Pronunciamento do presidente Lula durante lançamento do edital para construção do túnel submerso Santos-Guarujá
Primeiro, eu quero pedir desculpas a vocês, porque já são uma e quinze. Vocês devem estar com fome. Aqui, também nós estamos com fome. E eu ainda só vou almoçar em Brasília, quando eu voltar. Então, eu queria pedir desculpas pelo atraso.
E quero dizer para vocês que é muito difícil falar depois de ouvir 14 companheiros falando. É preciso um dicionário para encontrar palavras para falar quando você é o último a falar. Mas eu penso que mais do que a fala, a fotografia que foi tirada, hoje, aqui, ela possivelmente marque um novo momento na história do Brasil.
Eu vou, possivelmente, na semana que vem, Tarcísio [Tarcísio de Freitas, governador de São Paulo], a um estado que tem um governador que mais fala mal de mim. E eu vou também no porto para ver aquilo que tem que ser feito porque ele ficou parado quase dois anos. E nós vamos colocar aquele porto, que é o segundo porto de contêiner do Brasil, para funcionar.
E eu não estou preocupado com o governador, que você sabe quem é. Eu estou preocupado é com o Brasil, com Santa Catarina e em levar a possibilidade de as pessoas poderem trabalhar.
Dito isso, eu quero cumprimentar o meu companheiro Alckmin [Geraldo Alckmin, vice-presidente da República], quero cumprimentar o Tarcísio. E dizer, Tarcísio, que você está fazendo história nessas parcerias que nós estamos construindo. Você pode ficar certo de que o povo compreende o que está acontecendo. Pode ficar certo.
Porque tem gente do lado do Tarcísio que não gosta de vê-lo do meu lado. E tem gente do meu lado que não gosta de me ver do teu lado. Olha, o que nós temos que ter consciência é que nós só temos um lado: é atender bem o povo de São Paulo e o povo do Brasil. Esse é o nosso lado. E esse é o nosso compromisso. O restante a gente deixa passar.
Eu quero cumprimentar os deputados federais que estão aqui, na pessoa do presidente da Câmara, Hugo Motta. Porque o deputado federal e os senadores conseguiram fazer com que a gente provasse ao Brasil que o fato de as pessoas não serem do teu partido não significa muita coisa. E eu vou contar para vocês. O PT só tem 70 deputados em 513. O PT só tem 9 senadores em 81. E, nesses últimos dois anos, nós aprovamos 99% das coisas que nós queríamos aprovar para o bem deste país.
Inclusive, aprovamos uma Reforma Tributária que eu jamais acreditei que ela seria aprovada num regime democrático. E ela foi aprovada. E eu agradeço sempre aos deputados e aos senadores pela grandeza que tiveram, não se importando de que partido é o presidente da República, mas se a coisa a ser aprovada seria boa ou não para o nosso país.
Eu quero cumprimentar os deputados estaduais que estão aqui. Eu vou utilizar o Suplicy [deputado estadual Eduardo Suplicy] que é o nosso decano. Em nome dele, agradecer todos os deputados estaduais, as nossas deputadas estaduais. Porque também, esses companheiros, eles contribuem com o governo mesmo quando votam contra. Porque, às vezes, votar contra dá quórum, e a gente consegue aprovar as coisas que a gente quer.
Dito essas coisas, eu queria dizer para vocês uma coisa muito singela. O que está acontecendo hoje é uma coisa que eu prometi durante a campanha. Eu quero trazer o Brasil à normalidade. A normalidade é a relação civilizada entre os entes federados. Entre prefeitos, governadores, presidente da República, deputados federais.
Esta é uma relação civilizada. Ou seja, ninguém precisa concordar com ninguém. Ninguém precisa ser da mesma religião. Ninguém precisa torcer para o mesmo time. Ninguém precisa almoçar na mesma mesa. O que nós temos que ter em conta é o que nós estamos fazendo quando a gente governa um estado, um país ou uma cidade.
Para que nós fomos eleitos? Nós não fomos eleitos para brigar. Nós não fomos eleitos para fazer desaforo uns para os outros. Nós fomos eleitos para compartilhar o nosso esforço e fazer com que o povo sinta prazer em ser governado por alguém que está preocupado com ele. Essa é a coisa maior que a gente pode fazer aqui.
Vocês viram aqui vários empréstimos do BNDES ao governo do estado de São Paulo. O meu amigo Serra [José Serra, ex-governador de São Paulo], Tarcísio, não gostava quando eu vinha a São Paulo participar da assinatura de acordo do BNDES.
O Serra falava assim para mim: “Pô, Lula, mas é empréstimo, eu vou pagar. O que é que você está fazendo aqui?” Eu falava: “Eu estou fazendo aqui o que o presidente tem que fazer”. Porque você sabe, você sabe que, muitas vezes, o governo do estado, mesmo no governo do Mário Covas, precisava de empréstimo e não era liberado.
Não é todo presidente que autoriza liberar dinheiro para os estados, não. Não é todo presidente, não. Tem presidente que utiliza o BNDES como instrumento de fazer política contra o seu adversário.
