Entrevista do presidente Lula à TV Verdes Mares – Bom dia Ceará
Jornalista Karla Moura: Eu queria começar, presidente, desejando um ótimo dia e boas-vindas aqui ao Bom Dia Ceará.
Presidente Lula: Obrigado Karla e bom dia ao povo do Ceará.
Jornalista Karla Moura: Presidente, parte da sua agenda hoje é em relação à inauguração do Polo Automotivo do Ceará, um marco para a economia cearense, não só quando a gente fala em relação à geração de empregos, mas é uma coisa que já vinha sendo aguardada há muito tempo, principalmente com a saída de algumas empresas nos últimos anos aqui do estado. Eu queria saber em relação ao pós, o que é que o governo está pensando para além dessa implementação, por exemplo, algo relacionado a benefícios, incentivos fiscais para que esse produto chegue, por exemplo, ao consumidor final.
Presidente Lula: Olha, nem tudo que o governo faz de investimento tem incentivos fiscais. Muitas vezes você faz um incentivo fiscal para atrair um determinado capital, determinada empresa venha para cá. O que é importante, Karla, é saber que hoje vai acontecer coisas importantes no Ceará.
Além do Polo Automotivo, que a gente vai anunciar, o Ceará vai produzir o primeiro carro híbrido da General Motors no Brasil, que é uma coisa extremamente importante. É o começo de uma nova era de desenvolvimento industrial no estado do Ceará. Eu lembro da alegria que eu tive quando trouxe a Siderúrgica para cá.
Também a gente vai anunciar carteirinha para professores. Os professores vão ter uma carteirinha semelhante àquela da OAB, em que o professor agora vai poder ter orgulho de mostrar a sua carteirinha. Ele vai ter desconto em farmácias, em cinemas, em passagem de avião, em hotel.
Tudo isso em convênio com a empresa. E também 403 professores vão receber computadores -- quase todo mundo vai receber no futuro. E a novidade importante é que nós vamos anunciar o primeiro data center de verdade no Ceará.
No complexo portuário industrial do Ceará, a gente vai ter o TikTok que vai gerar investimentos a longo prazo de quase 200 bilhões de reais. E vai movimentar o setor de TI, de comunicação, o setor de energia. Ou seja, um data center que vai consumir energia renovável, portanto não vai mexer na energia que o povo está usando.
O data center vai consumir água reutilizada, não vai consumir água que o povo está utilizando. Então vai ter uma revolução aqui no estado do Ceará. Eu estou convencido que a gente pode começar a medir o Ceará daqui para frente como um estado que está em um polo de desenvolvimento extraordinário.
Com o data center e com os professores trabalhando muito mais orgulhosos com a sua carteirinha.
Jornalista Karla Moura: Perfeito, presidente. Já falamos aqui então da sua agenda hoje, desses compromissos, desses marcos aqui em diferentes aspectos da economia e tecnológicos aqui para o estado. Ontem, já mudando aqui um pouquinho de assunto, o senhor teve uma conversa por telefone com o presidente Donald Trump [Estados Unidos]. Conversou em relação, claro, acredito, ao tarifaço dos Estados Unidos. A gente já teve alguns, inclusive, que foram excluídos.
Mas eu queria saber o que é que o senhor considera já definido, martelo batido, como a gente costuma dizer aqui no Ceará. E o que é que ainda é uma preocupação do Brasil em relação a esse tarifaço?
Presidente Lula: Olha, da mesma forma que o povo brasileiro teve uma notícia ruim quando o presidente Trump anunciou a taxação. Eu acho que está perto da gente ouvir uma notícia boa, além dessa notícia de tirar alguns produtos nossos da taxação que ele fez.
Eu conversei seriamente com o presidente Trump sobre o fato dele compreender a necessidade do fortalecimento das duas maiores democracias do Ocidente: Brasil e Estados Unidos. Portanto, não tem sentido essa taxação. Disse para ele que era importante rever isso.
Disse para ele que era importante que a gente discutisse a questão do crime organizado, porque é preciso combater o crime organizado. E nós temos gente importante que pratica crime aqui no Brasil, que mora em Miami. Eu mandei um documento para ele, dizendo o que nós queríamos que fosse feito.
E disse para ele que nós estamos dispostos a trabalhar juntos para combater o crime organizado na fronteira, onde estiver. Porque o crime organizado é um atraso para qualquer sociedade, é uma violência contra a economia dos estados, é uma violência contra a liberdade. Então, foi uma conversa extraordinária.
