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A Casa de Tia Ciata abre as portas na Pequena África
Casa de Tia Ciata
Por: Marcela Ribeiro, coordenadora de Comunicação da Fundação Cultural Palmares
As ruas da Pequena África, região portuária do Rio de Janeiro, guardam há mais de um século marcas da diáspora africana, da fé e da música que moldaram o país. Foi ali, na Rua Camerino, que se abriu nesta quinta-feira (25) a Nova Casa da Tia Ciata – A Potência de um Legado, espaço que restitui à cidade um centro de referência cultural dedicado a Hilária Batista de Almeida, a ialorixá que atravessou o tempo como símbolo de sociabilidade, espiritualidade e invenção musical.
A cerimônia, marcada pela emoção de quem reconhece no território da Pequena África um patrimônio vivo, contou com autoridades, artistas e lideranças comunitárias. Entre elas, a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco; o presidente da Fundação Banco do Brasil, Kleytton Morais; a bisneta de Tia Ciata, Gracy Mary Moreira; além de representantes do Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania. A Fundação Cultural Palmares esteve presente por meio do representante regional no Rio de Janeiro, Eliel Moura, que reforçou a ligação histórica da instituição com o território.
Em sua intervenção, Moura destacou: “É importante reconhecer a relevância dos remanescentes de Tia Ciata para o território, cumprindo e mantendo o seu legado de espaço aglutinador da negritude, através do qual toda nossa inventividade e potencial podem florescer. O novo espaço, digno e com infraestrutura, é um passo importante para a preservação desse patrimônio afro-brasileiro”. Ele lembrou ainda a vizinhança entre as instituições: “A Fundação Palmares no Rio de Janeiro é vizinha da Casa de Tia Ciata, e chegou aqui pela influência de organizações como essa também”.
De Brasília, o presidente da Fundação Cultural Palmares, João Jorge Rodrigues, fez questão de ressaltar que “Tia Ciata transformou sua casa em referência cultural e social no Rio de Janeiro, reunindo gente, música e espiritualidade em torno de uma convivência que moldou parte essencial do Brasil. Reconhecer a importância da Casa de Tia Ciata é reconhecer que a história negra estrutura a vida nacional. A Fundação Cultural Palmares se irmana a esse gesto, certa de que preservar esse espaço é também afirmar a continuidade de uma presença que não se apaga”.
A ministra Anielle Franco ressaltou que a preservação da memória ancestral é condição para construir um futuro de justiça racial. Já Gracy Mary Moreira, à frente da Casa que leva o nome da bisavó, não esconde a admiração e envolvimento com o local e toda a sua história: “A reafirmação desse território da Pequena África é muito importante e Tia Ciata está inserida nisso. Você passa em qualquer lugar aqui, tanto no Largo da Prainha, na Pedra do Sal, no Morro da Conceição, no Morro da Providência. As pessoas abraçando e reconhecendo todas as atitudes e expressões que Tia Ciata trouxe. Esse é o legado dela”.
A guardiã do samba
A vida de Tia Ciata se confunde com a história da música brasileira. Sua casa, que também era terreiro, acolheu encontros entre Donga, Pixinguinha e João da Baiana, a chamada “santíssima trindade do samba”. Foi nesse espaço que o samba carioca se uniu ao samba de roda baiano e se consolidou como gênero musical capaz de traduzir a alma do país.
A reabertura da Casa é a devolução de um território de memória à cidade, um lugar onde fé, música e ancestralidade se encontram. Para a Fundação Cultural Palmares, que há 37 anos atua na preservação do patrimônio cultural afro-brasileiro, a inauguração da Nova Casa da Tia Ciata representa um gesto coletivo de reconhecimento: a memória negra é parte indissociável da identidade nacional.