Pronunciamento do presidente Lula durante assinatura da Medida Provisória Brasil Soberano
Olha, a primeira coisa, eu queria agradecer a presença dos deputados aqui, dos senadores, e a presença do Hugo Motta [presidente da Câmara dos Deputados] e do Davi [Alcolumbre, presidente do Senado Federal], porque o time do governo está passando a bola para o time da Câmara e o time do Senado. A bola está com vocês.
Além de parabenizar o companheiro Alckmin [Geraldo, vice-presidente e ministro do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços] e o Haddad, [Fernando, ministro da Fazenda] e as equipes que trabalharam, a Gleisi [Hoffmann, ministra da Secretaria de Relações Institucionais], o Fávaro [Carlos, ministro da Agricultura e Pecuária] e outros ministros, na apresentação desta proposta. É importante a gente dizer que a gente não pode ficar apavorado e nervoso ou muito excitado quando tem uma crise.
A crise existe para a gente criar novas coisas. A humanidade criou grandes coisas que salvaram a humanidade em tempos de crise. Nesse caso, o que é desagradável é que as razões justificadas para impor sanções ao Brasil não existem. Na questão comercial, por exemplo, é inadmissível alguém dizer que tem déficit com o Brasil quando, nos últimos 15 anos, o superávit deles foi de 410 bilhões de dólares se colocar bens e serviços. Não é pouca coisa.
A segunda coisa é que aqui no Brasil nós temos um Poder Judiciário autônomo. Está garantido, na nossa Constituição de 88, que o Poder Executivo e o Congresso Nacional não têm nenhuma incidência com relação a julgamento que está acontecendo na Suprema Corte. E ninguém está desrespeitando regra de direitos humanos como estão tentando apresentar ao mundo.
Porque os nossos amigos americanos, toda vez que eles resolvem brigar com alguém, eles tentam criar uma imagem de demônio contra as pessoas que eles querem brigar. É assim com América Latina, é assim com o mundo árabe, é assim com os russos, é assim com os países asiáticos. E o Brasil não tinha, efetivamente, nenhuma razão para ser taxado e tampouco aceitaremos qualquer pecha de que no Brasil nós não respeitamos os direitos humanos. E que o julgamento está sendo feito de forma arbitrária.
Na verdade, o que nós estamos fazendo é aquilo que é feito apenas em país democrático, julgando alguém com base em provas coletadas em testemunhas e com total direito de presunção de inocência. Isso é democracia elevada à sua quinta potência.
Coisa que eu não tive quando eu fui julgado. E eu não reclamei. E o que é mais grave é que essa mesma gente que está sendo julgada, que tentou dar um golpe em 2008, que invadiram a sede da Polícia Federal no dia da minha diplomação, que colocaram caminhão-bomba perto do aeroporto.
Essa gente que ocupou a frente dos quartéis com a benevolência de alguns está sendo julgada não por denúncia de oposição. Eu não vi nenhuma denúncia sua contra qualquer pessoa, Alcolumbre. Eu não vi sua, Hugo Motta. Eu não vi denúncia. Ele está sendo julgado com base nas delações e nos depoimentos feitos por pessoas que participaram da tentativa de golpe. E eu disse ao presidente Trump que se tivesse acontecido no Brasil o que aconteceu no Capitólio, ele estaria sendo julgado aqui também.
Porque aqui, depois da nossa Constituição de 88, a gente pode encontrar algum defeito. Mas a verdade é que a justiça nesse país tem que ser para todos. Para brasileiros e para estrangeiros residentes no Brasil. Para empresas brasileiras aqui e para empresas estrangeiras radicadas no Brasil. Não poderia deixar de ser diferente. Agora, o que está sendo jogado fora é uma relação de 201 anos de história.
Veja que nós relevamos até o golpe de 64. Nós nem lembramos o que foi o papel da embaixada americana aqui no Brasil, não lembramos o que foi o papel de navio de guerra dos Estados Unidos no nosso mar. Tudo isso a gente não esqueceu, mas não coloca mais em conta. Porque nós somos da paz. Nós somos da paz. E, nesse tempo de crise, meu caro Alban [Ricardo, presidente da CNI], veja uma boa notícia.
Eu acabo de ser informado pelo Fávaro que, nesse momento em que eu estou chegando à tribuna, nós estamos fazendo 400 acordos nossos em dois anos e meio, vendendo carne de boi e miúdo de boi para as Filipinas. E será assim. A gente vai continuar, através do Alckmin, através do Haddad, através do Mauro [Vieira, ministro das Relações Exteriores], através do Fávaro, através de todos os ministros que têm setores que têm relação com os Estados Unidos, a gente vai continuar teimando em negociação.
