Pronunciamento do presidente Lula na cerimônia de certificação do Brasil como país livre de febre aftosa sem vacinação
Bem, companheiros e companheiras, hoje é um dia de agradecimento.
Eu sempre disse que ninguém ganha medalha de ouro numa Olimpíada por sorte. Ou a pessoa treina, ou a pessoa treina, ou a pessoa se prepara, ou ele vai sair antes da final das Olimpíadas.
Eu quero dizer que é dia de agradecimento ao esforço que os produtores de gado no Brasil, que o Ministério da Agricultura, que os frigoríficos brasileiros, trabalharam 60 anos para serem reconhecidos como cidadãos de primeira categoria. Eu sei que todos nós aprendemos uma lição, Emmanuelle (Emmanuelle Soubeyran, diretora da Organização Mundial de Saúde Animal).
Uma coisa é a gente trabalhar para tentar agradar apenas aqueles de dentro da nossa casa. Outra coisa é a gente tentar ganhar o mundo e trabalhar para tentar agradar e convencer pessoas que muitas vezes nem conhecem o Brasil e nem conhecem os produtores, e que muitas vezes são competidores conosco e muitas vezes colocam exigências que nós achamos que são absurdas, mas nós cumprimos. Então hoje é o reconhecimento de um país que tem no agronegócio, que tem na agropecuária uma das suas mais importantes vertentes econômicas. Já não é quebra-galho trabalhar com o agronegócio do Brasil, virou o principal negócio do Brasil.
Então, eu acho que o companheiro Fávaro [Carlos Fávaro, ministro da Agricultura] tem razão de dizer que é um dia histórico, um dia histórico por merecimento de cada um de vocês que entendeu de que se a gente quer competir, a gente tem que ser o melhor. A gente quer produzir a melhor carne, a gente quer produzir a carne mais saudável e a gente quer disputar os mercados do mundo inteiro com quem quer que seja. É por isso que o Brasil hoje é possivelmente o campeão de exportação de proteína animal para o mundo inteiro.
E mesmo aqueles que ainda não querem comprar nossa carne, eu tive uma discussão muito rigorosa com o primeiro-ministro do Japão, não sei se ele já foi ao Brasil, se a equipe técnica já foi ao Brasil, mas eu tenho certeza que o que aconteceu no Japão, o que aconteceu no Vietnã, é o que vai acontecer na Coreia e é o que vai acontecer com todos os países que ainda não compram nossa carne. Durante muito tempo o Brasil foi tratado como se fosse um país insignificante, porque tem uma coisa, Emmanuelle, que nós brasileiros aprendemos e precisamos aprender cada vez mais. Ninguém respeita quem não se respeita.
Se a gente quiser ser respeitado no mundo afora, se a gente quiser disputar mercados, se a gente quiser ganhar mais espaço, nós temos que fazer o melhor e cada vez melhor. Não existe mais gracinha, não existe mais possibilidade de enganar ninguém e eu posso dizer a você, Emmanuelle, que no Brasil o pessoal trabalha com muita seriedade, com muita seriedade, porque eles aprenderam que é bom ser bom, eles aprenderam que é bom exportar carne de qualidade e ganhar mercados que até outro dia pareciam só dos outros e que o Brasil não tinha chance. A gente não quer ser grande apenas na manutenção da floresta, nos 12% de água doce, nos oito milhões e meio de quilômetros quadrados, nos oito milhões de fronteira marítima, nos 16 milhões e oitocentos de fronteira seca, na nossa riqueza mineral.
A gente nasceu para ser bom em tudo aquilo que a gente quer fazer e isso aqui é um certificado. Eu acho que esse certificado aqui é o reconhecimento da robustez e a confiabilidade do nosso sistema de defesa agropecuária. Mesmo sem a vacinação está comprovado que a aftosa não circula e cabe a nós não permitir que ela volte a circular nos nossos territórios.
