Pronunciamento do presidente Lula na entrega do Programa Terra da Gente
Hoje é um dia, eu diria, de festa. E, quando a gente está fazendo um dia de festa, a gente tem que agradecer a todas as pessoas que direta ou indiretamente ajudaram a gente a fazer essa festa.
Eu não costumo ler a nominata, porque aí tem o nome de muita gente, mas hoje eu acho que é muito importante a gente ler, porque a imprensa, pelo menos, vai registrar quem é que está participando dessa festa.
Eu queria, então, começar cumprimentando os companheiros da direção nacional e estadual do MST, a Ceres Hadich [direção nacional]; o Roberto Baggio [direção nacional]; o José Damasceno de Oliveira [direção estadual]; a Bruna Zimpel [direção nacional]; a Antônia Kelha [direção nacional]; a Leidiane Evangelista [direção nacional]; o Aldenir Gomes da Silva [direção nacional], o Marco Antônio Carolino da Silva [direção nacional]; o Sérgio Luiz de Oliveira [direção estadual], o Diego Moreira [direção nacional] e a nossa querida Jocelda Ivone de Oliveira [dirigente estadual]. Muito obrigado por vocês existirem, e fazerem a luta que estão fazendo, para garantir que as nossas crianças tenham um mundo melhor do que aquele que nós herdamos dos nossos pais.
Parabéns à direção nacional dos Sem Terra, parabéns à direção estadual dos Sem Terra e parabéns aos companheiros da comunidade Maila Sabrina. Parabéns a todos vocês!
Eu quero também cumprimentar os meus companheiros de governo, o ministro Paulo Teixeira [Desenvolvimento Agrário e Agricultura Familiar], que já falou; o Fernando Haddad [ministro da Fazenda], que já falou; o Silvio Costa [ministro de Portos e Aeroportos], que não falou, mas vai falar em Itajaí, porque nós vamos daqui a pouco para Itajaí e Navegantes, em Santa Catarina. A Márcia Lopes [ministra das Mulheres], que deveria ter falado, porque aqui tem mais mulher do que homem, mas a Márcia Lopes é a nova ministra das Mulheres do meu governo. (Ela) É uma companheira de Londrina e, para quem não sabe, ela é irmã do Gilberto Carvalho [secretário nacional de Economia Popular e Solidária do Ministério do Trabalho], o nosso querido companheiro Gilberto de tantos e tantos anos de luta.
Está aqui o nosso companheiro Márcio Macedo, ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República; está aqui também a nossa querida Gleisi [Hoffmann, ministra das Relações Institucionais], que já falou e eu quero cumprimentar o nosso querido desembargador [Fernando Prazeres, presidente da comissão de soluções fundiárias do TJ-PR], tão homenageado aqui pelos Sem Terra. Obrigado por fazer com que a gente não perca a confiança no Poder Judiciário brasileiro. Muito obrigado companheiros.
Quero cumprimentar o nosso querido companheiro Enio [Verri], presidente de Itaipu, que pelo menos agora, além de produzir energia, está ajudando a gente a fazer com que o povo também produza mais energia. E também quero cumprimentar os deputados federais, o Aliel Machado, o Tadeu Veneri, o nosso querido Zeca Dirceu, a Lenir de Assis e o Elton Welter.
Quero agradecer ao nosso querido Ary Matos, prefeito de Ortigueira, e Hermes Santa Rosa, prefeito de Faxinal, por meio de quem cumprimento todos os prefeitos aqui presentes.
Também quero cumprimentar a nossa querida Débora Mabel, presidente substituta do Incra, e cumprimentar todos os companheiros que estão aqui, a Marina Godoi, secretária-adjunta do Ministério do Desenvolvimento Agrário. Quero cumprimentar a Loroana Santana, diretora-presidente substituta da Anater. Quero cumprimentar o Luiz Gustavo Braz, vice-presidente de Agronegócio e Agricultura Familiar do Banco do Brasil.
Os deputados estaduais: a nossa querida Ana Júlia, nosso querido Arilson Chioratto, a Luciana Rafain e o professor José Lemos. Quero cumprimentar o Nilton Bezerra Guedes, presidente do Incra do estado do Paraná; o Márcio Killer, presidente estadual do PT, da CUT do Paraná; a Rosana Gomes Guerra, beneficiária do Fomento Mulher; a Cristina Aparecida de Sousa, beneficiária do Pronaf.