Eu posso te dizer que toda vez que eu converso com o Trump, me surpreende. Porque muitas vezes você vê o Trump na televisão, muito nervoso, e de repente, na conversa pessoal, ele é outra pessoa. E eu fiz questão de dizer para ele.
Nós temos dois Trumps, nós temos o Trump da televisão e o Trump da conversa pessoal. E eu acho que vai ser uma relação boa. Pode estar certa, porque eu estou convencido que a química entre nós rolou de verdade.
E o Brasil vai ganhar, os Estados Unidos vão ganhar, porque são as duas maiores economias do Ocidente. Nós estamos muito bem, 200 anos de relações diplomáticas, não há por que ter divergência entre Brasil e Estados Unidos.
Jornalista Karla Moura: Mas a gente pode esperar alguma nova revogação em relação a esse tarifaço, já para agora?
Presidente Lula: Pode esperar, muita coisa vai acontecer. Você está vendo o meu sorriso de Monalisa aqui? É porque eu estou convencido que vão acontecer boas novidades.
Jornalista Karla Moura: Antecipa para a gente, presidente.
Presidente Lula: É que determinadas conversas entre dois chefes de Estado, a gente não pode ficar divulgando tudo que a gente conversou, porque as coisas vão ter que acontecer envolvendo outras pessoas.
Mas eu só posso te dizer e dizer ao povo do Ceará e para o povo brasileiro, eu estou muito otimista da minha conversa com o presidente Trump ontem à noite, mas muito otimista mesmo.
Jornalista Karla Moura: Ainda sobre esse diálogo, presidente Lula, eu queria saber… O senhor inclusive tocou nesse assunto sobre esse tráfico internacional, sobre essa atuação internacional, na verdade, das facções. O Ceará, inclusive, tem uma posição geográfica privilegiada em relação a isso, isso é favorável como a gente trouxe para o governo em diferentes aspectos, mas para as facções criminosas também, elas estão de olho nisso.
A gente vê, inclusive, essa atuação no dia a dia. Tivemos no primeiro semestre desse ano uma operação da APF no Mucuripe, a região pertinho de onde a gente está, inclusive. Mas a sensação que a gente tem, e quando eu falo a gente aqui, especialistas e a população principalmente, é que entra governo, sai governo, e aqui estadual e federal, e parece que a gente está enxugando gelo, e parece que as facções continuam cada vez mais organizadas.
Presidente Lula: Cada vez crescendo mais, cada vez mais profissionalizadas, cada vez mais internacionalizadas. Tecnológicas. Porque hoje, as facções criminosas, elas competem com o Estado.
Elas têm drones, elas têm inteligência. Eles têm coisas que muitas vezes as forças policiais não têm. Então, o combate às facções criminosas, o combate ao narcotráfico é uma coisa muito importante.
E nós vamos assumir isso de corpo e alma. Porque nós não podemos permitir que traficantes, que vendedores de armas, que vendedores, como por exemplo, nós temos o maior traficante de combustível do Brasil, que mora em Miami. E eu fiz questão de dizer para o presidente Trump: “Vamos combater o narcotráfico, vamos começar pegando os brasileiros que estão aí”.
Só o cidadão de Manguinhos deve ao Estado brasileiro mais de 6 bilhões de dólares. Tem um projeto para votar que é contra o devedor contumaz, que não é votado nunca. Então, o que nós queremos, na verdade, é o seguinte: acabar com a bandidagem. É acabar.
Jornalista Karla Moura: Qual o caminho para isso?
Presidente Lula: O caminho é esse: nós estamos fortalecendo a Polícia Federal. Nós estamos tendo reuniões, com o ministro da Justiça, para a gente estabelecer a PEC que deve ser aprovada na semana que vem. E na medida que a PEC for aprovada, ela vai dizer qual é o papel da União no combate à violência criminal no Brasil.
E aí a gente vai poder fazer muito mais, inclusive colocar mais dinheiro na segurança, reforçar a Polícia Federal nas fronteiras e fazer o convênio com os outros países vizinhos, inclusive com os Estados Unidos, para que a gente possa juntar o que tiver de inteligência nos países para combater o crime organizado.
Nós temos facções no Brasil que têm ramificações em 15 países do mundo. Nós temos outros que têm ramificação na Venezuela, na Bolívia, no Equador, na Colômbia. Então nós sabemos onde eles estão.
