Pronunciamento do presidente Lula em visita ao projeto de assentamento agroextrativista de Ilha Grande (PA)
Eu queria dizer para vocês por que nós estamos aqui. Ontem, foi um dia nervoso para mim também, porque quando eu decidi vir, a semana passada, em Brasília, eu queria vir em uma comunidade que vive do extrativismo e, quando eu chego ontem à noite, fiquei sabendo que eu não ia visitar vocês.
Eu fiquei sabendo porque aquele baixinho ali, aquele cabeçudinho ali, meu amigo Léo, ele achou que eu deveria ir a uma escola, porque era difícil vir aqui, porque era complicado. Eu fiquei muito danado da vida. Essa nossa companheira Tchenna, que também trabalha conosco, trabalha com a Janja [Lula da Silva, primeira dama do Brasil], ela veio aqui antecipadamente, liguei para Brasília para dizer que eu quero visitar os trabalhadores extrativistas, é para isso que eu marquei a minha viagem e, hoje, eu estou aqui com vocês.
Então, eu quero saber que eu também estava muito nervoso. A segunda coisa é que eu vim aqui para aprender, porque a gente fala muito da Amazônia, a gente fala muito de ajudar e, muitas vezes, a gente delibera sobre políticas públicas, e a gente não sabe se ela chega aonde a gente quer que ela chegue. É como uma isca no anzol: você joga uma isca, mas, muitas vezes, você fica o dia inteiro e o peixe não aparece para pegar aquela isca. E, também, nas políticas públicas, muitas vezes, as pessoas não acessam porque não sabem.
A gente anuncia, em Brasília, e nem sempre vocês conseguem saber da política pública. E, às vezes, passa o tempo, uma coisa que vocês tinham direito, pelo fato de vocês não terem informação, vocês não acessam o direito de vocês. Então, a gente está aproveitando que vai ter essa COP30 para discutir a questão do clima.
E todo mundo aqui acho que entende um pouco a questão do clima: o mundo está ficando virado; tem lugar que chove muito, tem lugar que está chovendo pouco, tem lugar que era deserto e agora chove muito, tem lugar que choveu muito e agora virou deserto. Esse dia do Rio Tapajós estava vazio, não sei se aqui ficou vazio também, mas ficou muito rio aqui na Amazônia e eu tinha, uns dias antes, passeado na Amazônia, no Rio Tapajós, eu jamais imaginei aquele rio ficar vazio e ficou. Porque há uma mudança no clima, há uma coisa, o ser humano é o único animal capaz de destruir o habitat em que ele mora.
É impressionante: nós somos tidos como os únicos animais inteligentes do planeta Terra, mas somente nós matamos sem necessidade, roubamos sem necessidade e destruímos o nosso ninho. Só o ser humano faz isso, é impressionante. Você não vê um leão, você não vê uma onça matar se ela não está com fome, mas o ser humano é virado.
Então, como a gente está com essa história de que tem presidente no mundo que não acredita que o clima está mudando, a gente resolveu fazer a COP aqui no estado do Pará. A COP é o momento em que o mundo discute a questão do clima, se está derretendo a geleira que tem no mundo, se a gente vai ter mais de um grau e meio de calor, porque aí a coisa vai ficar muito difícil para nós. Quanto mais calor, mais a gente vai sofrer: o mar vai crescer, muitas ilhas podem afundar, ou seja, a gente não precisa acreditar nisso, mas isso pode acontecer, porque os cientistas estão dizendo que isso pode acontecer. Então, nós resolvemos marcar a COP aqui no Pará, para que os americanos, os franceses, os alemães, os finlandeses, os norueguês, os russos, os japoneses, os coreanos, para que o mundo venha aqui e veja o que é a Amazônia.
Não adianta falar que a Amazônia é o coração do mundo e que a gente não pode derrubar uma árvore. Então, é preciso vir ver para perceber que aqui nessa Amazônia moram só do lado brasileiro praticamente quase 30 milhões de pessoas que vivem aqui e muitas pessoas dependem da floresta. Então, é preciso que haja financiamento para que as pessoas sejam motivadas a não derrubar as árvores e tirar das árvores o alimento necessário, o seu sustento, ganhando um dinheirinho pelas coisas que vocês fazem.
