Pronunciamento do presidente Lula durante anúncios de investimentos e inauguração do Parque Linear da Nova Doca, em Belém (PA)
Minhas queridas companheiras e companheiros do estado do Pará e da cidade de Belém. O companheiro Helder [Barbalho, governo do estado do Pará] começou a sua fala agradecendo a Deus por estar vivendo esse momento. Eu acho que Deus ouviu bem e permitiu que o Helder fizesse um extraordinário pronunciamento tentando explicar para vocês a verdade sobre a COP30. Porque o preconceito é uma coisa muito difícil da gente vencer. Vocês sabem, porque muitos de vocês já viveram preconceito.
E na história do mundo sempre foi assim. Quando foi se construir a Torre Eiffel na França, teve quase que revolta popular para que a Torre não fosse construída. E hoje a Torre é o monumento de maior orgulho do povo francês e não tem um turista que vá a França que não queira tirar uma foto na Torre Eiffel. E eu e a Janja [primeira-dama do Brasil] temos uma foto na Torre Eiffel. Eu acompanhei a construção das Olimpíadas de Barcelona em 1992 e tinha muitas críticas sobre os gastos do governo para realizar as Olimpíadas.
E depois que terminaram as Olimpíadas, Barcelona virou uma outra cidade. Aqui no Brasil, Helder, quando a gente começou a discutir a Copa do Mundo de 2014, na verdade a gente nem precisou disputar a Copa do Mundo porque a FIFA tinha decidido que depois da África voltava para a América do Sul. E na América do Sul e na América Latina, o México já tinha feito duas e o Brasil tinha feito uma única em 1950. Estava lá eu, o Romário [senador e ex-jogador de futebol], o Dunga [treinador e ex-jogador de futebol] na sede da FIFA quando anunciaram que ia ser o Brasil.
E nós começamos a tomar uma decisão. O Governo Federal resolveu colocar à disposição dos estados R$ 400 milhões financiados pelo BNDES para que os estados pudessem construir os estádios de futebol. Eu era presidente na época e não tive nenhuma participação na seleção dos estados. Porque se eu tivesse o direito de dizer onde ia ser a Copa do Mundo, você pode ter certeza que, como eu gosto de futebol, eu sei que o estado do Pará tem muito mais histórico de futebol do que o estado do Amazonas. E, portanto, se algum estado na Amazônia tivesse que ter a Copa do Mundo, seria aqui. Seria exatamente aqui.
Da mesma forma, o Rio Grande do Norte ocupou o lugar de Santa Catarina, que naquele instante tinha quatro clubes na Série A. E o Rio Grande do Norte nunca teve. Mas o critério foi um critério político equivocado. Primeiro porque não precisava ser 14. Poderia ser 12 ou 10, mas escolher os estados corretos. E nós enfrentamos a maior campanha de preconceito da história desse país num evento internacional. Vocês não têm noção o inferno que foi aquela Copa do Mundo com denúncia todo santo dia de que tinha muita corrupção, tinha muita corrupção, tinha muita corrupção. E eu fui atrás do Tribunal de Contas [da União, TCU]. O Tribunal de Contas escolheu um conselheiro para acompanhar todas as obras de todos os estados.
Depois de quase destruir a Copa do Mundo, depois de colocar, inclusive, preocupação no governo de fazer a Copa do Mundo, não houve nenhuma prova de corrupção em nenhum estádio de futebol desse país. Isso dito pelo Tribunal de Contas da União no seu relatório final. Entretanto, foi a Copa do Mundo mais nervosa e o comportamento da torcida no dia da abertura da Copa vaiando a Dilma Rousseff [ex-presidenta do Brasil] e falando palavrão contra ela foi a pior coisa que eu já vi da falta de respeito de uma turma com a Presidência da República.
E eu aprendi a vencer preconceito e fizemos a Copa do Mundo. Lamentavelmente, apanhamos de 7 a 1 da Alemanha. Foi a maior vergonha que um brasileiro já pode ter passado de ver a seleção brasileira jogar aquele jogo medíocre diante da Alemanha. Pois bem, depois nós ganhamos as Olimpíadas no Rio de Janeiro. Eu estava em Copenhague [capital da Dinamarca], possivelmente tenha sido o momento mais emocionante da minha vida o dia que aquele cidadão suíço anunciou o nome do Brasil.
A gente estava disputando com o Barack Obama [ex-presidente dos Estados Unidos] que estava reivindicando Chicago [cidade dos EUA]. A gente estava brigando com o primeiro ministro japonês que estava reivindicando Tóquio [capital do Japão]. A gente estava brigando com o primeiro ministro da Espanha que estava reivindicando Madri [capital da Espanha].
E eu falava: “é muito difícil”. O Obama quando chegou em Copenhague, eu cheguei um dia antes. Não saiu uma matéria nem no rodapé de um jornal. Quando o Obama chegou, a televisão de Copenhague transmitiu ao vivo o pouso do avião dele, a descida do avião, o cumprimento dele, a entrada no carro. Eu falei: “é muito difícil ganhar dos Estados Unidos, eles são muito grandes”. Estava lá o Obama e a Michelle [Obama, ex-primeira dama dos Estados Unidos]. E eu estava lá com a minha turminha. Eu, Meirelles [Henrique, ex-presidente do Banco Central], o Sérgio Cabral [ex-senador] e o nosso companheiro Eduardo Paes [prefeito do Rio de Janeiro] para defender o Brasil. E aí a gente começou a mostrar o que era o Brasil.