Vocês acompanham isso. Não é toda hora que o Banco do Brasil empresta dinheiro para um governador, porque tem gente fazendo pressão. Vocês têm noção de quantas vezes um senador liga: “Presidente, está liberando dinheiro para tal estado? Não é possível, ele vai trabalhar contra a gente”.
Olha, eu não estou preocupado com isso. Eu estou preocupado em saber se a obra que o governador pediu para ter o empréstimo é válida. Eu jamais vou perseguir alguém porque votou contra mim. Jamais. Jamais vou deixar de emprestar dinheiro para um prefeito. Jamais vou deixar de ter uma relação com o governador. Não foi pra isso que eu quis ser presidente da República outra vez.
Eu quis ser presidente da República para provar que é possível, de forma civilizada, a gente resolver os problemas deste país. Esse negócio que foi feito agora para trabalhador do porto já está paralisado há quase 15 anos. É um dinheiro que eles têm direito. Por que não deram esse dinheiro pra eles? Porque não havia vontade política de quem tinha condições. E quando você tem vontade política, você consegue fazer as coisas acontecerem.
Eu e o Tarcísio vamos fazer um bem bolado. Um bem bolado é um acordo entre o governo de São Paulo e a Presidência da República, a Secretaria de Habitação dele, o ministro das Cidades, para que a gente acabe, de uma vez por todas, com a palafita, que é a forma mais degradante de um ser humano morar.
Não é possível a gente deixar de trabalhar de forma conjunta, de compartilhar esforços, porque eu não gosto de fulano e fulano não gosta de mim. Eu não estou propondo casamento para ele nem ele está propondo para mim. O que nós estamos propondo é um jeito de trabalharmos juntos. E eu faço isso com 27 governadores no estado. Faço isso com quase 5 mil prefeitos.
As pessoas moram numa cidade. É na cidade que vão pegar o ônibus. É na cidade que vão ao médico. É na cidade que vão à escola. É na cidade que querem o asfalto. É na cidade que querem água tratada. Então, por que marginalizar os prefeitos? Esse é o meu jeito de tratar as pessoas. Esse é o meu jeito de governar.
Agora mesmo, nós estamos fazendo uma PEC para discutir a questão da segurança neste país. Todo mundo sabe que em todos os estados da Federação a segurança é um problema. Todo mundo neste país está preocupado com a violência. Está preocupado com roubo de celular. Está preocupado com roubo de carro. Está preocupado com genocídio. Está preocupado com feminicídio. Está preocupado com a polícia matando, a torto e a direito, pessoas que, por serem negras, pagam um preço maior. Todo mundo sabe.
E não adianta a gente ficar falando que a questão da segurança é da responsabilidade do estado. Não adianta ficar falando. Isso está na Constituição. Mas a segurança interessa ao prefeito, e nós vamos na PEC colocar o direito de as prefeituras terem a sua guarda municipal agindo para combater o crime, agindo para combater a violência.
Interessa ao Governo Federal, sem que a gente se meta no papel constitucional do governador. A gente não quer mandar na polícia. Isso é da responsabilidade dele. O que a gente quer é compartilhar. Qual é o papel do Governo Federal na questão da segurança pública? Qual é o papel da Polícia Federal? Qual é o papel da Polícia Rodoviária Federal? Onde é que o Governo Federal pode compartilhar sem se meter no papel constitucional do governador?
Porque, se a gente não fizer isso, a violência vai continuar. Se a gente não fizer isso, as balas perdidas vão continuar matando crianças na porta da escola, vão continuar matando inocentes. Então, é um papel que nós temos que assumir. Daqui para a frente, tudo tem que ser compartilhado. As coisas boas e as coisas ruins. A gente tem que compartilhar para a gente mudar um pouco a história deste país. Não é possível, gente.
Eu vou lhe contar uma coisa, Tarcísio. Dizem que eu tenho muita sorte. A última vez que este país cresceu acima de 3% foi em 2010. De lá para cá, o Brasil crescia 1%, 1,5%, 0,8%, 0,9%. Ele só voltou a crescer acima de 3% quando eu voltei à Presidência da República.
Por uma razão muito simples, eu tenho uma filosofia na minha cabeça. Eu não fiz economia, portanto, não sou economista. Mas eu tenho uma tese que é a seguinte: muito dinheiro na mão de poucos significa miséria. E pouco dinheiro na mão de muitos significa distribuição de riqueza.
É por isso que o BNDES, hoje, está emprestando quatro vezes mais do que ele emprestava há pouco tempo atrás. É por isso que o Banco do Brasil está emprestando muitas vezes mais. É por isso que a Caixa Econômica está emprestando muitas vezes mais. É por isso que o BNDES está emprestando muitas vezes mais. É por isso que o BNB, no Nordeste, está emprestando muitas vezes mais. É por isso que o BASA, na Amazônia, está emprestando muito mais.
Porque eu quero dinheiro circulando na mão do povo trabalhador. Eu quero dinheiro circulando. Porque, quando o dinheiro circula, o comércio funciona. Quando o comércio funciona, a fábrica funciona. O comércio funcionando, a fábrica funcionando, vai gerar um emprego. Esse emprego vai gerar um salário. Esse salário vai gerar mais um consumidor. E, assim, a economia vai crescer.
