Pronunciamento do presidente Lula durante lançamento do programa Reforma Casa Brasil
Bem, eu acho que hoje nós estamos tentando fechar um ciclo para resolver um dos problemas mais sérios do povo brasileiro. A questão da moradia, a questão da reforma das casas, porque nem todo mundo quer comprar uma casa nova, nem todo mundo precisa comprar uma casa nova.
Às vezes, o cara tem uma casinha que ele construiu há 30 anos e ele não quer mudar da vila que ele mora, ele não quer mudar do bairro que ele mora, mas está caindo o telhado. Às vezes, ele tem uma lojinha que ele precisa fazer um banheiro novo para atender os clientes, um balcão novo. Ou seja, se a gente não olhar para essa gente, quem é que vai olhar?
Um dos papéis mais importantes do Estado é olhar para aquelas pessoas que o mercado não tem interesse de olhar. Pode ser duro dizer uma coisa dessas? Vão dizer: “o Lula é contra o mercado”? Não.
O mercado é muito sábio. O mercado não gosta de fazer aposta errada. O mercado não gosta de ganhar pouco.
Então, para que abrir uma linha de crédito para o cara ir comprar, sabe, num depósito de material de construção? O dono de um depósito é um empresário pequeno. Às vezes, é um depósito numa vila e ele não tem condições, sabe, de ter financiamento.
Se a gente consegue fazer o financiamento chegar na mão das pessoas, aquele depósito vai começar a ser frequentado. Ele vai ter, por parte da Caixa Econômica [Federal], a garantia de que as pessoas que vão pegar o crédito vão utilizar o crédito para que a gente possa fazer a reforma da casa.
E assim esse país vai dar um salto de qualidade, porque não tem muita explicação a gente ver uma notícia no jornal de que tem tantos milhões de casas no Brasil que não têm banheiro. Não tem nenhuma explicação para, em um país do tamanho do Brasil, a gente ligar a televisão e ver que tem milhões de pessoas que vão fazer suas necessidades fora de casa, no mato, que tem milhões de pessoas que nunca tomaram um banho de chuveiro.
Que tem milhões de pessoas que nunca tiveram uma torneira dentro de casa para lavar um prato, ou um tanque com água correndo para poder lavar a roupinha dos seus filhos. Eu ia falar ‘roupinha do marido’, mas o marido precisa criar vergonha e aprender a lavar a roupa dele também – porque, se ele suja, ele tem que aprender a lavar.
Então, são essas novidades que parecem novidades, porque tem um ditado que a gente tem que aprender, gente: este país nunca teve um governo que tivesse qualquer relação mais íntima com a maioria do povo sofrido desse país. Não adianta conhecer teoricamente o problema.
Não adianta ler um livro para, na época das eleições, ficar citando o miserê do povo. É preciso que já tenha sentido, que já tenha vivenciado, para que as pessoas, quando ganharem as eleições, tragam isso consigo na sua bagagem – porque é muito fácil mudar de comportamento. É muito fácil.
Nada aqui dá motivação para a gente lembrar do mundo que a gente vivia antes. Aqui é tudo mais fácil. Por isso que governar de Brasília não é o ideal.
Brasília é o palácio onde a gente fica, mas a gente precisa governar sabendo que o povo que precisa de nós não está aqui. O povo que precisa de nós não precisa de bilhões, não precisa sequer de milhões, precisa de alguns milhares de reais. E é pouco.
E com esse pouco que as pessoas mais humildes recebem, eles conseguem movimentar uma economia. Eles conseguem fazer a padaria da esquina funcionar, o depósito de material da construção funcionar, a lojinha que vende roupa de criança funcionar, porque ele compra as coisas ali em volta da casa dele. E quando a economia do bairro começa a melhorar, todo mundo quer reformar a sua casa.
Quem é que não quer fazer uma garagem quando tem dinheiro para comprar o carrinho? Aliás, nós tínhamos um grande intelectual brasileiro que dizia que o Brasil é o único país do mundo em que o carro tem casa e o pobre não tem casa. Porque tem casa que tem três garagens para quatro carros, para cinco carros, e muitas vezes a maioria dos pobres não tem um quarto.
Às vezes, as pessoas dormem apinhadas numa cama, com quatro, cinco pessoas no mesmo quarto, na mesma cama, apinhadas em rede. E ninguém se preocupa com isso, porque as pessoas não vão lá. Essas pessoas mais humildes não têm condição de protestar.
