Pronunciamento do presidente Lula durante inauguração de sede da Universidade Federal Fluminense em Campos dos Goytacazes
Apenas um aviso de uma coisa que não fazia parte da agenda do Camilo [Santana, ministro da Educação]. Não sei se vocês estão lembrados da imagem assim, aquele jovem que está em pé com aquela camisa azul ali. Sandrão, vem aqui na frente para te mostrar uma coisa.
O Sandrão é hoje presidente da CUT [Central Única dos Trabalhadores]. Ele foi muito conhecido no Brasil, famoso, porque, na campanha em que eu disputei as eleições com o José Serra, a primeira vez, houve uma turma que ia atrás do José Serra com aquele mosquito, provocando ele, porque ele ia acabar com os mata-mosquitos. E esses companheiros ficaram famosos de perseguir a candidatura do Serra. Depois eles jogaram uma bola de papel que inventaram que era pedra, inventaram que era uma pedra, e esses companheiros foram perseguidos durante muito tempo na questão da profissão deles.
Então o decreto que eu assinei hoje, em agradecimento ao trabalho sério que essas pessoas fazem e a importância para a sociedade, eu fiz o decreto que, na verdade, reajusta a indenização para os trabalhos de campo, nas atividades de combate ao controle de endemias, saneamento básico, entre outras coisas. Que Deus ajude os mata-mosquitos desse país, porque a gente pode, quem sabe, ter muito mais gente trabalhando.
Bem, companheiros e companheiras.
Eu não vou ler mais a nominata, eu não vou ler a nominata, porque o meu companheiro Camilo citou nomes e apelidos de todo mundo. Ainda citou gente que não estava nem aqui. Eu queria primeiro cumprimentar o prefeito. Obrigado por ter vindo nesse evento, prefeito.
É importante lembrar que quando a gente está numa atividade institucional, a gente não fica colocando divergência política do lado. Eu estou aqui porque sou presidente e ele está aqui porque é prefeito. Então, é importante que a gente aprenda uma lição de vida: quando chegar a época das eleições, a gente vai colocar o que a gente pensa dos outros na rua. Mas aqui não. Aqui a minha função é de presidente da República e a dele é de prefeito e a gente tem que se dar perfeitamente bem.
A segunda coisa que eu queria dizer para vocês. E vou pedir para vocês um pouco de paciência, porque eu não vou falar tanto, mas vou contar umas histórias para vocês. Na verdade, a vida da gente é um sonho. A gente nasce e só para de sonhar quando a gente morre. A gente sonha com tudo o que a gente deseja na vida. E, quando eu venho visitar um prédio desse, que vai servir de sala de aula para milhares de jovens estudarem daqui para frente, eu não poderia dizer outra coisa, senão que a sala de aula do Ensino Fundamental, do Ensino Médio, do instituto e da universidade, não deixa de ser uma sala de sonhos. É ali que a gente sonha em aprender. É ali que a gente sonha em melhorar a vida da nossa família. É ali que a gente sonha em arrumar um emprego melhor, por esse emprego ganhar um salário melhor.
Por exemplo, essa companheira aqui está no seu último ano, sabe, que ela está fazendo ciência social. E eu perguntei para ela: você já está trabalhando? Ela falou: “não, eu tenho o sonho de arrumar um emprego”. E eu quero ver se eu compartilho com o teu sonho para ver se você tem a oportunidade de ter um emprego. Porque, senão, as pessoas estudam, se formam e depois não têm emprego, as pessoas começam a desanimar. E nós precisamos criar condições para que as pessoas possam ter um emprego pelo estudo que eles fizeram, ganhar um pouco melhor e cuidar da sua família. É esse o meu sonho.
E eu digo sempre que toda a minha obsessão pela educação é porque eu não tive a sorte de estudar, não tive condições. Então eu acho que todo filho de trabalhador, acho que todo filho da pessoa mais humilde, daquele que cata papel na rua, daquele que dorme na sarjeta, o filho dele tem direito de disputar uma vaga na universidade com o filho da pessoa mais rica da cidade. Ele tem que ter o direito e o nosso papel é garantir esse direito. E vamos ver quem é que é melhor, vamos ver quem se preparou melhor, vamos ver quem estudou melhor.
E também porque nós temos consciência que não existe nenhum exemplo de sociedade que conseguiu avançar, progredir, melhorar de vida, sem que antes tivesse investido na educação. Portanto, a educação é a base para que tudo possa acontecer e se transformar na vida da gente, na vida de uma cidade, de um estado e na vida de um país. É por isso que é importante vocês jovens saberem: esse nosso querido Brasil nunca acreditou na educação. Nunca.
