Pronunciamento do presidente Lula durante entrega de duplicação da capacidade de bombeamento do Eixo Norte do PISF
Não, não se preocupe que eu não vou ler nenhum discurso aqui. Eu, primeiro, estou preocupado com o horário, que já são dez para as duas, se não me falha a memória. Vocês e eu estamos com fome, E palavras não enchem barriga.
Então eu vou tentar falar muito pouco para ver se a gente termina isso aqui do jeito que a gente começou, na mais absoluta harmonia. Queridas companheiras, queridos companheiros de Pernambuco, companheiros e companheiras prefeitas, deputados e deputadas, companheiros que vieram junto com o governador do Ceará, ministros e ministras, senadores.
Eu queria dizer para vocês que cada coisa que acontece na nossa vida tem um significado. E cada vez que eu venho ao Nordeste Brasileiro inaugurar qualquer coisa, eu sinto uma sensação de projeto concluído, de uma graça atendida. Porque quando a gente chega na casa da gente e a mãe da gente bota um prato de comida pra gente, a gente muitas vezes faz cara feia porque não tem tudo que a gente quer.
Ou a gente faz cara feia porque não está do gosto que a gente queria. A gente nunca parou para se perguntar o sacrifício que a nossa mãe fez para preparar aquele prato de comida. Ou a gente muitas vezes não perguntou para ela se ela tinha todos os condimentos para fazer a comida gostosa que a gente queria.
Governar um país é mais ou menos assim. Governar uma cidade é mais ou menos assim. A gente tem que fazer escolha.
Essa obra que nós estamos fazendo aqui não é uma invenção do Lula. Essa obra é um desejo do Imperador Dom Pedro II desde 1846. Se a gente for contar quantos anos se passaram desde 1846 até hoje, são 179 anos que se pensa em fazer a transposição do Rio São Francisco.
E por que se pensava fazer a transposição do Rio São Francisco? Não era para fazer piscina com onda para que os granfinos do Nordeste pudessem surfar, como a gente vê na televisão. Não era para fazer uma praia para que a gente atraísse turistas do exterior para vir ao Brasil. Não, era uma coisa mais simples e uma coisa mais sagrada.
A transposição das águas do Rio São Francisco tinha como objetivo dar aquilo que Deus dá a todo mundo, que é um copo d'água para beber, para 12 milhões de pessoas que viviam no semiárido brasileiro. Era apenas isso. E por que eu tomei a decisão de fazer as obras do Rio São Francisco? É porque eu sei o que é ir para um açude sujo pegar água para beber.
Eu sei o que é colocar uma água num pote para assentar, para não tomá-la com caramujo ou com fezes de cabrito, de cachorro, de gato, de cavalo. Eu sei o que é isso. Eu sei o que é tomar água sem tratar, sem sequer ser filtrada.
Então, quando eu cheguei a presidente da República, eu tinha que escolher o que eu iria fazer de mais importante. E eu tinha uma imagem da minha mãe saindo de Caetés. Lá, naquele tempo, prefeito, não chamava Caetés, era Vargem Comprida, porque era tudo Distrito de Garanhuns.
Eu lembro da imagem da minha mãe com os oito filhos, meu irmão mais velho fugido para não vir para São Paulo, minha irmã chorando para não vir para São Paulo, porque todo mundo só conhecia aquela miséria que a gente vivia, ninguém queria sair. Minha mãe, teimosa, colocou os oito filhos num lugar que o prefeito deve saber, chamado Bodega do Tozinho. A gente ficou lá esperando dois dias para chegar um pau de arara, pegamos um pau de arara, treze dias para chegar em São Paulo.
E minha mãe veio não apenas para matar a fome dos filhos, ela veio para encontrar o marido dela, que tinha deixado ela quando ela engravidou desse que está falando com vocês. A minha mãe veio na expectativa de encontrar com o meu pai. Quando nós chegamos em Santos, qual foi a surpresa da minha mãe? Meu pai tinha casado com outra mulher e já tinha uma penca de filhos.
A minha mãe não teve dúvida, com oito filhos, ela teve a coragem de se separar do meu pai. E nunca mais olhou para a cara dele. E ela sozinha criou os oito filhos e conseguiu fazer com que um deles chegasse à Presidência da República desse país.
Quando eu cheguei à Presidência da República, eu tinha na mente aquela imagem, aquela imagem de ver gente sofrendo, andando léguas para pegar um pote d'água. E eu falei, nós temos que resolver esse problema. Era uma situação difícil porque nós tínhamos estados que eram contra.
Naquele tempo a Bahia era contra, naquele tempo Alagoas era contra, naquele tempo Sergipe era contra. Então os presidentes da República iam ao Ceará, prometiam fazer a transposição de água para o governador. Quando chegava na Bahia, desmentia.
