Discurso do presidente Lula no encerramento do Fórum Empresarial Brasil-França
Transmissão ao vivo realizada pelo CanalGov
Meu caro Laurent Saint-Martin, ministro delegado encarregado do comércio exterior da França, por meio de quem cumprimento as autoridades francesas. Meu caro Márcio Elias Rosa, ministro interino do Desenvolvimento e Comércio [ministro interino e secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços], meu caro Jorge Viana, presidente da Apex, meu caro Ricardo Alban, presidente da Confederação Nacional das Indústrias do Brasil. Companheiros ministros que estão aqui, ministro das Relações Exteriores [Mauro Vieira], ministro da Justiça [Ricardo Lewandowski], ministro de Portos e Aeroportos [Silvio Costa Filho], ministro da Agricultura [Carlos Fávaro], que está muito feliz porque hoje o Brasil recebeu, da Organização Mundial de Saúde Animal, o certificado de que o Brasil, de 8,5 milhões de quilômetros quadrados, de mais de 250 milhões de cabeças de gado, recebeu o atestado de que o Brasil é um país livre de febre aftosa, sem vacinação.
Meus caros deputados federais, que me acompanharam, senadores da República, empresários brasileiros, empresários franceses, empresárias francesas e empresárias brasileiras, é uma grata alegria, depois de 13 anos de ausência, um presidente da República do Brasil voltar a Paris. Voltar a Paris não para passear, voltar a Paris para estreitar as relações entre dois países de uma língua de origem muito forte com o latim.
E, ontem, eu estou muito orgulhoso porque fui, na Academia [Francesa], homenageado, o segundo brasileiro a ser homenageado na academia. O primeiro foi Dom Pedro II, em 1872, se não me falha a memória. E eu consegui introduzir uma nova palavra no dicionário francês, que não existia, multilateralismo.
E, depois, tivemos uma bela reunião de trabalho com o presidente Macron [Emmanuel Macron, presidente da França]. A reunião estava tão boa que, quando a reunião terminou eu falei: presidente Macron, abra o seu coração para o Brasil e vamos fazer o acordo União Europeia e MERCOSUL, para que a gente possa aproveitar esta oportunidade, que querem derrotar o multilateralismo, que querem derrotar o livre comércio, a volta do protecionismo não ajuda ninguém.
Então esse é um momento extraordinário para a gente fortalecer as relações democráticas, as relações comerciais, as relações políticas, as relações econômicas e as relações culturais. É isso que faz com que eu esteja na França, um país que sempre me acolheu de forma muito calorosa.
Eu não esqueço nunca que quando eu criei o projeto Fome Zero, em 2003, o primeiro presidente dos países do mundo que me telefonou e que foi encontrar comigo para defender o meu programa foi o presidente Chirac [Jacques Chirac, ex-presidente da França].
Depois eu tive uma belíssima relação com o presidente Sarkozy [Nicolas Sarkozy, ex-presidente da França], depois eu não era mais presidente quando estava o François Hollande [ex-presidente da França], e quero dizer para vocês que eu tenho uma relação muito primorosa com o companheiro Macron. Já nem chamo mais de presidente, agora é companheiro. É “companheiro Macron” e “companheiro Lula”. E, sobretudo, nesse momento em que os franceses estão orgulhosos porque ganharam a Champions League.
E a lição, a vitória do Paris Saint-Germain, eu disse para o presidente Macron, ela nos ensina na política. Não existe saída mágica, saída individual. Eu lembro quando o Paris Saint-Germain contratou de uma vez só o Messi, já tinha o Mbappé, contratou o Neymar para ser campeão das Champions e não foi.
Esse time do Paris Saint-Germain, que foi campeão da Champions, os 11 jogadores – juntos – ganham menos do que ganhavam Mbappé, Messi e Neymar. Uma demonstração de que, no futebol e na política, o conjunto vale muito mais do que a ação individual.
Quero aqui dizer que está o nosso embaixador André Corrêa do Lago, que vai ser o presidente da COP30, no estado do Pará. Seria importante você levantar para as pessoas saberem quem você é, André. Levanta aí para as pessoas verem, olha para trás, pelo menos.
Bem, companheiros e companheiras, permitam chamá-los assim, eu terminei uma reunião com os empresários franceses e saí convencido que são todos meus companheiros. Aliás, até na reunião que nós recebemos o certificado, até com os empresários do agronegócio, eu achei que ali estava todo mundo companheiro. A gente percebe que tem momentos na vida da gente em que as diferenças desaparecem quando os objetivos comuns são contemplados.
E eu não poderia deixar de reconhecer o trabalho vigoroso que os empresários do agronegócio brasileiro tiveram durante 60 anos para que a gente conquistasse esse certificado. E a gente precisa aprender a reconhecer o sacrifício. Da mesma forma que foi muito orgulhoso fazer a reunião com os empresários franceses e ver os compromissos e o carinho que os empresários franceses têm com o Brasil.
Eu acho que cabe à Confederação Nacional da Indústria, cabe aos nossos ministros não deixarem para se reunir com os empresários quando eu vier aqui outra vez. É importante que a gente crie uma sistematização em que a gente possa, de tempos em tempos, escolher os empresários de vários países e reunir para tomar um café, para conversar, para saber qual é o problema, qual é a dificuldade, quais são as coisas boas que estão acontecendo. Porque não tem explicação um país do tamanho da França e do tamanho do Brasil, com a economia da França, com a economia do Brasil, só ter um fluxo de comércio de US$ 10 bilhões.