É por isso que nós marcamos a COP aqui no estado do Pará: para trazer o mundo para cá. Uma vez, eu conversei com uma jornalista sueca, e ela me disse que, quando ela era pequena, o pai dela deu de presente para ela um lote na Amazônia. Há muito tempo, o pai dela deu um lote, comprou um terreno.
(E eu... Agora sim eu aprendi a lição de quem não chora não mama, isso a gente aprende com uma criança.)
Então, essa jornalista, ela é jornalista, ela falou: “presidente, meu pai, quando eu era pequeno, me disse que comprou um terreno para mim na Amazônia porque ele não queria que destruísse a Amazônia”. E eu perguntei: “você sabe onde é o seu terreno?” “Não”. Ela nunca viu o terreno.
Já deve ter sumido, alguém já deve ter tomado, alguém já deve ter plantado, já deve ter desmatado. Então, nós trouxemos as pessoas para cá para ver. E nós, então, estamos tentando fazer com que o mundo tenha consciência de que é preciso financiar as pessoas que moram na floresta, criar mais reservas, que não possam ser tocadas, criar mais terras indígenas, legalizar mais quilombolas, para que as pessoas que moram aqui tenham o direito de viver com dignidade.
Vocês não podem viver aqui porque vocês estão obrigados a morar aqui porque não têm outro lugar, porque se saírem daqui, morrem de fome. Não! Vocês têm que morar aqui porque vocês gostam daqui. Aqui é bom para vocês morarem, aqui é bom para vocês cuidarem dos filhos de vocês, aqui é bom para vocês criarem a família de vocês.
E eu vou dizer para vocês, eu que moro em Brasília e moro em São Paulo, aqui é muito melhor, por Deus do céu. Se eu pudesse morar num rio desse, frondoso...Lá a gente mora na frente do Rio Tietê, totalmente poluído. E quem polui? O ser humano.
Quem joga sujeira não é nenhum elefante, nenhum leão, nenhuma girafa, nenhuma onça, nenhum tatu, nenhum jacaré, nem um pirarucu. Quem joga sujeira no rio é o homem. Então, essa vinda nossa aqui é para aprender com vocês.
Como é que vocês vivem aqui? Todo mundo é saudável. Olha que garotinho saudável, olha esse bichinho aqui, vivendo aqui a base do açaí? Comendo açaí com farinhazinha, com peixinho, um filhote, deve ser muito bom. Eu fico vendo a cara de vocês e a gente percebe que vocês são saudáveis.
Olha a Dona Nazaré ali. Dona Nazaré...Se ela não tivesse sido casada, eu ia pedir a mão dela em casamento aqui, porque ela tem apenas 70 e quantos anos? 79. Setenta e Nove, um ano mais nova do que eu, gente. Seria um casal maravilhoso aqui.
Eu vim aqui para dizer para vocês o seguinte, nós viemos saber se tem luz elétrica e, graças a Deus, aqui chegou o programa Luz para Todos. É triste a gente ver vocês morarem na beira de um rio como esse e saber que não tem água tratada para vocês beberem e a gente vai ter que discutir, se a gente vai fazer poço artesiano aqui para trazer água ou vai fazer o tratamento de água necessário. Porque é mais caro fazer por comunidade, numa cidade grande, fica mais barato fazer uma coisa grande. Mas a gente vai ter que encontrar um jeito de garantir água potável para vocês, sabe, beberem para as crianças serem mais saudáveis. Nós temos obrigação de fazer; não é nenhum favor nosso, é obrigação, porque vocês são tão brasileiros quanto qualquer brasileiro que mora em Brasília, que mora em São Paulo, brasileiros e brasileiras.