Ia em Pernambuco, prometia, depois desmentia. Ia no Rio Grande do Norte, prometia, depois desmentia. Eu resolvi fazer e enfrentar todas as adversidades do mundo.
E veja que coincidência. Nós tomamos a decisão de fazer essa obra e eu queria inaugurá-la ainda no governo da presidenta Dilma [Rousseff]. É que nem sempre a gente tem todo o dinheiro que a gente precisa.
Mas a coisa mais sagrada, e aqui um recado para os prefeitos e para os governadores, é que a gente está fazendo a primeira parte da obra, que é trazer água. Agora essa água tem que chegar nas casas. E aí precisa dos governadores e prefeitos participarem.
Essa obra tem que chegar nas casas. Essa obra tem que chegar no pequeno agricultor. Porque o grande tem dinheiro para comprar trator, tem dinheiro para comprar motor, tem dinheiro para comprar bomba.
O pobre não tem. Então cabe outra vez ao governo do estado, ao governo federal e ao prefeito fazer parceria para que a gente faça com que essa água faça definitivamente. E a gente veja o Semiárido nordestino, as cidades que nunca tiveram água, produzir tanta comida como produz Petrolina e Juazeiro ali no Rio São Francisco.
É por isso que eu resolvi fazer essa obra. É porque eu acredito que ela é a redenção de um povo. E é por isso que eu venho aqui quantas vezes for necessário.
A cada metro de canal que for feito, pode me convidar que eu venho. A mesma alegria que eu vi a primeira água lá de Cabrobó entrar no canal do São Francisco é a mesma que eu vou ter o dia que a gente inaugurar o fim da transposição. E o fim da transposição não é a gente terminar essa obra. É a gente fazer a água chegar na casa das pessoas, tratada e com qualidade.
Lamentavelmente, tem época que o Brasil é governado por gente que não gosta disso. E eu tenho uma coisa na minha cabeça, que é o seguinte: para cuidar da parte mais pobre do Brasil, você não governa com a cabeça. Ou você tem coração, ou você tem sentimento, ou você não governa.
Porque quando você pensa em fazer uma obra dessa, quando você pensa em fazer uma obra dessa, os técnicos, os famosos técnicos, começam a dizer para o presidente: “não, presidente, isso não tem perspectiva econômica, isso não tem viabilidade econômica, presidente. Para que gastar 12 bilhões, 15 bilhões, 20 bilhões para levar água para o povo? Deixa ele vir para São Paulo trabalhar de pedreiro, para construir ponte, para ser pedreiro”. E eles não sabiam que eu não queria mais que a gente fosse para lá trabalhar de pedreiro.
É por isso que nós fizemos universidade, para ele ir lá trabalhar de engenheiro, ir lá trabalhar de médico, e lá ser mais importante. E essa obra vai garantir que daqui a alguns anos, esse povo daqui só vá para São Paulo para turismo, não vá mais para procurar emprego, não vá mais para morar. É por isso que eu resolvi fazer essa obra.
E a cada metro quadrado que é inaugurado, eu fico feliz. Eu espero, Waldez [Góes, ministro da Integração e do Desenvolvimento Regional], que a gente possa concluir. Tem uma coisa que eu tenho que acabar, que é o tal do cinturão do Ceará, cinturão d'água.
Porque se a gente não acabar, Rui [Costa, ministro da Casa Civil], nós vamos ter que pegar do Oceano Atlântico para levar para o Ceará. Mesmo estando perto. Nunca vi um estado beber tanta água como o Ceará.
Pois nós vamos matar a sede do povo cearense com a transposição das águas do Rio São Francisco. Essa é uma coisa muito importante. Outra coisa importante que foi anunciada foi essa questão da Chamada Nordeste.
Essa que o Paulo Câmara [presidente do Banco do Nordeste] falou. Presta atenção nisso. É a maior bolsa de disponibilidade de recursos para que se faça investimento na indústria do Nordeste.
São 10 bilhões de reais que estão colocados à disposição de quem queira fazer investimento no Nordeste, fazer um projeto, mandar para o Banco Central ou mandar para outro, Banco do Brasil, na Caixa, no BNB, para que a gente possa, quando for julgar os projetos, vocês estarem premiados e poderem ter crédito para fazer uma empresa numa região do Nordeste brasileiro. Isso nunca tinha acontecido antes e eu posso repetir que nunca antes na história do Brasil houve uma disponibilidade de crédito, uma chamada para investimento do Governo Federal como essa que está sendo feita agora.
Agora eu estou num solo sagrado, se é verdade o que o prefeito disse, que aqui vai ser mais um campus da Universidade Federal do Nordeste.