Não tem nenhuma explicação. Não sei de quem é a falha, se é minha, se é do Macron, se é dos outros governos, se é dos empresários. O que é o dado concreto é o seguinte: os ministros de comércio exterior não podem ficar sentados em uma cadeira no ministério. Têm que viajar.
Os franceses têm que vender as coisas da França no mundo e o Brasil tem que vender as coisas do Brasil. Nós não podemos ficar sentados em uma poltrona achando que somos o melhor do mundo e que alguém vai nos procurar para comprar alguma coisa nossa. Eu é que tenho que vender aquilo que eu acho que é bom.
Se nós achamos que o Brasil é competitivo na área agrícola, ótimo, nós temos que sair para defender os nossos produtos. Eu, por exemplo, disse ao ministro e disse ao Macron ontem, “eu compreendo a necessidade dos discursos do governo francês com relação ao acordo, com relação à defesa dos seus agricultores”. Eu disse ao presidente Macron: “se nós colocarmos os agricultores franceses junto com os brasileiros, vai ter uma descoberta extraordinária. Eles vão descobrir que as nossas agriculturas são complementares, uma não prejudica a outra”.
Ora, por que eu não posso comprar um franguinho francês e por que os franceses não podem comprar um franguinho brasileiro? Afinal de contas, o comércio binacional é uma via de duas mãos. Eu compro e vendo. Eu exijo qualidade, mas eu ofereço qualidade. É preciso que a gente tenha essa abertura suficiente.
Eu falei para o Macron: “vamos juntar os nossos produtores que você vai ver que eles vão ter muito mais afinidade do que os nossos técnicos”. Não é que eu esteja desmerecendo o técnico, não. O técnico é muito importante. São gente especialista, gente bem formada, gente muito qualificada. Mas nesse negócio de acordo, falta uma certa sensibilidade política, sensibilidade econômica, sensibilidade de interesses, de quem produz. E é isso que nós precisamos mudar no nosso comportamento.
Por isso eu estou otimista e disse ao presidente Macron – eu assumo a presidência do MERCOSUL dia 6 de julho e termino acho que dia 6 de dezembro – e falei: “antes de eu terminar a presidência do MERCOSUL, esteja preparado porque nós vamos assinar o acordo União Europeia e MERCOSUL”.
É uma necessidade.
É uma necessidade para a União Europeia, é uma necessidade para o MERCOSUL e é uma necessidade para o mundo. É um acordo que envolve 722 milhões de pessoas, é um acordo que envolve US$ 22 trilhões. É um acordo que é uma demonstração – a quem está tentando derrotar o multilateralismo, e a quem está tentando voltar a fazer o protecionismo – de que o mundo não quer xerife.
O mundo não tem dono.
Cada país é soberano e, de acordo com a sua soberania, faz aquilo que quiser sem que ninguém de outro país dê palpite ou imponha taxação de forma desordenada a quebrar a harmonia de uma economia que já havia funcionado bem.
E, depois, nós não aceitamos mais uma nova Guerra Fria.
Nós não queremos disputar entre China e Estados Unidos. Eu quero negócio com a China e quero negócio com os Estados Unidos. Eu quero negócio com a França e quero negócio com a Alemanha. A França tem que querer com o Brasil e querer com outro país da América do Sul. Nós não podemos ter o direito de sermos donos do comércio mundial.
Por isso, eu tenho viajado muito o mundo, e vou continuar viajando e nós vamos fazer uma coisa no Brasil dia... acho que 7 e 8 e 9. Eu acho que vai ser a primeira vez. Aloysio [Nunes], você que foi ministro das Relações Exteriores do Brasil, vai ser a primeira vez que nós vamos fazer o BRICS. Ao terminar o BRICS, eu vou ter uma bilateral com a Índia, talvez uma visita de Estado da Índia, uma visita de Estado do Egito e depois uma visita de Estado da Indonésia.
Só aí são 1 bilhão e setecentos milhões de habitantes. Então, quem quiser vender, se prepare, porque o que não falta é consumidor. É preciso que a gente se dote de argumentos, porque cada visita dessa tem que ser dotada de reuniões empresariais, porque os políticos não sabem fazer negócio.
Os políticos, o máximo que eles fazem é abrir a porta. Quem sabe negociar são vocês empresários que se prepararam para isso. Então, o meu compromisso é permitir que os empresários brasileiros participem ativamente disso, Alban [Ricardo Alban, presidente da Confederação Nacional das Indústrias do Brasil], e a Apex [Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos]. Ou seja, para que a gente faça grandes negócios, porque o mundo não protege quem fica em casa descansando.
É preciso sair para trabalhar. Eu levanto todo dia às 5h30, faço duas horas de ginástica e vou dormir meia-noite ouvindo notícias negativas contra mim. Estou feliz da vida. Estou feliz da vida.
Quero agradecer a presença da imprensa brasileira, da imprensa francesa, e dizer para vocês, antes de ler o meu pequeno discurso aqui, que eu estou há muito tempo reivindicando a Deus o direito de viver 120 anos.
Um dia, eu vi uma matéria numa revista de que já nasceu o homem que vai viver 120 anos. Então, me bateu uma ideia na cabeça. Por que não eu? Pode ser eu, que já nasceu, eu já nasci. E eu ainda sou privilegiado de ter nascido quatro meses depois que acabou a Segunda Guerra Mundial.