Muitas vezes eles não têm sindicato. Muitas vezes eles não estão organizados na maioria dos lugares do país. Então essas pessoas ficam sendo tratadas como se fossem os eternos invisíveis da sociedade brasileira.
O orçamento da União não passava por essa gente. Não passava. Quem é que vai discutir pobre no orçamento?
Então, o que nós estamos fazendo é tentar passar a ideia para vocês que as coisas mudaram nesse país. O que nós estamos querendo passar para vocês é a ideia de que, embora a gente governe para todo mundo, as pessoas mais necessitadas têm que ter prioridade nas políticas do governo e nas decisões do governo. E sabe o ministro Haddad [Fernando, da Fazenda], o ministro Jader [Filho, das Cidades], o ministro Rui [Costa, da Casa Civil], sabe o caso da Caixa Econômica?
O que me incomodava muito é que muitas vezes a gente faz o programa para as pessoas mais humildes, para bem mais humildes. E chega um companheiro que trabalha, que ganha R$ 7 mil por mês, R$ 8 mil por mês, R$ 6 mil por mês, um bancário, um metalúrgico, um químico, um gráfico, um policial, um trabalhador do Banco do Brasil, um próprio trabalhador da Caixa Econômica Federal, ele ganha R$ 8 ou R$ 9 mil, não tem política para ele. Ele não é pobre e miserável, ele não é rico, então ele não existe também.
Porque a gente não pensa na política para essa gente. E é preciso saber que essa gente não é tão pobre, mas é quase que pobre. Porque se ele ganhar R$ 8 mil e pagar um aluguel numa casa, tiver que pagar uma escola para o filho, não vai sobrar dinheiro para ele.
O que nós estamos tentando fazer é o seguinte ditado: é que pouco dinheiro na mão de muitos significa distribuição de riqueza, e muito dinheiro na mão de poucos significa pobreza, significa miséria, significa desnutrição. É isso que as pessoas não gostam. É isso que as pessoas não gostam.
Os dados que o Haddad mostrou aí, é uma demonstração que vocês precisam conhecer para vocês saberem o que acontece de fato nesse país. Eu tenho muito orgulho de saber que o Brasil só voltou a crescer acima de 3% quando nós voltamos ao governo, Haddad. A última vez tinha sido em 2010, quando a economia cresceu 7,5%.
De lá para cá ela caiu, só voltou a crescer quando nós chegamos. O salário mínimo ficou sete anos sem receber um reajuste real de salário. Não a reposição inflacionária, mas alguma coisa comparada ao crescimento do PIB.
Há quanto tempo não se reajustava a tabela do Imposto de Renda? Quando você não reajusta a tabela do imposto de renda, você está diminuindo o poder aquisitivo do trabalhador. Então, esse país era assim.
As pessoas de baixo eram tratadas como invisíveis e continuavam sempre mais pobres. É por isso que nós tínhamos acabado com a pobreza em 2014, tínhamos acabado com a fome e voltamos em 2023 com 33 milhões de pessoas passando fome. E é por isso que eu tenho orgulho de dizer que em dois anos e meio a gente acabou com a fome outra vez nesse país.
O pessoal que acompanha mais o noticiário da imprensa sabe que tem algumas coisas que acontecem que não têm muita explicação. A primeira reunião que eu tive com a indústria automobilística, depois que eu voltei para a Presidência da República, era a indústria automobilística se queixando que estavam vendendo pouco carro. Eram as empresas de representação da indústria automobilística dizendo que estavam vendendo pouco carro.
De 2010, saímos de 3 milhões e 600 mil carros vendidos para 1 milhão e 600 mil carros, metade. Aí quando o pessoal do aço veio reclamar conosco que estava vendendo pouco aço, a gente mostrava: diminuiu 1 milhão e 600 mil carros, só pode vender menos aço.
Diminuiu a construção de casas, só pode vender menos aço. Quando a indústria automobilística veio reclamar, eu falei para a indústria automobilística: “cara, vocês tinham salão de automóvel no Brasil, vocês acabaram com o salão de automóvel. Como é que se explica vocês reclamarem de que não vendem carro e o salão de automóvel, que era, sabe, o cartão postal de vocês, vocês acabaram?”.
Dia 20 de novembro vai voltar a funcionar o salão de automóvel nesse país e nós vamos poder... A indústria automobilística, que fazia mais de 20 anos que não apresentava um projeto de carro novo, depois que veio uma empresa chinesa para cá, ô Rui, já anunciaram mais de R$ 190 bilhões no investimento de novos modelos de carro. É isso que faz a economia crescer, é motivação, é provocação e é seriedade.