Essa conquista, vocês sabem porque vocês trabalharam, isso aqui é fruto de 70 anos de trabalho de vocês, no esforço coordenado hora mais, hora menos pelo Ministério da Agricultura e eu quero agradecer a dedicação do companheiro Fávaro, a dedicação, o empenho, a peregrinação dele, de trabalhar, de viajar e com esse diploma que nós ganhamos ele pelo menos garantiu o Ministério até o começo do ano que vem, quando ele certamente se afastará para ser candidato outra vez a alguma coisa, porque as pessoas gostam de ser candidato.
Bem, eu tenho certeza que o que foi feito no Brasil pode servir de exemplo para toda América do Sul. Nós temos fronteira com muitos países, portanto, o nosso problema não é só cuidar de nós, não, nós temos que cuidar de nós e cuidar de ajudar os nossos vizinhos a cuidarem deles, porque se a gente não tiver e eles tiverem, a gente corre o risco de ter.
Então é muito importante, porque o Brasil veio para ficar. Eu tenho muito orgulho do que está acontecendo com o Brasil, muito orgulho, eu já fui presidente outras vezes, eu sei o que os presidentes da República brasileira sofriam no exterior, eu lembro quando o presidente não era sequer recebido pelo ascensorista do FMI, eu lembro quando ninguém queria conversar com o Brasil porque não acreditava que o Brasil fosse sério, e o que vocês fizeram e o que nós estamos fazendo é dar uma demonstração de que a gente não é melhor do que ninguém, mas a gente não é pior do que ninguém.
No mínimo, a gente quer ser igual àquele que pensa que é o melhor, é por isso que nós precisamos trabalhar mais, produzir mais, cuidar mais, porque o Brasil não tem retorno. Eu sonho que logo, logo esse país vai estar sendo a sexta economia mundial, nós já fomos a sexta economia mundial, eu sonho que a gente vai crescer mais do que os pessimistas dizem que a gente vai crescer. Se no ano passado a gente cresceu 3,4% com a agricultura não crescendo o tanto que se esperava, eu acho que o crescimento da agricultura desse ano pode permitir que a gente possa pensar em crescer um pouco mais.
Eu não acredito naqueles discursos que dizem que no começo do ano a economia brasileira vai crescer 0,8%, vai crescer 0,1%, vai crescer 0,5%, eu não acredito que tem estatístico tão preciso que consegue avançar e distinguir o que vai acontecer o ano inteiro. O que faz as coisas acontecerem é trabalho, trabalho e trabalho.
E o nosso crescimento nesse primeiro trimestre demonstra que a gente pode surpreender o mundo outra vez, crescendo acima da média dos países do mundo inteiro. E aí a gente tem que estar convencido que o Brasil depende única e exclusivamente de nós, naquilo que for preciso conversar, naquilo que for preciso negociar, naquilo que for preciso trabalhar, naquilo que for necessário fazer investimento, a gente vai fazer porque a gente não quer outra vez voltar a ser tratado como um país insignificante e um país pequeno.
Vocês já passaram por isso, vocês sabem o sofrimento, vocês sabem a loucura do que foi a gente ver 70 mil toneladas de carne brasileira no Oceano Atlântico indo para a China e a China ameaçando não querer receber a carne, e a quantidade de telefonemas que a gente teve que dar para ministro, para o Xi Jinping, para não permitir que a carne voltasse ao Brasil.
E essas coisas acontecem num gesto de confiança. Se a pessoa tem confiança no outro... Ontem eu conversei com o presidente Macron e o presidente Macron tem se posicionado contra o acordo União Europeia e Mercosul e eu disse para ele que eu vou ser presidente do Mercosul a partir do dia 6 de julho. Eu vou à Argentina para assumir a presidência do Mercosul.
E disse para ele que eu vou concluir o acordo definitivamente nos seis meses do meu mandato. Não tem porquê não concluir, não tem. E disse para ele, olha, se tem problema, se você tem problema com os agricultores franceses, vamos conversar com eles, vamos fazer uma reunião entre o pessoal agrícola seu e o nosso pessoal.