Então, vocês percebem que eu nasci para viver. E viver bem. Como eu acredito que existe um céu, deve ser muito maravilhoso, mas eu prefiro ficar aqui na Terra. Eu, sinceramente, estou reivindicando a Deus: "me deixa aqui, porque eu tenho muita coisa para fazer".
E, por isso, eu tento me cuidar, eu tento ser simpático, eu tento conversar bem com as pessoas, porque quem quer viver muito tempo não pode ser chato. Embora eu esteja sendo, não pode ficar falando coisas que desagradam as pessoas.
Bem, iniciativas como essas contribuem enormemente para o adensamento das relações entre os nossos países, ao trazer a dimensão empresarial para o centro da agenda bilateral. Estamos engajando o setor privado no avanço de projetos estratégicos vantajosos para os dois lados. Vocês sabem que, há 13 anos, um presidente do Brasil não vinha à França. E, quando um presidente da França tentou ir ao Brasil recentemente, o presidente do Brasil se escondeu para não recebê-lo.
Uma vergonha que não tem dimensão!
Quando a presidenta Dilma Rousseff esteve em Paris, em 2012, nosso intercâmbio atingiu seu ápice de US$ 10 bilhões. Sinceramente, uma vergonha. É muito baixo. O Brasil com o Vietnã já tem US$ 13 bilhões de fluxo de relação comercial.
Então, vocês, empresários franceses, e vocês, empresários brasileiros, tratem de trabalhar.
Vamos sair daqui lançando um plano de meta. “Nos próximos 10 anos, vamos chegar a US$ 20 bilhões”. E trabalhar para isso, porque, se não tiver plano de meta, e a gente só fizer as coisas quando a natureza permitir, não dá certo.
Nós temos que forçar, tentar garimpar, descobrir as oportunidades. E posso dizer para vocês, em se tratando da transição energética e da transição climática, poucos países no mundo oferecerão as oportunidades que o Brasil está oferecendo. Poucos. Nós não queremos ser o melhor, mas queremos apenas ser o maior. É isso que está na nossa cabeça, é esse o objetivo do governo.
Bom, desde a vinda da presidenta Dilma, nós não conseguimos retomar nem os US$ 10 bilhões. Meu governo está determinado a recuperar o tempo perdido e levar nosso comércio à altura da parceria estratégica com a França.
É com esse propósito que eu trouxe em minha comitiva ministros, aliás, governador, eu vi a cara do governador Brandão [Carlos Brandão], do Maranhão, aqui presente. Obrigado por ter vindo nesta reunião, companheiro Brandão.
Essa parceria é estratégica porque tem vocação para estimular a pesquisa, a inovação, a produtividade e a competitividade. É com muito orgulho que acabo de participar da cerimônia de certificação, eu já falei isso, do Brasil pela Organização Mundial da Saúde Animal.
O sistema de sanidade da agropecuária brasileira é exemplo para o mundo. Tem muita gente que às vezes eu vejo no jornal que “tal país não quer importar tal coisa do Brasil porque ele tem problema”. Eu queria dizer aos empresários franceses: não acreditem no que eu estou falando. Mandem seus técnicos, seus especialistas ir ao Brasil. Para acompanhar de perto. Eu, sinceramente, acho que a gente não tem a melhor política de sanidade animal, política sanitária, mas eu duvido que tenha um país que tenha melhor do que nós. No máximo é igual, porque os nossos produtores aprenderam que se a gente quer ganhar espaço no mundo, a gente tem que ser o melhor.
E eu disse agora há pouco para os empresários: ninguém ganha uma medalha de ouro numa Olimpíada se não treina sistematicamente a semana inteira. Se alguém acha que pode ficar na boa vida e depois vai ganhar a medalha, pode “tirar o cavalo da chuva”. Aliás, ontem eu tive a oportunidade de jantar, junto com o Macron, com um cidadão de 140 quilos que é cinco vezes campeão olímpico de judô pela França [Teddy Riner]. Quem quer tem que ter qualidade, cara.
Então, o Brasil se preparou para ser competitivo. O Brasil se preparou! E nós queremos a medalha de ouro da melhor política sanitária que qualquer país do mundo tenha, porque nós não podemos retroceder.
Então, companheiros, na desconfiança, visite o Brasil. Visite, peça informações, vá nos nossos laboratórios, que vocês terão uma resposta extraordinária sobre as coisas que nós estamos fazendo. Práticas inovadoras permitem que sejamos o quarto maior produtor mundial de alimentos, utilizando apenas 8% do nosso território.
E nós, agora, para cumprir as exigências que as mudanças climáticas estão a exigir, nós estamos com uma política muito séria de recuperação de terras degradadas, o equivalente a quase 60 milhões de hectares de terra que nós queremos disponibilizar para as pessoas recuperarem e plantarem, sem precisar devastar a floresta que está em pé. É simples isso. Ao invés de destruir uma coisa boa, vamos recuperar uma coisa ruim.
É esse o desafio que está colocado para nós, e eu estou convencido que também nós conseguiremos muito sucesso nessa política.
Mais da metade do Brasil permanece com cobertura vegetal do jeitinho que Deus fez o mundo. Só a natureza que coloca e tira quando quer, mas a gente tem muita coisa preservada no Brasil.
