Conversa com o Presidente - Live do dia 31.out.23
Jornalista Marcos Uchôa: Bom dia. Mais um programa Conversa com o Presidente. Bom dia, Lula. Bom dia, presidente. E nós estamos aqui num dia muito especial, porque se a gente voltar um ano, era um ano de muita alegria. Um momento de muita alegria, que foi um ano da vitória, realmente, daquele segundo turno. E aí? Eu gostaria de voltar um pouquinho atrás, aquele momento, aquele dia, como é que foi. O quê que vem à tua cabeça quando você lembra desse ano.
Presidente Lula: Veja, o que vem na minha cabeça é que nós tivemos o ano, possivelmente, de maior quantidade de mentiras contadas no Brasil desde que o Brasil foi descoberto. Acho que nunca se mentiu tanto, porque o nosso adversário, ele contava mentira por segundo. Ele fazia questão de acordar mentindo e deitar mentindo. Ele fazia questão de inventar coisas para contar para o povo. Ele fazia questão de inventar remédio para quem estava doente com Covid. Ele fazia questão de inventar mentira sobre economia, ou seja, fazia parte do DNA dele a quantidade de mentiras que era contada por dia na sociedade com a máquina de fazer mentira que, até então, a gente não tinha conhecimento.
Então, a nossa vitória foi uma vitória, eu diria, tão maiúscula que ele ficou nocauteado. Ele ficou dentro de casa um mês, porque não sabia o que fazer. Porque a quantidade de dinheiro que eles jogaram durante o processo eleitoral, a quantidade de utilização da máquina pública para tentar evitar de perder as eleições foi de tamanha magnitude que, quando ele perdeu, ele entrou em parafuso. Ele se trancou dentro de casa, ficou chorando, lamentava. Tem gente que disse que tem dia que ele falava, tinha dia que ele não falava. E, na verdade, ele estava preparando um golpe. E estava preparando um golpe que era para ser no dia da minha diplomação. Como eu mudei a diplomação do dia 18 para o dia 12, eles foram pegos de surpresa. Mesmo assim, no dia 12, quando eu fui diplomado, fizeram aquele carnaval, enfrentaram a Polícia Federal, tocaram fogo em ônibus. Aqui no centro de Brasília com a proteção da polícia. Eu estava no hotel, eu estava vendo tudo que estava acontecendo. Então, foi um ano glorioso para a democracia brasileira. Porque o povo que pensa na verdade, o povo que quer construir um Brasil saudável, um Brasil humanitário, um Brasil que as pessoas vivam felizes, que construam a sua família com a maior delicadeza, com maior respeito, esse povo venceu as eleições.
Então, depois de vencer as eleições, nós fomos fazer a transição. E na transição é que nós descobrimos todas as falcatruas que tinham acontecido neste país. O gasto de quase 300 bilhões de reais em políticas que se jogavam dinheiro pela janela, se distribui dinheiro para motorista de táxi.
Marcos Uchôa: Que nem existiam.
Lula: Para motorista de caminhão que não tinham nem carta, que não tinham nem carteira de motorista. Então, tudo isso está sendo apurado, tudo isso está sendo investigado. Tudo isso vai se transformar em uma denúncia. E eu acho que o que é importante é que nós conseguimos fazer quase que um milagre. O quê que é esse milagre? Nós pegamos esse país semidestruído do ponto de vista de políticas públicas. E nós já recuperamos, praticamente, todas as políticas públicas de inclusão social que tinham dado certo no Brasil. Depois nós fizemos o PAC, depois nós recuperamos a imagem do Brasil no exterior. E agora, a partir de 2024, é viajar o Brasil, é conversar com o povo, é fazer investimento na educação, é fazer investimento no ensino médio, é fazer investimento na saúde, é fazer investimento na geração de emprego, é fazer investimento na cultura. Ou seja, agora o Brasil, e eu, particularmente, vou me dedicar a viajar o Brasil. A conversar com prefeitos, a conversar com governadores, a conversar com sindicalistas, a conversar com a juventude, a conversar com estudantes, para que a gente possa colocar o Brasil definitivamente no centro da democracia em todos os países do mundo.
Marcos Uchôa: Mas volta, eu queria que você contasse, porque eu acho que é uma curiosidade de todo mundo. Naquele dia, naquela noite, quando você ganhou, como é que foi a comemoração, como é que foi a alegria. Porque tem esse lado também. Devia ser uma mistura de um alívio com a vitória, realmente, contra uma coisa muito forte. Mas, ao mesmo tempo, devia estar sendo uma alegria enorme.