Eu não ia entregar umas coisas aqui para essas mulheres, gente? Estava na minha agenda que eu ia entregar não sei o quê para essas mulheres. Cadê o Messias? As entregas que eu ia fazer aqui, você colocou no roteiro, “o Lula vai entregar não sei o quê para tal mulher, vai entregar não sei o quê para tal mulher”. As mulheres estão aqui, mas cadê a coisa que eu ia entregar? Não tem? Então não tem.
E agradecer o nosso maestro, Fernando Campaner. Parabéns. Que Deus queira que essa orquestra maravilhosa se transforme numa orquestra para fazer muito sucesso nesse país e encantar mentes e corações do povo brasileiro. Parabéns às crianças que participam dessa orquestra, companheiras e companheiros.
Eu já avisei ao companheiro Baggio, e quero avisar aos ministros, que nós temos um almoço aqui. Mas, possivelmente, a gente não vai almoçar, porque, outra vez, nós estamos atrasados.
Ontem, eu fui à Paraíba e a Pernambuco, na divisa com o Ceará, e era para terminar às 14h. Era 14h30 e a gente estava falando ainda. Então, nós passamos o dia sem almoçar ontem, nós fomos almoçar às seis horas da tarde no avião.
E agora, outra vez, não vai dar tempo da gente almoçar, já estamos com uma hora de atraso. Eu não sei quanto tempo eu vou falar, porque vai depender de eu me controlar aqui para falar pouco ou muito. Então, nós vamos sair daqui, pegar o helicóptero e nós vamos para Itajaí e Navegantes, ainda hoje, em Santa Catarina. Porque nós estamos nacionalizando o porto de Itajaí, que foi tentado privatizar pelo Bolsonaro. Nós estamos nacionalizando ele. E nós vamos a Navegantes também. Na verdade, vamos ter tudo em Itajaí e anunciar mais quatro navios contratados pela Petrobras.
Então, outra vez, a gente vai ter que almoçar no nosso avião. E a comida do avião nunca é tão boa quanto a comida caseira que os Sem Terra iam nos oferecer aqui, com aqueles produtos produzidos pelas mulheres. E eu já vi que quem trabalha produzindo comida aqui são as mulheres, porque vocês, os homens, inventam de trabalhar longe para não trabalhar.
Mas, companheiros e companheiras, quando eu tomei posse, a primeira coisa que eu disse a meu ministro Paulo Teixeira é de que um jeito de a gente evitar morte e violência no campo, seria a gente preparar uma prateleira de todas as terras disponibilizadas nesse país, seja terras em litígio, com bancos, dívida pública. Ou seja, a terra da União que a gente tivesse, para que a gente pudesse ter uma prateleira de terra e começasse a ofertar terra em todos os estados do país. Para não precisar ter uma guerra antes da gente ter a terra.
E isso foi feito, demorou um pouco, porque o Incra estava totalmente desorganizado. É importante que vocês saibam que quando nós voltamos agora ao governo, o governo que nós pegamos estava muito pior do que quando eu peguei, em 2002, do Fernando Henrique Cardoso.
Peguei um governo totalmente desestruturado. O Incra não tinha metade dos funcionários que precisava para tocar a máquina. O Ibama tinha 700 funcionários a menos do que tinha no meu governo em 2010.
Ou seja, esse país foi quase que semidestruído e, em vez de pensar em ajudar o povo, se pensou em construir um gabinete do ódio para se contar mentiras durante quatro anos de mandato. Foi isso que aconteceu no Brasil. Só para vocês terem ideia, nós encontramos 87 mil casas do Minha Casa, Minha Vida, sem terminar, que tinham começado no governo da Dilma. Oitenta e sete mil.
Nós encontramos quase 3 mil creches paralisadas há oito anos. Eu estou inaugurando o conjunto habitacional que foi começado em 2013. Então, esse país estava destruído.
O Haddad, que é o ministro da Fazenda, sabe como é que nós encontramos a Fazenda. Ele sabe como é que nós encontramos esse país administrado da forma mais irresponsável possível — e consertar isso leva tempo. Às vezes, para fazer uma obra nova, a gente gasta menos tempo do que a gente reformar uma coisa que está estragada, uma coisa velha. E vocês sabem porque vocês chegaram aqui.