Nós vamos ver esse negócio do crédito. Eu fiquei muito feliz porque o Nelson, aquele jovem que está ali, empresário, inventou uma máquina para facilitar a retirada do açaí, eu não sei quantos quilos, você não está subindo mais no pé de coqueiro, cara! Então, eu confesso a vocês que eu tentei subir, não consegui subir dois minutos, mas olha...
Esse rapaz jovem aí olha ele trouxe aqui um robô, uma máquina inventada por alguns engenheiros aqui do Brasil, e essa máquina, o robozinho, sobe no pé do açaí, vai lá em cima, corta o açaí e traz o açaí sem precisar um homem correr qualquer risco.
O nosso companheiro ali subiu com uma rapidez violenta, mas eu acho que se ele subir 50 vezes com aquela violência, ele cansa, aí com o perigo de se machucar, de cair. Então, essa máquina não veio para substituir o homem; ela veio para facilitar a vida do homem ou da mulher. Ele não vai mais correr risco, porque a maquininha sobe e corre de lá. Eu já falei para ele colocar uma máquina de fotografia para você acompanhar pelo celular qual é o cacho que tem mais coco, para não tirar o cacho errado.
Nós vamos trabalhar para melhorar, porque o que nós queremos é ver as pessoas felizes, você me vendeu um remédio que eu vou passar, se não sarar, você vai ver, vai ver...
Pode fazer um pedido como mamãe...
Fala da moradora da comunidade da Ilha Grande
Então, vocês percebem: eu já ouvi esse pedido nos três acampamentos que eu fui. É muito difícil fazer uma faculdade em cada acampamento, mas eu já falei com o ministro Camilo [Santana, da Educação]. Veja: nós vamos criar condições para que o jovem ribeirinho, que mora numa comunidade como essa, quando ele atingir a formação média dele, a gente ou dá uma bolsa, ou cria condições para que ele tenha direito de dormir e se alimentação numa faculdade, na cidade mais próxima, para que ele não possa perder a oportunidade de estudar, pode ficar certo que nós vamos cuidar disso.
Eu fui agora no quilombo ali, um monte de moça, tudo formada pela cota quilombola, pela cota racial, na verdade. Então tem o Pronera [Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária], mas eles têm dificuldade de sair. Por isso, nós vamos criar condições de, se ele for estudar em Santarém ou em Belém, que ele tenha um financiamento para poder ter alojamento e comida, porque senão ele não consegue.
Nós vamos cuidar disso também. Eu estou levando todas as reivindicações que eu recebi. Eu quero te agradecer por essa sugestão, tá? Eu vim aqui para aprender, nós vamos ver o que está funcionando; o que não está funcionando, nós vamos ter linha de crédito para financiar esse robozinho; nós vamos fazer financiamento para vocês utilizarem as terras degradadas e plantar o que vocês quiserem. É importante que...
Eu ia fazer uma pergunta para vocês, quem é o cara que mais conhece açaí aí? Você, seu açaizeiro. Me diga uma coisa, aqui, vocês não cortam o açaí para palmito, cortam? Quando é que vocês cortam? Vem aqui, vem aqui, só me ensina, porque eu quero, isso é para me aprender mesmo.
Veja, porque o açaí, além do fruto, ele dá o palmito, que é vendido nos restaurantes de Belém, de São Paulo, do Brasil inteiro. Quando é que você corta o açaí para fazer palmito? Quando é que ele não prejudica a produção de açaí?
Eu tinha medo, porque eu sei que aqui no Pará, tem empresa que produz palmito; e se a empresa que produz palmito não tem interesse no açaí, e só no palmito, aí, pode ser uma desgraceira, pois só vai consumir o palmito.
Mas do jeito que você falou, é mais ou menos o que Deus nos ensinou com a bananeira, quando a bananeira dá um cacho, a gente tira o cacho, depois tem que cortar o pé de bananeira, porque já nasceu a filhinha daquela bananeira, e vai ser ela que vai dar outra vez. Não é isso? Então, o açaí, se você vai cortando os mais velhos e deixando o mais novo crescer, nunca vai faltar açaí, nunca vai faltar palmito.