Lula: A alegria foi grande. Mas veja, é a primeira vez. Se você pegar desde a Proclamação da República até a eleição do Bolsonaro você vai perceber que nunca antes na história do Brasil nenhum presidente utilizou a máquina pública como ele utilizou.
Marcos Uchôa: Sim.
Lula: Ninguém nunca. Porque não foi só a máquina pública. Ele utilizou as Forças Armadas, ele utilizou as polícias estaduais, ele utilizou a Polícia Rodoviária, ele utilizou a Polícia Federal. Ele utilizou todas as instituições.
Marcos Uchôa: A Abin agora com esse escândalo...
Lula: A que ele não conseguiu utilizar para ele, agora nós estamos vendo, escuta telefônica de gente que não deveria ter escutado, que não tinha decisão judicial. O que é importante em tudo isso é que o Brasil também tem pessoas boas que resistiram a isso. Por isso, a Justiça Eleitoral, a Suprema Corte, tiveram um papel excepcional no garante do processo democrático. Porque até então eu nunca tinha visto ninguém ameaçar a Suprema Corte. Eu nunca tinha visto ninguém pegar um bando de coronel ou de general aposentado e colocar dúvidas sobre as eleições, sobre as urnas eletrônicas que são respeitadas no mundo inteiro.
Ou seja, então, essas coisas que aconteceram criaram um clima muito, muito, muito, de muita expectativa no Brasil. E quando nós ganhamos, obviamente que eu fiquei muito alegre. Porque foi uma eleição com muito suor, com muito sangue, enfrentando a máquina pública como jamais nós tínhamos enfrentado. E agora o nosso papel é recuperar as instituições e estabelecer a normalidade da relação com o Congresso, com a Suprema Corte, com o Poder Judiciário como um todo. E cada um cumprir com a sua função. E é isso que nós estamos fazendo. É por isso que o ano de 2023 está sendo exitoso. Obviamente que, quando você planta um pé de fruta, não vai dar fruta no mesmo ano que você planta, às vezes demora um pouco. Mas o que nós já plantamos, nós vamos começar a colher. Agora muita coisa já está sendo colhida. E vamos colher muito a partir de 2024. Só pra ter ideia, esse ano, possivelmente, a gente chega no final do ano a 2 milhões de empregos com carteira profissional assinada. O que é importante, esse ano o PIB vai crescer 3 vezes mais do que o FMI previa no começo do ano.
Esse ano o que a gente vai perceber é que já melhorou a qualidade da saúde, já está melhorando a integração. Nós já anunciamos escola de tempo integral. Já anunciamos bolsa para estudante de classe média. Já vamos criar uma universidade de matemática no Rio de Janeiro. Nós vamos levar o ITA para o Ceará. Nós vamos voltar a fazer desse país ser o país efetivamente do presente. Não um país do futuro. É um país que vai acontecer agora. E nós estamos trabalhando para isso. Eu estou muito satisfeito. Eu tenho consciência de como é difícil fazer as coisas, como é difícil recuperar políticas públicas desmontadas. Quando você vai reconstruir, reformar uma casa, é muito mais difícil do que você começar a fazer uma casa nova. E nós colocamos a casa em ordem. Agora, é trabalhar, trabalhar, trabalhar, para gente poder fazer o Brasil voltar a ser o país do sonho e da esperança de 200 milhões de brasileiros.
Marcos Uchôa: Presidente, eu tenho uma curiosidade. São quase 40 ministérios. É muita gente, são muitos ministros, são muitas secretarias, são muitas políticas públicas, muitas mudanças. E o senhor, de certa maneira, tem que ter na cabeça um pouquinho de tudo. E claro, de alguns assuntos mais do que outros. Como é que o senhor faz esse trabalho?
