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Povos indígenas fortalecem estratégia para a COP30 em reunião da PNGATI
- Foto: André Corrêa
A COP30 se aproxima e, com ela, a mobilização dos povos indígenas para garantir que suas demandas sejam parte central das discussões climáticas globais. Durante a 21ª Reunião Ordinária do Comitê Gestor da Política Nacional de Gestão Territorial e Ambiental de Terras Indígenas (PNGATI), realizada nesta quarta-feira (26/02), na sede da Funai, em Brasília, representantes do Governo Federal e do movimento indígena discutiram estratégias para fortalecer essa participação.
O governo federal aposta na participação indígena e na mobilização social para fortalecer a agenda climática do Brasil na COP30. Durante a reunião, que contou com a participação da sociedade civil além de representantes de diversos ministérios, como Povos Indígenas (MPI), Meio Ambiente e Mudanças Climáticas (MMA), Presidência, Casa Civil e Relações Exteriores (MRE), foram debatidas ações como a valorização dos saberes tradicionais, a capacitação de lideranças indígenas e a ampliação do diálogo interministerial para a construção de políticas ambientais mais inclusivas e eficazes. O encontro também tratou da demarcação territorial, do acesso a financiamento para comunidades e da estruturação da presença indígena na conferência.
O evento das Nações Unidas acontece em novembro, em Belém (PA), e é uma oportunidade para que os povos indígenas tenham maior influência nas decisões globais sobre o meio ambiente. Para a ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, a conferência precisa ir além de acordos formais e resultar em medidas concretas. Segundo ela, as discussões sobre a crise climática devem acompanhar a urgência do problema e garantir avanços proporcionais à gravidade da situação enfrentada no Brasil e no mundo.
“Estamos trabalhando para que esta COP traga grandes decisões dentro daquilo que é urgente, do que o mundo já vive e do que se espera como resultado”, afirmou. O MPI tem mantido reuniões permanentes para definir estratégias que garantam a participação indígena na COP30 e encaminhem as propostas do movimento.
Para fortalecer a incidência indígena no debate climático global, o MPI propôs, ainda na COP28 em Dubai, a criação de uma Comissão Internacional Indígena. O objetivo, segundo a ministra, é reunir diferentes instâncias representativas, como o Caucus Indígena e o Fórum Permanente das Nações Unidas sobre Questões Indígenas (UNPFII), para estruturar uma posição indígena unificada. “Foi uma ideia nossa, do MPI, de fazer essa articulação internacional para que pudesse ter um lugar onde juntasse as instâncias já constituídas do movimento indígena”, disse Sonia.
Ana Toni, secretária Nacional de Mudança do Clima do Ministério do Meio Ambiente (MMA) e diretora-executiva da COP30, também participou do debate. Ela explicou que a conferência se estrutura em diferentes frentes para garantir resultados concretos. As decisões políticas de maior impacto serão firmadas em encontros entre chefes de Estado, nos quais serão discutidos compromissos globais e diretrizes estratégicas. Paralelamente, as negociações entre países vão determinar os recursos financeiros e as responsabilidades compartilhadas para enfrentar a crise climática.
De acordo com a secretária, a conferência será uma oportunidade de agir em busca da implementação das políticas ambientais que já foram acordadas. Ao mesmo tempo, a mobilização da sociedade civil terá papel essencial para pressionar por avanços reais. Ana Toni enfatizou a importância dessa participação ativa: “Sem engajamento social, nada avança na velocidade necessária”, disse.
ENCONTROS REGIONAIS
O governo brasileiro definiu um limite para a delegação oficial da COP30, e o MPI propôs que uma parcela das vagas seja destinada a indígenas, incluindo representantes do Brasil e de outros países. Além disso, a ministra ressaltou que os critérios de credenciamento ainda estão sendo discutidos para garantir diversidade e representatividade.
“A gente precisa qualificar qual o critério utilizar para esse credenciamento. A gente fazendo a distribuição por estado, por representação”, disse a ministra. Uma das propostas em debate é incluir anciãs e sábios indígenas na delegação oficial. “Recebi uma demanda que achei linda demais: para a gente garantir, nessa delegação indígena credenciada para a Zona Azul, as anciãs. Trazer as mulheres, os homens, sábios e sábias indígenas”, contou emocionada.
A ministra ainda afirmou que serão realizados encontros nos estados para levar informações sobre a conferência, definir os temas prioritários e estruturar a delegação indígena. “Temos que garantir que os representantes cheguem a Belém sabendo exatamente onde estarão, quais serão os debates e como poderão incidir nas decisões”, disse.