Porque nós gostamos de negociar. E nós não queremos conflito. Eu não quero conflito nem com o Uruguai, nem com a Venezuela, quanto mais com os Estados Unidos. Agora, a única coisa que nós precisamos exigir é que a soberania nossa é intocável. Ninguém dê palpite nas coisas que nós temos que fazer. Falar de direitos humanos no Brasil já foi importante em outras épocas.
Mas agora, antes de falar em direitos humanos no Brasil, tem que olhar o que acontece no país que está acusando o Brasil. E com muita tranquilidade, a gente vai continuar fazendo. Eu quero dizer para os empresários, para os trabalhadores, a gente vai tentar fazer o que estiver ao nosso alcance para minimizar o problema que foi causado conosco. Nós vamos fazer o que estiver ao nosso alcance.
Agora, a verdade é que não é possível imaginar que o governo vai substituir os nossos parceiros comerciais. E nós vamos ter que procurar outros parceiros. Da minha parte, eu sou vendedor de qualquer coisa. Eu liguei para o Xi Jinping [presidente da República Popular da China] essa semana e uma das coisas que eu falei foi dos pés de galinha. Eu não cheguei a falar de pés de galinha, porque eu falei carne de frango. Mas eu sei que é pés de galinha.
Está aqui a Apex, está aqui o Sebrae. Nós vamos continuar vendendo as coisas que o Brasil, se os Estados Unidos não querem comprar, nós vamos procurar outro país. Pode se preparar, Alban, que eu vou para a ASEAN [Associação de Nações do Sudeste Asiático], em outubro, para vender coisas do Brasil lá.
Pode se preparar que em janeiro já marquei com a Índia, vamos fazer um grande evento em que eu quero levar pelo menos uns 500 empresários brasileiros para a Índia. Porque é um país muito grande, muito importante e muitas coisas para a indústria brasileira, sobretudo na questão de fármaco, questão de inteligência artificial, a questão espacial e a questão de defesa. Nós temos muito o que aprender com a Índia. Então, em vez de ficar chorando aquilo que nós perdemos, vamos ficar procurando ganhar outro lugar.
O mundo é grande, o mundo está ávido para fazer negociação com o Brasil. Todo mundo sabe que nós somos do bem. Todo mundo sabe que a gente não quer brigar com ninguém, que a gente faz concessões. Mas a gente não merecia isso. E o que é grave? O que é grave é que não foi só conosco, foi com muitos.
Muita gente dizia, mas a Índia é muito pró-americano. E eles taxaram a Índia em 50%. Ora, o que leva a isso? Posso dizer para vocês que não é comercial. Posso dizer para vocês que não tem um fundo comercial nisso. Eu acho que existe por trás disso uma necessidade muito grande de destruir uma coisa chamada multilateralismo que é o que permitiu que o mundo tivesse um comércio mais equilibrado, uma coisa mais harmônica, feita através da OMC [Organização Mundial do Comércio], que ela começou a perder valor quando os Estados Unidos saíram da negociação em 2008 por causa das eleições do Obama.
Então nós estamos em um debate que não é econômico, a gente está em um debate político. É um debate político com teor ideológico. A razão pela qual o presidente americano anuncia punir o Brasil por causa do ex-presidente. Se ele conhecesse a verdadeira história, ele estaria dando parabéns à Suprema Corte Brasileira por estar julgando alguém que tratou de bagunçar a democracia brasileira. E quem está falando para vocês é o cara que mais perdeu eleição neste país para presidente.
Eu acabava de perder e voltava para casa. Não ficava xingando ninguém, não ficava duvidando das urnas. Então, gente, é preciso que a gente tenha clareza do que está em jogo. O meu time de negociador está aqui, primeira linha, nem o Real Madrid, nem o Barcelona, nem o Paris Saint-Germain chegam perto do meu time de negociação. Agora, é preciso encontrar, do outro lado, reciprocidade, que nós não estamos anunciando reciprocidade. Veja como nós somos negociadores.
Nós não queremos, no primeiro momento, fazer nada que justifique piorar a nossa relação. Nesse momento, nós estamos tentando aproximar a relação, procurando o nosso parceiro. Eu já falei com a Índia, já falei com a China, já falei com a Rússia. Vou falar com a África do Sul, vou falar com a França, falar com a Alemanha, eu vou falar com todo mundo.