Lula: Primeiro, você tem o acompanhamento daquilo que os ministérios fazem. Ou seja, a cada mês, a cada dois meses, a gente pede informações de cada ministério, o quê que eles fizeram. Eu já fiz duas reuniões, vou fazer a terceira reunião de ministério esse ano. No final do ano vou fazer uma reunião de avaliação do que aconteceu no país. Cada ministério vai prestar conta, aquilo que foi feito, aquilo que funcionou, aquilo que não funcionou, aquilo que está dando certo, aquilo que não está dando certo. Para que a gente possa, a partir de 2024, acertar tudo que tem que acertar. A quantidade de ministérios se faz necessária porque é importante que os segmentos da sociedade estejam representados no governo. Eu vou te dar um exemplo. O Brasil é um país que tem 12% de água doce do mundo. O Brasil é um país que tem 8 mil km de costa marítima. Ou seja, a minha pergunta é o seguinte: você ter a Secretaria da Pesca ligada ao Ministério da Agricultura, isso só se peixe nascesse em terra. Mas peixe não nasce em terra, nasce em água. Então, você cria um ministério especial de pesca, para quê? Para que a gente possa fomentar a criação de peixe, inclusive em cativeiro, para que o Brasil se transforme em um país competitivo, exportador. O Brasil hoje exporta menos que o Peru, exporta menos que o Chile e o Brasil tem muito mais água e tem muito mais mar. E o Brasil pode se profissionalizar. Quando você cria a Secretaria da Igualdade Racial. Olha, um problema muito sério que acontece no Brasil, o preconceito racial. Então você cria para você dar representatividade a um segmento da sociedade que é muito importante, que ele não estará representado em um ministério muito grande. Um ministério muito grande tem um ministro, tem 50 subsecretarias. E subsecretário pode menos do que o ministro, tem menos visibilidade. Então, o que eu quero é dar visibilidade ao extrato social que compõe a sociedade brasileira. Daí o Ministério dos Direitos Humanos, daí o Ministério da Mulher. A questão da mulher é uma coisa muito grave, a questão de gênero é muito grave no Brasil. O preconceito contra a mulher, a violência contra a mulher. O salário da mulher que era mais baixo, outro dia que nós aprovamos a lei garantido um salário igual para trabalho igual entre homens e mulheres. O feminicídio tem aumentado apesar das leis punitivas que nós fazemos. Então, criar o Ministério da Mulher é uma necessidade de fazer aquele segmento, que é a maioria da sociedade brasileira, a ter um espaço em que ela possa dizer, falar, reclamar, reivindicar, propor e executar política para as mulheres.
Marcos Uchôa: Hoje, inclusive, tem uma lei que o senhor vai sancionar de uma bolsa para filhos de vítimas de feminicídio. Que é uma coisa realmente muito séria.
Lula: É preciso garantir que as pessoas que são vítimas da violência não tenham seus filhos abandonados pelo Estado. Se o Estado não cuidou da pessoa e permitiu que ela fosse vítima, o Estado precisa pelo menos assumir a responsabilidade de cuidar das crianças. Então a gente quer criar uma bolsa para garantir que essas crianças possam estudar, e se formarem e amanhã poderem ter o direito de viver cidadania plena nesse Brasil. Nós vamos sancionar a lei. É uma lei muito importante. Acho que o Congresso Nacional está de parabéns por ter aprovado isso. E, aos poucos, a gente vai conseguindo conquistar os espaços. Muita coisa para conquistar. Tem muita coisa, Uchôa. O problema é que o Brasil foi abandonado durante muito tempo. Então, quando você vai na periferia que você nota o abandono das pessoas. Quando você vai no campo é que você nota o abandono das pessoas. Ou seja, você percebe que tem uma parcela da sociedade que ninguém quer cuidar. Que as pessoas não têm nenhuma importância. Eu, agora, estou preocupado não apenas com as crianças, mas eu estou preocupado com as pessoas de terceira idade, com as pessoas mais velhas. Que muitas vezes são abandonadas, que muitas vezes tem algum problema de doença mental e que ficam na rua e o Estado precisa criar uma política para cuidar dessa gente. Se não for o Estado, ninguém vai cuidar. Então essas são minhas preocupações. E eu tenho 3 anos e 2 meses de mandato e vou tentar criar todas as políticas que puder cuidar de cada um dos brasileiros. Seja criança, seja adulto, seja pessoa de meia idade, ou seja, pessoa mais idosa. O Estado brasileiro tem que cuidar disso. E cuidar gerando oportunidade de as pessoas terem acesso a centros de reabilitação. As pessoas precisam ter acesso a muita cultura porque as pessoas precisam...