Com o Programa Nacional de Recuperação de Pastagens Degradadas, vamos ampliar a produção sem cortar uma única árvore. Nossa indústria também é competitiva em vários setores de elevado conteúdo tecnológico. Projetos bilaterais como o Programa de Submarinos em Itaguaí ou a Fábrica de Helicópteros de Itajubá têm enorme potencial transformador. Aprofundar a integração dessas e de outras cadeias de valor permitirá gerar mais emprego e mais renda para os dois lados, francês e brasileiro.
Meu governo está recuperando a capacidade de planejamento do Estado brasileiro e priorizando a reindustrialização. O meu comandante da Marinha, o Almirante Olsen, veio nessa viagem porque nós estamos concluindo definitivamente o acordo com os franceses para a gente produzir o navio de propulsão nuclear em parceria com a França.
Isso foi um acordo feito com o presidente Sarkozy e nós esperamos concluir o mais rápido possível. Porque o Brasil, além de ter uma costa marítima de 8 mil quilômetros, o Brasil tem responsabilidade de 5,7 milhões de quadrados de mar. Nós temos muita água para tomar conta, além da nossa. E não dá para ir de canoa. Não dá. Então, nós temos que ter um submarino desses que somente as potências mundiais têm.
E por isso nós estamos… E também helicópteros. Nós queremos fazer uma grande compra de helicópteros em parceria com os governos dos Estados para que a gente cuide da segurança pública dos Estados. Para que a gente cuide do desmatamento dos incêndios nas florestas brasileiras. E para que a gente cuide da nossa defesa. O Brasil é um país, sabe, que além desse território imenso que o Brasil tem, a riqueza mineral, a riqueza do oceano, e a gente não tem efetivamente uma preparação de uma potência para cuidar disso.
E por isso nós precisamos produzir helicópteros no Brasil, com a França, para vender para a América Latina. Esse é o nosso desejo. Por isso é que nós estamos discutindo. Quem sabe quando o Macron for para lá na COP, a gente já tenha esse acordo para a gente assinar e começar a fazer com que a fábrica da Helibras, na cidade mineira de Itajubá, se transforme numa grande fábrica construtora de helicópteros.
O acordo que a Fiocruz celebrou com a Sanofi e o Instituto Pasteur, hoje, associa pesquisa e produção, demonstrando o dinamismo e a capacidade do complexo industrial da saúde. Nossa indústria cultural também floresce. O premiado Cinema Nacional, celebrado no Oscar e no Festival de Cannes, confirma o talento da nossa gente.
É importante dizer para vocês uma coisa que eu acho muito séria. O Brasil é o único país do mundo com mais de 100 milhões de habitantes que tem um Sistema Único de Saúde, aprovado na Constituição de 1988.
Esse Sistema de Saúde Único sempre foi muito atacado por setores privados que não se conformavam com o nosso Sistema Único. Quando veio a covid, se não fosse esse Sistema Único, a gente teria perdido muito mais gente do que perdemos. E o que é mais importante é que um país que tem 215 milhões de habitantes – que tem um Sistema Único de Saúde que dá atendimento à grande maioria da população – precisa de uma indústria de saúde muito forte.
E é por isso que dentro dessa Nova Indústria Brasil, a gente tem um capítulo especial sobre a indústria da saúde, para comprar máquinas sofisticadas, para produzir no Brasil máquinas sofisticadas e para produzir todos os remédios que nós precisamos. Porque no Brasil, 41 remédios de uso contínuo são doados de graça para as pessoas. De graça. As pessoas saem do médico e levam o remédio.
E mais ainda, agora estamos criando um programa de saúde chamado Agora Tem Especialista, que é garantir às pessoas mais humildes do país que quando ele fizer a sua primeira consulta, que o médico dizer que ele tem que procurar um especialista, ele vai ter um especialista logo, e quando o especialista disser que ele tem que fazer uma ressonância magnética, ele não pode esperar 11 meses, 10 meses, 12 meses. Nós queremos que seja imediatamente.
E por isso, nós estamos acreditando muito que essa indústria da saúde será uma coisa extraordinária, sobretudo num país que tem um instituto como a Fiocruz, que tem um instituto da maior qualidade, e eu acho que nós vamos ter sucesso.
Eu fui à China há poucos dias atrás e fizemos acordo para produzir muitas máquinas importantes dentro do Brasil.
Nós vamos resolver um problema sério, porque o pobre antes recebia a receita do médico, levava para casa, colocava em cima do criado e morria sem ter dinheiro para comprar o remédio.
Nós começamos a dar remédio de graça. Mas então agora eu tomo remédio, mas vai no especialista, como não tem especialista, ele morre sem ter um especialista. E eu quero que as pessoas tenham, na área da saúde, um tratamento muito respeitoso, e aí eu tenho certeza que essa indústria da saúde vai crescer de forma extraordinária.
Na indústria cultural, também floresce. Vocês sabem que nós estamos fazendo uma coisa extraordinária. Esse motivo do orgulho do Brasil é ganhar um Oscar com um filme que conta uma história muito interessante. O filme chama-se “Ainda Estou Aqui”. É a história da mulher de um deputado que foi chamado pela Polícia Federal na época do regime militar, pela Política Federal não, pelo regime militar, e nunca mais voltou. Mataram ele.
E a mulher dele… o filme é sobre ela. E o filme é um livro feito pelo filho dele, que é um cadeirante, Marcelo Paiva, que é um grande escritor, um companheiro de primeira qualidade. E também o Festival de Cannes.
