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Discurso
Discurso do Vice-Presidente da República na reunião de Grupo de Lima, na Colômbia
Hamilton Mourão durante reunião de Grupo de Lima, na Colômbia
1- Palavras iniciais
Animado do propósito de paz que marca sua diplomacia, o Brasil comparece a esta Cúpula comprometido com a concertação regional que ponha fim à gravíssima crise vivida pela Venezuela.
O momento é de chamada à responsabilidade.
Antes de tudo, dos governos dos países das Américas. Independentemente de ideologias e partidos, é forçoso reconhecer que temos nossa cota de participação na consolidação de um regime ilegal e ilegítimo na Venezuela, devido a erros e omissões que desejamos que não se repitam.
Chamada também à responsabilidade dos organismos internacionais que, na busca de solução para conflitos, devem atender às posições soberanas e seus países-membros mediante a adoção de medidas eficazes, eficientes e efetivas, sob pena de sua irrelevância, a antessala do desastre que irremediavelmente atingirá todos nós.
O mundo vive uma preocupante escalada de tensões políticas, econômicas e militares que deve ser adequadamente enfrentada pela atuação responsável de governos nacionais e de organismos internacionais, o motivo primário de nossa presença nesta Cúpula, reunida para tratar da mais grave crise havida no Hemisfério desde o início dos anos 60 do século passado.
Se o momento é de desafio, é também de afirmação, a partir da memória das nossas independências. Temos uma história comum, compartilhando valores pelos quais lutaram os patriotas de todas as Américas: liberdade, igualdade e justiça.
Neste momento, em que se levantam vozes clamando pela preservação da ordem liberal e democrática erigida no pós-guerra, é oportuno lembrar que este continente, ao longo do maior conflito da História, findo há mais de setenta anos, mostrou ao mundo como grandes ameaças à paz e à liberdade podem ser enfrentadas pelo compromisso com a solidariedade, com a legalidade e com a legitimidade, afastando de nosso Hemisfério conflitos destrutivos e sangrentos que marcaram o terrível século XX.
Essas são as contribuições que o Brasil traz a esta Cúpula.
2- A AMEAÇA DO REGIME CHAVISTA
A primeira delas é a afirmação da ameaça que representa o regime chavista instalado na Venezuela. Ameaça à democracia, à defesa e à segurança dos países da região.
Desfigurando o legado de Simon Bolívar, a ditadura implantada por Hugo Chávez é a antítese da liberdade, da igualdade e da justiça sonhadas pelo libertador em sua luta pela Independência. Em Caracas está instalado um regime de privilégios, discriminação e violência que não respeita as mais elementares condições de um Estado de Direito democrático: eleições livres, alternância de partidos no poder, independência dos poderes constituídos e legítima representação nacional.
Contrariando a tendência da América do Sul, como a região menos militarizada do mundo, a Venezuela, sem ter recebido qualquer ameaça direta à sua soberania e incolumidade territorial, militarizou parte de sua população, por meio de milícias ideologizadas e, desde 2009, vem adquirindo equipamentos militares sofisticados com considerável capacidade ofensiva: carros de combate, helicópteros e caças. Mais grave do que essas aquisições é a disposição do regime de Caracas em atrair atores estranhos à região, que podem aproveitar um eventual conflito interno no país para mover peças no tabuleiro de sua confrontação mundial com o Ocidente.
E a caminho de se tornar um estado renegado, a Venezuela tem em sua cúpula dirigentes envolvidos com crimes transnacionais, razão pela qual talvez se explique sua resiliência financeira em um quadro pré-falimentar do orçamento nacional e, particularmente, a truculência com que investe contra a oposição política e a maioria da população que resiste e protesta contra seu arbítrio.
Por todas essas razões, o regime não democrático, militarista e criminoso que empolga de maneira ilegal e ilegítima o poder na Venezuela, como tal visto por mais de cinquenta países, é uma ameaça que deve ser conjurada pela convocação de eleições organizadas pela sua Assembleia Nacional soberana e fiscalizadas pela Organização dos Estados Americanos (OEA).
