Manual de Orientações para Normas de Preservação de Bens Tombados em Contextos Urbanos, destinado a moradores, proprietários e gestores públicos de todo o país.
Outro anúncio relevante foi a formalização de um Termo de Execução Descentralizada (TED), no valor aproximado de R$ 6,7 milhões, firmado entre o Iphan e o Fundo de Defesa de Direitos Difusos (FDD), do Ministério da Justiça, que viabilizará a conclusão das obras de restauração da Igreja e do Hospício da Boa Viagem, em Salvador.
O presidente do Iphan, Leandro Grass, destacou o momento de reconstrução das políticas culturais no país e o protagonismo do Ministério da Cultura na garantia de direitos. Para ele, a atual gestão representa um período singular da história. “Não é a qualquer tempo histórico que nós temos alguém que vem da base da cultura, com tamanha representatividade e legitimidade, conduzindo a política cultural brasileira”, comemorou.
Ele também ressaltou a importância da atuação integrada com a Universidade Federal da Bahia e parceiros locais, mencionando projetos de restauração de imóveis, pesquisas, recuperação de bens móveis e ações voltadas à população em situação de vulnerabilidade no Centro Histórico, como o programa Conviver. Segundo ele, as novas normas trazem segurança jurídica e ampliam as perspectivas de desenvolvimento para a região.
Ao falar sobre a participação social, o presidente do Iphan reforçou que a democracia é um pilar essencial das políticas públicas de patrimônio. “Nada na democracia tem legitimidade sem participação social”, explicou, lembrando que a Bahia é referência nacional na área, com conquistas recentes como o tombamento de terreiros históricos, mas que ainda há um longo caminho de reparação histórica a ser percorrido.
O reitor da UFBA, Paulo César Miguez de Oliveira, enfatizou o papel da universidade pública como agente de cidadania e guardiã da memória cultural. Para ele, preservar o patrimônio é reconhecer a diversidade de expressões que formam a identidade brasileira. “Salvador tem, nos seus tambores, nos seus terreiros, nas suas igrejas, nos seus sobrados, nas suas festas, a sua razão de ser, e isso é permanentemente desrespeitado”, pontuou.
Ao relembrar os 40 anos do reconhecimento do Centro Histórico pela Unesco, Miguez enfatizou que o título é resultado de uma luta contínua. “São quarenta anos do nosso Centro Histórico reconhecido pela Unesco, quarenta anos de luta para garantir que ele continue existindo”, completou. O reitor também reafirmou o compromisso institucional da UFBA com as políticas públicas de preservação e homenageou o professor Mário Mendonça, referência nacional na área, destacando sua contribuição histórica para o patrimônio cultural brasileiro.
A cerimônia também foi marcada por uma apresentação do Olodum, grupo símbolo da cultura afro-brasileira e da identidade de Salvador. A participação do coletivo reforçou, na prática, a centralidade da cultura negra na construção da memória e do patrimônio da cidade, dialogando com as falas sobre representatividade, diversidade e enfrentamento dos apagamentos históricos. Com seus tambores, o Olodum levou ao evento a força das manifestações populares que mantêm vivo o patrimônio cultural soteropolitano, conectando tradição, resistência e contemporaneidade.