PROTAGONISMO INDÍGENA
Sineia do Vale, co-presidente brasileira do Caucus Indígena, foi uma das representantes dos indígenas na reunião do Comitê Gestor. Ela destacou que a participação indígena na COP30 não é um espaço concedido, mas sim conquistado ao longo de décadas de mobilização.
Representante do povo Wapichana, ela ressaltou que o Caucus Indígena, que hoje representa povos originários de sete regiões do mundo, foi resultado da luta iniciada na ECO-92 e que a presença indígena nesses espaços de decisão exige esforço contínuo. “Temos investido na formação de lideranças para que possamos entender profundamente os debates e, principalmente, levar esse conhecimento para as bases, para os territórios, onde muitas pessoas ainda não sabem exatamente o que são as mudanças climáticas”, afirmou.
Para Alana Manchineri, representante da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (COIAB), a liderança do Brasil na pauta ambiental só existe devido às comunidades indígenas. “Se o país tem protagonismo, parte disso vem da atuação indígena. A COP30 não pode ser vista apenas como um evento regional”, pontuou.
A demarcação territorial e o reconhecimento dos povos indígenas como protagonistas da luta climática também foram centrais no debate. A ministra Sonia Guajajara defendeu, durante a reunião, que a demarcação de terras indígenas deve ser reconhecida como um compromisso oficial dentro da agenda climática global, dado o papel fundamental dessas áreas na preservação das florestas. “A questão das NDCs e o reconhecimento da demarcação territorial das terras indígenas são fundamentais”, explicou.
ORGANIZAÇÃO INTERMINISTERIAL
A organização da COP envolve diversos ministérios dentro do governo federal. Além do MPI e do MMA, estiveram na reunião do comitê gestor representantes da Casa Civil, Presidência da República e do Ministério das Relações Exteriores (MRE). Pelo Itamaraty, Luiza Gouveia, destacou o protagonismo dos povos indígenas na construção da agenda climática do Brasil. Segundo ela, o país tem um papel de liderança no multilateralismo ambiental e deve garantir que as vozes indígenas sejam ouvidas.
"Os povos indígenas não têm a menor responsabilidade nas mudanças do clima [...], mas ao mesmo tempo têm o maior impacto. São as populações que mais sofrem com as mudanças climáticas", explicou. A representante do Itamaraty ressaltou que enfrentar a crise climática exige a valorização dos saberes indígenas. Nesse contexto, o governo aposta na capacitação de lideranças indígenas para fortalecer sua participação nos debates internacionais.
Lançado no segundo semestre de 2024, o programa Kuntari Katu: Líderes Indígenas na Política Global fortalece a participação indígena em debates internacionais. Na COP30, essa presença pode ajudar a incluir temas importantes, como a demarcação de terras que contribui para reduzir os impactos das mudanças climáticas.
"Na agenda de ação, [...] já há algumas soluções em desenvolvimento, como o curso de formação de lideranças indígenas. O primeiro módulo abordou biodiversidade, e agora esse segundo será sobre clima. [Serão capacitadas] 35 lideranças, permitindo que acompanhem de perto as negociações.", afirmou Gouveia.
Para Tatiana Berringer, assessora especial da Presidência da República para Finanças, Clima e Sociedade Civil, a COP30 também marca uma mudança na condução da política climática brasileira, com maior participação da sociedade civil. Tatiana destacou que o governo vem promovendo processos de escuta e mobilização, como ocorreu no G20 e nos Diálogos Amazônicos. “O processo de escuta traz ganhos muito grandes, não só em transparência, mas também de mobilização e capilarização”, pontuou.
Para a assessora, a crise ambiental impõe a necessidade de construir uma nova consciência coletiva, baseada na diversidade e, sobretudo, no respeito às populações indígenas. “A gente está falando da necessidade de formar mesmo uma nova consciência coletiva, pautada na diversidade global e nacional”, afirmou.
Rafael Dias, da secretaria de Articulação e Monitoramento da Casa Civil, reforçou o papel dos povos indígenas na agenda climática e a necessidade de incluir seus conhecimentos tradicionais nas políticas ambientais do país. "Acho que a gente não pode errar de não contemplar toda a sabedoria, todos os instrumentos, toda a tecnologia social que os povos indígenas têm para reflorestamento, para manutenção da floresta em pé e geração de valor com isso”, disse.
"A gente tá muito atento à qualidade desse plano, porque ele vai materializar um grande objetivo da Presidência da República, que é a COP30 e a agenda do tempo", concluiu.