Eu duvido, e falo isso olhando nos olhos de vocês, que em algum momento teve alguém nesse país que tivesse pelo menos 10% do compromisso que a gente tem com a questão fiscal nesse país. Eu duvido. Esse país nunca foi tratado com seriedade, nunca.
Eu lembro que tinha um economista muito famoso que já morreu, que era um homem muito inteligente, muito esperto, muito sabido. O Delfim Neto [ex-ministro da Fazenda], às vezes, ele brincava de enganar os outros, ou seja, ele falava que ia fazer, mas não fazia. E o que acontecia?
Os outros também brincavam com a gente, fingiam que iam fazer, mas também não faziam. E o Brasil ficava naquela coisa enrolada de nunca conseguir dar um passo, um salto de qualidade. Quando eu fico pensando que fomos nós que pela primeira vez resolvemos fazer uma poupança e fazer uma reserva internacional que persiste desde 2008, e se não fosse ela, a gente já tinha quebrado, e a gente mantém uma reserva internacional de US$ 370 bilhões, o que poucos países do mundo têm.
E isso permite que a gente vá escarafunchando para cá, vá puxando o Haddad para cá, vá puxando o Rui Costa, vá empurrando a Caixa Econômica, que é sempre muito sovina, “não, não posso fazer, não está preparada”. Você vai cutucando o cara, pelo amor de Deus, abra a mão, abra o seu coração para o povo, o dinheiro deve ser o dinheiro do próprio povo. Ele vai amolecendo, ele já está rindo, você fala mais suave.
E a gente vai percebendo que é possível fazer as coisas. É possível. Quem é que imaginava que a gente conseguiria aprovar e chegar, no ano que vem, o trabalhador que ganha até R$ 5 mil não pagar mais Imposto de Renda nesse país?
Quem é que acreditava que a partir de novembro a gente vai ter mais de 15 milhões e meio de pessoas, sabe, não precisando pagar mais gás de cozinha, o botijão de 13 quilos, que sai da Petrobras a R$ 37 e chega na casa de vocês a R$ 140? Quem é que imaginava que a gente ia fazer um programa em que quem consome até 80 quilowatts de energia não vai pagar nada de energia e quem consome até 120 [quilowatts] só vai pagar a diferença? Quem é que imaginava que a gente fosse criar um programa, o Pé-de-Meia, para garantir que milhões e milhões de meninos do ensino técnico e médio pudessem continuar estudando e não ter que entrar no mercado de trabalho precocemente abandonando a escola?
Essas coisas só acontecem por causa do compromisso originário que nós temos com o povo trabalhador do país. Ou seja, eu não nasci numa academia política para ser candidato a presidente, eu nasci numa porta de fábrica. Então, eu tenho na minha mente a certeza de onde eu vim e para onde eu vou voltar quando eu sair daqui.
Eu não vou fazer pós-graduação em nenhum país do mundo, eu vou voltar a conviver com o povo desse país que é o responsável de me eleger pela terceira vez para presidente da República desse país. E esse povo é muito bondoso, porque esse povo, ele é muito calmo, ele tem muita esperança, ele tem uma expectativa de espera que outros povos de outros países não têm. E eles acreditam, aí é só a classe dirigente levar em conta que com muito pouco a gente resolve o problema dessa gente.
Eu quando vejo, Haddad, os empresários, às vezes, criticar a gente, porque a gente gasta demais, porque a gente gasta demais, porque vai criar um programa de R$ 40 bilhões de financiamento de casa, tinha gente que não queria que a gente criasse esse programa de reforma de casa, tinha gente que não queria que a gente aumentasse a poupança, porque para o mercado não interessa, não sei das quantas. Sabe que os empresários que reclamam de nós, eles têm praticamente mais de R$ 500 bilhões de desoneração em isenção fiscal e eles não querem baixar 1% disso. Então, é preciso que a gente tenha firmeza e a certeza de dizer de que lado a gente está e para quem de verdade a gente quer governar.
Eu quero que os empresários todos ganhem muito dinheiro, eu quero que as suas empresas possam crescer, possam produzir, possam gerar emprego, eu quero que a indústria automobilística venda quantos carros necessitar, e só vai vender se o povo trabalhador puder comprar. Eu quero que os banqueiros ganhem dinheiro, mas não precisa extorquir o povo, ganhe dinheiro de forma tranquila, emprestando dinheiro, a juros razoáveis. E aí, Haddad, cai nas nossas costas, porque o Banco Central vai precisar começar a baixar os juros, porque todo mundo sabe o que nós herdamos. Todo mundo sabe o que nós herdamos.