E nós precisamos das forças desses países, junto com a nossa força para que a gente possa combater. E eu disse ao presidente Trump, a gente não precisa utilizar armas. Nós temos que utilizar inteligência para que a gente possa acabar com as facções criminosas e com o narcotráfico e com o crime organizado.
Jornalista Karla Moura: A inteligência, presidente, passa por um escopo, inclusive, de policiais. O senhor, inclusive, citou um caso de um criminoso relacionado à venda de combustíveis. Aqui no Ceará a gente tem visto muito mais essa oscilação, essa mudança em relação à atuação dessas facções, muito mais distantes, às vezes, do tráfico de drogas, envolvidas em grandes empresas.
A gente tem casos aqui no estado, inclusive, de famílias sendo expulsas das suas casas por essa questão geográfica mesmo de interesse das facções, regiões inteiras em que há completo abandono por essas famílias. Que respostas a gente pode dar para essas famílias que estão precisando sair daquilo que tanto lutou para ter? Aquela casa, aquele carro, aquele comércio, aquele espaço.
Presidente Lula: A resposta que a gente tem que dar é a seguinte: Nós estamos tentando mexer em todos os andares do crime organizado. Lá embaixo, no bairro pobre, já é a periferia do crime organizado, que causa danos às pessoas mais humildes fazendo isso, querendo intermediar a venda de gás, qualquer benefício que o povo tenha para receber. Houve um tempo em que as pessoas queriam até intermediar o cartão do Bolsa Família com as pessoas pobres.
Isso nós vamos acabar. Para isso é preciso só definir qual é o papel do estado, qual é o papel da União nas coisas com o estado. Porque, no fundo, a Constituição garante que a segurança pública é feita pelo Estado.
Então, o que nós queremos fazer? Nós queremos saber o seguinte. Qual é o papel da Força Nacional? Qual é o papel da Polícia Federal? Onde é que a gente entra com ação e onde é que a gente entra com dinheiro?
Na hora que a PEC definir isso, você pode ficar certa que nós iremos, no Governo Federal, fazer muitos investimentos, mas muitos investimentos, para que a gente seja mais sofisticada do que o crime organizado. Porque o crime organizado hoje está na indústria, na política, no judiciário, na polícia, no futebol e nas bets.
Ele está em tudo que está no lugar. Ele se espraiou. Então, eu fico até com medo, porque quando você faz um concurso público para qualquer cargo... Olha, quem é que disse que as pessoas ligadas ao nosso crime organizado não estão fazendo concurso para fazer parte da estrutura do Governo? Então, é um trabalho muito duro e nós vamos levar isso muito a sério.
Você pode ficar certa que nós estamos discutindo com muito carinho e a minha conversa com o Trump foi muito em torno desse assunto. Vamos trabalhar de verdade, vamos utilizar a inteligência que nós temos dos países que fazem fronteira com o Brasil, dos Estados Unidos e de outra parte do mundo, para que a gente possa jogar todo o peso do mundo para derrotar as facções criminosas, o crime organizado, o narcotráfico, tantas outras coisas ilícitas que tem no planeta Terra.
Jornalista Karla Moura: Existe essa articulação também com os estados? Porque a gente sabe que a PEC da Segurança gerou muitas polêmicas e divisões, inclusive entre os governadores.
Presidente Lula: Gerou polêmica com alguns governadores, sobretudo os governadores do Sudeste, que no início não queriam a PEC, os governadores do Nordeste querem a PEC, não tem problema com os governadores do Nordeste.
O Governo Federal não quer interferir no trabalho do Governo Estadual. Agora, o que nós queremos é perguntar onde é que a gente pode ajudar, onde é que a gente pode entrar, porque a Polícia Federal, ela não pode investigar um crime no Ceará, a não ser que seja um crime federal ou a não ser que o estado peça. Você veja o negócio, jamais seria descoberto quem matou a Marielle se não fosse a Polícia Federal, jamais, porque a polícia do Rio estava, teoricamente, com a parte dela envolvida.
Então, precisou a Polícia Federal entrar, mas ela não pode entrar em tudo. Então, o que nós queremos é definir. Eu tenho certeza que o Congresso vai ter a grandeza de aprovar a PEC e com a PEC aprovada, a gente vai ter um outro momento de discutir a questão da segurança pública no Brasil.
A sociedade brasileira precisa estar de bem com a vida. Ela não pode temer o seu vizinho, ela não pode temer um cidadão que acha que é chefe de um bairro, que é chefe de uma vila, que é chefe de uma rua, que é chefe de um comércio. Não.