Eu vou dizer uma coisa aqui, Tarcísio. Você já viu, a moça do FMI [Diretora-Geral do Fundo Monetário Internacional, Kristalina Georgieva], em janeiro de 2023, encontrou comigo em Hiroshima e ela disse: “O Brasil vai crescer 0,8%”. Eu falei: “Querida”. Eu chamo de querida. “Você não conhece o Brasil. E nós vamos crescer mais que 0,8%”. Crescemos 3,2%.
Agora, disseram que, em 2024, a economia brasileira ia crescer 1,5%. Ela vai crescer 3,8%. E, agora, estão dizendo que vai haver uma recessão, que o Brasil vai crescer no máximo 2,5%. Eu estou apostando. Eu estou falando, olhando para vocês. Podem ter certeza que o Brasil vai crescer um pouco mais.
A única coisa que a gente não quer que cresça é o preço do ovo. É o preço da carne. É o preço da batata. É o preço da laranja. É o preço do óleo de soja. Esse a gente não quer que cresça.
Ontem, eu vi uma matéria absurda. Ontem, eu vi uma matéria, Tarcísio, que me deixou boquiaberto. Foi uma matéria no jornal dizendo o seguinte: O mercado pensava que [a geração de] emprego ia ser mais ou menos de 40 mil empregos no mês de janeiro. Aí o Caged publicou 130 e poucos mil empregos. Ao invés de o cara ficar feliz, porque tem aquele emprego, o mercado disse: “Isso é muito ruim. Isso vai dar inflação.”
Ora, meu Deus do céu, como é que é possível alguém achar ruim que no país está crescendo o emprego? Só se o cara nunca precisou de emprego ou nunca ficou desempregado... Porque todo mundo deveria ficar feliz. Quando tem muita oferta de emprego e tem menos gente para trabalhar, qual é o resultado natural? Tem mais oferta do que demanda. O que vai acontecer? Vai melhorar o salário. A pessoa vai ganhar um pouco mais.
É esse país que nós queremos construir. A gente não quer construir um país eternamente de pobre. O Bolsa Família não é um programa para viver a vida inteira. O que nós queremos é que a pessoa receba o Bolsa Família até arrumar emprego. Quando ela arrumar o emprego, ela sai do Bolsa Família. Essa é a lógica. A gente não quer que as pessoas sejam a vida inteira pobres.
A gente quer que as pessoas sejam de classe média. Todo mundo tem que ganhar bem. Todo mundo tem que comer bem. Todo mundo tem que vestir bem. Todo mundo tem que ir ao cinema. Todo mundo tem que ir ao teatro. Todo mundo tem direito de ter as coisas. E é possível.
Então, quando a gente vem fazer parceria com o governador de São Paulo para fazer esse túnel, não é porque ele quer fazer o túnel porque o túnel é bonito. É fazer o túnel para melhorar a vida do povo de Santos, a vida do povo do Guarujá e a vida de quem vai atravessar de um lado para o outro.
Eu vi o pessoal lá atrás gritar para criar o Instituto no Guarujá, e me parece que o prefeito já deu até o prédio. Pois eu vou lhe dizer aqui, companheiro. Eu não sou ministro da Educação, mas eu vou lhe dizer. Nós temos 101 Institutos para fazer. Aqui na Baixada, tem um em Santos e tem um em São Vicente. Mas eu vou dizer aqui: nós vamos fazer o Instituto do Guarujá.
Nós vamos fazer o Instituto do Guarujá porque quem faz 100, faz 101. Quem está disposto a fazer 100, vai fazer 101. E a coisa em que eu mais acredito na vida é em educação. A educação é a única possibilidade de a gente tirar esse país do atraso. É a única possibilidade. E eu quero - com Escola de Tempo Integral, com o Pé-de-Meia e com alfabetização até o segundo ano do ensino fundamental -, fazer uma revolução educacional neste país.
Não é possível que 68% da nossa população não tenha terminado o ensino fundamental. 68%. Não é possível que 500 mil alunos do ensino médio desistam da escola para ajudar no orçamento familiar. Então, eu vou lhe contar uma coisa para terminar. Enquanto eu estiver vivo, educação não é gasto. Educação é investimento. E nós vamos fazer o que for possível para melhorar.
Por isso, companheiros, companheiro governador do estado de São Paulo, companheiro presidente da Assembleia Legislativa, companheiros deputados federais, no nosso governo não tem veto. No nosso governo é proibido proibir. É proibido proibir aquilo que for necessário fazer, em cada estado ou em cada cidade. O que a gente tiver dinheiro, a gente vai fazer.
Portanto, Tarcísio, não se preocupe que vai ter muita foto, eu e você junto. O que é mais grave, o que é mais grave para o nosso adversário é a gente estar rindo na foto. Isso vai deixar muita gente... Pode até ter infarto na história. Mas o que nós queremos é cuidar do povo de São Paulo e cuidar do nosso Brasil.
Parabéns, Tarcísio. Parabéns, Rui Costa. E parabéns ao povo da Baixada Santista. Um abraço.