E todo mundo sabe que nós estamos preparando esse país para ter uma política monetária mais séria. Todo mundo sabe. Todo mundo sabe que quando o presidente Trump [Donald, presidente dos EUA] sobretaxou o Brasil e ofendeu o Brasil, a gente não abaixou a cabeça, porque embora a gente não seja tão grande como eles, a gente tem caráter que muitas vezes eles não sabem que a gente tem, a gente tem dignidade que muitas vezes eles não sabem que a gente tem.
E é isso que faz um país virar nação. É isso que significa soberania nacional. Um país onde o povo não tem casa, onde o povo não tem educação, onde o povo não tem comida, esse país não é soberano.
Aliás, nem de país pode ser chamado, porque para a gente falar de um país de verdade, para falar em democracia, isso tem que ter, tem que estar espelhado no rosto das pessoas, na roupa que as pessoas se vestem, na comida que as pessoas comem, na qualidade de educação que eles tenham, na qualidade de sapato que eles calçam. É isso que dá o sentido de soberania de um país. E é por isso, companheiros e companheiras, que eu estou orgulhoso hoje.
Eu estou muito orgulhoso porque estou cumprindo uma das minhas profissões de fé: fazer com que todas as pessoas desse país possam ser beneficiadas com as políticas de inclusão social. O Haddad falou algumas coisas aí, mas se a gente for fazer uma relação de tudo o que nós batemos recorde nesse país, sinceramente, só as mulheres jogadoras do Corinthians é que bateram mais recorde que nós, porque elas são agora hexacampeãs da Libertadores [Copa Libertadores da América]. Então, quando você fica olhando para trás, e aqui tem gente muito humilde do movimento social, mas muito preparada politicamente, aqui tem gente preparada intelectualmente, pode pesquisar, pesquisem para saber em que momento da história esse país teve a situação que ele tem hoje.
Não é só o crescimento econômico, é a distribuição desse crescimento. Porque esse país já cresceu durante 30 anos em média 7% ao ano, e o povo continuou pobre. Esse país já teve anos que o PIB [Produto Interno Bruto] cresceu 14% ao ano, e quando o IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] fez pesquisa ou o Banco Mundial, o povo estava mais pobre.
Então, é preciso a gente compartilhar o crescimento da economia com a distribuição. Tem gente que acha que a gente não pode dar aumento para o salário mínimo, mas se o PIB cresceu 2%, ele cresceu por quê? Ele cresceu porque alguém trabalhou, e as pessoas que ganharam salário mínimo trabalharam.
Então, é justo que esse crescimento seja repartido. Nós ainda não levamos em conta uma coisa, nós estamos para adotar uma política de cuidados, que é uma coisa que a gente vai ter que pensar muito, porque quando a gente anunciar, tem que acontecer. Mas imagina se a gente fosse, Haddad, colocar no crescimento do PIB brasileiro a quantidade de pessoas que trabalham cuidando de parentes, cuidando de pai, cuidando de mãe, cuidando de filho, sem ganhar nada.
Se a gente colocasse isso no crescimento do PIB, a gente ia ter o PIB quase que dobrado, porque, embora essa gente não ganhe, eles produzem, e nós não levamos em conta. Então, companheiros e companheiras, eu quero, Haddad, a você, ao Galípolo [Gabriel, presidente do Banco Central], que contribuiu nessa nova política habitacional, ao Rui Costa e à Casa Civil, que são os responsáveis de colocar isso no papel, ao Jader [Filho, ministro das Cidades], que é o ministro executor, e a vocês, que pressionam a gente todo dia. Eu digo sempre o seguinte, nesse governo, não parem de reclamar.
Aqui nunca teve política para ajudar material de construção. Aquele pequeno vendedor de material que fica vendendo fiado, ainda na caderneta. Agora não, agora vai ter crédito, e a Caixa é que vai ser o pagador desse crédito.
E aí vocês vão aprender como é bom. Quando o rico tem muito dinheiro, ele vai comprar um tijolo em Paris. Quando o pobre tem um pouquinho de dinheiro, ele vai comprar um tijolo na rua e na vila em que ele mora.