Bem, dito isso, companheiros e companheiras, eu ontem fui ao Nordeste inaugurar uma parte de uma obra que estava há 179 anos esperando, uma obra que se pensou em fazer no Brasil, em 1846, pelo imperador Dom Pedro II. Essa obra era a famosa Transposição do São Francisco para levar água do São Francisco para 12 milhões de pessoas que moram no semiárido brasileiro.
Vocês sabem que eu saí de Pernambuco, em 1952, por causa da seca e fomos embora para não morrer de fome. E isso persiste desde o império. Não é uma coisa nova. O que se estranha é que demorou 179 anos para que a gente chegasse no governo e a gente lembrasse que ninguém pode viver sem água. E nós resolvemos fazer a transposição do São Francisco.
Muita gente era contra. “Ah, vai tirar água do São Francisco”, “vai acabar com o São Francisco”, “o São Francisco é da Bahia”, “o São Francisco é de Minas Gerais”, “o São Francisco é de Sergipe”, “é de Alagoas”. Não.
A gente chegou a conclusão que o São Francisco é do Brasil e, se tem 12 milhões de pessoas que moram em lugares que não têm água, a gente tem obrigação de levar água para as pessoas, porque senão as pessoas, todo ano, saem para vir para São Paulo para trabalhar de pedreiro, de servente de pedreiro e a gente não queria mais isso. A gente não queria que as pessoas saíssem procurando coisas para fazer na vida.
A gente resolveu trazer a água e posso dizer com orgulho para vocês: nós estamos fazendo, possivelmente, a mais importante obra hídrica do mundo. Possivelmente, não tenha nada igual feito em nenhum país. Vamos levar água para quatro estados e vamos fazer com que 12 milhões e meio de pessoas abram, pelo menos uma vez na vida, uma torneira para lavar uma louça, para tomar um banho, para dar água para o seu gado, para as suas vacas, para as suas cabritas, para as suas galinhas, sem precisar carregar um pote na cabeça, como eu carreguei com sete anos de idade.
Vocês percebem que eu não tenho pescoço, isso aqui é de carregar pote na cabeça desde pequeno para levar água suja para beber. Então, nós resolvemos fazer a transposição e se Deus e Nossa Senhora Aparecida ajudarem, quando chegar no final do ano, nós vamos terminar levando água para o Rio Grande do Norte, Pernambuco, o Ceará e a Paraíba, para as pessoas nunca mais morrerem de sede nesse país — e os animais não morrerem.
E eu dizia que só era possível fazer uma obra daquela se o Brasil tivesse um presidente que já tivesse passado sede, que já tivesse passado fome. Se a pessoa não conhece, a pessoa não tem sentimento de necessidade. Você vai falar da transposição da água no Rio de Janeiro, o cara vai falar: “que levar água, aqui tem Copacabana, aqui tem Ipanema”. Você vai falar na Avenida Paulista em São Paulo, o cara vai falar: “aqui tem água, que negócio de água para pobre, pobre precisa de água? Pobre, se tiver muito pobre, a gente vai buscar as meninas para trabalhar de empregada doméstica para nós aqui em São Paulo. Ou a gente vai pegar o cara para ser servente de pedreiro, para construir viaduto, para construir prédio”. Eles pensam que pobre só gosta de ser pedreiro. Não, pobre quer ser engenheiro, pobre quer ser médico, pobre quer ser o que quiser.
Bem, por conta desse entusiasmo, eu atrasei duas horas e saí sem almoçar. E aqui eu queria dizer para vocês o seguinte: nós temos a obrigação, é obrigação moral, obrigação ética e obrigação política de ver o que a gente viu aqui e ter coragem de debater com aqueles que são contra o Movimento Sem Terra, aqueles que estão contra a reforma agrária, aqueles que não conhecem o sacrifício e tentam vender a imagem de que vocês são invasores de terra.
Na verdade, vocês são invasores de busca de dignidade, de busca de respeito, de busca de direito que vocês têm que ter. E é por isso que nós temos que trabalhar com muito carinho com vocês e fazer aquilo que nós prometemos, Paulinho, sabe? Se não for possível, com a mesma verdade que a gente prometeu, a gente diz que não dá para fazer, mas vamos dizer na cara que não dá para fazer, porque as pessoas também compreendem.