Já tinha falado o Obama, já tinha falado a Espanha e falado o Japão. E eu falei: “nós vamos ganhar essa Copa que é com o coração, essa Olimpíada”. E vamos mostrar.
Aí terminamos de fazer o nosso discurso e começa a emoção. E ficamos esperando. Daqui a pouco veio o suíço e fala “Rio de Janeiro”. Foi o momento mais emocionante da minha vida. Eu nunca tinha passado uma emoção daquela. E cheio de preconceito, cheio de preconceito. E eu não fui convidado sequer para a inauguração das Olimpíadas. É só ir ao Rio de Janeiro para a gente ver as mudanças que houve no Rio de Janeiro.
Você conhece. A Margareth [Menezes, ministra da Cultura] conhece. A Janja [Lula da Silva, primeira-dama da República] conhece. O Aloizio [Mercadante] está no Rio de Janeiro. O André [Corrêa do Lago, presidente da COP30] conhece. Vai ver as coisas que aconteceram. E quando a gente resolveu, lá no Egito, que a gente ia bancar Belém, eu já sabia do preconceito. Já sabia. Porque todo mundo fala “por que querer fazer investimento no Amazonas, lá no estado do Pará, se São Paulo já tem a cadeia de hotéis que os turistas precisam? Por que fazer em Belém, se o Rio de Janeiro já tem os hotéis que os turistas precisam?”.
E eu tomei a decisão de que a gente ia fazer aqui porque a COP não é um desfile de moda. A COP não é um desfile de produtos ideológicos, em que as pessoas vêm aqui, falam o que querem, ouvem o que não querem e vão embora. Esta COP vai ser diferente. Primeiro, eu quero que o mundo conheça a Amazônia. Eu quero que as pessoas conheçam os nossos rios. Eu quero que eles conheçam o Rio Negro, o Rio Solimões, o Rio Tapajós e tantos outros rios que a gente tem. Eu quero que eles conheçam, definitivamente, a copa das árvores da Amazônia. Mas eu quero que eles conheçam o povo da Amazônia.
Eu quero que eles conheçam os indígenas brasileiros. Eu quero que eles conheçam os quilombolas brasileiros. Eu quero que eles conheçam os estudantes brasileiros, as mulheres e os homens. E eu disse na entrevista agora em Nova York, eu quero que eles conheçam a culinária do estado do Pará. Eu quero que eles conheçam a culinária do estado do Pará. Porque, não sei se vocês sabem, o Brasil tem três estados que têm uma culinária forte. Pará, a Bahia e Minas Gerais, da companheira Macaé [Evaristo, ministra dos Direitos Humanos e da Cidadania]. São três tipos de cozinhas diferentes. Eu posso dizer aqui na frente da Bahia, na frente de Minas Gerais, que o Pará tem a maior diversidade culinária deste país.
E eu quero que eles venham aqui, para eles conhecerem essa riqueza. Para eles conhecerem os nossos extrativistas, os nossos pescadores. Para eles perceberem que isso aqui não é um mundo de aves apenas. Tem 30 milhões de pessoas que moram na Amazônia. Tem mulheres, tem crianças, tem adultos, tem velhos que querem viver, que querem trabalhar, que querem estudar. E se eles querem que a gente proteja a nossa floresta, ajuda a financiar para que a gente mantenha o que eles chamam de pulmão do mundo funcionando corretamente.
E aí começaram as desavenças. Começaram a falar do preço das diárias de hotel. Imagina você, Helder, se os hotéis fossem estatais. Imaginemos que os hotéis fossem do Governo Federal. Imagina que a gente ia sofrer pressão, a gente ia fazer um preço bem baixinho. Aí a imprensa, que está dizendo hoje que os hotéis são caros, ia dizer que o governo não sabia administrar, que ele estava tendo prejuízo. Que era preciso privatizar os hotéis, porque a indústria privada sabe administrar mais do que o governo. Então quem está cuidando disso é o seguinte, nós queremos garantir ao mundo. Ninguém vai dormir aqui pior do que a gente dorme em nenhum lugar do mundo. Ninguém, ninguém.
Para compensar o luxo de um quarto de hotel, vai ter o amor do povo do Pará na rua dessa cidade mostrando que tipo de gente que nós somos. Eu quero que eles conheçam as pessoas dançando carimbó. Eles precisam aprender o que é o carimbó. Eu, se a Janja quiser, a gente pode treinar um pouquinho. Você e sua esposa podem treinar. E quem sabe a gente possa dançar um pouquinho de carimbó, possa se mexer. A gente vai. Eu, depois dos 80, estou sem limite para rebolar aqui. Então, gente, o que está acontecendo?