É muita coisa, muito orgulho para nós, que sempre fomos tratados como um paizinho de terceiro mundo. A gente ganhar Cannes e ganhar o Oscar é motivo de muito orgulho, igual vocês ganharem a Champions League, que nunca tinham ganhado, é para nós ganhar o Oscar, que nunca tínhamos ganhado, e Cannes, que nunca tínhamos ganhado.
Bem, as centenas de eventos e atividades das Jornadas Culturais Cruzadas, de França e Brasil neste ano, ampliarão o conhecimento recíproco e o turismo. Na Europa, a França é a maior emissora de turistas para o Brasil. Nos últimos dois anos, o número de turistas franceses que visitam o nosso país cresceu 80%.
Mas aqui também não vale. Esse 80%, quem colocou aqui, certamente foi para me agradar. Porque 80% é sobre o quê? Então é o seguinte, da próxima vez, coloca o número efetivo de turistas. Porque uma coisa é 80% sobre mil, outra coisa é 80% sobre 100, outra coisa é 80% sobre 10.
E eu não sei quantos turistas franceses iriam ao Brasil. Mas eu posso dizer para vocês que a França é um país que tem na sua economia o turismo como um dos pilares mais fortes.
Porque vocês têm história.
São milhares de anos de história.
Nós não temos história. Nós fomos descobertos pelos portugueses. Depois, no primeiro tempo, se matou quase todos os indígenas. Depois, em outro tempo, começou a trazer o povo negro da África. Foram 350 anos de escravidão.
Mas nós temos uma coisa que vocês precisam: a natureza. A natureza virgem, intocada. Lugares que nunca foram mexidos desde que chegaram os portugueses no Brasil em 1500. Praias maravilhosas. Água quente. Você já entrou numa praia no Nordeste brasileiro, gente? A minha mulher estava querendo ir à praia em Nice.
Eu falei: ó, eu acho que a água é gelada. Eu acho que a água é como tirar uma cerveja da geladeira. Agora, se vocês forem a Pernambuco, à Bahia, Alagoas, Rio Grande do Norte, Paraíba, vocês vão entrar na água às cinco horas da manhã como se estivessem tomando um banho morno embaixo do chuveiro, de tão boa que é a água.
Ah, os Lençóis Maranhenses são tão bonitos que eu ainda não conheço. Eu nunca tive a sorte, mas é um dos lugares mais lindos do Brasil, que eu quero ver se eu passo umas férias com a Janja lá. Porque é um lugar muito, mas muito, muito bonito. Eu vejo por fotografia e vejo meu companheiro governador do Maranhão dizer que os Lençóis Maranhense são uma peça da natureza.
Bem, o Brasil é um mercado de 212 milhões de pessoas. Eu falo 215 e o cara me escreve 212. Não é possível. Não é possível, gente. É o seguinte: o Brasil teve um censo no governo passado que não era crível. Então nós tivemos que fazer um outro censo para dar credibilidade à quantidade de pessoas que tem no Brasil. Eu ainda trabalho com a ideia de 215 milhões de brasileiros que é um número redondo e é o número que o Brasil merece, 215.
Bem, e com uma classe média em expansão, uma juventude criativa e uma democracia vibrante. Contrariando os pessimistas nos mercados internacionais, nos últimos dois anos o Brasil cresceu acima de 3%. Vocês podem falar assim: “Mas esse Lula, esse cara vem aqui falar que o Brasil cresceu 3%. O que é 3%?” Quanto é que cresceu a França? Poucos países cresceram mais que 3%. Qual é a novidade nesse crescimento?
A novidade nesse crescimento é que desde que eu deixei a presidência da República em dezembro de 2010, o Brasil não crescia mais que 3%. Então ficou 15 anos sem crescer mais de 3%. Voltou a crescer quando eu voltei à presidência.
Cresceu 3,2% no primeiro ano, cresceu 3,4% agora, e, se prepare, porque a gente vai continuar crescendo. Porque tem uma coisa que eu acredito, que eu vou dizer para os empresários brasileiros e franceses. É uma lógica econômica que eu construí. Eu não aprendi na universidade, porque a universidade não ensina isso. Não ensina isso.
A minha lógica é a seguinte: muito dinheiro na mão de poucos significa pobreza, significa miséria, significa fome. Agora, pouco dinheiro na mão de muitos significa exatamente o contrário. Significa distribuição de renda. Porque quando um cidadão pega um bilhão de dólares no banco, ele até fazer o seu empreendimento vai demorar anos ou ele vai pegar num banco e colocar no outro para render lucro.
Mas quando você coloca dinheiro na mão do povo, mesmo que seja pouco, aquele dinheiro volta para o mercado imediatamente. Ele volta no dia seguinte, com um agravante. Como o povo não pode sonegar imposto, ele vai pagar de cara 28% do dinheiro que ele recebeu. É descontado na hora. Ele não tem forma de sonegar imposto. Não há possibilidade de evasão fiscal.
Então eu acredito muito nessa história de que nós precisamos fomentar cada vez mais crédito para as pessoas mais humildes. Crédito, crédito, crédito. Fazer o dinheiro circular. O dinheiro não pode ficar no Banco Central ou ficar nos bancos, não. O dinheiro tem que circular na mão das pessoas.