Marcos Uchôa: Crescer, aprender, divertir…
Lula: A cultura dá vida às pessoas. Por isso que eu tô feliz com o trabalho no Ministério da Cultura, com a Lei Paulo Gustavo, com a Lei Aldir Blanc. Ou seja, dinheiro que a gente jamais imaginava ter, foi aprovado no Senado e na Câmara. Então agora você está fazendo com que as prefeituras possam participar ativamente da cultura. Os estados possam participar e a União participar. Nós vamos ter a primeira conferência de cultura o ano que vem. E durante a campanha eu propunha que a gente deveria ter comitês culturais em cada capital e nós vamos ter que ter comitês culturais. Porque a cultura é uma das formas mais extraordinárias de você envolver a sociedade brasileira, envolver a juventude, a ser criativa e a propor coisa nova para esse país. Por isso as coisas vão acontecer. Eu sei que as fake news continuam. A máquina de contar mentira continua. Ela está em andamento. Graças a Deus a gente debelou o golpe de 2008, do dia 8 de janeiro. A gente debelou esse golpe, do dia 8 de janeiro. As pessoas estão sendo condenadas e cada um que tiver culpa vai ser condenado. Porque as pessoas precisam aprender a viver democraticamente. Eu digo sempre e repito todo dia. Ninguém é obrigado a gostar de ninguém. O que nós somos obrigados é a respeitar as pessoas como elas são. E cada um respeitar o direito dos outros. Essa é a sociedade que nós queremos criar pro Brasil. E, por isso, nós vamos fortalecer o processo democrático. Vamos fortalecer a nossa relação com o Poder Judiciário, a nossa relação com o Poder Legislativo, a nossa relação com a sociedade organizada. Porque aí sim, a gente vai estar consolidando a democracia.
Marcos Uchôa: Voltando na cultura. Eu queria que você falasse um pouquinho da tua vida. De música, de cinema, de televisão, de teatro. O quê que você começou gostando, o que foram as primeiras coisas que, para você, foram te despertando interesse nisso, nessa área?
Lula: Eu acho que como todo brasileiro a gente nasce...
Marcos Uchôa: Futebol, claro, é cultura também…
Lula: Gostando da música brasileira. Eu sou da terra do forró. Então, desde pequeno a gente estava habituado a ouvir Luiz Gonzaga e outros cantores famosos do Nordeste. Depois você vem para São Paulo, você tem acesso à chamada música raiz, a música caipira, que era representada em São Paulo, muito mais por Tonico e Tinoco. Depois você tem a música popular brasileira representada pelos cantores extraordinários, como Chico, Gil, Caetano, Gal Costa, Bethânia, Elis Regina, e tantos outros, Martinho da Vila, que são figuras extraordinárias. Djavan. Então, aí você passa a gostar um pouco de tudo. Você passa a gostar um pouco de tudo. Eu gostava muito de carnaval, eu frequentava carnaval. Lamentavelmente, depois da vida política, eu fiquei um pouco proibido disso. Eu gosto muito de futebol. Ainda assisto futebol quando eu tenho tempo. Gosto de futebol brasileiro, gosto do futebol estrangeiro. Gosto de ver...
Marcos Uchôa: Messi ganhou ontem a oitava Bola de Ouro.
Lula: Não é possível. Não é possível que o Messi não sirva de exemplo a outros jogadores brasileiros. Um cara com 36 anos de idade, um cara que foi campeão do mundo, ganhou o ano passado e ganhou esse ano outra vez, jogando nos Estados Unidos, a Bola de Ouro. O Messi deveria ser inspiração para essa molecada que aparece na televisão que a gente pensa que vai ser craque e daqui a pouco desaparece. Daqui a pouco desaparece, porque talvez a vaidade, talvez não ter estrutura psicológica para crescer. Aparece a meninada pintada de ouro e daqui a pouco desaparece. Aí aparece o menino de 17 anos, daqui a pouco ele está vendido. E a gente não consegue mais criar. Há quantos anos que o Brasil não tem um ídolo de verdade? Há quantos anos? Eu fico pensando na Seleção de 70, na Seleção de 2002. A última Seleção foi a de 2006. A última grande seleção que nós perdemos por, eu diria, um acidente, uma coisa que a gente não deveria perder porque a Seleção Brasileira era muito boa. Mas já vai fazer 22 anos que a gente não ganha nada. E do jeito que a gente está, do jeito que a gente vê os jogadores de outras seleções e vê a brasileira. Se a gente não tomar consciência de que nós precisamos melhorar, nós precisamos ser mais sérios, precisamos ser mais responsáveis, a gente vai passar mais tempo sem ganhar um título. Porque o título conta muito e 24 anos. Eu lembro que nós ficamos de 70, nós fomos ganhar só em 94. Foram 24 anos.