A pupunha... eu estava contando que a pupunha, eu conheci a pupunha em 1992, mas eu conheci a pupunha porque as pessoas tiravam o cacho de fruta para cozinhar e fazer comida. Eu não sabia que a pupunha tinha palmito. Aí, depois, em São Paulo, o pessoal conseguiu descobrir a pupunha, levou a pupunha para São Paulo, mas não esperava dar fruto. Com três anos, cortava só para comer o palmito.
Então, isso aqui cozido é muito bom, muito bom. Você nunca comeu, Janja? Já comeu? Se não, eu vou levar a pupunha para você comer.
Gente, olha, eu quero agradecer a vocês. Eu vi que quase todos vocês têm celular. Veja, todo o ministério do meu governo, está conectado na internet.
Qualquer coisa que vocês quiserem saber que um ministério faça, para vocês que têm celular, é muito fácil saber. Olha, se vocês quiserem, podem saber cada centavo que o governo coloca numa cidade. Se você quiser saber quantas mulheres recebem o Bolsa Família em qualquer cidade do Pará, vocês sabem.
É só entrar no Comunica.br que vocês vão saber. Eu pensei que a gente ia ensinar como é que faz, ensinar para as pessoas utilizarem, porque, às vezes, a gente cria essas coisas digitais que todo mundo sabe, e nem sempre sabe.
Se você sabe, por favor, ensina como é que funciona o Comunica.br. E, Paulo, depois você comunica como é que funciona o seu ministério, para a pessoa acessar o seu ministério. Deixe aqui, para todo mundo aqui saber e lhe cobrar. Telefonar direto para você. É assim.
E o Incra [Instituto de Colonização e Reforma Agrária] também.
Você viu que o pessoal que é Instituto de Colonização, inventa outro nome. Porque a colonização da Amazônia não é a colonização do Brasil pela Europa. Nem é a colonização da África pela Europa.
Todo mundo não quer mais colonização. Nós queremos integração. Ensina como é que é.
Fala da primeira-dama, Janja Lula da Silva
Ô gente, aqui tem médico.
Quantas vezes passa médico aqui por mês? Deixa eu ver, vamos primeiro o médico. Primeiro o médico. Aqui tem posto de saúde? Tem a UBS [Unidade Básica de Saúde] e o médico vem quantas vezes por mês? Ele vem um dia?
E tem enfermeira trabalhando? Aqui. E onde que é a UBS? Mas aqui passa a lancha da saúde? Vem cá. Mas deixa eu fazer uma pergunta para você.
Levanta aqui. Você vai falar diretamente para o ministro Padilha [Alexandre, da Saúde]. Cadê o Stuckert [Ricardo, secretário de Produção e Divulgação de Conteúdo Audiovisual]? Fala qual é a comunidade em que nós estamos e fala como é a questão da saúde aqui.
Fala de Rafaela Silva, ribeirinha, moradora da comunidade Ilha Grande, zona rural de Belém do Pará
--E fala para o ministro da Educação [Camilo Santana], sobre a educação.
Fala de Rafaela Silva, ribeirinha, moradora da comunidade Ilha Grande, zona rural de Belém do Pará.
As crianças vão para qual escola? De lancha? A lancha de quem que é? Da escola, da prefeitura? Não. Ah, tá bom.
E esse seu filho bonito está na escola? E ele vai todo dia de barco? Quantas crianças tem aqui na comunidade? Trinta, cinquenta, cem? E não tem escola? Tem creche aqui? Vamos olhar isso. Você é professora? Você é diretora da escola?
Eliza Cardoso, diretora da Escola São José, de Ilha Grande, Zona Rural da Belém do Pará
Um beijo, querida. Gente, um abraço.
Quero que vocês fiquem com Deus. E eu espero encontrar com vocês, porque eu vou ficar até dia 10 aqui em Belém. Eu estou morando no barco.
É verdade. Esse barco que eu vim, eu estou morando nele durante 10 dias. Então, se vocês forem para a COP30, a gente vai se encontrar lá.
Está bem? Um abraço, gente. Fique com Deus. E até outro dia, se Deus quiser.