E esse é um dos sucessos do nosso governo. Já foi no governo passado, quando a gente cresceu 7,5%. Eu ia nas reuniões, visitava o mundo e meus ministros só falavam da macroeconomia, da macroeconomia, da macroeconomia, e eu só falava da microeconomia. Da microeconomia. Eu quero o dinheiro na mão do povo. Para que ele possa ter crédito. O microempreendedor individual. Dinheiro na mão das mulheres, das pequenas mulheres empreendedoras no Brasil. É muita gente. E esse dinheiro gera emprego. Esse dinheiro tem um retorno imediato.
Esse é o sucesso da economia brasileira. Só de inclusão social, o Brasil tem aproximadamente mais de 360 bilhões de reais. Dinheiro que em outros governos não se daria. Porque tem muita gente que não gosta de ajudar os pobres.
Tem muita gente que acha que é assim mesmo, tem que ter pobre e tem que ter rico. O rico tem tudo, o pobre não tem nada. E assim vai. Passam séculos, séculos e séculos e as pessoas pobres. E eu não acredito que as pessoas nasceram para ser pobres. Eu acredito que as pessoas nasceram nas condições que eles tinham que nascer. Mas a partir do nascimento o Estado tem a responsabilidade de criar as condições de ele ter oportunidade para não ser mais pobre. É isso que nós temos que fazer.
Bem, companheiros, eu estou muito preocupado porque em um mundo cada vez mais complexo e que vê o retorno do protecionismo, é fundamental que parceiros históricos se unam para enfrentar as incertezas e as instabilidades da economia global. Eu estou seguro, mas estou mesmo, de que nós vamos concluir o Acordo União Europeia-MERCOSUL. Que não vai dar resultados imediatos para nós, não. E vai demorar porque nada acontece de imediato.
Mas o exemplo que a gente vai dar, vai ser um exemplo muito importante. Por isso, eu vou tirar proveito da minha relação de amizade com o Macron e vou toda semana ligar para o Macron: “Macron, Macron, meu amigo, Macron, meu companheiro, vamos fazer negócio…”. Vai sair. Aí, quando sair, eu volto a Paris. Aí sim, nós vamos fazer um acordo definitivo.
Eu tenho a certeza, e eu já falei para vocês, de que, ontem eu falei para o presidente Macron: “Macron, vamos chamar um grupo de pessoas ligadas à agricultura francesa, um grupo de pessoas ligadas à agricultura brasileira e vamos colocar numa mesa para conversar”. “Qual é o teu problema? Qual é o teu problema?” E vamos perceber que há muita complementaridade entre os produtores franceses e os brasileiros. A França tem coisas muito especiais e isso não tem competitividade, ela vai continuar vendendo. Mas nós temos coisas boas também. Gente, vocês não sabem a qualidade da carne brasileira. Não sabem a qualidade.
Eu, se fosse ministro da Agricultura, tinha convidado todos vocês para um churrasco. Mas ele, como é sovina, não chama.
Outra coisa que eu tenho falado para o companheiro Macron: “pelo amor de Deus, Macron, você precisa falar para os franceses que os franceses são um país amazônico”. Os franceses não sabem que a maior fronteira da França no mundo é com o Brasil. Ninguém sabe. E mais, com o Brasil amazônico. Não é com o Brasil urbano, não, é com o Brasil amazônico.
Eu cheguei a propor para o Sarkozy a gente criar uma universidade entre os dois estados, Amapá e a França, para que a gente pudesse discutir a riqueza da nossa biodiversidade. Não foi possível, mas nós vamos criar um instituto logo, logo, porque se faz necessário.
Bem, companheiros e companheiras, eu queria ir terminando, dizendo para vocês que eu espero que vocês compareçam na COP30 no Brasil. Porque vocês sabem que eu estou defendendo muito uma mudança na governança mundial. Nós não temos governança mundial hoje. A ONU não representa quase nada mais. Nenhuma decisão da ONU é cumprida. E os cinco países que são membros permanentes do Conselho de Segurança também não obedecem a ONU.
Então, fica o Putin [Vladimir Putin, presidente da Rússia] fazendo guerra com a Ucrânia sem decidir na ONU. Os Estados Unidos invadem o Iraque sem decidir na ONU. A França e a Inglaterra vão para a Líbia sem passar pela ONU. O que é que passa pela ONU? A ONU criou o Estado de Israel em 1947. Por que não cria o Estado da Palestina agora? Porque não tem força.
A geopolítica mundial mudou.
Por que não tem, no Conselho de Segurança da ONU, um país do tamanho do Brasil? Do México? Por que não tem uma Índia? Por que não tem... uma Etiópia – tem 126 milhões de habitantes. Uma Nigéria – tem 216 milhões de habitantes. Um Egito – tem 100 milhões de habitantes.
Todas essas pessoas estão fora.
A Alemanha está fora. O Japão está fora porque a China não quer. A Alemanha está fora porque não sei o que quer. Gente, não funciona assim.
Vamos entender, não existe mais a ONU que foi criada depois da Segunda Guerra Mundial.
É preciso que a gente abra a nossa cabeça para entender que a ONU precisa voltar a ser representativa. Quando a gente decide alguma coisa na COP30, como se discutiu o Acordo de Paris, as pessoas não cumprem.
E qual é a punição que eles têm? Nenhuma. Quando os Estados Unidos recusam a cumprir o Protocolo de Kyoto e depois tentam sair do Acordo de Paris, o que vai acontecer na COP30?
A gente está fazendo a COP30 na Amazônia para mostrar para as pessoas o que é a Amazônia. Porque tem muita gente que fala da Amazônia, mas tem pouca gente que conhece. E a gente quer que as pessoas vejam do que é que nós estamos falando.