É esse o Brasil que nós queremos. Um abraço, gente.
Bem, eu acho que hoje nós estamos tentando fechar um ciclo para resolver um dos problemas mais sérios do povo brasileiro. A questão da moradia, a questão da reforma das casas, porque nem todo mundo quer comprar uma casa nova, nem todo mundo precisa comprar uma casa nova.
Às vezes, o cara tem uma casinha que ele construiu há 30 anos e ele não quer mudar da vila que ele mora, ele não quer mudar do bairro que ele mora, mas está caindo o telhado. Às vezes, ele tem uma lojinha que ele precisa fazer um banheiro novo para atender os clientes, um balcão novo. Ou seja, se a gente não olhar para essa gente, quem é que vai olhar?
Um dos papéis mais importantes do Estado é olhar para aquelas pessoas que o mercado não tem interesse de olhar. Pode ser duro dizer uma coisa dessas? Vão dizer: “o Lula é contra o mercado”? Não.
O mercado é muito sábio. O mercado não gosta de fazer aposta errada. O mercado não gosta de ganhar pouco.
Então, para que abrir uma linha de crédito para o cara ir comprar, sabe, num depósito de material de construção? O dono de um depósito é um empresário pequeno. Às vezes, é um depósito numa vila e ele não tem condições, sabe, de ter financiamento.
Se a gente consegue fazer o financiamento chegar na mão das pessoas, aquele depósito vai começar a ser frequentado. Ele vai ter, por parte da Caixa Econômica [Federal], a garantia de que as pessoas que vão pegar o crédito vão utilizar o crédito para que a gente possa fazer a reforma da casa.
E assim esse país vai dar um salto de qualidade, porque não tem muita explicação a gente ver uma notícia no jornal de que tem tantos milhões de casas no Brasil que não têm banheiro. Não tem nenhuma explicação para, em um país do tamanho do Brasil, a gente ligar a televisão e ver que tem milhões de pessoas que vão fazer suas necessidades fora de casa, no mato, que tem milhões de pessoas que nunca tomaram um banho de chuveiro.
Que tem milhões de pessoas que nunca tiveram uma torneira dentro de casa para lavar um prato, ou um tanque com água correndo para poder lavar a roupinha dos seus filhos. Eu ia falar ‘roupinha do marido’, mas o marido precisa criar vergonha e aprender a lavar a roupa dele também – porque, se ele suja, ele tem que aprender a lavar.
Então, são essas novidades que parecem novidades, porque tem um ditado que a gente tem que aprender, gente: este país nunca teve um governo que tivesse qualquer relação mais íntima com a maioria do povo sofrido desse país. Não adianta conhecer teoricamente o problema.
Não adianta ler um livro para, na época das eleições, ficar citando o miserê do povo. É preciso que já tenha sentido, que já tenha vivenciado, para que as pessoas, quando ganharem as eleições, tragam isso consigo na sua bagagem – porque é muito fácil mudar de comportamento. É muito fácil.
Nada aqui dá motivação para a gente lembrar do mundo que a gente vivia antes. Aqui é tudo mais fácil. Por isso que governar de Brasília não é o ideal.
Brasília é o palácio onde a gente fica, mas a gente precisa governar sabendo que o povo que precisa de nós não está aqui. O povo que precisa de nós não precisa de bilhões, não precisa sequer de milhões, precisa de alguns milhares de reais. E é pouco.
E com esse pouco que as pessoas mais humildes recebem, eles conseguem movimentar uma economia. Eles conseguem fazer a padaria da esquina funcionar, o depósito de material da construção funcionar, a lojinha que vende roupa de criança funcionar, porque ele compra as coisas ali em volta da casa dele. E quando a economia do bairro começa a melhorar, todo mundo quer reformar a sua casa.
Quem é que não quer fazer uma garagem quando tem dinheiro para comprar o carrinho? Aliás, nós tínhamos um grande intelectual brasileiro que dizia que o Brasil é o único país do mundo em que o carro tem casa e o pobre não tem casa. Porque tem casa que tem três garagens para quatro carros, para cinco carros, e muitas vezes a maioria dos pobres não tem um quarto.
Às vezes, as pessoas dormem apinhadas numa cama, com quatro, cinco pessoas no mesmo quarto, na mesma cama, apinhadas em rede. E ninguém se preocupa com isso, porque as pessoas não vão lá. Essas pessoas mais humildes não têm condição de protestar.