É importante vocês lembrarem: esse país foi o último a acabar com a escravidão, foi o último a fazer a independência, acho que foi o último do voto da mulher e foi o último a ter uma universidade federal. O último.
Eu conto sempre uma história para todo mundo lembrar. O Brasil só foi ter a sua primeira universidade federal em 1920, 420 anos depois da descoberta. O Peru teve a primeira em 1554 [1551]. Significa o quê? Significa que a elite que ocupou esse país, a partir de Portugal, só imaginava que a gente fosse indígena, negro e trabalhador cortador de cana. Não imaginava que a gente fosse ser outra coisa nesse país.
Eu acho que a elite brasileira deveria ter vergonha, deveria se olhar no espelho e ter vergonha. Porque precisou um torneiro mecânico, sem diploma universitário, governar esse país para ser o presidente que mais fez universidade na história desse país. Para ser o presidente que mais fez instituto nesse país. Nós encontramos 140 institutos feitos em 100 anos. Quando eu tomei posse, em 2003, a gente tinha 140 institutos. Quando eu deixar a presidência, nós vamos entregar 782 Institutos Federais nesse país e ainda é pouco. Ainda é pouco.
Por isso, meu querido magnífico reitor, eu fico muito, mas muito lisonjeado e muito feliz quando eu vejo o orgulho teu, no teu semblante e na tua voz, a alegria de estar aqui no meio dessa meninada conversando um pouco. Porque, veja, nós temos que consertar o que não foi feito nesse país há muito tempo. Eu sempre digo, companheiro Camilo, que o nosso Brasil e a nossa cidade, os prefeitos atuais, eles, na verdade, estão tentando consertar os erros que começaram na década de 50 com o êxodo rural nesse país.
As pessoas foram para as capitais, para o Rio, para Belo Horizonte, para São Paulo, e as pessoas foram invadindo as cidades da forma que podiam. E, hoje, muitos prefeitos estão vendo as cidades se localizarem, sabe, em lugares que são inadequados para pessoas morarem. E, muitas vezes, os prefeitos passam a maior parte do tempo atrás de dinheiro para tentar consertar as coisas que estavam erradas. Porque, nesse país, tudo que a gente tenta fazer para o povo, aparece alguém para dizer: “é muito gasto, vai gastar demais”. Tem um pessoal na área financeira desse país que qualquer coisa que a gente faça, é um “vai gastar demais, vai gastar demais, vai gastar demais”. “Na educação vai gastar, na saúde vai gastar, na segurança vai gastar”.
A minha pergunta que não quer calar é a seguinte: quanto custa não fazer as coisas no tempo correto nesse país? Se o companheiro Camilo não tivesse me apresentado os números do IBGE, de que 480 mil meninas e meninos do Ensino Médio estavam desistindo da escola para ajudar no orçamento familiar, para ajudar a comprar comida para casa. Se a gente não soubesse disso no tempo certo e a gente criasse o Pé-de-Meia, o dinheiro que a gente está deixando de investir na educação, a gente depois ia investir em cadeia, que é muito mais caro e muito menos produtivo para a história desse país.
É por isso que nós resolvemos criar o Pé-de-Meia, para dar à mãe, ao pai, aos filhos, a certeza de que nós, enquanto Governo Federal, vamos cuidar para que vocês continuem estudando, para que vocês se formem e para que vocês possam ter uma definição na vida de vocês para criar uma família digna, muito respeitada neste país e com todo mundo vivendo de cabeça erguida neste país. É esse o princípio que nós queremos.
É por isso que nós agora resolvemos colocar, sabe, compromisso com quase 6 mil prefeitos neste país. Até 2030, a gente quer ver se a gente alfabetiza 80% das crianças brasileiras até o segundo ano do Ensino Fundamental, porque se as crianças não forem alfabetizadas no tempo certo, elas vão demorar muito mais para sair do analfabetismo.
Da mesma forma que nós resolvemos fazer com que a gente atinja — esse ano já atingimos 1 milhão de crianças no [programa] Escola em Tempo Integral. Não apenas para permitir que a criança tenha mais oportunidade de estudar, mas para que a gente possa garantir também tranquilidade às mães, tranquilidade aos pais, que podem sair para trabalhar, sabendo que o seu filho está sendo bem cuidado numa escola e não abandonado na rua, quem sabe à mercê de uma chamada bala perdida, que é o que mata muito aqui no Rio de Janeiro.