Quem é dono de tudo isso é o povo brasileiro. Então, nós vamos garantir a ele que ele tenha essa liberdade.
Jornalista Karla Moura: Presidente, vamos falar agora do bolso de quem está nos acompanhando. Na semana passada, o senhor, inclusive, assinou uma lei que libera a isenção do Imposto de Renda para quem recebe até 5 mil reais. O que o governo está projetando de impacto disso para os próximos anos?
Presidente Lula: Uma novidade boa é a seguinte. Você está acompanhando o caso da Previdência Social. Nós já devolvemos dinheiro para 3,9 milhões de aposentados. Só no Ceará, nós já devolvemos o dinheiro para 205 mil pessoas em um total de 136 milhões de reais.
Quando nós fizemos essa isenção do Imposto de Renda, e eu agradeço ao Congresso Nacional de ter aprovado por unanimidade, é porque é o seguinte: O Brasil não pode continuar sendo um país tão desigual em que o pobre paga mais imposto proporcionalmente do que o rico. Então, essa foi uma coisa muito importante. Isso vai injetar, no ano que vem, na economia, por volta de 28 milhões de reais.
Nós estamos vivendo um bom momento econômico. A inflação é a menor inflação acumulada em quatro anos. Nós temos a economia crescendo. Nós temos o desemprego mais baixo da história do Brasil. A massa salarial é a mais alta da história do Brasil. Nós temos o salário mínimo crescendo todo ano.
E nós estamos vivendo um momento muito extraordinário com a entrada de capital externo no Brasil. Ou seja, eu estou muito otimista. Eu digo sempre o seguinte: eu vivo um momento muito bom da minha vida.
Aos 80 anos, parece que eu entrei no máximo da minha vida. Estou apaixonado pela minha mulher, estou apaixonado pelo Brasil, apaixonado pelas coisas que eu faço, acreditando nas coisas que eu faço, acreditando na educação, acreditando na saúde. Então, esse programa Mais Especialistas vai ser uma revolução.
Vai ser uma revolução no Ceará e no Brasil. Nós temos aqui no Ceará várias carretas, que estão em Juazeiro do Norte e em outras cidades, fazendo tomografia, ressonância magnética, mamografia. A gente quer acabar com a fila de espera que o povo tem, utilizando os hospitais universitários.
Compramos 800 ambulâncias para fazer um ambulatório odontológico, não para ficar em um gabinete esperando, para viajar aos lugares em que as pessoas precisam de dentistas. Nós fizemos o Pé-de-Meia, que é uma revolução na educação para garantir que o jovem continue estudando. Então, eu estou num momento muito especial da minha vida, mas muito especial, e estou vivendo um momento de muito otimismo.
Eu, às vezes, fico pensando o seguinte: Você sabe qual foi a última vez que o Brasil cresceu acima de 3%? Foi quando eu era presidente em 2010. Depois que eu saí da Presidência, nunca mais o Brasil cresceu acima de 3%.
Foi preciso eu voltar para que o Brasil voltasse a crescer acima de 3%. Então, isso é um motivo de orgulho para mim. É um motivo de orgulho saber que o povo brasileiro compreende essas coisas e saber que as coisas vão melhorando.
Houve o julgamento de um presidente, houve o julgamento de quatro generais que estão presos, e não aconteceu nada na sociedade. Cumpriu-se a Constituição, tudo está bem, e tudo está andando normalmente.
Por isso que eu estou feliz, e por isso que eu estou feliz de estar aqui no Ceará.
Jornalista Karla Moura: Deixa eu aproveitar, presidente, o que o senhor falou em relação à saúde, porque é uma demanda da sociedade. A gente tem aí as filas por cirurgias, alguns mutirões já aconteceram, inclusive, aqui no Ceará. Há previsão de novos investimentos para esses mutirões relacionados às cirurgias eletivas, para tentar, de alguma forma, zerar essa balança?
Presidente Lula: Olha, eu conversei com o ministro Padilha [Alexandre, da Saúde], eu participei de dois mutirões, e eu acho que nós vamos ter que trabalhar, a fazer mutirões semanais. Acho que a gente pode fazer, durante quatro sábados seguidos, mutirões, porque é uma coisa extraordinária você envolver 45 hospitais universitários para fazer mutirão, para fazer consultas que as pessoas estavam com dificuldade, para fazer tratamento com especialistas, para fazer cirurgias. Ou seja, nós vamos continuar, porque nós vamos acabar com as filas.