Muitas vezes eles não têm sindicato. Muitas vezes eles não estão organizados na maioria dos lugares do país. Então essas pessoas ficam sendo tratadas como se fossem os eternos invisíveis da sociedade brasileira.
O orçamento da União não passava por essa gente. Não passava. Quem é que vai discutir pobre no orçamento?
Então, o que nós estamos fazendo é tentar passar a ideia para vocês que as coisas mudaram nesse país. O que nós estamos querendo passar para vocês é a ideia de que, embora a gente governe para todo mundo, as pessoas mais necessitadas têm que ter prioridade nas políticas do governo e nas decisões do governo. E sabe o ministro Haddad [Fernando, da Fazenda], o ministro Jader [Filho, das Cidades], o ministro Rui [Costa, da Casa Civil], sabe o caso da Caixa Econômica?
O que me incomodava muito é que muitas vezes a gente faz o programa para as pessoas mais humildes, para bem mais humildes. E chega um companheiro que trabalha, que ganha R$ 7 mil por mês, R$ 8 mil por mês, R$ 6 mil por mês, um bancário, um metalúrgico, um químico, um gráfico, um policial, um trabalhador do Banco do Brasil, um próprio trabalhador da Caixa Econômica Federal, ele ganha R$ 8 ou R$ 9 mil, não tem política para ele. Ele não é pobre e miserável, ele não é rico, então ele não existe também.
Porque a gente não pensa na política para essa gente. E é preciso saber que essa gente não é tão pobre, mas é quase que pobre. Porque se ele ganhar R$ 8 mil e pagar um aluguel numa casa, tiver que pagar uma escola para o filho, não vai sobrar dinheiro para ele.
O que nós estamos tentando fazer é o seguinte ditado: é que pouco dinheiro na mão de muitos significa distribuição de riqueza, e muito dinheiro na mão de poucos significa pobreza, significa miséria, significa desnutrição. É isso que as pessoas não gostam. É isso que as pessoas não gostam.
Os dados que o Haddad mostrou aí, é uma demonstração que vocês precisam conhecer para vocês saberem o que acontece de fato nesse país. Eu tenho muito orgulho de saber que o Brasil só voltou a crescer acima de 3% quando nós voltamos ao governo, Haddad. A última vez tinha sido em 2010, quando a economia cresceu 7,5%.
De lá para cá ela caiu, só voltou a crescer quando nós chegamos. O salário mínimo ficou sete anos sem receber um reajuste real de salário. Não a reposição inflacionária, mas alguma coisa comparada ao crescimento do PIB.
Há quanto tempo não se reajustava a tabela do Imposto de Renda? Quando você não reajusta a tabela do imposto de renda, você está diminuindo o poder aquisitivo do trabalhador. Então, esse país era assim.
As pessoas de baixo eram tratadas como invisíveis e continuavam sempre mais pobres. É por isso que nós tínhamos acabado com a pobreza em 2014, tínhamos acabado com a fome e voltamos em 2023 com 33 milhões de pessoas passando fome. E é por isso que eu tenho orgulho de dizer que em dois anos e meio a gente acabou com a fome outra vez nesse país.
O pessoal que acompanha mais o noticiário da imprensa sabe que tem algumas coisas que acontecem que não têm muita explicação. A primeira reunião que eu tive com a indústria automobilística, depois que eu voltei para a Presidência da República, era a indústria automobilística se queixando que estavam vendendo pouco carro. Eram as empresas de representação da indústria automobilística dizendo que estavam vendendo pouco carro.
De 2010, saímos de 3 milhões e 600 mil carros vendidos para 1 milhão e 600 mil carros, metade. Aí quando o pessoal do aço veio reclamar conosco que estava vendendo pouco aço, a gente mostrava: diminuiu 1 milhão e 600 mil carros, só pode vender menos aço.
Diminuiu a construção de casas, só pode vender menos aço. Quando a indústria automobilística veio reclamar, eu falei para a indústria automobilística: “cara, vocês tinham salão de automóvel no Brasil, vocês acabaram com o salão de automóvel. Como é que se explica vocês reclamarem de que não vendem carro e o salão de automóvel, que era, sabe, o cartão postal de vocês, vocês acabaram?”.
Dia 20 de novembro vai voltar a funcionar o salão de automóvel nesse país e nós vamos poder... A indústria automobilística, que fazia mais de 20 anos que não apresentava um projeto de carro novo, depois que veio uma empresa chinesa para cá, ô Rui, já anunciaram mais de R$ 190 bilhões no investimento de novos modelos de carro. É isso que faz a economia crescer, é motivação, é provocação e é seriedade.