Outra coisa importante, gente, outra coisa importante é a gente voltar a acreditar que tudo que a gente puder fazer para garantir uma educação de qualidade, nós vamos ter que fazer. Não existe outra possibilidade da gente olhar na cara de uma mãe, de um pai, olhar na cara dos filhos e ter a certeza de que a gente está fazendo o mínimo necessário para garantir tranquilidade àquela família. Tranquilidade. Porque muita gente pensa, Camilo, que os pais querem deixar para os filhos herança, querem deixar dinheiro, querem deixar imóveis. É verdade que qualquer coisa que deixar é importante, mas não tem nada mais sagrado para um pai e para uma mãe do que deixar um filho com diploma, com uma profissão para viver independente.
Eu vou dizer mais duas coisas que eu costumo repetir. Primeiro, o aprendizado e a profissão são muito importantes para o homem, porque eu sei o que é um homem com uma profissão procurando emprego. E sei o que é um homem sem profissão procurando emprego. Um é tratado com respeito, o outro não se olha nem para a cara dele. Alguns te pedem o documento para ele poder fazer uma ficha, outros só falam: “não tem vaga”. Porque quem não tem profissão sofre muito nesse país.
A outra coisa é menina. As meninas, sobretudo, precisam ter noção de que além da profissão, além do estudo, a profissão significa para vocês independência. Uma mulher não pode depender de uma pessoa porque paga aluguel para ela. Uma mulher não pode depender de uma pessoa porque dá um prato de comida para ela ou para o filho dela. É muito importante que vocês saibam que, quando vocês tiverem uma profissão, vocês vão morar com quem quiser porque vocês gostam, mas, se a pessoa fizer desaforo, vocês não são obrigadas a levar para casa. Ninguém é obrigado a morar com ninguém por causa de um prato de comida.
Eu conto sempre, prefeito, uma história. A minha mãe, com oito filhos pequenos, teve coragem de largar o meu pai com a roupa do corpo e criou oito filhos, inclusive um que virou presidente da República. Numa demonstração de que nós precisamos acabar com a violência contra a mulher, precisamos acabar com o feminicídio, precisamos acabar com as coisas que tratam a mulher como se ela fosse cidadã de segunda categoria, como se ela fosse objeto. Não tem porquê. Então, levantem a cabeça. Vocês não são inferiores a ninguém. A única coisa que vocês têm que exigir é respeito.
O homem tem que respeitar vocês como ele respeita a mãe dele, a avó dele. Não é porque ele, sabe, respeita a mãe que ele vai brigar com a mulher dele, com a companheira dele. Isso é uma coisa que me ofende e ofende por causa da história da minha mãe. A gente tem que conquistar essa independência, porque o mundo justo que a gente quer criar, ele está ligado à educação, ele está ligado à democracia, está ligado à nossa liberdade.
É por isso que eu dizia para vocês o seguinte: procurem a história de Campos, procurem a história do Rio de Janeiro e vejam quais foram os últimos presidentes que investiram em educação. Tentem. Não precisa eu ficar falando quem. Analise quantas escolas foram feitas numa data que terminou outro dia atrás. Pesquise quantos Institutos Federais, quantas universidades foram feitas, que vocês vão perceber que tem gente que passou por esse país, governando, só para contar mentiras e só para provocar a boa fé do nosso povo.
E eu quero dizer para vocês uma coisa. Eu quero dizer para vocês uma coisa. Eu tenho um compromisso com a educação, um compromisso extremamente sério, porque eu não acredito que exista outra saída para o nosso povo. Tem gente que acha que pode ficar rico apostando na bet, apostando na loteria. É até possível, mas é um em 50 milhões. É bem possível que alguém pense que é fácil. “Eu vou ganhar dinheiro, eu vou roubar”. Pode ser fácil, mas a chance dele ser preso é muito grande.
Há gente que acha que pode ter sorte na vida arrumando alguém que seja um chefão, um cara que tenha poder na prefeitura, no Governo Federal, e possa oferecer o emprego para vocês. Não vai acontecer. Então eu queria que vocês pensassem, reflitam comigo. Só tem uma saída: estudar, estudar, estudar, estudar, estudar, estudar. É a única saída que pode garantir que vocês possam realizar o sonho de vocês.
Portanto, gente, muito obrigado. Que Deus abençoe vocês, que Deus abençoe o campus de Campos e até outro dia, se Deus quiser.