Para eles se darem conta do que está acontecendo no mundo e, junto aos BRICS, nós vamos fazer uma teleconferência que está sendo articulada para a gente discutir, dentro dos BRICS, o que a gente pode fazer para melhorar a nossa relação entre todos os países que foram afetados. Porque é importante lembrar, que daqui a pouco alguém vai começar a dizer: “o Brasil está sendo punido por causa dos BRICS”. É importante lembrar que esse cara dos BRICS, que assusta eles, é simplesmente um país que o Brasil tem uma balança comercial de 160 bilhões de dólares.
O dobro da que nós temos com os Estados Unidos. E nós queremos crescer mais, nós queremos vender mais e queremos comprar mais. Nós queremos aprender mais e queremos ensinar mais.
É assim que esse país vai se transformar num país grande, Alban. É assim que a gente vai tentar procurar as nossas alternativas para que os Estados Unidos aprendam que democracia e respeito comercial e multilateralismo vale para nós e deve valer para eles.
Essa aposta que o governo americano está fazendo pode não dar certo para eles. Pode não dar certo. Porque ontem eu vi no jornal que me entregaram um quilo de contrafilé nos Estados Unidos a 150 dólares. Eu não sei que carne é essa, mas estava lá a tabela da carne. E aqui no Brasil a gente vai continuar assustando muita gente, porque a gente vai continuar melhorando a nossa produção, seja de milho, seja de soja, seja de frango, seja de feijão, seja de arroz, seja de café. A gente vai continuar melhorando a produção.
Ninguém nunca mais falou, depois que nós chegamos ao governo, as pessoas nunca mais falaram que a produção industrial estava acabando, que a indústria brasileira estava acabada. Ou seja, o PIB industrial cresceu 3,8%. São 547 milhões de reais em créditos para a Nova Indústria Brasil. E isso vai continuar acontecendo.
Se os americanos não quiserem comprar, nós vamos vender para outro. Se outro não quiser comprar, nós vamos vender para o nosso mercado interno. Nós temos um mercado interno poderoso.
O que nós precisamos é explorar o nosso potencial. Eu fico imaginando, Haddad, que parte das frutas que a gente exporta para os Estados Unidos, o mercado carioca, o mercado mineiro, o mercado gaúcho, o mercado paulista, o mercado do Brasil está à inteira disposição para comprar essas frutas e comer. Qual é o problema? Se a gente não tiver mercado interno, vamos procurar outro mercado.
Eu não tenho nenhum problema de andar com uma caixa de uva na cabeça, uma caixa de manga, uma caixa de abacaxi, só não vou carregar uma caixa de jaca, porque aí é muito pesado. Mas eu já andei com um carro verde dois anos para a Europa, mostrando que a gente ia produzir um carro verde. Então, se quiser negociar etanol, nós negociaremos.
Se quiser negociar etanol, não coloque o problema nisso, porque nós estamos dispostos a negociar. Produzimos mais e melhor do que eles. E queremos negociar. Agora, quem não quer negociar são eles.
Quem está com bravata são eles. Os meus bravateiros estão aqui, olha a cara do Alckmin. Foi chamado até de Sancho Pança, não sei porquê. Fizeram bullying com você, você deve processar o cara que fez bullying com você. E olha o Haddad, como está feliz da vida, sorrindo. Olha a Gleisi Hoffmann, olha o Mauro Vieira. Esse é o time meu de bravata para brigar. Esse time só sabe negociar.
Agora, também, o meu time não tem medo de briga. Não tem medo de briga. Se for preciso brigar, a gente vai brigar. Mas antes de brigar, a gente quer negociar, a gente quer vender e quer comprar para os Estados Unidos e para o resto do mundo. Por isso, Alckmin, Haddad, Gleisi, Mauro, parabéns pelo que vocês fizeram até agora. E Fávaro, continue vendendo. Continue vendendo, porque o Brasil precisa vender.
E eu tenho orgulho de, em apenas dois anos e meio, a gente ter aberto 400 novos mercados. E mais orgulho eu tenho ainda que, com apenas dois anos e meio, nós acabamos outra vez com a fome no Brasil. Isso é motivo de orgulho de um governo que trabalha.
Meu caro Davi, meu caro Hugo Motta, companheiros deputados, senadores e deputadas, a bola está com vocês. Quanto mais rápido vocês votarem, mais rápido os prejudicados serão beneficiados. E nós também estaremos dando ao mundo uma saída, porque muitos países estão na mesma dificuldade que o Brasil.
Estamos mostrando que é assim que se faz. E se tiver mais coisa, nós vamos fazer. Se tiver mais coisa, nós vamos fazer para os trabalhadores. Porque nesse país, a gente aprendeu, ninguém larga a mão de ninguém.
Um abraço e boa sorte.