Eu não vou beijar o chão porque não tem chão aqui, mas eu quero dizer para vocês, sobretudo para as crianças que estão aqui, uma das razões pela qual eu tenho uma obsessão com escola, universidade, com Instituto Federal, é porque eu não tive o direito de fazer um curso universitário. Eu não tive a oportunidade de fazer. Meus filhos todos tiveram, eu não tive.
Então, a minha obsessão pela educação é que eu quero que todo trabalhador, que toda trabalhadora, que toda empregada doméstica, que todas as pessoas vejam os seus filhos tendo a oportunidade de sentar em um banco de uma universidade e ser doutor, e ter uma profissão. Isso é extremamente sagrado, porque uma profissão na vida de um homem e de uma mulher é tudo o que nós precisamos para que a gente tenha liberdade.
Uma mãe, ela não quer que o filho tenha uma herança, não. Uma mãe quer que ele tenha educação. Uma mãe quer que ele tenha uma profissão. E sobretudo para as mulheres, eu falo sempre, Raquel [Lyra, governadora de Pernambuco], eu falo sempre, sobretudo para as mulheres.
A profissão para o homem é importante, porque se ele ganhar melhor, vai ter uma família, ele vai cuidar melhor, vai morar melhor, vai tratar melhor. Mas para a mulher é tão importante, porque para a mulher significa a independência. Nenhuma mulher é obrigada a viver com alguém por necessidade econômica.
A gente tem que morar com uma pessoa que a gente gosta, que a gente quer ficar. Não é isso? Que a gente quer compartilhar a nossa vida. Mas se uma mulher casa com um sabujo que só sabe ofender ela, só sabe gritar com ela, se ela tiver uma profissão, ela manda ele catar lata e vai cuidar da vida dela.
É por isso que eu tenho obsessão pela educação. É sobretudo pela independência. E eu acho que a educação faz a gente virar a vida de uma cidade, de um estado, de um país.
Por isso, eu fico muito feliz com o fato da Universidade Federal querer fazer uma extensão aqui em Lajedo para que vocês tenham o direito de ter perto daqui. Eu tenho, aliás, Lajedo foi a primeira cidade que eu vim a Pernambuco, em 1979, junto com o Marco Freire, junto com o Jarbas Vasconcelos. A primeira vez que eu voltei a Pernambuco depois de 1952, a primeira vez que eu voltei a Pernambuco foi em 79. E eu fui a Lajedo, a Quipapá e a Garanhuns.
Então, querido companheiro de Salgueiro, o erro não foi tão grave porque eu citei uma cidade pernambucana e não uma cidade parisiense aqui, para vocês não ficarem chateados. Então, é extremamente importante que a gente consiga fazer nas cidades polos, sabe, institutos federais, universidades, para que a gente tenha nas nossas crianças a formação que a gente não teve oportunidade de ter.
Mas além da transposição, além do informe do BNDES e dos ministérios aqui, dessa chamada para investimento em indústria, além da faculdade, tem uma outra notícia que eu quero dar para vocês, que é o seguinte.
Nós mandamos para o Congresso Nacional nós mandamos uma medida provisória. Você sabe que medida provisória, ela começa a ter valor na hora que a gente entrega ela na Câmara. E nós mandamos uma medida provisória que vai mexer com a vida de vocês.
Ou seja, vocês sabem que nós temos uma tarifa para energia elétrica para as pessoas mais pobres. Nós aumentamos essa tarifa. Ou seja, quem consome até 80 quilowatts e ganha como renda per capita meio salário mínimo, ou seja, se na família a soma de todos der meio salário mínimo para cada um, as pessoas vão pagar só depois que consumir 80 centavos.
Então quem consome até 80, não pagará nada. Isso vale a partir de agora. Mas tem mais.
Isso vai atingir mais ou menos 60 milhões de pessoas. Tem mais. Mas se na sua família você juntar todo mundo e a renda per capita der entre meio e um salário mínimo, você vai ter desconto até 120 quilowatts.
Isso significa que nós vamos atender aproximadamente 100 milhões de pessoas que vão pagar menos energia nesse país. E mais importante, é que a partir do ano que vem, vai ter uma licitação, vai ter uma concorrência e todo mundo vai poder escolher qual é a empresa que oferece a energia mais barata. Porque hoje, eu não sei se vocês sabem, o povo pobre paga proporcionalmente mais energia do que o rico.
O rico, ele compra energia no mercado livre. E ele paga metade do que paga o povo pobre que pega, sabe, a energia controlada. Então o que é que vai acontecer? Você que tem um pequeno mercado, uma pequena loja, você vai poder escolher a empresa que você vai buscar energia e você vai sempre procurar a mais barata.