Marcos Uchôa: Em 82 aquela Seleção maravilhosa, mas não ganhou.
Lula: Tivemos seleção extraordinária em 82 e 86, com Zico, Sócrates, Falcão, Cerezo, mas que não ganhou. É o que o Romário fala: “Eram bons, mas não ganharam”. E a dele ganhou em 94. Então, é importante. Eu às vezes fico triste porque no Brasil a molecada é vendida com 16, 17 anos, e depois a gente compra o cara aposentado já. Você vende um jovem e traz de volta um aposentado com 36 anos, 37 anos. Se bem que hoje o preparo físico permite que as pessoas vivam, joguem bola um pouco mais. Eu fico um absurdo de ver o Cristiano Ronaldo na Arábia Saudita, em 43 jogos marcar 40 gols. Mais do que todo o time do Corinthians em dois campeonatos. Eu fico triste de ver o Messi nos Estados Unidos, em 43 jogos marcar 30 gols, aí ganhar outra vez a Bola de Ouro com 36 anos de idade. Isso é para mexer com a cabeça dos nossos jovens. Quem quiser ganhar a Bolsa de Ouro, tem que ser profissional, tem que se dedicar. Quem quiser ser profissional não combina com farra, não combina com noitada. Ser profissional significa se dedicar, significa ser ídolo. Significa se dedicar, significa ser exemplo. Se você não é exemplo, você não serve pra muita coisa. Então, eu acho que o Brasil vai precisar melhorar muito. Eu, agora que fiz operação nos quadris, devo voltar a jogar bola. Se o Diniz estiver com bom humor, o Diniz pode até me convocar.
Marcos Uchôa: O teu fisioterapeuta me falou até que uma das tuas fisioterapias é dar uns chutinhos na bola, né? Com apoio de uma perna e também para o movimento.
Lula: Eu faço todo dia. Todo dia eu tô chutando 30 chutes com a perna direita, 30 chutes com a perna direita.
Marcos Uchôa: E tá acertando no gol?
Lula: Estou chutando de três dedos. Eu tô me preparando. Se o Diniz estiver de bom humor e quiser me fazer um treino eu posso até ir junto com o Chico Buarque que, aos 81 anos, também está jogando bola.
Marcos Uchôa: Agora é bom falar de esporte também, que no Pan-Americano o Brasil está indo muito bem, hein? Já está em segundo lugar. Só perde para os Estados Unidos em medalha e é fruto, muito, de Bolsa Atleta, de ajuda do Governo Federal. Isso é esperançoso para a Olimpíada.
Lula: Eu fico muito feliz em saber que grande parte dos atletas que estão participando das Olimpíadas, da Paraolimpíadas, são...
Marcos Uchôa: Pan-Americano agora.
Lula: São pessoas que estão recebendo o Bolsa Atleta. O Bolsa Atleta foi uma coisa que nós criamos para garantir que as pessoas pobres, que não tinham dinheiro para comprar um tênis, pudessem praticar esporte. Porque o que acontece. A iniciativa privada, ela só faz publicidade para o cara que dá retorno financeiro. Mas ninguém que está começando a carreira dá retorno financeiro. Nós temos exemplo de pessoas que corriam na rua sem tênis, nós temos exemplo de pessoas que queriam fazer ciclismo sem bicicleta. Então, as pessoas precisam de ganhar um incentivo de quem? Do Estado. A prefeitura pode dar incentivo, o governo do estado pode dar incentivo, o Governo Federal pode dar incentivo. No caso, foi o Governo Federal que criou o incentivo. E isso precisa ser seguido. Nós temos o sistema S no Brasil que pode ajudar muito. As Forças Armadas têm contribuído muito na formação de profissionais. Ou seja, o que nós precisamos é aproveitar o jeito esportivo do povo brasileiro, a vontade que ele tem e dar condições para essa gente treinar. Eu, quando vejo a Rebeca com a medalha de ouro, eu fico feliz.
Marcos Uchôa: Aquele sorriso dela é lindo.
Lula: Eu fico feliz porque eu sei como é que ela começou. Eu sei que pra ela ser uma medalhista de ouro, ali não teve moleza de sábado e domingo, ali não teve balada, ali não tem tempo para descansar. Ali é treino, treino, treino e treino. Somente assim é que a pessoa vai conseguir uma medalha de ouro. Seja na natação, seja no boxe, seja no trapézio, em qualquer coisa que o cara quiser fazer nas Olimpíadas e no Pan-Americano tem que treinar muito, muito, muito, se não não ganha nada. E eu acho que essas pessoas merecem elogios, merecem respeito, porque são pessoas que se dedicaram muito para chegar onde chegaram. Aqueles que não conseguiram medalha certamente vão se preparar, vão continuar treinando para que na próxima eles possam ganhar.