Eu duvido, e falo isso olhando nos olhos de vocês, que em algum momento teve alguém nesse país que tivesse pelo menos 10% do compromisso que a gente tem com a questão fiscal nesse país. Eu duvido. Esse país nunca foi tratado com seriedade, nunca.
Eu lembro que tinha um economista muito famoso que já morreu, que era um homem muito inteligente, muito esperto, muito sabido. O Delfim Neto [ex-ministro da Fazenda], às vezes, ele brincava de enganar os outros, ou seja, ele falava que ia fazer, mas não fazia. E o que acontecia?
Os outros também brincavam com a gente, fingiam que iam fazer, mas também não faziam. E o Brasil ficava naquela coisa enrolada de nunca conseguir dar um passo, um salto de qualidade. Quando eu fico pensando que fomos nós que pela primeira vez resolvemos fazer uma poupança e fazer uma reserva internacional que persiste desde 2008, e se não fosse ela, a gente já tinha quebrado, e a gente mantém uma reserva internacional de US$ 370 bilhões, o que poucos países do mundo têm.
E isso permite que a gente vá escarafunchando para cá, vá puxando o Haddad para cá, vá puxando o Rui Costa, vá empurrando a Caixa Econômica, que é sempre muito sovina, “não, não posso fazer, não está preparada”. Você vai cutucando o cara, pelo amor de Deus, abra a mão, abra o seu coração para o povo, o dinheiro deve ser o dinheiro do próprio povo. Ele vai amolecendo, ele já está rindo, você fala mais suave.
E a gente vai percebendo que é possível fazer as coisas. É possível. Quem é que imaginava que a gente conseguiria aprovar e chegar, no ano que vem, o trabalhador que ganha até R$ 5 mil não pagar mais Imposto de Renda nesse país?
Quem é que acreditava que a partir de novembro a gente vai ter mais de 15 milhões e meio de pessoas, sabe, não precisando pagar mais gás de cozinha, o botijão de 13 quilos, que sai da Petrobras a R$ 37 e chega na casa de vocês a R$ 140? Quem é que imaginava que a gente ia fazer um programa em que quem consome até 80 quilowatts de energia não vai pagar nada de energia e quem consome até 120 [quilowatts] só vai pagar a diferença? Quem é que imaginava que a gente fosse criar um programa, o Pé-de-Meia, para garantir que milhões e milhões de meninos do ensino técnico e médio pudessem continuar estudando e não ter que entrar no mercado de trabalho precocemente abandonando a escola?
Essas coisas só acontecem por causa do compromisso originário que nós temos com o povo trabalhador do país. Ou seja, eu não nasci numa academia política para ser candidato a presidente, eu nasci numa porta de fábrica. Então, eu tenho na minha mente a certeza de onde eu vim e para onde eu vou voltar quando eu sair daqui.
Eu não vou fazer pós-graduação em nenhum país do mundo, eu vou voltar a conviver com o povo desse país que é o responsável de me eleger pela terceira vez para presidente da República desse país. E esse povo é muito bondoso, porque esse povo, ele é muito calmo, ele tem muita esperança, ele tem uma expectativa de espera que outros povos de outros países não têm. E eles acreditam, aí é só a classe dirigente levar em conta que com muito pouco a gente resolve o problema dessa gente.
Eu quando vejo, Haddad, os empresários, às vezes, criticar a gente, porque a gente gasta demais, porque a gente gasta demais, porque vai criar um programa de R$ 40 bilhões de financiamento de casa, tinha gente que não queria que a gente criasse esse programa de reforma de casa, tinha gente que não queria que a gente aumentasse a poupança, porque para o mercado não interessa, não sei das quantas. Sabe que os empresários que reclamam de nós, eles têm praticamente mais de R$ 500 bilhões de desoneração em isenção fiscal e eles não querem baixar 1% disso. Então, é preciso que a gente tenha firmeza e a certeza de dizer de que lado a gente está e para quem de verdade a gente quer governar.
Eu quero que os empresários todos ganhem muito dinheiro, eu quero que as suas empresas possam crescer, possam produzir, possam gerar emprego, eu quero que a indústria automobilística venda quantos carros necessitar, e só vai vender se o povo trabalhador puder comprar. Eu quero que os banqueiros ganhem dinheiro, mas não precisa extorquir o povo, ganhe dinheiro de forma tranquila, emprestando dinheiro, a juros razoáveis. E aí, Haddad, cai nas nossas costas, porque o Banco Central vai precisar começar a baixar os juros, porque todo mundo sabe o que nós herdamos. Todo mundo sabe o que nós herdamos.