Porque dizem que a Amazônia é o pulmão do mundo. Eu já briguei com isso desde os anos 80. Eu viajava o mundo naquela época, Marina [Silva, ministra do Meio Ambiente e Mudança do Clima], e em qualquer país que eu chegava: “Não, porque a Amazônia é o pulmão do mundo, não pode desmatar a Amazônia”. Eu falava: “a Amazônia é o pulmão do mundo, mas a nossa dívida externa é a pneumonia. Então, por favor, nos ajude a curar dessa pneumonia para a gente poder salvar esse pulmão”.
E ainda hoje. Agora, as florestas continuam sendo o pulmão do mundo, mas a pobreza é a desgraça do mundo. Os países que têm florestas são quase todos pobres. A América do Sul tem uma Amazônia envolvendo vários países. A Indonésia e o Congo [têm florestas]. Onde mais tem floresta?
E depois, os países mais ricos têm que compreender que eles têm um passivo histórico. Como eles começaram a industrialização há muito mais tempo, eles emitiram gás de efeito estufa há muito mais tempo. Então, eles têm que pagar esse contencioso. Têm que pagar, senão não resolve o problema.
Eu sei que é difícil a gente convencer, mas essa é a realidade. Vocês já tiraram proveito de poluir o planeta. Vocês já criaram o Estado de Bem-estar Social. E nós que ainda não criamos nada? Não vamos ter chance de criar? Essa é a discussão que está na mesa. E, obviamente, que é uma discussão que precisa de muito convencimento, muito carinho, sabe, não é na marra.
E aí, quando a gente decidir as coisas, quem é que vai obrigar a cumprir?
Tem que ter uma governança mundial. E não vamos deixar o Trump [Donald Trump, presidente dos Estados Unidos] ser o presidente dessa governança, não. Não vamos deixar, porque se ele quiser ser, nós estamos prejudicados. A governança tem que ser um coletivo, não pode ter direito de veto no Conselho da ONU. Você viu nesse negócio de Gaza?
Quantas decisões foram feitas? Aí tem 14 favoráveis, um veta, não acontece nada. Dizem que tem que ser por consenso. Não precisa ser por consenso. O consenso é importante quando ele é construído. Mas se ele não for construído, vota a maioria. Isso é democracia.
Então nós estamos nessa situação. Nós estamos órfãos de pai e mãe. Nós não temos uma governança global que possa, como o G20, como o BRICS. Se juntar todo mundo, você tem um fórum muito representativo que quando tomar decisão, a pessoa tem que cumprir.
Se não cumprir, aí sim, uma punição coletiva para as pessoas cumprirem. Porque hoje não acontece nada!
Então esse é o desafio que a humanidade está tendo no século XXI. Eu vou terminar dizendo para vocês que nós temos também… Eu vou a Nice participar do Congresso da Conferência sobre o Oceano, que é outra coisa muito menosprezada por todos nós. Por todos nós!
Nós vamos para a praia, nós esquecemos de jogar o saquinho de plástico, esquecemos de jogar a cervejinha e vai deixando coisa no lixo. Daqui a pouco estão os tubarões procurando a gente na beira da praia porque não tem mais comida para eles comerem.
Então nós precisamos tomar cuidado, que é o seguinte: nós estamos destruindo o planeta. Não é possível que nós, que somos a única espécie inteligente do mundo animal, sejamos tão ignorantes de destruir o mundo em que a gente vive. Não tem outro mundo, é só aqui mesmo.
Então, em vez de ficar fazendo voo não sei para onde, vamos conservar a Terra. É tão bom aqui, gente. É tão bom, o ar é tão gostoso. Então vamos preservar isso aqui, vamos deixar de ser irresponsáveis, vamos acreditar na ciência.
A gente paga estudo para tanta gente que ficar tão inteligente e nós precisamos então ter certeza de que o que eles falam é verdade.
Está acontecendo um problema sério no planeta!
Quando eu vejo gelar na Arábia Saudita, quando eu vejo encher de água no deserto do Saara, quando eu vejo chover muito onde não chovia, vejo secar onde não seca, alguma coisa está acontecendo.
E é isso que nós temos que cuidar, mas não é um país sozinho, são todos juntos. Qual é a contribuição que o Brasil pode dar com a sua Amazônia? Nós estamos dispostos a dar, assumimos o compromisso.
Agora é preciso que as pessoas compreendam que embaixo de cada copa de árvore tem um ser humano necessitado, que precisa sobreviver. Essa é a questão que está colocada para todos nós. E não é uma questão do governo, é uma questão da sociedade. Se a gente não se manifesta, os governos pensam que estão certos. E se vocês não se manifestarem, a gente vai continuar errando.
Bem, o Brasil tem um compromisso muito sério com a agricultura de baixo carbono. Só para vocês terem ideia: o Brasil é um país que tem 90% da sua energia elétrica limpa. O Brasil tem uma gasolina que utiliza 30% de etanol na mistura. E o Brasil tem um óleo diesel que usa 15% de biodiesel no óleo diesel.
Então ninguém no mundo vem dar lição para a gente de descarbonizar o planeta.
Mas nós precisamos sobreviver. E o que nós queremos é construir parceria, nada mais do que isso. É construir parceria para que a gente tente – coletivamente – encontrar uma solução para garantir aos nossos filhos, aos nossos netos, um mundo habitável.