Marcos Uchôa: Agora, uma das coisas desse ano, particular, é a questão do ensino integral. No ensino integral também, essa coisa do esporte, estar na escola o tempo todo, vai ajudar, né? Porque de certa maneira cativa o jovem, cativa essa criança para estar na escola, para crescer junto, cabeça e o corpo.
Lula: Uchôa, o nosso sonho é que o Brasil inteiro tenha um sistema de ensino integral para todas as pessoas. Do ensino fundamental ao ensino médio. Porque não só você dá oportunidade das pessoas praticarem outras atividades nas escolas além do aprendizado normal, mas praticar esporte, participar de olimpíadas, como você também tem uma coisa que é a questão da segurança das pessoas. A tranquilidade que você dá para mãe e para o pai. Eles sabendo que seu filho está em uma escola de tempo integral. Isso é uma coisa extraordinária que vale para a educação, vale para o esporte, mas vale também para a família, vale para a questão da segurança. Uma coisa importante que nós fizemos, Uchôa, nós vamos fazer a faculdade de matemática no Rio de Janeiro. Nós vamos pegar as crianças que participam das olimpíadas e ganharam medalha de ouro, nós vamos criar um centro de excelência, para que esses pequenos gênios brasileiros possam fazer uma faculdade de matemática e competir no mundo inteiro, com quem quer que seja. Porque o nosso IMPA, Instituto de Matemática Aplicada, é uma coisa de extraordinária competência no mundo inteiro. Então, a gente vai tentar fortalecer esses nossos alunos. Já tem 100 apartamentos comprados no Rio de Janeiro. A faculdade já está pronta e a gente vai, então, começar a fazer com que essas crianças possam, esses adolescentes, possam ter quase que uma escola de tempo integral. Porque eles vão morar lá e vão estudar matemática. Essa é uma coisa que a gente vai começar com 100, no ano seguinte 200, no ano seguinte 300, no ano seguinte 400. Para que a gente possa criar a faculdade de gênios nesse país da matemática.
Marcos Uchôa: Porque matemática é tecnologia. É a raiz da tecnologia. O mundo hoje é tecnologia.
Lula: Eu lembro que eu tava, domingo, conversando com meu neto, que tem 13 anos, e eu tava perguntando se ele gosta de matemática. Ele falou que gosta, mas ele não é tão bom. Eu falei: "Então, se você não é tão bom, você precisa ficar bom. Você precisa pegar um professor que gosta de matemática para te ensinar a desfiar o casulo da matemática". Porque a professora Suely Druck, um dia, me disse que matemática, quando a pessoa aprende a matemática, passa a ser a melhor matéria da escola. Passa a ser a matéria preferida do aluno. E, para muitos, a matemática é difícil, porque ele não aprendeu ainda. Então, é importante que as pessoas aprendam a fundo para que as pessoas possam participar, porque o Brasil está precisando muito de gente muito qualificada. O Brasil está precisando de muita gente formada na matemática. O Brasil está precisando de muita gente formada em engenharia. O Brasil está precisando de muita gente formada em pesquisa. Para que o Brasil dê um salto de qualidade. Nós vamos abrir um ITA no Ceará. É quase que uma premiação para o Ceará, porque boa parte dos alunos que passam no vestibular para entrar no ITA, passam no Ceará. Então, nós vamos levar o ITA para o Ceará. Eu não estou podendo fazer viagem de avião até o final de novembro. Depois eu vou ter que ir nos Emirados Árabes, que é a reunião do clima, depois eu passo na Alemanha em uma reunião empresarial Brasil-Alemanha. E, ainda em dezembro, eu quero ver se eu vou ao Ceará anunciar a construção do ITA e, talvez, inaugurar a universidade no Rio de Janeiro. E também eu quero ir a São Paulo anunciar a famosa faculdade da Zona Leste, que já era para estar pronta e nem começou. Inaugurar a Universidade de Osasco e tentar anunciar dois institutos federais na Zona Leste e na Zona Sul de São Paulo. Então, eu pretendo, a partir do ano que vem, cuidar muito, mas com muito carinho da questão da educação. E quando se fala em educação, além do ensino fundamental com o ensino de tempo integral, eu quero cuidar do ensino médio, para que os nossos jovens tenham uma profissão. E, daí, a novidade é que nós vamos propor uma bolsa para que a gente evite a evasão escolar,
Marcos Uchôa: Sim, que é um problema sério.