Porque nós, embora produzimos vinho, nós não queremos criar dificuldade para o vinho de vocês. Embora a gente produza champanhe boa no Rio Grande do Sul, a gente não quer proibir que vocês vendam champanhe para nós. Embora a gente esteja produzindo laticínios de qualidade, a gente não quer criar caso para vocês, continuem exportando para nós.
Eu sempre defendi que essa relação comercial é uma via de duas mãos. A gente vende, a gente compra e é bom que exista um equilíbrio. O que não tem explicação é um país, sabe, do tamanho da França, com a economia da França, e um país do tamanho do Brasil, com a economia do Brasil, só ter US$ 9 bilhões de fluxo comercial entre os dois países.
Não tem explicação. Com o Vietnã, sabe, que é uma relação muito recente, nós já temos quase R$ 13 bilhões de negócio. E se der certo, a carne vai aumentar. Mas temos que comprar o peixe bagre, não tem problema. O acordo estava afirmado, começa o Fávaro a brigar por causa de um peixe. Vamos levar esse bagrinho.
E é isso, eu quero primeiro agradecer à Organização Mundial da Saúde Animal, agradecer, Emmanuelle, você pode ter certeza, eu não vou ler meu discurso não, você pode ter certeza que esse reconhecimento de vocês é muito gratificante para o Brasil, é muito gratificante. O Brasil deve ter hoje mais de 230 milhões de cabeças de gado. Nós temos um estado, que eu não sei se está aqui, está o Fávaro, do Mato Grosso, um estado que só tem 3 milhões de habitantes e tem 33 milhões de cabeças de gado.
Então, isso é uma coisa para nós muito gratificante. Ou seja, deu certo, as pessoas teimaram, as pessoas acreditaram, as pessoas investiram, o governo contribuiu, porque o papel do governo é contribuir. Se o governo não atrapalhar, já está bom, gente. É esse o papel e por isso eu sou muito grato ao trabalho do Fávaro e acho que vocês precisam compreender o papel que esse gaúcho do Mato Grosso joga, na relação com vocês. Nós temos mais coisas, nós temos mais espaço, nós temos mais mundo para ganhar.
Eu vou ter que fazer uma bilateral, eu vou fazer três bilaterais seguidas. Nós vamos terminar os BRICS, depois eu vou ter uma bilateral com a Índia, que é preciso fazer um grande evento empresarial com a Índia. Depois, no dia seguinte, eu vou ter uma bilateral com o Egito, é preciso fazer uma grande reunião de empresários com o Egito, viu, Alban? (Ricardo Alban, presidente da Confederação Nacional da Indústria - CNI). Estou falando aqui para você, Alban.
E depois, eu vou ter, no dia seguinte do Egito, eu vou ter a Indonésia, que é outro país com mais de 200 milhões de habitantes e nós vamos fazer. Vai ser inédito, Guinness Book, três bilaterais seguidas depois de um encontro de mais de 40 países que vão se reunir no BRICS.
E em outubro eu ainda vou fazer uma outra coisa, eu vou no ASEAN. Pela primeira vez eu estou sendo convidado para participar da reunião do ASEAN, que envolve os 10 países asiáticos e eu vou lá para vender o que a gente produz, para vender a nossa carne, osso não, vender a carne de qualidade, vender o café, vender a soja, vender o milho, vender o carro, vender tudo que a gente produz.
E vender a necessidade da gente cuidar do meio ambiente. Gente, essa questão climática não é menos. Pode estar certo que o mundo está passando por uma virada. Se a gente tiver pelo menos a decência de cumprir o acordo de Paris, a gente vai estar livre para continuar produzindo aquilo que a gente quiser. O seu Fávaro que trate de incentivar a recuperação de todas as terras degradadas, para que a gente não precise mais derrubar, mas a gente precise plantar, que é isso que vai ajudar o Brasil.
Um beijo no coração de vocês, obrigado à Organização Mundial da Saúde Animal, muito obrigado.