Porque se a temperatura ultrapassar 1,5°C e chegar a 4°C, como estava previsto antes do Acordo de Paris, nós iremos pagar um preço muito alto.
Bom, dito isso, queridos companheiros e companheiras, eu estou pulando as páginas aqui para acabar logo o meu discurso, porque eu já improvisei demais. Eu queria dizer para vocês que eu tenho um compromisso de vida na luta contra a desigualdade. Qualquer desigualdade. A desigualdade racial, de gênero, da saúde, da educação, do salário, do emprego.
No Brasil nós aprovamos uma lei em que mulher e homem recebem o mesmo salário se exercerem a mesma função, se der o trabalho igual. Mas nós temos que ir para a justiça, porque a lei, todos os empresários questionam. Então, como é que a gente acaba com o preconceito? Como é que eu vejo nos jornais? A Europa está se preparando, se armando. “Não sei que país colocou 800 bilhões de dólares para comprar armas”. Foi a União Europeia toda. “O Japão volta a comprar armas”.
O mundo gastou ano passado 2 trilhões e 700 bilhões de dólares de armas. E ao mesmo tempo, nos nossos olhos, o Haiti está sendo destruído. Pela fome. 733 milhões de pessoas no planeta Terra vão dormir toda noite sem ter certeza de que no dia seguinte terão um café com leite e um pão para tomar.
Isso não é capaz de indignar a gente? Olha, se isso não for capaz de indignar a gente, sinceramente, eu acho que a humanidade precisa ser revista.
Aliás, precisa mesmo!
Porque hoje, muitos de nós estamos sendo algoritmos. Nós não pensamos mais, nós falamos o que o celular manda a gente fazer. Não é assim? Quantas horas vocês passam com o dedo no celular procurando notícia que nem interessa para vocês? Quantas horas? Não é verdade?
E nós ainda estamos inventando uma coisa chamada inteligência artificial. Imagina o que vai ser uma campanha eleitoral com inteligência artificial. 100% de mentira! 100% de mentira! Isso é inteligência artificial. É tudo o que dizem que é? Eu fico com medo, porque para que o ser humano, então? Nós vamos ser descartados. O cara vai olhar para mim e falar: “Esse Lula? Eu vou querer um presidente pela inteligência artificial. Esse cara com pensamento urbano, com pensamento de combater a fome. Inteligência artificial é só coisa nobre, é só coisa sofisticada. Não tem mais problema.” Você acredita que o ser humano é capaz? Ele não descobre que ele é tão inteligente que ele é capaz de construir uma inteligência para superar a dele e ele ficar inútil.
Então, eu sinceramente, eu sou daqueles que eu prefiro ser um ser humano, com sentimento.
Eu choro.
Quando alguma coisa me toca no coração, eu choro. Eu choro com novela. Eu choro com revista. Eu choro com filme. Eu choro quando vejo crianças precisando de coisas que a gente poderia dar. Coisa simples, simples, simples.
No meu país, o governo passado passou sete anos sem aumentar a refeição escolar. Sete anos! No meu país, muita gente acha que para controlar o déficit fiscal, você não precisa dar aumento do salário mínimo. O mínimo é o mínimo! Como é que você pode cortar o aumento do mínimo do mínimo?
Então, eu fico imaginando se não era bom a gente deixar que o humanismo prevalecesse na alma da gente. Humanismo! Nós voltarmos a ser mais carinhosos. A gente ir para um restaurante e ficar olhando na cara do amado ou da amada sem o celular. Aí você vai perceber que o seu namorado é bonito. Ele vai perceber que a sua namorada é bonita. Ou que o parceiro que você tem é bonito. Mas nós estamos ficando manipulados pelos algoritmos.
Tem gente que levanta seis horas da manhã picando o celular, almoça picando o celular, vai ao banheiro picando o celular, vai para casa picando o celular, deita à meia-noite picando o celular. E não sobra tempo para o humanismo. Não sobra tempo para você pensar em alguma coisa do mundo real.
Então, eu acho que nós temos um desafio, companheiros. Eu, sinceramente, acho que o mundo está precisando de humanismo. Nós precisamos voltar a nos abraçar. Nós precisamos voltar a nos ajudar. Nós estamos ficando muito individualistas, cada um com o seu problema.
O mundo está tão individual que quando você entra no elevador e tem uma pessoa, você acha que aquela pessoa está incomodando. O mundo está tão individualista que quando você sai da sua garagem com o carro e tem um carro na sua frente, você acha que o cara do carro não presta. Ele está te atrapalhando!
Este mundo não serve para o ser humano!
O ser humano nasceu para viver em comunhão. Em comunidade. Nos ajudar.
Eu, ontem, estava no meu apartamento aqui no terceiro andar e estava vendo as pessoas saindo do metrô. As pessoas já saem do metrô olhando o celular. Não olham nem para a escada. As pessoas não olham para o lado se tem uma moça bonita, um rapaz bonito. Nem olham para o lado. Está todo mundo assim. Os meus ministros também.
Na reunião, eu proibi de usar telefone. No meu gabinete também não usa telefone celular. Porque os caras marcam audiência, chegam na minha sala e querem atender o telefone.
Então, meus companheiros. Eu disse que não ia ser chato e fui muito chato. Mas como eu não venho sempre aqui. Eu espero que vocês desculpem a minha chatice.
Muito obrigado pelo carinho. E muito obrigado pelo dia de hoje.