Lula: Porque tem muita gente desistindo da escola e a gente não quer que as pessoas desistam da escola. A gente quer fomentar que o jovem continue na escola, que se forme, que aprenda uma profissão para ele poder cuidar da vida dele. Eu digo sempre que quando a gente tem uma profissão, a gente é mais cidadã, mais cidadão do que se a gente não tiver uma profissão. Eu sei o que é procurar emprego com profissão e sei o que é procurar emprego sem profissão. Por isso que nós queremos colocar o ensino médio profissionalizante, para que a gente dê qualidade no aprendizado da nossa juventude.
Marcos Uchôa: Essa aposta tua muito na educação também é porque, é claro que o agronegócio é maravilhoso, vender soja. Mas a gente precisa voltar a se industrializar, voltar a entrar também no jogo da tecnologia, não simplesmente comprando do exterior, mas fazendo nossas coisas aqui.
Lula: Então, mas deixa eu te falar uma coisa, Uchôa, para a gente não cometer um erro. Quando a gente fala no agronegócio, muitas vezes, as pessoas tratam com um certo desdém. "Ah, o Brasil quer exportar milho, o Brasil quer exportar soja, o Brasil quer exportar carne". O que é importante a gente saber, Uchôa, é a quantidade de tecnologia que tem em um grão de soja hoje. A quantidade de tecnologia que tem em um milho. A quantidade de investimento em genética que tem em um frango, que tem em um boi. Você demorava 48 anos para matar um boi e você mata com 15 meses. O avanço genético é muito grande.
Marcos Uchôa: Isso é ciência também.
Lula: No agronegócio tem muita tecnologia também, não é uma coisa rude, grotesca, como alguns tentam passar. Obviamente que o Brasil tem espaço para o agronegócio e tem espaço para a indústria. O Brasil precisa voltar a ter investimento em indústria. O PIB industrial precisa voltar a crescer. Nós precisamos colocar, na nossa balança comercial, produto com maior valor agregado. E aí nós temos que incentivar. Por isso que nós estamos criando uma indústria na área da saúde. Por que na área da saúde? Porque o Brasil tem mercado. O SUS será um grande comprador dessa indústria da saúde, a hora que ela começar a produzir máquinas, a hora que ela começar a produzir qualquer aparelho para melhorar a investigação de doenças e, ao mesmo tempo, de remédios. Nós temos um potencial extraordinário nisso. E é por isso que nós fizemos um lançamento de um programa de investimento na indústria na área da saúde. E o Alckmin tem cuidado disso com muito carinho. A Luciana tem cuidado no Ministério de Ciência e Tecnologia e nós pretendemos fazer com que o Brasil volte a ser um país industrializado. Se a gente conseguir combinar uma boa política industrial com a manutenção de uma boa política agrícola, é tudo que o Brasil precisa, gente. O Brasil hoje exporta algodão para o Egito. O Brasil, só para você ter ideia, nesses primeiros nove meses de governo, o Brasil abriu 40 novos mercados, 40 novos mercados. Só para ter ideia do que aconteceu com o Brasil. E ainda tem muita coisa pra acontecer. Muita coisa. Tinha gente que não comprava carne no Brasil e agora está comprando. Muita gente no mundo.
Marcos Uchôa: O Fávaro está lá na Indonésia agora, né?
Lula: O que nós queremos é mostrar para o mundo o potencial. O Brasil, sinceramente, o Brasil poderá ser o maior produtor de soja, o maior produtor de milho, o maior produtor de algodão, o maior produtor de café, o maior produtor de soja, o maior produtor de tudo que ele quiser. O Brasil pode porque tem terra, porque tem sol, porque tem água. E, sobretudo, tem tecnologia. Então, veja, não existe essa briga de governo contra fulano ou contra beltrano. O que nós queremos é que esse país cresça, que esse país invista. Os maquinários que nós produzimos para a agricultura são altamente sofisticados, competitivos com qualquer país do mundo. Então, nós precisamos, em um país que foi capaz de criar uma Embraer, esse país pode ter uma política industrial muito importante. É nisso que nós vamos investir. Eu só queria dizer para o povo que está nos vendo que é só o começo.