Nós, e eu quero aqui, Helder, na tua frente, dizer que esse companheiro [Rui Costa, ministro da Casa Civil] e a Miriam Belchior [secretária executiva da Casa Civil] foram dois heróis nessa COP. Dois heróis nessa COP, porque não é fácil você enfrentar a desavença. Não é fácil você deixar de fazer aquilo que já está pronto para fazer uma coisa nova. Não é fácil. Mas veja, para enfrentar o problema dos apartamentos, nós dizemos que o povo do Pará ia fazer com que as suas casas virassem apartamento.
E muita gente no Pará está saindo da sua casa para dizer para os gringos: venha morar no meu aconchego por uns dias para você saber o que é o Pará. Fomos atrás de dois navios.
Esses navios bonitões que a gente só vê em novela ou em filme, navio que cabe 4 mil pessoas. Pois aqui vai ter dois navios para quem quiser dormir, vai dormir no navio também. Portanto é o seguinte. Ah, começaram a se queixar que os países pobres não podiam vir para cá. Porque “ah, coitados dos países africanos que não têm dinheiro para vir para cá”.
Pois bem, nós resolvemos garantir aos africanos: venham para a COP, que o governo estadual e o Governo Federal vão garantir que vocês tenham onde dormir. Vão ter o que comer e se quiserem beber vão ter também, porque aqui tem de tudo. Então é o seguinte, gente. É o seguinte: o preconceito está vencido. O preconceito você não sabe, Helder, o que é o preconceito de algumas regiões do país com a Zona Franca de Manaus. Você não tem noção. Toda, qualquer oportunidade tem alguém tentando desmanchar a Zona Franca de Manaus. Itaipu está colocando um bilhão e meio [de reais] aqui.
E tem gente que fala: “mas Itaipu é do Paraná”. Itaipu não é do Paraná. Itaipu é do Brasil e, portanto, o Pará tem direito de receber dinheiro de Itaipu. E eu quero te agradecer, Enio [Verri, diretor-geral brasileiro da Itaipu Binacional], pela coragem. O que você está fazendo é simbólico. É fazer com que as coisas que são brasileiras sirvam aos 27 estados brasileiros e aos 215 milhões. Pois bem, gente, a COP já está garantida. Eu estava vendo essa obra. Na França não tem um canal desse. Nos Estados Unidos não tem. Ele ainda está poluído.
O nosso prefeito sabe, e o nosso governador, que os prédios que tem do lado vão ter que canalizar os seus esgotos, porque a gente quer que vocês vão passear aí com as crianças de vocês e não tenha fedentina, que não tenha mau cheiro. Então é para estar bonito, cheiroso, para vocês poderem sentir o prazer de passar um domingo passeando no Parque Linear da Nova Doca. Olha que nome bonito. E aí vai ter quiosque para vocês comprarem alguma coisinha. Vai ter os banheiros para vocês não precisarem ir atrás de um poste. Vai ter tudo direitinho. Vocês vão perceber.
E hoje eu fiz uma coisa que é sagrada para mim. Eu fui visitar uma estação de tratamento de esgoto. Ninguém nesse país gosta de investir em tratamento de esgoto. Porque é colher dejeto humano, tratá-lo para tentar jogar ele em algum lugar. Mesmo que seja uma água aceita pelas pesquisas, pelos cientistas. Pois bem, André. Hoje eu fui inaugurar a maior estação de tratamento de esgoto da história do Pará.
É isso que a COP tem que ver. É isso que a COP tem que ver. A gente não está aqui fazendo luxo. A gente está aqui fazendo aquilo que é necessário para os estados que foram mais esquecidos, para os estados que receberam pouco investimento. E eu quero agradecer a vocês, ao povo do Pará, pelo carinho que vocês têm por mim desde a primeira vez que eu vim aqui.
Quero agradecer, Helder, a você, ao teu irmão [Jader Filho, ministro das Cidades], ao Sabino [Celso, ministro do Turismo], aos deputados, ao meu querido amigo Beto Faro [senador], que já foi embora. O Beto Faro já foi embora. Eu quero agradecer, porque eu sei o trabalho que vocês fizeram para a gente chegar ao dia de hoje.
Então, queridas companheiras, estejam certas: nós vamos virar motivo de orgulho para o mundo a partir dessa COP. A partir dessa COP, ninguém vai ter mais dúvida de que o Brasil não deve nada a nenhum país do mundo, de que o Brasil é soberano na tomada das suas decisões.
E aqui, quando a gente resolve trabalhar, governo municipal, governo estadual e Governo Federal juntos, ninguém consegue segurar. E eu estarei aqui na COP, de peito aberto. Até, Helder, mandei uma carta para o Trump [Donald, presidente dos Estados Unidos], mandei uma carta para o presidente Trump para ele vir aqui.
Mandei uma carta para o presidente Xi Jinping [presidente da República Popular da China]. Mandei uma carta até para o Milei [Javier, presidente argentino], da Argentina, eu mandei carta. Porque aqui a gente não tem preconceito. Venha quem quiser. Porque a gente quer ser o exemplo mundial de defesa do clima nesse país.
Um abraço, gente. Que Deus abençoe vocês e até a COP daqui a 30 dias.
Um abraço.