Em reforço a essas preocupações, lembramos que os grandes patrocinadores e apoiadores do regime venezuelano são países que têm governos totalitários ou autoritários, também violadores do Direito internacional.
3- SOLIDARIEDADE
A verdadeira amizade à Venezuela não se traduz na complacência de seus vizinhos com um regime que desrespeita, oprime e espolia seu próprio povo.
A amizade continental pela Venezuela deve se exprimir por uma vigorosa mobilização dos países-irmãos em favor do povo venezuelano que não pode arcar com o peso das sanções que devem incidir, de forma legal e legítima, sobre o regime e seus dirigentes, remetendo-os todos à categoria de párias internacionais, que é o que realmente são, à vista de sua insensibilidade pelas reiteradas violações dos Direitos Humanos que cometeram e insistem em cometer, agora negando a entrada de ajuda humanitária para a população.
Permitam-me lembrar que somos habitantes das Américas, mais do que um continente.
Somos uma fatia do mundo, tanto geográfica como historicamente, onde floresceram as esperanças do Novo Mundo caudatário das melhores tradições culturais do Ocidente a que pertencemos e no qual desejamos viver em harmonia com outros povos e sociedades.
A Venezuela deve retornar ao convívio democrático das Américas, assegurando liberdade, igualdade e justiça ao seu povo, o que redundará, por certo, na volta da prosperidade a um país naturalmente rico de recursos e talentos.
Mas, à luz dos acontecimentos acumulados há mais de uma década, devemos reconhecer que a Venezuela não conseguirá sozinha livrar-se da opressão do regime chavista.
O momento é de solidariedade interamericana, despida de ideologia e facciosismo. Uma Solidariedade antes de tudo sensível à crise humana e moral que se abate de maneira contundente sobre a Venezuela. Uma crise que não será superada pela tergiversação ou oportunismo, mas somente com boa fé e perseverança.
4- LEGALIDADE E LEGITIMIDADE
Não devemos temer as dificuldades em buscar as sanções contra o regime chavista nos fóruns internacionais, desde as Nações Unidas até as agências de aplicação de tratados internacionais, tribunais, bancos de fomento e investimentos e organismos de cooperação, passando obviamente pela nossa OEA.
A Venezuela é o bom combate por um mundo melhor, sem ditaduras e totalitarismos, no qual o Direito Internacional prevaleça com respeito à autodeterminação dos povos e às soberanias nacionais, em que os Direitos Humanos estejam institucionalizados como obrigação dos governos para com seus governados e estabelecidos como normas de convivência nas sociedades.
O Brasil acredita firmemente que é possível fazer a Venezuela voltar ao convívio democrático das Américas sem qualquer medida extrema que nos confunda, enquanto nações democráticas, com aqueles que serão julgados pela História como agressores, invasores e violadores das soberanias nacionais.
5. PRESERVAÇÃO DO HEMISFÉRIO
Há mais de setenta anos, face a uma ameaça que transfigurou o mundo, Brasil e Estados Unidos, aliados históricos, lideraram a cooperação pan-americana que evitou confrontos entre países-irmãos e afastou do Hemisfério potências estranhas à cultura e valores que compartilhamos.
Como ouvimos de um arguto observador sul-americano, nossos ódios são fracos. E como aprendemos do convívio interamericano, as afinidades de nossas sociedades são fortes. Assim deve continuar.
Hoje, considerada a estatura político-estratégica da região, nossa tarefa não é mais apenas liderar uma Iniciativa de preservação da paz e da segurança nas Américas, mas oferecer o exemplo feliz de uma ação conjunta, equilibrada, prudente e consistente como inspiração para a superação da crise na Venezuela.
6. PALAVRAS FINAIS
Concluindo, esta é a mensagem que trago a essa Cúpula.
De confiança na solidariedade pan-americana, na legalidade e legitimidade de nossas ações e no compromisso com a paz em nosso Hemisfério.
Agradeço a atenção dos senhores e deixo, em nome do Brasil, minhas respeitosas saudações a todos os países aqui representados.