Vocês sabem, porque vocês esperaram aqui há 22 anos, a Jocelda disse que tem gente que nasceu aqui, que já casou aqui e que já tem filho aqui. Então, governador, é o seguinte: nós vamos fazer um esforço muito grande para entregar o compromisso firmado com vocês, mas não só com vocês.
É que a verdade nua e crua é que quanto mais gente estiver produzindo no campo, quanto mais pequenos proprietários a gente tiver, quanto mais incentivo a gente der, quanto melhor produzir, melhor a qualidade do alimento, fica mais barato e todo mundo vive, porque não é possível o mundo ter 733 milhões de pessoas que não consomem (tudo), no mundo que produz mais alimento do que o povo pode consumir. Como é que é possível? Não é possível, gente.
Eu dizia que “a seca era um problema da natureza”. A falta de comida por conta da seca era a falta de vergonha na cara de quem governa um país, um estado ou uma cidade. Isso continua de pé, porquê isso é a mais pura verdade.
A Jocelda estava me dizendo, que às vezes ela vai no Incra pedir alguma informação, Paulo, e muitas vezes as pessoas que atendem só falam assim: “não, não posso fazer, não dá para fazer”. Porque a máquina pública, ela é preparada para dizer “não”, a primeira palavra é “não”, chega uma pessoa qualquer para procurar uma informação, a primeira atitude é dizer “não”.
Quando seria pelo menos mais decente dizer “eu vou procurar como fazer”, “eu vou tentar fazer”, “eu vou ver se eu dou um jeito”, mas a primeira é não, se a pessoa desistir com o primeiro não, está ótimo, mas se a pessoa insistir, alguém vai tentar dar um jeito — e esse “não” vale para todas as áreas públicas desse país; vale para as prefeituras, vale para o estado, ou seja, o pobre chega lá atrás de uma coisa, “olha eu queria saber tal coisa”. “Não”. É sempre assim, é o “não” em primeiro lugar.
Quando, na verdade, se todo mundo fizesse o mínimo de esforço e falasse: “olha, eu não sei, eu vou estudar, eu vou analisar”, sabe? Seria muito mais fácil e muito mais respeitoso. E é isso, Paulinho, que eu quero que a gente faça no Ministério do Desenvolvimento Agrário, em vez de a gente ter alguém para dizer “não”, alguém dizer: “eu vou tentar encontrar uma solução, se for fácil, eu faço, se for difícil, eu faço, e se eu não puder fazer, eu peço desculpas a vocês”. Porque aí as pessoas passam a respeitar mais as coisas que acontecem na nossa relação pessoal.
A vinda aqui, para dizer para vocês que está consolidada a comunidade Maila Sabrina — é comunidade, não é acampamento, não é assentamento — é comunidade. Logo logo, vai ser uma cidade, porque vocês têm a cara de gente que sabe construir as coisas nesse país. Eu queria que vocês soubessem — nem estava vendo você aqui, Maneco, eu devia saber que onde está o Rocha o Maneco está atrás, eu devia saber, esses dois advogados que estão aqui, essas duas belezuras aqui, não sei se o desembargador pode levantar e ver aqui, deve conhecer, porque deve ter estudado na Universidade Federal, todo mundo aqui é da Universidade Federal, todos os advogados.
É que o Maneco e o Rocha foram os advogados que me acompanharam os 580 dias na cadeia, todo santo dia, eu recebia um de manhã e todo santo dia um de tarde. Um me levava a carta da Janja [Lula da Silva, primeira-dama do Brasil] e o outro levava a minha carta para a Janja, porque eu e a Janja escrevemos 580 cartas durante os 580 dias que eu fiquei preso.
Ela me mandava a carta, eu recebia a carta dela de manhã e o Rocha levava a minha. Não, o Rocha levava a minha de manhã e o Maneco me trazia a dela à tarde. Ô, gente, vocês não tem noção do que é receber uma carta, vocês já receberam carta de amor? Ô, gente do céu, ô Haddad, vale mais do que um presente. Eles sabem a ansiedade que eu ficava, o Maneco conversava comigo dois minutos e eu falava: “E minha carta?” O dia que ele falava: “hoje não tem carta”, cara, eu entrava em depressão, a depressão passava, porque no dia seguinte eu recebia duas, aí foi uma maravilha.
