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Museu Lasar Segall destaca o olhar do artista para a natureza brasileira — e outras paisagens
O Museu Lasar Segall, na Vila Mariana, abre em 8 de novembro a exposição gratuita O Paisagismo Modernista na Produção Artística de Lasar Segall, que convida o público a redescobrir a obra de um dos ícones do modernismo a partir de seu olhar para a natureza brasileira e para diferentes paisagens que tocaram sua sensível capacidade criativa. A mostra é inaugurada a dois dias da Conferência das Nações Unidas sobre as Mudanças Climáticas — COP 30 — e explora as possibilidades da arte como forma de (re)conexão com a natureza.
Dois recortes curatoriais se entrelaçam. O módulo Planta e plantação: culturas bananeiras em Segall, com curadoria de Ana Carolina Carmona, autora do livro Pequeno guia da botânica modernista (2020), propõe uma leitura das bananeiras como elemento estruturante de uma ideia de país. Ao escolher a bananeira como tema em meio à vasta diversidade da vegetação brasileira, entre 1924 e 1925, Segall (1889–1957) parte da premissa de que ela representa um signo consolidado do Brasil enquanto país tropical.
Rejeita, no entanto, o senso comum, ao representar nas bananeiras aquilo que considera “essencial” e “interiormente verdadeiro”, em contraste com o que seria apenas “interessante” ou “belo no sentido vulgar”. Volta-se não apenas aos frutos, mas às várias partes da planta e às relações entre elas. E vai além, ao desdobrar o interesse pela planta em desenhos de plantações, nos quais a paisagem dos bananais ganha uma riqueza formal cada vez maior, ao mesmo tempo em que aspectos da história, da sociedade e do trabalho se insinuam. Não por acaso, os conceitos de “paisagem humana” e “natureza humana” são utilizados com frequência para interpretar suas obras desse período.
O módulo Lasar Segall: outras paisagens no horizonte, com curadoria de Pierina Camargo, pesquisadora do Museu Lasar Segall, apresenta uma cartografia expandida que fala de identidades em fluxo e da experiência humana em seus deslocamentos e pertencimentos. As paisagens sóbrias e angulosas do tempo de Segall na Europa são sucedidas pela expansão da cor e da luz a partir de seu contato com o Brasil; os tons serenos que desenvolve mais tarde, ao fixar dramas sociais e a placidez bucólica do interior, se condensam nas verticais de troncos em suas florestas.
Segall reinventou-se continuamente, ao longo de sua trajetória, desenvolvendo novas maneiras de manifestar suas imagens interiores nas paisagens e compondo um conjunto que testemunha uma incessante busca.
A exposição conta com apoio do Governo Federal, Política Nacional Aldir Blanc, Governo do Estado de São Paulo, Secretaria da Cultura, Economia e Indústria Criativas do Estado de São Paulo e Fomento CultSP.
Planta e plantação: culturas bananeiras em Segall
Curadoria de Ana Carolina Carmona
No final de 1912, Segall deixa a Alemanha em sua primeira viagem ao Brasil. No navio, identifica-se com os emigrantes. Nesse momento inicial, o chamado da novidade, o imaginário do exotismo e o reconhecimento do outro o afetavam profundamente. Ao aportar no Rio de Janeiro, encanta-se com a paisagem e os elementos da terra: o povo, a dança, o sol, o solo, a vegetação.
Uma década mais tarde, em 1923, decide se estabelecer definitivamente no país, o que traz mudanças à sua obra, conformando o que se convencionou chamar de “fase brasileira”. Nesse período, novos procedimentos pictóricos passam a ser explorados — com a valorização de cores luminosas, figuras de contornos definidos e uma espacialidade acolhedora —, além de novos gêneros.
Realiza desenhos de observação que identificam, com precisão artística e expressividade quase científica, as “fantásticas formas ornamentais” de plantas como cactos, abacaxis, agaves e, é claro, palmeiras — estas últimas, símbolos por excelência do imaginário da “tropicalidade”.
Para alguns críticos, o artista abandona a postura expressionista de criação da realidade, substituindo-a por uma de captação da natureza tropical e do povo brasileiro, focada na aparência exterior, superficial, do novo mundo por ele descoberto. Outros, entretanto, percebem que — nesse novo mundo — Segall encontra elementos que, mesmo desconhecidos, lhe parecem familiares e com os quais se identifica, em um processo de reconhecimento marcado por seu profundo interesse e empatia pelo próximo.
Lasar Segall: outras paisagens no horizonte
Curadoria de Pierina Camargo
Na tradição da história da arte ocidental, a paisagem só se torna gênero independente a partir do século XVII. Após séculos servindo como cenário, fundo ou elemento decorativo, o registro de uma impressão visualmente fiel da natureza passa a ser aceito como finalidade suficiente por si só. Ao longo do século XIX, o interesse pela representação naturalista cede espaço à investigação sobre as próprias dinâmicas da pintura. As telas tornam-se tratados sobre a maneira pela qual tintas e traços formam montanhas e praias, nuvens e luz.