É um compromisso meu, é um compromisso do ministro Padilha, que está trabalhando diuturnamente para que a gente coloque a saúde do povo brasileiro em dia.
Jornalista Karla Moura: Queria tocar num assunto, antes da gente caminhar para o fim da nossa entrevista, também relacionado à saúde, que são as vacinas. O senhor assumiu um governo com um forte movimento anti-vacina, principalmente depois da pandemia.
Os índices de cobertura vacinal acabaram caindo drasticamente, principalmente de algumas doenças específicas, o que preocupa muitos especialistas. Como é que está essa meta até o fim deste mandato? O que vocês estão esperando enquanto governo?
Presidente Lula: Karla, nós estamos recuperando a confiança nas vacinas. É um trabalho lento, mas um trabalho necessário de ser feito, porque aquelas pessoas que diziam que quem tomava vacina ia virar gay, quem tomava vacina ia virar jacaré, quem tomava vacina ia virar não sei das quantas, são irresponsáveis.
Essas pessoas deveriam ser processadas, julgadas e punidas por irresponsabilidade com o futuro deste país. A gente não pode permitir que doenças antigas voltem por causa da falta de uma vacina. É responsabilidade moral e ética de uma mãe, de cuidar para que o seu filho não fique doente, para que ele possa se precaver.
Então, nós estamos trabalhando com muito, mas muita força nisso. É uma briga, eu acho até ideológica, porque o cidadão que falou contra a vacina é responsável por parte das 700 mil pessoas que morreram por Covid. Se a gente tivesse comprado a vacina no tempo certo, se a gente tivesse aplicado a vacina no tempo certo, a gente teria evitado mais da metade das pessoas que morreram de terem morrido.
Então, a vacina também é para nós uma questão de honra. Nós vamos vacinar o povo brasileiro e vacinar todas as crianças brasileiras.
Jornalista Karla Moura: Presidente, aproveitando a sua presença aqui em relação à entrega de tantos equipamentos importantes, a gente está com o ITA [Instituto Tecnológico da Aeronáutica] em construção.
O senhor comentou sobre o Data Center, que deve ser inclusive uma fonte que vai absorver muitos profissionais que devem se formar no ITA aqui do Ceará. Como é que está a expectativa de vocês também em relação a essas obras, à entrega?
Presidente Lula: O ITA é um motivo de orgulho. Você sabe que o ITA veio para cá por um reconhecimento do Governo Federal à qualidade educacional do estado do Ceará no governo Cid [Gomes, ex-governador do Ceará] e no governo Camilo [Santana, ex-governador do Ceará e atual ministro da Educação]. Vamos fazer justiça. E agora no governo Elmano [Freitas, governador do Ceará]. A gente constatou que mais de 40% de todos os jovens que entravam no ITA estudavam aqui no Ceará e passavam no Ceará.
Então, era um prêmio para o Ceará. O que nós fizemos foi dar um prêmio ao estado do Ceará pela qualificação que ele vinha fazendo nos últimos governos. E eu espero que no ano que vem a gente possa inaugurar o ITA, porque me parece que vai estar pronto para fazer o primeiro curso já no começo de 2027.
E quem sabe a gente possa até antecipar. Eu estou convencido de uma coisa. A minha obsessão de fazer com que as coisas aconteçam no Nordeste é porque eu sempre fui um cidadão indignado, porque o Nordeste era o lugar que tinha mais mortalidade infantil, mais analfabeto, mais desnutrição, menos professor universitário, menos mestre, menos doutor, menos pesquisa.
Por que era assim? Por que era a região que tinha mais fome? Então, tudo o que eu puder fazer para trazer investimento e desenvolvimento para o Nordeste, eu vou fazer. Não porque eu quero prejudicar o Sul. É porque eu quero que o Brasil seja mais equânime.
Eu quero que todos os estados tenham a mesma oportunidade de se desenvolver, porque nós somos um território de 8 milhões e meio de quilômetros quadrados, de um único povo, que fala uma única língua, e isso merece ser tratado com igualdade.
Jornalista Karla Moura: Presidente, mais uma pergunta, agora relacionada à vaga no STF [Supremo Tribunal Federal]. Já existe uma previsão do envio da sua indicação?
Presidente Lula: Veja, sinceramente, eu não entendo o porquê da polêmica. Veja, não é o primeiro ministro que eu indico. Já indiquei oito ministros. Eu simplesmente escolho uma pessoa, mando para o Senado, e o Senado, então, faz um julgamento para saber se a pessoa está qualificada ou não.