Ou seja, nós estamos calçando o sapato, porque o primeiro ano é só isso, o primeiro ano é arrumação de casa. Não sei se vocês já mudaram de casa, já mudaram de cidade. O primeiro ano é arrumação, é saber onde vai colocar o espelho, saber onde vai colocar a penteadeira, saber onde vai colocar o fogão, a geladeira. E, quando a casa estiver pronta, você começa então a utilizar. Nós acabamos de remontar o Brasil. E agora, é para o Brasil voltar a funcionar. Por isso, ano que vem, se preparem, porque eu vou viajar para cada estado. Eu quero inaugurar muitas escolas, muitas universidades, muitos institutos federais. Eu quero participar de muitas atividades culturais neste país. Quero visitar comitê de cultura em cada estado desse país, porque, somente assim, é que esse país vai dar um salto de qualidade. Esse país vai voltar a sorrir. Esse país vai desprezar as mentiras, desprezar fake news. Desprezar aqueles que transmitem o ódio todo santo dia. Que vomita ódio e que arrota ódio. Quando nós estamos precisando de gente com coração leve. Gente que sorri. Gente que fala de amor, de paixão, de fraternidade, de solidariedade. Gente que cuida de criança. Gente que cuida das pessoas mais velhas. Gente que trata com carinho seus familiares. Por exemplo, nós estamos chegando ao final do ano. Tem muita gente que deixou de conversar entre famílias por conta de eleições. Eu queria fazer um apelo para vocês que votaram em mim, que não votaram em mim: isso é ignorância. A gente não pode brigar com filho, com pai, com irmão, por causa de política. A gente tem que aproveitar essa época do final de ano e se abraçar. Se beijar. E deixar a política para discutir fora de casa. Dentro de casa, a gente discute família. A gente discute a solução dos nossos problemas. A gente discute solidariedade. Visitar aquele parente que está doente, visitar aquele parente que está desempregado, tentar ajudá-lo a melhorar de vida. É isso que a gente tem que fazer para esse país ser melhor. E é isso que o governo vai se dedicar. Nós vamos cuidar das pessoas. Se você está assistindo e você fala: "Ah, eu não gosto desse Lula". Não tem problema, eu gosto de você assim mesmo. Porque, sabe o que acontece quando um não quer? Dois não brigam. Então, o meu papel enquanto governo não é brigar com ninguém, não é ficar falando mal de ninguém. O meu papel é cuidar desse país. E eu vou cuidar, que é uma coisa que eu aprendi a fazer. E vou fazer com muito carinho, com muito cuidado. A economia vai dar certo, os empregos vão acontecer, os salários vão subir, as pessoas serão melhor tratadas pelo governo. A saúde vai melhorar. O salário vai melhorar. É esse o país que você deseja e é esse país que eu quero ajudar a construir, junto com vocês. Sozinho eu sou apenas um. Mas, se a gente tiver junto, a gente faz uma revolução nesse país para melhorar a vida de todo mundo. Por isso, eu conto com vocês. Por isso, eu vou continuar falando com vocês, toda terça-feira. Não sei se só terça-feira, talvez até a gente faça mais programas, a gente possa conversar mais, mas eu só quero que vocês saibam o seguinte: vocês estão na minha agenda em primeiro lugar. Vocês estão em segundo lugar. Vocês estão em terceiro. Porque é por causa de vocês que eu estou aqui e é para vocês que eu tenho que trabalhar. Eu quero dizer para o povo que sofreu as enchentes, que nós vamos cuidar dessas pessoas, independentemente do estado e do governador. Quero dizer para as pessoas que estão sofrendo a seca no Norte do país, no Pará, no Amazonas, no Amapá, no Acre, que nós vamos cuidar de vocês. Nós estamos pedindo a Deus que chova logo na Colômbia, que chova logo no Peru, para a água descer e vir logo encher o nosso rio Tocantins, nosso rio Madeiro, nosso rio Amazonas, nosso rio Solimões. E que a gente possa voltar à normalidade. Enquanto isso não vem, estejam certos que nós estaremos juntos com vocês de dia, de tarde e à noite. Um beijo no coração, gente, e até o próximo programa, se Deus quiser.
Marcos Uchôa: Obrigado a vocês que acompanharam esse Conversa com o Presidente. Um final muito bom. E desse planejamento de fim de ano de muito mais paz. Obrigado presidente.