Eu nunca pensei na minha vida que fosse tão bom escrever carta, de noite, sozinho numa cela, Haddad, pensando na amada e você escrevendo para ela, sabe. E depois você ficar esperando que ela escrevesse para você, é uma coisa muito prazerosa. Eu estou falando isso, mas o sacana que era meu carcereiro está aqui também, eu vi. Eu vi que meu carcereiro está aqui também, eu vi ele aí, deve estar escondido aí, porque também ficou 580 dias me perturbando lá, era um cara da Polícia Federal.
Um eu contratei para trabalhar comigo, o Paulão [Paulo Rocha Gonçalves Júnior, agente de segurança do presidente] era um carcereiro meu, negro. Sabe, simpático ao PT, ele admirava uma vereadora do PT de Curitiba, ele me levava os papéis da vereadora, quando eu saí da cadeia eu falei: “eu vou contratar o meu carcereiro”. Contratei, está lá trabalhando comigo. O Chastalo [Jorge Chastalo Filho, ex-policial federal] não foi trabalhar comigo porque estava no Peru, vivendo a boa vida da Polícia Federal, no Peru.
Bem, companheiros, eu estou muito feliz, eu quero que vocês saibam o seguinte: eu estou com 79 anos de idade, não parece, parece que eu tenho 30 ou 40, mas eu estou com 79 anos de idade. Eu sou um homem muito agradecido a Deus, porque tudo o que aconteceu na minha vida, eu tenho certeza que tem o dedo de Deus. Eu tenho certeza! Porque sair de onde eu saí, para não morrer de fome com 7 anos de idade e chegar onde eu cheguei, só pode ter a mão de Deus.
Não é competência minha, não é inteligência minha, é uma coisa maior, que eu, sinceramente, não consigo explicar. Mas o que me faz brigar é um compromisso que eu tenho: eu não me conformo desse país ser tão grande, desse país ter tanta riqueza, desse país ter um povo tão justo e trabalhador, e a gente viver nessa desgraça todo dia para ver se a gente consegue tirar uma pessoa da rua, arrumar emprego para uma pessoa, assentar outra pessoa, levar outra pessoa no hospital. E nós entramos para consertar isso. Eu quero que vocês saibam que a minha vontade de brigar, hoje, é a mesma de quando eu tinha 50 anos de idade. Não mudou um milímetro a minha vontade de brigar.
E por isso, eu quero dizer para vocês, que nós vamos continuar viajando por esse país, vamos tentar continuar fazendo as coisas que nós temos que fazer nesse país e eu queria que vocês soubessem, eu só tenho um medo na minha vida. Na minha idade, a gente não tem mais medo de nada, a única coisa que eu tenho medo é de trair a confiança que vocês depositaram em mim durante toda a minha vida política — e não foi pouca confiança.
Eu se tivesse acesso a todo o ouro do mundo, ainda assim eu não poderia pagar a gratidão que eu tenho a vocês pelo que vocês fizeram em Curitiba. Não teria como pagar, porque vocês não sabem o que é estar preso, e durante 580 dias, com chuva ou com sol, com frio ou com calor, e eu ouvia, às oito horas da manhã, “Bom dia, presidente Lula”, “Boa tarde, presidente Lula”, e “Boa noite”. De domingo a domingo. Não tem nada que já tivesse acontecido no mundo, não tem nada que já tivesse acontecido em outro lugar do mundo (como) o que vocês fizeram na vigília para mim.
Aquele reconhecimento de solidariedade, do dia que eu cheguei na cadeia ao dia que eu saí, não há dinheiro que pague. A única coisa que pode pagar é a minha retribuição a vocês, ao respeito ao carinho que vocês tiveram comigo, sendo respeitoso com vocês, leal com vocês e fazendo aquilo que vocês precisam para continuar andando de cabeça erguida no meu país.