Eu não sei porque foi transformado num problema político dessa monta, sabe? Eu espero que seja resolvido. Eu estou muito tranquilo com relação a isso. Eu cumpri com o meu papel.
Mandei um nome que eu entendo, que tem qualificação profissional para ser ministro da Suprema Corte. Qualificação comprovada como advogado-geral da União.
Jornalista Karla Moura: Presidente, só para a gente finalizar, eu, enquanto mulher jornalista, não posso deixar de questionar o senhor, a maior autoridade do país, em relação à violência que a gente vive contra as mulheres.
Aqui no Ceará, a gente tem números absurdos, quase que diariamente a gente está noticiando essa violência. O que é que o senhor tem recebido relacionado a isso? Que mensagem o senhor também quer deixar para essas famílias?
Presidente Lula: Ontem eu contei um caso, nos atos que eu participei em Pernambuco. Eu acordei domingo de manhã, fui tomar café com a Janja [Lula da Silva, primeira-dama do Brasil] chorando, por causa da violência contra a mulher. No domingo à noite, no Fantástico, outra vez, a violência contra a mulher, aquele carro arrastando aquela mulher por um quilômetro, que teve as duas pernas amputadas.
Depois, uma mulher que foi trancada, dentro de casa, grávida, com três filhos e o marido tocou fogo na casa. Depois, uma mulher que o marido chega com duas pistolas e descarrega as pistolas em cima dela. Depois, uma criança de dois anos na Bahia que foi violentada, estuprada.
Então, é o seguinte, eu resolvi assumir a tarefa de tentar criar uma mobilização de homens neste país. Não é uma coisa de mulher, é uma coisa de homem. Porque a violência é do homem contra a mulher.
Nós, homens, vamos ter que criar juízo, criar vergonha, nos educar e ao invés de ser violento contra a mulher, a gente tratá-la com respeito. Se um homem não gosta de uma mulher, se separa. Se a mulher não gosta de um homem, ela vai embora e ele fica quieto, procure a vida.
O que não dá é pra você aceitar como normal o cidadão achar que ele tem direito sobre a companheira dele. Que ele pode bater, que ele pode espancar. Não, eu acho que nós temos que juntar todos os homens de bem neste país. Todos! É uma campanha de homem pra homem.
É uma campanha de homem que tem vergonha na cara, que tem caráter, que tem respeito, que quer criar sua família. Dizer pro seu amigo: “Cara, não bata na mulher, não seja violento contra a sua mulher. Se você não gosta mais dela, você toma um rumo e vai embora”.
Fazer como a minha mãe fez. Minha mãe com oito filhos pequenos, meu pai foi encher o saco dela, ela saiu de casa e criou oito filhos sozinha.
Agora, não dá pra levantar a mão e bater na mulher. A mão da gente foi feita pra trabalhar, foi feita pra fazer cafuné e não pra fazer violência na mulher. Então, eu estou… Só pra você ter ideia, como presidente da República, vou fazer o movimento dos homens de bem neste país contra a violência contra a mulher.
Até ontem eu disse: “Olha, quem bater em mulher não precisa votar em mim. Essa mão que bate na mulher, não precisa votar em mim”. Porque é uma vergonha alguém ser violento.
A minha mãe era analfabeta. Minha mãe dizia: “Meu filho, se você tiver um problema com a sua mulher, nunca levante a mão pra ela. Você saia de casa, vá cuidar da sua vida e deixe a sua mulher viver tranquila”.
É assim que a gente tem que ser. A gente não é dono, a gente não é proprietário. A mulher não é obrigada a morar com a gente porque a gente quer que ela fique. Não. Ela vai morar se ela quiser morar.
Então, essa coisa é um movimento que eu estou assumindo porque eu cansei. A gente aprovou a Maria da Penha no meu primeiro governo. Eu pensei que ia diminuir a violência, mas a violência aumenta a cada dia. E não é só no meio do pobre, não. É na classe média e na classe rica também. Então, você tem aqui um companheiro na luta em defesa das mulheres.
Jornalista Karla Moura: A gente compartilha essa revolta e eu queria, presidente, só que o senhor agradecesse agora aos cearenses.
Presidente Lula: Eu quero agradecer, a você, aos ouvintes, aos telespectadores, porque é sempre uma graça a gente poder falar com o povo de um estado que eu adoro tanto como o Ceará. Muito obrigado.
Jornalista Karla Moura: Obrigada, presidente.