Lasar Segall inverteu o sentido dessa investigação: as técnicas de seu ofício serviam para um mergulho em si mesmo. A obra fixada na tela apresenta uma visão do mundo a partir das imagens interiores do artista. Não pinta simplesmente o que vê, mas o que sente ao ver. As formas se distorcem; as cores se afastam daquelas que parecem emanar da superfície das coisas.
Segall explorou a paisagem de diversas maneiras: ora recolocando-a como elemento de fundo, ora acentuando com ela os sentimentos e emoções que desejava imprimir ao conjunto, ora trazendo-a ao centro das atenções, reiterando sua independência como gênero. Ao mesmo tempo, incorporou as paisagens urbanas em suas obras, tratando-as não apenas em seus aspectos físicos, mas enfatizando sua carga de memórias, usos e significados.
Lasar Segall
Lasar Segall (1889–1957) foi pintor, gravador, escultor e desenhista, nascido em Vilna, na atual Lituânia, então território do Império Russo. Filho de uma família judaica, viveu desde cedo a experiência da migração, tema que marcaria profundamente sua obra. Em 1905 mudou-se para a Alemanha, onde estudou nas Academias de Belas Artes de Berlim e Dresden. Lá, enfrentou a condição de estrangeiro e a solidão do exílio, que se tornaram centrais em sua produção artística.
Nos anos seguintes, Segall rompeu com o ensino tradicional das academias e aderiu às linguagens de vanguarda, aproximando-se do expressionismo. Suas obras passaram a integrar importantes coleções públicas e privadas na Alemanha, especialmente durante a República de Weimar, quando o país se abriu à arte moderna. Com a ascensão do nazismo, em 1933, cerca de 50 obras suas foram confiscadas de museus alemães e algumas exibidas na mostra Arte Degenerada (Entartete Kunst).
Em 1923, Segall fixou-se definitivamente no Brasil, tornando-se um dos pioneiros do modernismo no país. Entrelaçou temas universais — o exílio e o sofrimento humano — com a realidade brasileira, retratando paisagens, tipos e dramas sociais locais. Faleceu em São Paulo em 1957, reconhecido como um dos grandes nomes da arte moderna brasileira.
O Museu
O Museu Lasar Segall conserva, pesquisa e divulga a obra de Lasar Segall, abrigando um acervo de mais de 3 mil itens da produção do pintor, escultor e gravurista, um dos pioneiros da arte moderna brasileira.
O acervo forma um recorte representativo da obra de Segall, permitindo uma visão panorâmica em toda sua variedade técnica e temática. A produção contínua de exposições possibilita novas leituras que dinamizam e contextualizam historicamente — e no presente — a importância do artista e de sua produção.
É uma instituição responsável não apenas pela guarda da obra de seu patrono, mas também por estimular a vivência, a reflexão e a experimentação no campo das artes, assegurando o direito à memória e à promoção da educação para a cidadania.
Constitui-se como um centro de atividades culturais, oferecendo exposições, visitas educativas e cursos e oficinas gratuitas na área de gravura e desenho. Conta também com uma sala de cinema, o Cine Segall, e uma biblioteca especializada nas artes do espetáculo, a Biblioteca Jenny Klabin Segall.
Localizado na cidade de São Paulo, no bairro da Vila Mariana, na Rua Berta 111, o Museu está aberto à visitação de quarta a segunda, das 11h às 19h, com entrada sempre gratuita, sem necessidade de reserva de ingressos.
Idealizado pela viúva de Lasar Segall, Jenny Klabin Segall, o Museu foi criado em 1967 pelos filhos do casal, Mauricio Segall e Oscar Klabin Segall. A antiga residência e ateliê do artista, projetados em 1932 por Gregori Warchavchik — um dos pioneiros da arquitetura moderna no Brasil —, abrigam a instituição.
É uma unidade do Instituto Brasileiro de Museus (Ibram), vinculada ao Ministério da Cultura, e conta com apoio da Associação Cultural de Amigos do Museu Lasar Segall (ACAMLS), sociedade civil sem fins lucrativos fundamental para viabilizar projetos culturais e educativos, por meio das contribuições regulares de seus sócios e dos recursos obtidos junto a órgãos públicos e privados.
O Paisagismo Modernista na Produção Artística de Lasar Segall
Abertura em 8 de novembro de 2025, das 15h às 19h
Visitação de quarta a segunda, das 11h às 19h (fechado terças)
Entrada gratuita
Museu Lasar Segall (Ibram/MinC)
Rua Berta 111, Vila Mariana, São Paulo
A 500m da estação Santa Cruz do metrô
Informações em www.mls.gov.br