E eu quero, em nome da direção nacional do Sem Terra, essa minha gratidão não é pelos Sem Terra do Paraná, essa minha gratidão é pelos Sem Terra do Brasil, porque o que vocês fazem, é apenas fazer com que nós, que não somos do Sem Terra, nós que somos de outros estados, nós que somos de outras profissões, aprendam uma lição de vida. O que vocês fazem, a luta de vocês, não tem nada de ilegal, a luta de vocês é para cumprir a Constituição, como disse o Haddad. A luta de vocês é, na verdade, a história da dignidade do povo desse país, representada pelo Movimento Sem Terra do Brasil.
Por isso, parabéns, parabéns a vocês, parabéns à comunidade Maila Sabrina, parabéns. Jocelda, um movimento que criou uma mulher como você… você sabe quantos anos a gente leva para formar uma política da sua qualidade? Às vezes, são muitos anos e a gente não forma. E a Jocelda disse, Haddad, que ela vai voltar a estudar. Você vai fazer o quê? (Jocelda responde). Ela quer aprender a fazer cooperativismo.
Eu acho que essa é outra coisa importante, Jocelda. Você sabe que o nosso governo, talvez (esteja) no momento de maior investimento na educação brasileira. Quando nós criamos o ProUni, quando nós fortalecemos o Fies, quando nós resolvemos fazer os Institutos Federais, agora fazer Escola em Tempo Integral, fazer parceria para alfabetizar todas as crianças até o segundo ano de escola, fazer mais universidade, é porque a gente acha que todo cidadão, independentemente, sabe, do dinheiro que tenha, merece ter condições de estudar.
E eu digo sempre, em todos os encontros em que eu estou: todo mundo precisa estudar. O homem, para ter uma bela profissão, aprender a produzir mais, aprender a trabalhar mais, aprender (a ter) mais qualidade, aprender a cuidar da família, se ele tiver família, a cuidar dos filhos, se tiver filho. A mulher precisa estudar por uma coisa mais nobre, Jocelda, é uma coisa chamada independência.
(Especialmente) No mundo machista em que o homem acha que a mulher é obrigada a fazer tudo para ele. O cara vai tomar banho e é “Amorzinho, traz uma cueca para mim”, “Amorzinho, traz uma toalha para mim”. O cara está vendo o jogo lá, o time dele está perdendo, “Amor, traz uma cerveja”, “Amor, essa não está gelada”, “Amor, prepara o almoço, amor”. Sabe, é tudo assim, é como se a mulher fosse um pombo-correio nesse mundo machista.
E eu acho que quando as mulheres têm uma profissão, elas vão morar com alguém, porque elas querem morar com alguém. Elas não vão morar por causa de um prato de comida, atrás do cara que paga aluguel; ela vai morar com uma pessoa que ela gosta de morar, seja quem for.
É por isso que estudar é uma coisa maravilhosa e eu acho que todos vocês que puderem voltar a estudar, voltem a estudar. Todos vocês, voltem a estudar, porque, se vocês se formarem, quem sabe você haverá de trabalhar até com o presidente da República. É uma divindade de Deus as pessoas estudarem. Sobretudo as meninas, sabe? Para o homem é a mesma coisa, mas para a mulher é uma necessidade.
A violência contra a mulher cresceu muito nesse país, o feminicídio cresceu muito, tem gente que está maluca, a sociedade está um pouco conturbada, sabe? Então é o seguinte, gente, se vocês tiverem uma profissão e estiverem morando com uma pessoa, e essa pessoa gritar com vocês, (diga) eu não sou obrigada a aguentar desaforo. “Cara, fala baixo, fala baixo, fala baixo que eu não estou aqui de graça, não. Quer ficar comigo? Me respeite.” Porque, senão, a gente não cria uma sociedade diferenciada. Então, estude, Jocelda, pelo amor de Deus, estude e faça com que os Sem Terra estudem.
Eu dou parabéns a vocês também pelo investimento em educação e eu acho que é o seguinte, vocês são um exemplo de que o Brasil tem jeito. Portanto, não tenha vergonha do que você faz, tenha orgulho do que vocês fazem, porque o que vocês fazem é motivo de orgulho.
Gente, um abraço, que Deus abençoe a todos vocês e que vocês possam realizar todos os sonhos agora que vocês viraram donos de verdade da nossa querida comunidade Maila Sabrina.
Um beijo no coração, gente, e até outro dia, se Deus quiser.