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Artigo: Um ano de participação no Clube de Paris
Há um ano, na reunião de novembro de 2016, o Brasil tornou-se o 22º integrante do Clube de Paris. Essa organização internacional coordena os esforços de cobrança e de eventual renegociação de dívida com devedores públicos, sejam eles governos ou entidades sub-nacionais.O compromisso brasileiro de aproximação com a organização foi conduzido pelo Ministro Henrique Meirelles durante a Cúpula do G-20 em Hangzhou.
Ainda que a Secretaria de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda já representasse, informalmente, o País nas reuniões do Clube mesmo antes da adesão, a formalização foi mais um passo em direção a uma participação mais efetiva do Brasil em fóruns econômicos multilaterais.
Por que a participação do Brasil nesta organização é importante?
Há uma percepção de alguns setores da sociedade civil de que as renegociações de dívida soberana são meros processos de perdão de dívida. O histórico das renegociações coordenadas pelo Clube de Paris, no entanto, indica que a maior parte das dívidas são renegociadas respeitando-se o desejo do credor de receber a integridade do crédito concedido, ainda que o hiato entre o inadimplemento e a recuperação possa ser mais longo do que o desejado.
Certamente há exceções à regra de se evitar remissões de dívida, como no caso da iniciativa HIPC (Heavily Indebted Poor Countries), em que foi coordenado um esforço de perdão global a países africanos, com intuito de levar a dívida desses países a níveis sustentáveis, de modo a liberar recursos para a redução da pobreza e a impulsionar o desenvolvimento econômico-social no continente.
Caso seja necessário reestruturar dívidas, trabalha-se em conjunto com o Fundo Monetário Internacional para que o novo cronograma de repagamento seja condizente com as perspectivas macroeconômicas dos devedores, a fim de se obter uma trajetória sustentável de endividamento.
Após reestruturação e remissão de parte significativa da dívida dos países HIPC, esse grupo de países, que conta com programa de auxílio do FMI, passou a ter a contratação de novas dívidas monitorada, de forma a evitar novos ciclos de sobreendividamento.
Em sua reunião de junho de 2017 com credores privados internacionais, o Clube de Paris indicou publicamente que não se discute uma nova iniciativa HIPC, reforçando o desejo de seus membros em reaver os créditos em atraso. Como membro formal da organização, o Brasil aumentou o seu peso na governança financeira internacional, com uma participação mais ativa no processo de formação de agenda e dos termos das renegociações de dívida.
Apesar de já utilizar os parâmetros técnicos da organização como base para a maior parte das renegociações aprovadas pelo Senado Federal, o Brasil, até sua adesão formal, não tinha poder decisório sobre as condições finais concedidas pelos membros do Clube aos devedores.
Ao se tornar membro formal, também passou a ser facultado ao Brasil o direito de incluir assuntos que sejam de seu interesse na pauta das reuniões. Além da maior projeção internacional, ao seguir os parâmetros do Clube da Paris, o Brasil uniu-se ao grupo de principais credores internacionais e ganhou força nos esforços de cobrança.
Pela regra de comparabilidade de tratamento, os membros recebem as mesmas condições de repagamento. Nenhum país tem sua dívida renegociada em condições mais vantajosas. Outro ganho relevante ao País, nesses doze meses, foi a troca de experiências e de aprendizado para o corpo técnico dos órgãos do governo brasileiro envolvidos com o tema, especialmente para o Ministério da Fazenda.
Apesar dos diversos ganhos, há desafios. O Brasil escolheu o caminho da colaboração internacional, o que significa seguir os padrões definidos conjuntamente, ainda que, em alguns poucos casos, o tratamento bilateral pudesse ser mais vantajoso. Outro problema coletivo é o desejo do Clube de Paris de incrementar a lista de credores que participam do grupo, o que tende a dificultar a formação de consenso e a cooperação entre os membros.
A participação da Secretaria de Assuntos Internacionais no Fórum de Paris, no dia 16 de novembro, ao completarmos um ano de participação formal no Clube de Paris, reforça o desejo de diálogo do Brasil com o exterior. Ao utilizarmos parâmetros internacionais para processos de cobrança e de renegociação de dívidas, conferimos maior objetividade ao processo, reduzindo o risco de as decisões serem tomadas sem critérios técnicos de referência.
A formulação de políticas públicas com base nas melhores práticas internacionais é o caminho recomendável tanto para assegurar a sustentabilidade dos programas de governo quanto para aumentar a projeção internacional brasileira.
*Marcello Estevão, PhD em Economia pelo MIT, é secretário de Assuntos Internacionais do Ministério da Fazenda e Chairman do Corpo de Diretores do New Development Bank. Foi economista do Federal Reserve Board, do FMI e da Tudor Investment Corporation.