Essa não é uma coisa fácil de ser aprovada no Congresso Nacional, não. Porque toda vez que a gente quer promover o pobre e aumentar um pouquinho o pagamento dos ricos, tem sempre muita gente contra. Mas eu quero que vocês saibam que essa medida é uma medida que vai beneficiar quase 100 milhões de pessoas que consomem de 80 a 120 quilowatts dentro de casa.
A maioria das pessoas consome isso. A maioria. A não ser que o cara tenha, sabe, 10 televisões, 10 ar-condicionados, 10 ventiladores, ou seja, se ele tiver as coisas normais que todo mundo têm, muita gente vai ficar sem pagar a energia nesse país, né? E, se tudo der certo, o Congresso Nacional aprovando este ano, sabe, que quem ganha abaixo de 5 mil reais não pagará mais imposto de renda, isso vai significar mais dinheiro no bolso das pessoas mais necessitadas desse país e, quando o povo mais pobre tem um pouco de dinheiro, ele vira consumidor.
Quando ele vira consumidor, ele vai na loja, ele vai na padaria, ele vai na bodega. Significa que a bodega vai ter que pedir mais coisa pra indústria, a indústria vai ter que pedir mais coisa pro comércio e assim a economia vai crescendo, assim o salário vai melhorando, a vida das pessoas vai ficando melhor e todo mundo voltará a ser feliz neste país. Porque vocês vão ter que assumir um compromisso comigo.
Vocês vão ter que assumir um compromisso comigo. Eu desafio um de vocês a levantar a mão, se vocês lembram alguma obra que o governo passado fez aqui no estado de Pernambuco. Pode levantar, eu dou dois minutos aí para alguém levantar a mão se lembra de uma obra que o governo passado fez no estado de Pernambuco. Se fez no estado do Ceará.
Na verdade, o governo passado, o que ele fez foi passar quatro anos mentindo na televisão, fazendo fake news, contando mentira para o povo. Até contra a Covid, ele conseguiu mentir, conseguiu inventar um remédio, conseguiu fazer com que 700 mil pessoas morressem quando a gente poderia ter evitado a morte de pelo menos 50% dessa gente. Então o compromisso que vocês têm que ter não é comigo, não, é com os filhos de vocês, é com os netos de vocês, é com os pais de vocês.
A gente não pode votar em qualquer tranqueira para governar esse país. É preciso votar em gente que tenha compromisso, é preciso votar em gente que tenha dignidade, é preciso votar em gente que tenha o direito de olhar para vocês, olhando nos olhos de vocês. Porque esse país não pode mais sofrer o retrocesso que nós sofremos nos últimos seis anos.
Não pode mais. O Rui Costa falou apenas um pouco das coisas que nós pegamos paralisadas aqui. Nós pegamos 87 mil casas da minha vida paralisadas.
Nós pegamos quase 3 mil creches paralisadas nesse país, porque tudo que eles sabiam fazer era mentir, era fake news, era contar mentira, era tentar ficar no gabinete do ódio o tempo inteiro. A diferença entre nós e ele é que nós queremos apresentar obra, nós queremos apresentar melhoria na vida de cada companheiro desse país. Nós agora acabamos de fazer uma coisa importante no Rio Grande do Sul.
Nunca o estado recebeu a quantidade de recursos que nós mandamos para o Rio Grande do Sul com aquela enchente. Vocês podem saber, Elmano [de Freitas], [governador] do Ceará, e Raquel, que nós assumimos um compromisso. O que nós fizermos com o Rio Grande do Sul, daqui para frente a gente vai ter que fazer com todos os outros estados, porque ninguém é melhor do que o outro aqui.
Todo mundo é igual. Por isso, gente, eu estou feliz. Eu vou sair daqui, vou para a Paraíba.
Na Paraíba, vamos inaugurar um outro trecho da transposição e eu espero, até chegar ao final do meu mandato, a gente poder inaugurar tudo, tudo que for obra, inclusive a Transnordestina, que é um compromisso meu com o doutor Miguel Arraes. Um compromisso.
Eu quero dizer para vocês que a Transnordestina foi um pedido do Arraes pra mim em 1989. A gente foi visitar a mãe dele na cidade do Crato, que estava com 90 anos na época, e na volta ele falou assim para mim: “ô, Lula, se você ganhar as eleições, faça a Transnordestina”. Eu ganhei e comecei a fazer.
Era pra estar pronta em 2012, mas por ene problemas não acabou. Quis Deus que eu voltasse para acabar a Transnordestina e fazer o que o povo quer que eu faça.
No mais, companheiros e companheiras, obrigado pelo carinho. Obrigado, gente, obrigado, Raquel, obrigado, João, obrigado, deputados e senadores daqui, e até a próxima vinda, se Deus assim o permitir. Um abraço, gente. Um abraço.