E todo mundo sabe que nós estamos preparando esse país para ter uma política monetária mais séria. Todo mundo sabe. Todo mundo sabe que quando o presidente Trump [Donald, presidente dos EUA] sobretaxou o Brasil e ofendeu o Brasil, a gente não abaixou a cabeça, porque embora a gente não seja tão grande como eles, a gente tem caráter que muitas vezes eles não sabem que a gente tem, a gente tem dignidade que muitas vezes eles não sabem que a gente tem.
E é isso que faz um país virar nação. É isso que significa soberania nacional. Um país onde o povo não tem casa, onde o povo não tem educação, onde o povo não tem comida, esse país não é soberano.
Aliás, nem de país pode ser chamado, porque para a gente falar de um país de verdade, para falar em democracia, isso tem que ter, tem que estar espelhado no rosto das pessoas, na roupa que as pessoas se vestem, na comida que as pessoas comem, na qualidade de educação que eles tenham, na qualidade de sapato que eles calçam. É isso que dá o sentido de soberania de um país. E é por isso, companheiros e companheiras, que eu estou orgulhoso hoje.
Eu estou muito orgulhoso porque estou cumprindo uma das minhas profissões de fé: fazer com que todas as pessoas desse país possam ser beneficiadas com as políticas de inclusão social. O Haddad falou algumas coisas aí, mas se a gente for fazer uma relação de tudo o que nós batemos recorde nesse país, sinceramente, só as mulheres jogadoras do Corinthians é que bateram mais recorde que nós, porque elas são agora hexacampeãs da Libertadores [Copa Libertadores da América]. Então, quando você fica olhando para trás, e aqui tem gente muito humilde do movimento social, mas muito preparada politicamente, aqui tem gente preparada intelectualmente, pode pesquisar, pesquisem para saber em que momento da história esse país teve a situação que ele tem hoje.
Não é só o crescimento econômico, é a distribuição desse crescimento. Porque esse país já cresceu durante 30 anos em média 7% ao ano, e o povo continuou pobre. Esse país já teve anos que o PIB [Produto Interno Bruto] cresceu 14% ao ano, e quando o IBGE [Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística] fez pesquisa ou o Banco Mundial, o povo estava mais pobre.
Então, é preciso a gente compartilhar o crescimento da economia com a distribuição. Tem gente que acha que a gente não pode dar aumento para o salário mínimo, mas se o PIB cresceu 2%, ele cresceu por quê? Ele cresceu porque alguém trabalhou, e as pessoas que ganharam salário mínimo trabalharam.
Então, é justo que esse crescimento seja repartido. Nós ainda não levamos em conta uma coisa, nós estamos para adotar uma política de cuidados, que é uma coisa que a gente vai ter que pensar muito, porque quando a gente anunciar, tem que acontecer. Mas imagina se a gente fosse, Haddad, colocar no crescimento do PIB brasileiro a quantidade de pessoas que trabalham cuidando de parentes, cuidando de pai, cuidando de mãe, cuidando de filho, sem ganhar nada.
Se a gente colocasse isso no crescimento do PIB, a gente ia ter o PIB quase que dobrado, porque, embora essa gente não ganhe, eles produzem, e nós não levamos em conta. Então, companheiros e companheiras, eu quero, Haddad, a você, ao Galípolo [Gabriel, presidente do Banco Central], que contribuiu nessa nova política habitacional, ao Rui Costa e à Casa Civil, que são os responsáveis de colocar isso no papel, ao Jader [Filho, ministro das Cidades], que é o ministro executor, e a vocês, que pressionam a gente todo dia. Eu digo sempre o seguinte, nesse governo, não parem de reclamar.
Aqui nunca teve política para ajudar material de construção. Aquele pequeno vendedor de material que fica vendendo fiado, ainda na caderneta. Agora não, agora vai ter crédito, e a Caixa é que vai ser o pagador desse crédito.
E aí vocês vão aprender como é bom. Quando o rico tem muito dinheiro, ele vai comprar um tijolo em Paris. Quando o pobre tem um pouquinho de dinheiro, ele vai comprar um tijolo na rua e na vila em que ele mora.
É esse o Brasil que nós queremos. Um abraço, gente.